Público e o privado se misturaram no home office - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Público e o privado se misturaram no home office

Rafael Dantas

Home office, vídeo conferências, cursos online para aperfeiçoamento profissional... Muitas novidades que não são bem assimiladas por todos os trabalhadores que estão atravessando as transições que a pandemia impôs ao mercado de trabalho. Nessa conversa com Mirelle Braga, psicóloga e designer de carreiras do Centro Universitário UNIFBV.

O home office sempre foi um tema que era tratado de uma maneira mais positiva. Mas com a prática geral nessa pandemia passamos a ver muitas dificuldades. Que fatores você aponta que tem gerado tanto estresse nos profissionais nesse período em que a maioria das pessoas foi de alguma maneira forçada a trabalhar em casa?

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Antes de responder à pergunta eu só gostaria de desmistificar um pouco sobre o que é estresse, ele não é uma emoção. É um conceito que foi tirado da física (uma força ou um conjunto de forças). O estresse é o mal do século, pode desencadear tanto a ansiedade quanto a depressão. Estar no mundo é estar sobre estresse, então não podemos demonizá-lo até porque o processo de batida no coração, você respirar, o bombear do sangue em todo seu corpo gera algum tipo de estresse no organismo, porém isso é algo saudável por se tratar de uma reação do organismo voltada para se adaptar. O conceito estresse nos remete a mudança e estamos sempre em mudança e o fato de nos adaptar a essa nova rotina nos causa estresse. Fazendo uma ponte com o que acabei de falar é necessário entender que antes tínhamos uma definição do que era público e privado. Quando existia um problema no privado (casa) em muitos momentos não víamos a necessidade de resolver naquele instante, evitando lidar com aquilo, pois não era algo que levaríamos para o público (trabalho, faculdade, ambiente externo), onde na grande maioria das vezes passávamos a maior parte do nosso tempo. Ou seja, não precisava “resolver” pois por ela mesma a demanda se desfazia, ou não. Atualmente isso mudou, pois agora o público e o privado se encontram no mesmo ambiente e isso faz com que tenhamos que nos empenhar com mais energia para resolução de conflitos que antes não eram "necessários". Hoje não resolvendo algo no privado impacta em nossas atividades que antes realizávamos externamente. Além disso, outro fato que impacta diretamente no aumento de estresse é a não definição de limites como horário de realizar as refeições e se desligar de forma real do trabalho, pois hoje ferramentas que eram utilizadas em muitos momentos como lazer podem ser associadas a rotina de trabalho, assim como o whatsapp.

Como as pessoas podem organizar sua rotina para não se cansar tanto no trabalho? Os relatos são inúmeros de pessoas mais exaustas e até desmotivadas com o trabalho no formato atual.
A melhor maneira de organizar a rotina é fazer um planejamento mínimo, conscientizar as pessoas que em determinado momento você não está mais disponível para empresa. Estipular horários assim como no trabalho, de almoço, pausa café e evitar que estes sejam realizados na frente do computador ou no mesmo espaço que você delimitou como trabalho. Ter minimamente uma organização como se estivesse em dias "normais" de trabalho faz com que seu cérebro entenda que você está em casa, porém está em um novo formato. Em tudo é necessário disciplina. Se você não tiver o mínimo de autocuidado e controle referente a essas questões infelizmente o reflexo virá em forma de estafa, estresse de forma não tão saudável, cansaço em excesso e em muitos momentos aumento de ansiedade e de angustia não possibilitando o enxergar as possibilidades desse momento o tornando dele um peso, que nem sempre deve ser empregado.

As teleconferências são uma das novidades para a maioria das pessoas. Facilita as reuniões, muito usada nas aulas e eventos. Mas é também um dos motivos que são apontados como mais estressantes e que gera rejeição de muitas pessoas. Nós estamos usando muito ou usando de forma errada essa ferramenta?
Algo que é visível é a autocobrança de entrega a mais de resultados sem o entendimento de que isso desencadeia muito estresse. Além de tudo isso, teleconferências, chamadas de vídeo, reunião, aulas e eventos ainda contamos com lives intermináveis e cursos ofertados de forma gratuita que visam "auxiliar" nesse momento. Tudo parece ser importante, nada podendo ser negligenciado, experimentado ou vivido em outro momento da sua vida, mas não é bem assim. Somos seres humanos e não damos conta de tanta informação. As ferramentas são úteis em muitos momentos, auxiliam em demandas difíceis, mas até nisso precisamos parar e refletir: será que é necessário? Eu preciso mesmo assistir esse conteúdo? É urgente? Se fizer parte do seu trabalho e rotina de aulas OK. Mas ainda assim, não precisa fazer tudo e viver tudo. É preciso entender que teremos momentos que não iremos dar conta. É preciso entender os nossos limites e não devemos nos cobrar mais por isso, mas sim acolher e entender que momento é esse que temos feito em prol de algo que nem sempre vale a pena o estresse e instabilidade emocional. Lembre-se que para cuidar do outro e até atender a demanda do outro precisamos cuidar de nós mesmos primeiramente. É necessário refletir se essa sobrecarga faz bem a única pessoa que lida com você em 24hrs sem parar do seu dia... Você mesmo.

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