A literatura de Marcelino Freire não tem nada de ordinária. O pernambucano nascido em Sertânia – e hoje radicado em São Paulo – contou recentemente que tem dois romances engavetados. Decidiu não publicá-los ainda porque estavam “muito donos de si”. Veio, no lugar, com este “Bagageiro”, que chega às livrarias pela José Olympio em outubro. A forma mais ordinária de definir “Bagageiro” seria como um livro de contos. Mas, como previamente dito, essa forma não cabe. O livro é uma coleção de “ensaios de ficção”, como define o próprio escritor, inquieto, passional e sempre disposto a rir do próprio umbigo.
Em Pernambuco, o bagageiro é onde se leva todo tipo de coisa em cima da bicicleta: mercadoria, botijão de gás, criança, etc. Nas páginas, são textos com o pulso vivo e vozes múltiplas que erguem mundos. Uma coletânea de pequenas histórias, entremeadas por comentários – por vezes mordazes – sobre a escrita, o país, o mundo, a vida literária e a não literária também. “Minha pontuação de estimação é a interrogação. Mas não tenho muita certeza disto”, escreve Marcelino em uma dessas tiradas.
“Neste livro de ‘ensaios de ficção’, eu estou lá me divertindo. Indo sem ir. Sem apontar o dedo. Quando aponto, baixo o dedo e sigo me perguntando, sigo ironizando, não me levando a sério. Chamei meus contos de ‘ensaios’ porque nunca chamo meus contos de contos. Chamo de ladainhas, improvisos, cirandas”, explica o autor em entrevista ao Blog da Record.
TRECHO:
“Antigamente, eu só de olhar sabia a medida do quadril, a anca da noiva, agora é só nos instrumentos de medida, 18 a 23 cm abaixo da cintura, olha se não é, me ajuda, que é muito número, prefiro dar de ouvido ainda à experiência, aqui amarro um fio ao redor do tronco, a curva natural de tua cintura, ô, minha filha, a primeira que vai sair de casa, Bernarda, teu futuro marido não pode te ver antes da igreja, minha laranjeira, vai sentir a falta da tua mãezinha aqui, vai, não vai?”
Marcelino Freire nasceu no ano de 1967, em Sertânia, Pernambuco. Vive em São Paulo desde 1991. É autor de “Angu de sangue” (Ateliê Editorial, 2000), “Contos negreiros” (Prêmio Jabuti, Editora Record, 2005), “Rasif” (Editora Record, 2008), entre outros. Em 2013, lançou “Nossos ossos”, vencedor do Prêmio Machado de Assis da Biblioteca Nacional, também pela Record.