*Por Paulo Caldas
As circunstâncias descritas por Bruna Estima Borba, neste “Vivendo as circunstâncias” (Novoestilo-Edições do Autor; edição, capa e projeto editorial Salete Rego Barros), não foram mero exercício de memória, mas surgiram da criatividade, tantas vezes bem-humorada, mesmo em situações adversas concebidas pela autora, numa dinâmica que envolve o leitor.
A diversidade vocabular acompanha a época em que nasceram as cenas, um truque sutil, sem falar no primoroso desdobramento das tramas, em confrontação ou sequência, como se Bruna estivesse na sua alça de mira as letras de Lygia Fagundes Telles. Tal recurso cede ritmo e mantém a toada que ressoa ao longo da escrita.
A escritora lida com as palavras com invejável intimidade, como se fossem amigas de infância. Assim amplia o mundo restrito da pensão de dona Lia num universo de pessoas de perfis insólitos, quando, por exemplo, encontra vestígios do fantástico num papagaio fofoqueiro que vira confidente da cozinheira em troca de guloseimas. Este animal, estimulado pelo hóspede Heitor, torna-se “leitor assíduo” e repete frases emblemáticas: “O poeta é um fingidor” …
Embora sem revelar detalhes do perfil físico dos personagens (deixa a critério do leitor), a autora vai além do psicológico, e no exótico revela cacoetes, manias inusitadas, como as da personagem Stelinha, que coleciona calçolas, fetiche e símbolo do seu matrimônio.
*Paulo Caldas é Escritor