*Por Manu Siqueira
Eu tive um amor de Carnaval. Alguns, eu diria. Mas um, especificamente, foi mais marcante. Depois do Carnaval, tivemos apenas um encontro. A magia se perdeu. Carnaval tem um encanto, não é? Uma energia meio inexplicável. Foi bonito o que vivi, e guardo memórias lindas desse Carnaval, que foi intensamente saboreado, com todos os seus exageros e fantasias.
Como celebrante de casamentos, contei, no altar, a história de um casal que se conheceu em pleno Carnaval, no Recife Antigo. Um amor mais maduro e bem inspirador, inclusive. Eu acho triste quem nunca amou no Carnaval. Quem nunca trocou olhares com alguém em um bloco e suspirou: “tô apaixonada”. Quem nunca trocou um beijo ardente embaixo de um sol de 40 graus. Quem nunca fez uma amizade que durou menos de cinco minutos. Carnaval faz isso. A gente toma banho de mangueira em meio a uma multidão de desconhecidos, borra toda a maquiagem, mas mantém o sorriso largo no rosto. Nada nos abala.
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Tem uma coisa que gosto muito no Carnaval: a democracia. Na festa, brincam os ricos e os pobres, pretos e brancos, todos os gêneros e credos, quem torce pelo Náutico ou para o Santa Cruz. A gente é mais feliz no Carnaval. Lembro de uma vez estar com uma latinha não mão, ao lado de uma orquestra de frevo, em um bloco de rua, pulando e dançando, quando um catador, esfuziante de alegria, perguntou, com um sorriso grande no rosto, se minha latinha estava vazia para ele recolher. Resultado: pulamos juntos e nos abraçamos no meio do bloco. Nesse dia, chorei emocionada. Eu e ele éramos apenas foliões.
Carnaval, para mim, é isso: a manifestação mais autêntica, irreverente e original, vinda do povo para o povo. Para mim, é, ainda, um ato, sobretudo, político. É uma forma de amar, reivindicar, debochar, se emocionar e ser feliz. Uma ofegante epidemia, como disse Chico Buarque. O mesmo Chico também disse que Carnaval é desengano: “Deixei a dor em casa me esperando. E brinquei, e pulei e fui, vestido de rei. Quarta-feira sempre desce o pano”.
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Carnaval, para mim, tem cheiro, gosto, tato e audição. Amo me arrumar para os blocos já ouvindo frevo. A minha memória olfativa mistura o cheiro das colônias infantis que eu usava nas matinês dos clubes na minha infância com a fumaça incessante dos churrasquinhos de rua. Tem mãos e braços entrelaçados ao som do frevo bem quente. Amo o ritual: preparar a fantasia no dia anterior, encontrar os amigos, pular e dançar até as pernas ficarem dormentes, reclamar do calor, da cerveja quente e da falta de carros de aplicativo. Chegar em casa, tomar um banho, desmaiar na cama e acordar no outro dia para começar tudo de novo.
Nasci no Carnaval. Tenho a alma festiva e, nessa época, glitter espalhado por todos os cantos do meu corpo. Quero continuar acreditando que, no Carnaval, “quem sabe um dia a paz vence a guerra. E viver será só festejar”.
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Neste Carnaval, eu desejo que você receba “Aquela Rosa”, cantada lindamente pela Banda de Pau e Corda, que diz: “Lembro-me bem quando o bloco passou, você sorrindo jogou aquela flor, e eu, que na hora um violão tocava, lhe joguei um beijo e suspirei de amor”. Que a gente continue suspirando de amor pelo Carnaval e pela vida!
*Manu Siqueira é jornalista (mmsiqueira77@yahoo.com.br)