Diálogo. Esta é a principal ferramenta do novo presidente da Câmara de Diretores Lojistas do Recife, Cid Lôbo, para a sua gestão. Ele tem conversado com governo, prefeitura e até com os camelôs, para encontrar soluções para as dificuldades enfrentadas pelos lojistas e consumidores. Nesta entrevista a Cláudia Santos, ele comenta, por exemplo, as sugestões dos comerciantes para o projeto de reforma da Av. Conde da Boa Vista.
Quais são seus planos à frente da CDL?
São de continuidade do que estamos fazendo. Fui vice-presidente de Eduardo Catão (ex-presidente da CDL) durante seis anos e na CDL seguimos, há mais de 10 anos, um planejamento estratégico, em que estão as bases da gestão que devem ter continuidade. Claro que tem o toque pessoal da cultura do presidente, mas a proposta é seguir esse planejamento que visa manter o relacionamento forte tanto com o Governo do Estado, principalmente nas questões relativas à segurança, como com a prefeitura, em assuntos referentes a controle urbano, mobilidade, limpeza, manutenção. No começo de janeiro tivemos duas reuniões com João Braga (secretário da Mobilidade e Controle Urbano). Numa delas tratamos da reforma na Av. Conde da Boa Vista, que já está licitada. Na ocasião conhecemos o projeto. Temos outra reunião marcada para entregarmos as sugestões dos lojistas. A segunda reunião foi sobre o bairro de São José, em que discutimos soluções para organizar o comércio informal, pois sabemos que é impossível acabar com ele. Até porque o ambulante faz parte da cultura dos bairros São José e Santo Antônio e a “Terra dos Mascates” já surgiu desse jeito. O grande problema é que tem hora em que a prefeitura controla mais, em outras, menos. Muda o prefeito, muda a visão sobre o assunto. Não é uma política constante. Mas acreditamos que se pode organizar a atividade, manter a limpeza, sempre em diálogo com os camelôs e a prefeitura. Com Geraldo Julio e João Braga temos mantido diálogo e eles já fizeram várias tentativas, mas tem que ficar sempre tentando porque sabemos que com esta crise, a maior recessão do Brasil na história, é impossível controlar muito rigidamente os camelôs porque as pessoas precisam viver.
Quais as sugestões da CDL para o problema?
Primeiro, criar minicamelódromos. É uma forma de oferecer um ponto onde passa muita gente, porque se não passar ninguém eles voltam para as ruas desordenadamente. Por exemplo, o camelódromo da Dantas Barreto metade funciona (que é onde passa gente), a outra metade fica abandonada. A prefeitura já tem os prédios para instalação do camelódromo, mas faltou verba em razão da crise. Mas, por exemplo, no entorno do Mercado de São José, a prefeitura está construindo no Cais de Santa Rita uns galpões. As ideia é retirar da rua os camelôs que já estão cadastrados e abrigá-los lá. Na esquina da Conde da Boa Vista com a Sete de Setembro, a prefeitura possui um prédio que está tentando transformar num camelódromo, mas também falta verba. Mas há outras providências que precisam ser tomadas: melhorar a iluminação, coletar o lixo, diminuir o tamanho das carroças que eles usam. São soluções que não resolvem o problema totalmente, mas melhoram 50 a 60%. O mesmo ocorre com o trânsito. Sabemos que no Recife a mobilidade é péssima, mas se há a instalação da faixa azul para o ônibus circular, proíbe-se o estacionamento em algumas áreas, ocorre uma melhora.
Como o transito impacta o comércio?
Quanto melhor a mobilidade dos ônibus, mais fácil atrair o consumidor para o centro da cidade. Uma das premissas da Nova Conde da Boa Vista é eliminar a circulação de carros na via para só trafegar ônibus. Os automóveis poderão apenas cruzar a avenida. Esta é uma proposta, não sei se será aceita.
O que mais está previsto?
O BRT terá duas estações no meio da avenida, os demais ônibus ficarão como eram antes, isto é, dos lados da avenida. O que é o correto, porque, se não tiver passarelas, as pessoas têm que atravessar a via, o que é um perigo. A avenida ficou uma bagunça porque fizeram as modificações pela metade quando ela foi transformada. A Conde da Boa Vista será mais humanizada, terá bancos para o transeunte sentar. Foi feito estudo do tamanho das paradas que foram dimensionadas em função da frequência dos ônibus, a iluminação será trocada e, segundo os secretários, a verba já está garantida, o que é o mais importante. A previsão da prefeitura é implantar o projeto depois do Carnaval.
A avenida então será mais voltada para o pedestre?
Sim. É bom lembrar que a parte destinada ao carro hoje é horrível, é estreita, o motorista leva muito tempo para trafegar nela. Então é um projeto que nós da CDL gostamos e achamos necessário. A Conde da Boa Vista está muito deteriorada.
E em relação à segurança?
Até meados do ano passado a situação estava horrível. O secretário de Defesa Social, Antônio de Pádua, esteve aqui e planejou um esquema especial para o centro, que funcionou, como a alocação dos 9,5 mil policiais nas ruas (aqueles que usam boné laranja). Há a previsão de entrada de mais mil e poucos soldados. Nessa tentativa no Bairro São José contamos com a parceria do comandante do 16º Batalhão de Polícia Militar e representantes da Polícia Civil para encontrarmos soluções conjuntas. Trazemos as ideias para serem discutidas com os lojistas, que sugerem soluções e as entregamos para as autoridades.
Quais as ações realizadas pela CDL para aumentar as vendas?
Ao contrário do shopping center, que é uma área privada e os lojistas seguem um contrato que prevê, por exemplo, a obrigatoriedade de abrir a loja todos os domingos, na rua é diferente. Cada lojista faz seu horário. O que fazemos? A gente tem que conseguir as coisas com diálogo. Então próximo a datas importantes – Dia das Mães, Natal – lideramos um movimento que propõe abrir a loja aos domingos, mas cada um abre se quiser. Na maioria das vezes conseguimos convencer os lojistas.
O resultado é bom?
Sempre vem muita gente. Em dezembro abrimos todos os domingos. Também organizamos campanhas, como o Liquida Recife. No ano passado conseguimos fazer o Natal de Prêmios, em parceria com a Rede (empresa que oferece pagamento em cartão). Quem comprasse com a maquininha da Rede tinha o direto de trocar um cupom a cada R$ 50 em compras. Foram sorteados um automóvel, três motos, cinco caminhões de prêmios, mais 20 prêmios de R$ 1 mil. A entrega foi realizada na Pracinha do Diário, onde havia um posto de trocas, para incentivar as pessoas a virem ao centro. Mesmo quem comprasse no shopping para trocar teria que vir aqui. Outro problema do comércio do centro da cidade é a falta de estacionamento. Mas com esta crise muitas lojas grandes fecharam e se transformaram em estacionamento. Na Rua da Concórdia hoje há uns seis estacionamentos grandes. Então isso melhorou um pouco. A prefeitura está construindo um mercado no Cais de Santa Rita que terá um estacionamento oficial. Isso permite que consumidores de outras cidades venham para o comércio de rua. Quem tiver a curiosidade de ir no entorno do Forte de Cinco Pontas aos sábados, verá carros estacionados com placas de cidades do interior e até de João Pessoa. Eles vêm comprar produtos que só encontram no comércio de rua.
Como a crise impactou o varejo?
Esta foi a pior crise que já se abateu no comércio do Brasil. Em 2017 foi o fundo do poço. De novembro para cá começou a recuperar as vendas de forma lenta. A nova legislação trabalhista vai ajudar muito.
Como está o comportamento do consumidor com a crise?
O SPC Brasil fez uma pesquisa e constatou que o nível de confiança do consumidor atingiu 40.9 pontos, numa escala de 1 a 100, na qual acima de 50 é positivo, abaixo é negativo. O consumidor não está tão confiante e 52% dos entrevistados acham caro o custo de vida, principalmente devido ao preço da gasolina, da energia e do botijão de gás.
A Black Friday trouxe benefícios para o comércio físico?
Ela virou uma faca de dois gumes, porque como acontece no final de novembro, há uma antecipação das compras de Natal. Por isso, ela não acrescenta novas vendas, principalmente de produtos eletrônicos e da linha branca. Quem compra uma TV na Black Friday não vai comprar outra no Natal.
Qual a tendência do e-commerce?
A tendência mais predominante é a junção da loja virtual com a física. Um consumidor pode pesquisar o produto na loja física, comprar na internet e receber o produto na sua casa. Ou pode compra pelo e-commerce e buscar a mercadoria na loja.
Como é a participação dos chineses do comércio de rua?
Eles vendem barato e comercializam produtos importados. Muitos são legais, mas outros não. Há comerciantes chineses que estão aqui há 40 anos, são tradicionais, mas tem aqueles que chegaram há três anos no estilo Galeria Pajé (prédio situado no comércio popular de São Paulo conhecido por comercializar produtos contrabandeados), onde se vende de tudo. Às vezes tem concorrência desleal, não só no tocante aos impostos, como à qualidade do produto vendido. Eles vendem muita coisa que não tem selo do Inmetro, como brinquedo e eletrônicos. É comum também o consumidor comprar um produto e se não funcionar eles não fazem a troca.
A concorrência chega a ser predatória?
Sim. Às vezes um lojista está num bom ponto, eles oferecem um aluguel de valor mais alto. O comerciante sai e entra o chinês. Agora, tem o seguinte: para saírem do País também é ligeiro, se as condições deixam de ser favoráveis eles vão embora.
E a tendência dos grandes supermercados instalarem pequenas lojas?
As grandes redes perceberam que estavam perdendo espaço para o mercadinho de bairro. Com a crise, para quem faz bico, trabalho informal, o dinheiro chega aos pouquinhos. Ele ganha um pouco e compra um pouco. Por isso, lançaram essas lojas menores. Outro fator é o problema da mobilidade. As pessoas não querem enfrentar um trânsito para fazer compras.