Diego Ramos: “Nosso Tempero Secreto é A Cultura De Colaboração” - Revista Algomais - A Revista De Pernambuco
Diego Ramos: “Nosso tempero secreto é a cultura de colaboração”

Revista Algomais

Durante a cobertura da participação das startups pernambucanas no Startup Summit, a Algomais também voltou os olhos para outro protagonista da cena nacional de inovação: Florianópolis. A capital catarinense tem hoje na tecnologia o setor responsável por 25% do seu PIB, resultado de um processo de organização que começou ainda nos anos 1980 e que hoje se desdobra em um ecossistema com quase 30 mil empresas espalhadas pelo estado.

Na entrevista a seguir, Diego Ramos, presidente da Acate (Associação Catarinense de Tecnologia), explica ao repórter Rafael Dantas como uma cidade que não podia depender da indústria de transformação ou de um turismo sazonal reinventou sua matriz econômica. Ao relatar a importância da cultura de colaboração, das incubadoras e do fortalecimento de polos regionais, Ramos oferece pistas que dialogam diretamente com os desafios enfrentados em Pernambuco, onde o Porto Digital também busca ampliar conexões com setores tradicionais e fortalecer a presença das empresas locais no cenário global.

acate sc

Por que Florianópolis está “bombando” em tecnologia e inovação? O que esse polo tem feito impulsionar o sistema? 

Eu sempre falo, o que a gente está vivenciando agora não é algo que foi construído da noite para o dia. É algo que a gente vem construindo há muito tempo, praticamente há quatro décadas. Em Florianópolis, vivemos em uma ilha, onde mais da metade do território é de preservação ambiental. Logo, a cidade não pode comportar a indústria de transformação. 

Então, lá atrás, pensamos: poxa, não dá para depender só do turismo, que diferente do Recife, que vocês têm oportunidade, tem calor o ano inteiro. Aqui não temos. Nosso turismo é muito sazonal. Também não podemos depender só do poder público. 

Entendeu-se que deveríamos focar numa nova matriz econômica. E foram se construindo as bases para tudo isso. Uma dessas foi a Acate, a Associação Catarinense Tecnologia. Essa foi uma forma de as empresas se organizarem. Mas tem o nosso tempero secreto, que a gente fala, que é essa cultura de colaboração que a gente construiu. Por exemplo, eu e esses tantos aqui – diretores da associação – somos voluntários. A gente busca um propósito maior de construir um ecossistema em que todos possam se beneficiar dentro desse espírito de colaboração. 

E crescemos bem acima da média geral em 2024, fazendo com que passássemos do sexto para o quinto faturamento do Brasil, ultrapassando o Rio Grande do Sul. Isso é representativo, porque estamos falando de forma absoluta. Nosso Estado é pequeno, tem apenas 1,1% do território e 3,4% da população brasileira. Sermos o quinto maior polo de faturamento é bem representativo.

FLORIPA

Qual é o tamanho da Acate?

A CAT tem 39 anos, ela começou com menos de 10 empresas associadas. Hoje já são 1.800, o que nos faz ser uma das maiores entidades de tecnologia do País, embora tenhamos atuação somente regional.

Como é que funciona esse ecossistema local? 

As empresas estão localizadas no estado inteiro. O número total é de quase 30 mil empresas de tecnologia. Então, obviamente, o setor é muito maior que os nossos associados. 

Uma característica importante de Santa Catarina é que a tecnologia tem a força do Polo da Grande Florianópolis, que hoje tem se destacado bastante, mas temos mais sete polos espalhados pelo Estado. A gente busca sempre fortalecer cada vez mais esses polos. 

Nós temos em Florianópolis a Incubadora Miditec há 27 anos, mantida com parcerias com o Sebrae. A incubadora é um de sucesso, eleita por três vezes uma das cinco melhores do mundo. Uma estrutura que graduou grandes empresas, com 95% a taxa de sobrevivência de quem participa desse programa. A gente estruturou uma metodologia e vamos replicar isso em todo o estado. 

miditec

Em termos de participação na economia, qual o tamanho desse ecossistema de tecnologia?

Hoje nós temos Florianópolis com uma capital que se destaca com 25% do PIB da cidade do setor de tecnologia. E falando em termos de estado, são 7,75% do PIB. Então, a gente tem bastante pista ainda para percorrer. 

Como é o relacionamento desse setor de tecnologia com os demais setores produtivos do estado?

Ele é muito bom, mas a gente precisa explorar um pouco mais. Isso é o desafio que a gente tem, principalmente de aproximar, o que a gente chama de indústria tradicional da nossa indústria, que é uma indústria mais digital. Ainda temos uma indústria que é muito conservadora e a Acate tem esse trabalho de atuar, por exemplo, com a Federação das Indústrias, de conseguir apoiar as empresas. Temos um programa de inovação aberta, que é o LinkLab, que é uma forma também de a gente conectar essa indústria com o setor de tecnologia.

Hoje em Pernambuco, temos algumas dificuldades também nesse sentido.  Às vezes uma empresa de tecnologia local tem mais conexões até com o mercado exterior do que às vezes com o mercado local. Isso parece um desafio comum na área de tecnologia. Hoje, das atividades das empresas locais de tecnologia há alguma característica principal em que esses negócios estão mais conectados?

Aqui nossas empresas de tecnologia atuam muito no B2B (Business-to-Business, negócios que vendem para outras empresas).  Diferente de grandes centros, como São Paulo e Rio de Janeiro, que acaba sendo muito B2C (Business-to-Consumer, venda para o consumidor final). Então, temos essa característica, mas elas atendem os mais diferentes setores. Tanto que a Acate hoje tem 13 verticais de negócio: agro, fintech, educação, manufatura, entre outros. Então acaba tendo clientes de diversos setores, mas são a maior parte B2B e também é a maior parte SaaS também, desenvolvimento de software como serviço.

Em geral, esses polos têm muitas empresas, mas algumas gigantes que ancoram o setor. Quais são as grandes empresas do polo tecnológico de Santa Catarina? 

Como é um ecossistema já de quase 40 anos, bastante maduro, a gente começa a ter empresas que são as ponta de lança. Então hoje vou te dar três exemplos aqui em três regiões diferentes. 

Em Joinville nós temos a Asaas. No ano passado, ela recebeu um aporte R$ 820 milhões. Então, é uma empresa que já está valendo seus bilhões de reais. Em Blumenau, nós temos a Senior Sistemas, que é uma líder do mercado de RP. E, semanas atrás, uma empresa nascida aqui em Florianópolis, a Softplan, uma das suas empresas [a Starian] recebeu um aporte R$ 640 milhões. 

seniorsistemas fachada

Temos aqui também a própria RD Station, que foi comprada pela Totvs há alguns anos. Inclusive, a gente quer fomentar cada vez mais essas empresas que se tornam empresas bilionárias. Lançamos um programa chamado Acate 1 bi, que é justamente levar essas empresas para o próximo nível. Esse grupo é formado por empresas que faturam acima de R$ 30 milhões e a gente quer levá-las para faturarem R$ 100, R$ 500 milhões até R$ 1 bilhão.

Vocês têm alguma relação com os outros polos tecnológicos do Brasil, como o de  Pernambuco?

Não, algo formal não. Mas sempre que temos oportunidade, gostamos de trocar ideias.  Eu já conversei algumas vezes com Pierre Lucena, do Porto Digital. Mas tanto a gente quanto eles têm tanta demanda interna e às vezes a distância também não ajuda muito. Então, seria importante que a gente tivesse [esse contato], mas cada um tem seus desafios.  Aqui na casa, já temos um desafio enorme de nos conectar com os polos da Acate, que são espalhados pelo estado. Hoje a gente tem esse papel de integrar, de olhar o estado inteiro.

Quais são os principais desafios que o senhor observa para o setor tecnologia e ganhar mais força, ganhar mais corpo no Brasil?

Eu acho que o desafio é os nossos governantes entenderem o potencial desse setor. Eu não falo nem da culpa deles, mas muitos dos políticos vêm de setores tradicionais, só conhecem esses setores. Tecnologia é um negócio muito novo para eles. Mas se  despertarem será importante. 

Quando olhamos para fora, as empresas mais valiosas americanas são todas de tecnologia. A China hoje talvez é a que mais fabrica unicórnios (startups que valem mais de um bilhão de dólares e que ainda não abriram capital na Bolsa de Valores) do mundo. Infelizmente o Brasil ficou para trás em termos das últimas revoluções tecnológicas. A gente perdeu realmente todas. 

Então, é um trabalho constante [de conscientização]. Infelizmente, por exemplo, na Reforma Tributária, o setor de tecnologia ficou prejudicado, mas é um setor forte gerador de PIB, ajuda as outras indústrias a se modernizarem. 

Mas eu sou otimista. O otimista pode até errar, mas o pessimista já começa errando. Então, a gente tem que olhar com otimismo esse trabalho que a gente faz, que é uma celebração do empreendedorismo.

Nesse olhar nacional ainda, o gargalo estaria onde? É um problema que o político, o gestor público não está conseguindo enxergar o setor?

Eu acho que é financiamento. O agro se tornou o que é graças ao apoio governamental. O apoio governamental nessa área de financiamento é muito importante. Uma startup hoje não tem garantia nenhuma para dar para o banco. A criação de fundos, garantidores de crédito, ajudaria bastante a carregar na mão de obra. 

O Brasil hoje forma menos de 100 mil engenheiros por ano. A China forma mais de 4 milhões. O nosso foco deveria ser nessas disciplinas de ciência e matemática. A gente precisa dar foco naquilo que a gente quer expandir.

Para encerrar, quais os planos para o futuro da associação?

A gente quer abrir a Acate e o ecossistemas de tecnologia cada vez mais para o mundo. A gente abriu uma final no Canadá ano passado, estamos levando 20 empresas para o Canadá agora na imersão. Então, o Brasil ainda é um país muito fechado, participa só de 2% do comércio global. Deixamos 98% na mesa e o setor de tecnologia é muito fácil de internacionalizar. Tanto que a gente está recebendo aqui [Startup Summit,] 20 delegações de várias partes do mundo para criar essas pontes e ajudar a tornar o polo aqui de Santa Catarina uma referê

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