Em palestra do projeto Pernambuco em Perspectiva, realizada pela Algomais e pela Rede Gestão, o superintendente da Sudene, Danilo Cabral anunciou que a região vai crescer acima da média nacional, mas o Estado precisa de união e mobilização para aproveitar os investimentos
*Por Rafael Dantas | Fotos: Tom Cabral
O PIB do Nordeste está reagindo e promete voltar a crescer acima da média nacional. Em um contexto de aumento dos investimentos federais na região, além de grande interesse privado nos setores de energia e infraestrutura, o Estado tem oportunidades visíveis para construir um novo ciclo de desenvolvimento. No evento de agosto do projeto Pernambuco em Perspectiva – Estratégia de Longo Prazo, realizado pela Revista Algomais e pela Rede Gestão, o superintendente da Sudene, Danilo Cabral, destacou alguns dos principais potenciais de crescimento mas revelou também o cenário preocupante de redução do protagonismo dos pernambucanos na economia regional.
Os nove Estados da região Nordeste respondem por 13,8% do Produto Interno Bruto do Brasil (ano de 2021, último com números divulgados), embora abriguem cerca de 26,9% da população brasileira, segundo o Censo 2022. Apesar dessa disparidade, várias consultorias projetam um crescimento econômico na região superior à média nacional nos próximos anos. A Tendências, por exemplo, estima que o Nordeste terá um avanço anual de 3,4% entre 2026 e 2034, superando a expectativa média de 2,5% para o Brasil no mesmo período.
Danilo Cabral ressaltou a elevação do volume de investimentos destinados à região, como o FNE (Fundo Constitucional de Desenvolvimento do Nordeste) e o FDNE (Fundo do Desenvolvimento do Nordeste). Enquanto o primeiro tem R$ 39 bilhões, dividido em 20 linhas de crédito, o segundo em 2023 liberou R$ 2,46 bilhões e atualmente detém um orçamento de R$ 1,1 bilhão. Esses números e um conjunto de outros programas e parcerias da instituição revelam uma nova vitalidade da Sudene, que ainda é pouco conhecida pela sociedade. Há ainda diversos outros instrumentos de incentivo ao desenvolvimento regional em andamento dentro da superintendência.
“É preciso desconcentrar o crescimento do País (entre as regiões) e dentro do Nordeste, também, porque ficou muito centralizado na beira do mar. É preciso levar para o interior e consolidar um conjunto de cidades policêntricas, com crescimento que transborda para os municípios próximos. Em Pernambuco, por exemplo, Serra Talhada é uma cidade com essa característica. Quando ela cresce, a borda do Pajeú cresce também”, afirmou Danilo Cabral.
Além de uma melhor distribuição geográfica do crescimento do País, com foco na redução das desigualdades, o superintendente destacou ainda uma preocupação acerca do tipo desse desenvolvimento. O foco de atração de investimentos e de criação de novos polos deve ser conectado com as tendências globais.
“Os eixos com que queremos atuar dialogam com a pauta do mundo de hoje. Queremos um desenvolvimento sustentável, que trabalhe a inovação, o meio ambiente, a infraestrutura, a educação e o desenvolvimento social e produtivo, além da capacidade de governança”, destacou Danilo Cabral. Essas diretrizes estão no Plano Regional do Desenvolvimento Nordeste que orienta as políticas e projetos da instituição.
INDÚSTRIA NO HORIZONTE DA REGIÃO
O novo ciclo de desenvolvimento do Nordeste deve ser puxado pelo setor industrial, segundo a Consultoria Tendências. A estimativa é que o PIB Industrial cresça 4,3% entre 2026 a 2034. Muito dessa estimativa vem dos anúncios feitos pelo Governo Federal com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e o Nova Indústria Brasil. Em ambos a Região tem um papel de destaque, com boas parcelas do orçamento.
No PAC, do total de R$ 1,7 trilhão previsto, a parcela de R$ 700 bilhões é para o Nordeste. Só em Pernambuco há uma previsão de aportes de R$ 91,9 bilhões. As áreas com mais investimentos esperados no Estado são Educação, Ciência e Tecnologia (R$ 21,1 bilhões), Transição e Segurança Energética (R$ 16,8 bilhões) e Cidades Sustentáveis e Resilientes (R$ 14,8 bilhões).
No programa Nova Indústria Brasil, as expectativas são de mobilização de R$ 360 bilhões. A diversidade de áreas é extensa, devido à complexidade do tecido industrial pernambucano. No entanto, Danilo Cabral elencou algumas das principais. O campo fica contemplado com aportes em mecanização da agricultura familiar, na fruticultura, na produção de etanol, além de um olhar atencioso aos potenciais da Caatinga. O polo automotivo tem como destaque os incentivos às cadeias produtivas da Baterias Moura e da Stellantis.
Há ainda investimentos previstos para impulsionar os serviços de transformação digital da indústria, conectadas ao Porto Digital e à Rede de ICTs (Instituições Científicas e de Inovação Tecnológica). Outros destaques são para a indústria da biotecnologia, com oportunidades para o Lafepe e para a Hemobrás, além do investimento robusto na Escola de Sargentos, que deve contribuir para pesquisas na área de defesa.
Há também um movimento recente na região de investimentos bilionários em parques de energias renováveis (eólicas e solares). No radar de vários Estados estão também projetos de muitos bilhões para produção de hidrogênio verde, que é a grande aposta para a descarbonização da matriz energética global no médio prazo.
Apesar dos investimentos que chegam para a região nesse setor energético, é importante ressalvar que existe uma forte crítica dos impactos desses parques industriais na Caatinga. Há embates tanto com as populações tradicionais, quanto em reação ao avanço do desmatamento da vegetação. Um cenário que contribui para ampliar o risco de desertificação nessas áreas, já afetadas pelos efeitos extremos das mudanças climáticas.
DESAFIO DA TRANSNORDESTINA
Em uma introdução à apresentação de Danilo Cabral, o consultor da TGI Francisco Cunha destacou a necessidade de fomentar um novo ciclo de desenvolvimento de Pernambuco. Apesar da percepção do esgotamento dos horizontes traçados nos anos 1950 para o futuro do Estado, uma peça prevista que não foi realizada é a ferrovia que conectaria o porto ao Sertão. “A única previsão do desenho original traçado pelo Padre Lebret para Pernambuco, que não se concretizou, é a Transnordestina”, sentenciou o consultor.
Essa infraestrutura, fundamental para a logística da região, começou a ser construída na primeira gestão do Governo Lula, no ano de 2006, mas nunca foi concluída. Em 2022, no apagar das luzes do Governo Bolsonaro, a linha pernambucana que conectava Salgueiro à Suape foi retirada da concessão.
A ausência dessa estrutura compromete o avanço do Porto de Suape, como uma referência regional e, também, toda a vocação logística histórica do Estado de integração da região. A resolução do imbróglio envolvendo a concessionária deu passos importantes em 2024. No entanto, o ritmo dessa virada de cha ve é insatisfatório para os interesses de Pernambuco, podendo aguardar mais de uma década caso não seja acelerada.
Atualmente, há uma estimativa da necessidade de investimentos de R$ 5 bilhões para o trecho do Ceará. A previsão é de conclusão da linha de Pecém até 2026 ou 2027. Com a desistência da concessionária da linha entre Salgueiro e Suape, Pernambuco voltou à estaca zero, estando mais uma vez na fase de projetos, só após esse momento iniciará a busca por recursos para o avanço da obra.
“Isso é algo que está me inquietando. Daqui a três anos, o Porto de Pecém estará interligado. Pernambuco está na fase do projeto e depois vai ter que ir atrás de recursos. Precisamos de um montante entre R$ 4 e R$ 5 bilhões. Nós temos no PAC hoje 400 milhões. Se isso for um fluxo de R$ 400 milhões por ano, teremos pelo menos mais 10 anos. Isso seria 2035. Onde é que vai ficar o gap logístico de Pernambuco, com uma diferença de sete anos entre Pecém e Suape? Ou nós colocamos isso na pauta do Estado, ou esse negócio vai ficar enganchado lá e não vai andar. É preciso tratar disso de forma estruturada ou vai ficar patinando”, alertou Danilo Cabral.
O QUE É NECESSÁRIO PARA APROVEITAR AS OPORTUNIDADES?
Tanto para destravar a linha pernambucana da Transnordestina como para avançar nos projetos previstos no PAC e na Nova Indústria Brasil é necessário que haja unidade da sociedade pernambucana e mobilização pelas pautas prioritárias. Essa foi a fórmula sugerida por Danilo Cabral para viabilizar os investimentos e para reverter a tendência atual de perda de protagonismo regional de Pernambuco.
“A gente tem políticas e planos, instrumentos de financiamento, uma inteligência regional, com as universidades, e temos um empresariado engajado. Temos espaços políticos que talvez nenhum outro Estado da Federação tenha, do ponto de vista de presença política”, afirmou Danilo Cabral, fazendo uma referência aos vários ministros pernambucanos dentro do Governo Lula (Luciana Santos, André de Paula, Silvio Costa Filho e José Múcio Monteiro).
Apesar dessas condições, ele destacou que há dificuldades de criar consensos atualmente, como no passado foi a defesa por Suape, que uniu diferentes vertentes políticas. “Temos déficit de unidade, de mobilização e de articulação. Nós perdemos a perna da Transnordestina e a sensação que a gente tem, e eu digo isso sem criticar o vizinho, é que a gente está sem dono da pauta de Pernambuco. Já sentimos que estamos perdendo a referência do protagonismo regional. Precisamos ter uma integração e nos mobilizar”, defendeu Danilo Cabral.
Um exemplo lembrado dessa articulação da sociedade pernambucana foi o do Meppe (Movimento Empresarial Pró-Pernambuco), lembrado pelo consultor Ricardo de Almeida, ativado em um momento de crise no Estado, na década de 1990. “Pernambuco tem muitas ideias, mas poucas convergências. E é exatamente esse o nosso desafio: construir essas convergências”, considerou Ricardo de Almeida durante o evento.
Além da promoção de seminários e debates, uma das propostas do evento foi a de criar uma estrutura de governança das pautas prioritárias de Pernambuco. “Precisamos de uma estrutura que tenha um plano de ação, metas, prazos… que tenha uma sistemática de discussão. É isso que precisamos organizar”, sugeriu o superintendente da Sudene.
Dentro desse cenário de queda do protagonismo, Pernambuco desabou no recém-publicado ranking de competitividade, publicado pelo CLP (Centro de Liderança Pública). O Estado, que já se apresentava na desconfortável 16ª posição nacional, caiu três postos, figurando a partir dos dados de 2023 na 19ª colocação nacional. Foi o pior desempenho naquele ano entre todos os Estados da Federação. O estudo avalia 10 eixos: Infraestrutura, Sustentabilidade Social, Segurança Pública, Educação, Solidez Fiscal, Eficiência da Máquina Pública, Capital Humano, Sustentabilidade Ambiental, Potencial de Mercado e Inovação.
O mediador do evento Pernambuco em Perspectiva, Ricardo de Almeida, anunciou que o próximo encontro promovido pelo projeto será no dia 17 de setembro. Os convidados são Sérgio Xavier (coordenador do Fórum de Mudança do Clima) e Ana Luíza Ferreira (secretária de Meio Ambiente, Sustentabilidade e de Fernando de Noronha de Pernambuco). A pauta será: O papel dos planos de sustentabilidade (estadual e federal) para o desenho do novo modelo de desenvolvimento de Pernambuco.
*Rafael Dantas é repórter da Revista Algomais e assina as colunas Pernambuco Antigamente e Gente & Negócios (rafael@algomais.com | rafaeldantas.jornalista@gmail.com)