A reforma política morreu – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

A reforma política morreu

Em vários episódios da história do País a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sempre teve um papel atuante. Na conturbada conjuntura atual não tem sido diferente. O presidente da regional Pernambuco, Ronnie Duarte, nesta entrevista a Cláudia Santos e Rafael Dantas, fala sobre o pedido de impeachment de Temer requerido pela OAB e se mostra descrente da realização de uma reforma política no curto prazo. Também comenta as inovações feitas na sua gestão.

O que acha da reforma política que está tramitando no Congresso?
A reforma política morreu, pelo menos dentro de um horizonte próximo. O grande problema hoje no Brasil é o corporativismo. Todos querem o sacrifício, mas só o alheio. Cada um que dê a sua justificativa retórica para manter seus privilégios. Em termos de reforma política o que você começa a ver: a maioria das pessoas que se esperava que pudesse fazer essa reforma política tem como preocupação básica garantir a preservação de seus mandatos na próxima eleição. Temos hoje um governo federal que se rebaixou para o que tem de mais promíscuo em termos de relações político-partidárias e entrou num vale tudo para poder também se preservar.

A saída seria um Congresso Constituinte?
Dentro do ambiente que temos hoje, não teríamos uma representatividade eleita muito diferente da que está aí. Não há solução para mim no curto prazo. A gente vai precisar de um tempo de depuração. A gente precisa acabar com esse patrimonialismo que faz com que cada um se ache dono de um pedacinho do Estado. O grande mal do poder, em todas as esferas, é a perpetuação. Acho que isso que favorece a adoção de práticas pouco republicanas. É importante que haja uma oxigenação, uma rotatividade. A gente também precisa qualificar os quadros. A imagem da política está tão esgarçada que as pessoas de bem têm medo de ir para a política. Mas a gente não pode ignorar que não há solução fora da política. A gente precisa prestar atenção dentro das opções que estão postas, quais são as pessoas que têm efetivamente um grau de compromisso público e também a formação pessoal para auxiliar a vencer esse momento de crise.

Estamos então num processo de depuração. Mais adiante vai melhorar?
Acho que a gente vai ter uma renovação nos quadros partidários. Se essa renovação vai ser boa, não estou certo, porque hoje a gente vive um momento de muita incerteza. Na vida você não toma decisões importantes sob forte emoção e a sociedade hoje está emocionada, escandalizada, perplexa. Embora tenha muita gente defendendo uma Constituinte, acho que o momento não é para tomar decisões fundamentais. A gente precisa esperar um pouco uma decantação. Essa reforma não aconteceu agora. Pode esperar mais um pouco e esperar um cenário mais claro para poder definir que rumo tomar.

Como deveria ser essa reforma?
Em relação às coligações, acho que é um consenso que são péssimas para a política nacional. A multiplicação de pequenos partidos também é o que permite o fisiologismo.

A cláusula de barreira impediria os pequenos partidos mais ideológicos de progredirem?
Não há soluções perfeitas. Isso pode ser um efeito colateral, mas se a gente for analisar em termos de custo/benefício é muito custoso para o País essa infinidade de pequenos partidos, que são formados de acordo com conveniências dos partidos maiores. Não existe em país nenhum no mundo a quantidade partidos políticos que a gente tem no Brasil.

E sobre o financiamento das campanhas?
Essa é uma grande questão. O problema é a falta de repressão e de fiscalização efetiva ao caixa 2. Não adianta falar que vai ter financiamento público se os recursos não se limitam ao que os partidos informaram. Não adianta falar que vai ter financiamento privado se for criada uma infinidade de doações fictícias por pessoas que não tinham renda. Não adianta falar de financiamento empresarial se uma parte é feita por fora. Qualquer um desses modelos só será efetivo, em termos de paridade e equidade na disputa, se houver uma fiscalização efetiva, e isso é possível. Fizemos uma tentativa. Contratamos alguns estagiários num convênio com a Procuradoria Regional Eleitoral e o Tributal Regional Eleitoral para verificar o volume da campanha nas ruas e para cotejar com o valor declarado e analisar se é compatível, porque existem valores de referência no mercado publicitário. O que se fala é que há um comércio eleitoral, em que pessoas que são referências em algumas comunidades são remuneradas para fazer campanhas políticas. Hoje existem mecanismos efetivos que permitem o monitoramento desses ambientes. Uma investigação bem-feita teria condições de revelar esquemas de compra de votos e de movimentações irregulares em campanhas políticas. Agora, isso precisa de vontade política. Priorizar, é esse o problema.

E quanto ao voto distrital?
Acho que o voto distrital, pelo menos o misto, traz um ganho. Esta é a posição da OAB. A grande preocupação que tenho hoje − e mesmo o voto em lista puro − é o efeito da importação de celebridades para a política. Temos uma massa que não compreende quais são as atribuições de um representante político e acho que isso poderia também trazer uma instabilidade muito grande para o País.

Como o senhor se posiciona sobre o pedido de impeachment do presidente Temer feito pela OAB?
Lamento muito que o impeachment esteja represado. A OAB chegou a ajuizar um mandado de segurança no Supremo Tribunal que foi rejeitado. Acho importante que o Congresso Nacional vote o pedido. Tiveram elementos novos que surgiram e que robusteceram as suspeitas em relação ao governo de Dilma, mas no instante em que o impeachment foi aprovado os elementos eram de menor gravidade do que existem hoje em relação a Temer. O Congresso não adota os mesmos pesos e medidas numa situação e na outra. A OAB foi muito criticada quando pediu o impeachment de Dilma por parte de segmentos sociais mais à esquerda, depois foi criticada pelos partidários de Temer. Mas isso lança luzes sobre uma preocupação que temos de ser verdadeiramente imparciais.

Como analisa as delações premiadas?
Acho fundamental. Hoje o País passa por esse momento importantíssimo devida à possibilidade da produção desse tipo de prova. Agora eu acho que há a necessidade de uma maior regulação, isso precisa ser normatizado de maneira mais clara para que a sociedade, os réus e o Judiciário compreendam seus critérios e limites.

Este momento turbulento que vivemos pode levar a um Estado de exceção?
Temos hoje um grau de maturidade institucional que não vejo ambiente para qualquer tipo de alteração de regime. Não vejo essa perspectiva, pelo menos diante do que está posto, embora seja de uma gravidade escandalosa. Por muito menos, se o que a gente está experimentando aqui no Brasil tivesse sido vivenciado num país desenvolvido, teria muita gente nas ruas todo dia. O que a gente vê é o seguinte: a mobilização popular esfriou, até porque as denúncias terminaram por atingir figuras de expressão em todas as vertentes partidárias, então não há interesse em qualquer tipo de mobilização. Hoje, na realidade da gente, você só consegue mobilizar se tiver alguma entidade organizada, tentando provocar as pessoas. Eu não vejo isso.

Como analisa o fato de setores da sociedade desejarem a volta da ditadura militar?
Acredito que hoje vivemos um momento em que não há apoio ao militarismo, tirando minorias segmentadas (alguns nostálgicos e outros desavisados), porque efetivamente você não percebe o ambiente para isso. Qualquer tipo de mobilização é algo muito discreta. Outra coisa que a gente precisa entender, que é fundamental: tem-se uma imagem equivocada do regime militar, achando que não havia corrupção. Havia, mas quem ousava tentar denunciar atos corruptos virava comunista, era preso ou desaparecia. Hoje se a gente fosse tentar viver no regime militar com os mecanismos de controle social teria uma percepção totalmente diferente. Acredito que o que a gente precisa é de uma evolução moral que a gente está experimentando.

Como tem sido sua gestão na OAB?
Assumi a presidência em janeiro do ano passado. Eu destacaria a modernização da gestão, com o apoio da consultoria da Deloitte. Hoje temos uma cobrança enorme por transparência, austeridade e mecanismos de controle. A gente reduziu em 20% nosso quadro de recursos humanos e dentro deste contexto de crise fizemos um programa de renegociação de contrato com todos os nosso fornecedores em 2016. Tivemos uma economia só no ano passado de praticamente R$ 2 milhões. Estamos no azul e investimos quase R$ 6 milhões na sede nova. Criamos também um aplicativo no qual o advogado se cadastra e pode reclamar de tudo: da OAB, do horário de um juiz, de um promotor, da qualidade atendimento numa delegacia. O grande diferencial disso é que tem sigilo de fonte preservado. Não é denúncia anônima. Ele começa a permitir ao advogado a geração de uma estatística. Imagine um determinado ambiente onde o advogado atue (pode ser uma vara) e há 50 a 100 advogados reclamando diariamente de maus tratos, de assiduidade. Isso para a gente encaminhar para as corregedorias e órgãos de controle externo traz uma credibilidade maior do que uma denúncia individualizada. O aplicativo foi um pouco antipatizado pela magistratura, sobretudo a estadual. O que a gente nota é que ainda hoje o Judiciário é muito resistente ao controle social, isso é uma barreira que precisa ser vencida. O serviço judiciário é nobilíssimo, é essencial para a sociedade, mas é importante que todos os que atuam nele, incluindo os advogados, tenham ciência que a gente presta um serviço público e por isso estamos sujeitos a um julgamento e isso é algo inafastável, não é uma opção.

Qual o tamanho do Polo Jurídico de Pernambuco?
Fizemos um levantamento pioneiro do nosso polo jurídico. É um setor que emprega mais de 20 mil pessoas, o faturamento declarado é de meio bilhão de reais. Descobrimos também que 90% dos advogados atuam em pequenos escritórios ou individualmente.

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