Secretária de Desenvolvimento Econômico da capital pernambucana, Joana Florêncio, explica os benefícios da plataforma Observatório Econômico do Recife, que reúne num só local uma grande diversidade de indicadores. Segundo a titular da pasta, a iniciativa tem sido de grande valia para conhecer a realidade da economia do município, para elaborar políticas públicas e para as ações do empresariado.
Indicadores econômicos são essenciais para entender e avaliar a situação da economia e as perspectivas de uma cidade, um Estado ou um País. Eles oferecem uma visão da realidade que é essencial para um gestor público formular políticas, ou para orientar o setor privado na tomada de decisão sobre onde alocar seus investimentos.
Diante dessa relevância, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico lançou este ano a plataforma Observatório Econômico do Recife, que reúne num só local, no site do Conecta Recife, uma diversidade de indicadores. Antes, para obter esses dados era necessário recorrer a diversas fontes e, muitas vezes, eles estavam em planilhas ininteligíveis ou relatórios de mais de 100 páginas. Para falar sobre essa plataforma, Cláudia Santos conversou com a secretária Joana Portela Florêncio. Na entrevista, ela também analisou o momento econômico da capital pernambucana, suas perspectivas e desafios.
O que é o Observatório Econômico do Recife?
É uma plataforma de dados e macrodados econômicos do Recife apresentados de forma simples e integrada em um único lugar trazendo informações fáceis para quem precisa delas. Está inserido no Portal Conecta Recife. Nessa plataforma é possível acessar movimentação de porto e aeroporto, balança comercial, PIB per capita – fazendo comparativo com outros municípios, com o Nordeste e com o Brasil. Em relação ao mercado de trabalho, há dados de admissões, demissões, nosso saldo do Caged, (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), a Rais (Relação Anual de Informações Sociais), a capacidade de pagamentos, rankings de competitividade, ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis), IPTU e tudo que ajude a entender como o Recife está se comportando economicamente.
Acompanhar esses dados é muito importante para a tomada de decisão, tanto empresarial, quanto por parte da gestão pública. Também estamos inserindo, no Observatório, os boletins econômicos da cidade, trazendo os dados de forma contextualizada, explicando economicamente como o Recife se comportou mensalmente. Hoje, o Observatório funciona para todo mundo, incluindo o cidadão. Entregamos a transparência em dados econômicos, que também é muito importante.
E qual a importância de ter esses indicadores reunidos numa só plataforma que pode ser acessada pelo público em geral?
A importância é essencial. Antes do Observatório, os dados federais, estaduais e municipais eram descentralizados. Como a pauta econômica é muito transversal, tudo importa e precisamos ter inteligência da leitura desses dados. Para se ter uma expectativa econômica da cidade para o Carnaval, por exemplo, era preciso coletar dados de anos anteriores, entender como tinham se comportado e fazer o cruzamento. Entretanto, às vezes, o resultado não representava a realidade por terem sido coletados dados de forma equivocada.
Então, foi preciso automatizar. Quando começamos a fazer isso, entendi que precisávamos disponibilizar para o público, como os empresários, porque quem gera emprego e renda é o setor privado que, para fazer qualquer investimento, precisa de segurança para tomar decisões assertivas. Aos disponibilizarmos os dados, de forma clara e transparente, ajudamos em decisões, como trazer um investimento ou um plano de construção para a cidade.
No ambiente público do Conecta Recife, outras instituições e entidades também podem acessar. Por exemplo, é importante para instituições de contabilidade que podem ver a quantidade, o tempo e o porte de empresas que estão sendo abertas no Recife. Com esse entendimento, abrimos o Observatório para todos, mas não estamos falando de uma política pública de acessibilidade para as pessoas em geral e, sim, de informações bem efetivas para os negócios.
Lançamos em julho de 2024 e já temos mais de seis mil acessos. São acessos robustos, muitos deles, de pessoas em busca de informações adequadas para seus negócios, que estão olhando o Recife como um mercado atrativo na área econômica. Recebemos várias pessoas de universidades econômicas, tivemos acessos da TGI, da Amcham, e percebemos que as empresas de consultoria também precisavam desse ambiente para coletar esses dados que, em sua maioria, estavam decentralizados, cada site entregando de uma forma, muitas vezes em planilhas ininteligíveis ou relatórios de 100 páginas. E nós trazemos isso de forma direta na palma da mão do empreendedor pelo Conecta Recife. Estamos trabalhando, inclusive, a usabilidade desses dados. Então, atingimos desde o cidadão até a academia.
Como foi concebida essa iniciativa?
O Observatório nasceu de um domínio de gestão pública a fim de olhar o Recife economicamente. Surgiu de uma “dor” minha, da necessidade de acompanhar se as promessas de empregabilidade dos empresários que recebíamos aqui estavam sendo cumpridas. Como eu acompanharia essa empregabilidade? Como saberia quais são os maiores setores? Eu até poderia consultar o faturamento empresarial, mas não era possível identificar outras atividades econômicas do Recife que talvez precisassem de políticas públicas.
Também é preciso acompanhar o PIB per capita, o IPCA, a taxa Selic, o nosso ranking de competitividade, o consumo, o que está pesando na balança comercial, checar a movimentação de portos e aeroportos em um evento ou momento específico do ano. Então, a ideia começou a partir de uma demanda da secretaria a fim de averiguar a necessidade de gestão de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento econômico.
Para criar isso de forma automatizada, fechamos uma parceria com a Faculdade Senac, em que os desenvolvedores foram os alunos da instituição. Participamos das aulas explicando o que os estudantes precisavam trazer como soluções e, ao final do curso, foram criados vários observatórios como trabalho de TCC. Nesse processo, nasceram duas startups, e uma foi contratada como servidor nosso. Então, quando o Observatório chegou, demos outra roupagem com mais características. Nós higienizamos alguns dados (atualizar e corrigir informações) para trazer de forma mais específica o que estamos querendo enquanto secretaria. Assim, o empreendedor também consegue fazer várias junções, dependendo da área de atuação que necessita consultar. São dados entregues com robustez.
E como é feita a alimentação desses dados?
Criamos, por meio da Emprel, que é nossa empresa municipal de informática, algumas APIs (Interface de Programação de Aplicações) para buscar os dados que alimentam o Observatório e, na nossa secretaria, na Gerência de Inovação, contamos com uma economista e uma pessoa que utiliza o Power BI (um serviço de análise de negócios e de dados da Microsoft) e, assim, higienizamos e entendemos esses dados, verificando quais são importantes e se estão corretos.
Inicialmente só trabalhávamos com dados abertos, mas entendemos que era preciso entregar outros dados, como dados financeiros, de faturamento empresarial, também estamos construindo uma normativa jurídica para trazer dados da Neoenergia para o Observatório, como algumas informações de contratos que queremos traduzir, ou seja, se é um contrato de comércio, ou residencial, ou industrial porque a gente consegue entender onde tem comércio, onde tem residência e onde tem indústria no Recife. Então, estamos trazendo um grande apurado de fora para o Observatório e, a cada reunião, entendemos, por exemplo, o que o empresário deseja, que são dados mais diferentes como sobre infraestrutura, sustentabilidade (ESG) e vamos buscando essas informações.
Dessa forma, o Observatório nunca é um produto pronto, ele sempre é dinâmico. Para nosso uso, nos ajuda a criar políticas públicas para diminuir impactos como na Covid-19, por exemplo, ou em algo mais pontual, conseguimos fazer um acompanhamento mais específico e muito mais dinâmico.
Como o Observatório Econômico está auxiliando a Prefeitura do Recife ou investidores do setor privado?
Por exemplo, se uma empresa de varejo, se instalou aqui na cidade dizendo que iria fazer "x" contratações de pessoas, o Observatório nos ajuda no acompanhamento dessas contratações nos períodos indicados. Também quando vamos criar uma política pública, estudamos antes os dados. Foi o caso do programa voltado para mulheres e tecnologia. Nós tínhamos os dados e conseguimos entender que era uma demanda reprimida do Recife ter mais mulheres na área de tecnologia ocupando um ticket médio mais alto de primeiro emprego. Tudo isso só é possível porque estamos estudando os dados.
Do mesmo jeito, conseguimos verificar se, de fato, os preços do petróleo ou da gasolina aumentam quando divulgados pela imprensa. Outro exemplo é o Gestor Recife, uma plataforma de gestão financeira que criamos porque vimos que o tempo de sobrevivência das microempresas era em média de dois anos. Então, criamos uma política pública para apoiar os microempreendedores.
Dessa forma, utilizando o Observatório, a prefeitura vem analisando tudo que vai acontecer na cidade e a gente consegue criar política pública para ter impacto e não criar apenas por criar. Em relação ao empresariado, para empresas da área de consultoria, como a TGI, por exemplo, tornou a atividade muito mais fácil com esse acesso a uma plataforma única que disponibiliza vários dados que, antes, sequer eram encontrados.
Com base nesses indicadores, como você analisa o cenário da economia hoje no Recife?
O Recife tem uma crescente na economia. Óbvio que, quando comparado a outra cidade, temos que observar algumas questões. O Recife é a capital mais antiga do Brasil, tem um território mais difícil de trabalhar, porque sua extensão territorial é pequena, com grande densidade populacional. Não é como Fortaleza ou Salvador, por exemplo. Quando verificamos essas duas capitais é como se tivessem numa fase de desenvolvimento supercrescente, mas quando verificamos os dados sobre investimento público, observamos que o Recife investe muito mais que essas duas outras cidades.
O Recife tem uma capacidade de gerar emprego muito maior do que Fortaleza e Salvador, inclusive de forma muito equilibrada, em nenhum momento temos saldo negativo, só em janeiro, por causa dos cargos temporários de fim de ano, que já é uma realidade econômica. Mas conseguimos ver que o Recife é muito sólido na área de negócios e, em relação à área de porto e aeroporto, está recebendo cada vez mais voos domésticos para o setor de executivos. Verificamos que nosso perfil hoteleiro, de segunda à sexta-feira, é executivo. Ou seja, o Recife está preparado para fazer e receber negócios e, cada vez mais, para crescer.
Nosso polo médico tem sido um grande destaque, assim como o polo de tecnologia. Também verificamos a construção civil num faturamento muito crescente. Então esses três segmentos ainda continuam sendo destaques na cidade do Recife. E, quando você compara aos anos anteriores de outras realidades em um período pós-pandêmico, vemos o Recife de uma forma muito crescente e sólida, que é o mais importante na área da economia. Temos uma solidez que outras capitais da região Nordeste não apresentam. É óbvio que a gente sempre precisa melhorar, mas quando olhamos hoje o apurado, entendemos que o investimento público está sendo traduzido nos dados econômicos.
E quais têm sido as estratégias da Prefeitura do Recife para o desenvolvimento econômico da cidade?
O desenvolvimento econômico é uma forma muito transversal de se trabalhar, porque ele é influenciado pela educação, já que precisamos de capital humano, de ter uma mão de obra muito qualificada. Quando trabalhamos infraestrutura, também trabalhamos mobilidade e bem-estar da cidade. Então, de maneira geral, a Prefeitura tem inúmeros programas que vêm melhorando esse dado econômico.
Mas se eu pudesse destacar da nossa caixa de desenvolvimento econômico, primeiro destacaria a forma muito próxima com que trabalhamos com o ambiente privado. Criamos uma prática de sempre revisitar nossas legislações, nossos processos, para melhorar e fazemos isso junto com o privado. Criamos oficinas de escuta para entender demandas e desafios. Multiplicamos em mais de três vezes o número de CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) que dispensamos o licenciamento da Prefeitura do Recife. Lançamos duas fórmulas de alvará, um tácito e um expresso, preservando a boa-fé do empresariado local, trouxemos uma ferramenta de mapeamento, que é a ESIG, para que o empresário consiga observar os loteamentos da cidade e quais legislações precisa cumprir nesse zoneamento; possibilitamos agendamento online para despachar com o servidor daquela área sua licença específica.
Estamos criando o EIV (Estudo de Impacto de Vizinhança), temos o portal de licenciamento de forma digital que faz com que o empreendedor, em um único lugar, acompanhe todas as suas licenças. No caso de empreendimentos de grande impacto que envolvem várias secretarias licenciadoras ou cuja normativa não é tão conhecida, fazemos toda interlocução com os secretários, entendendo as partes, a fim de aprovar de forma séria, com segurança jurídica e previsibilidade.
Outra coisa que tem dado muito certo são feiras de empregabilidade, fechamos agora uma feira e chamamos empresas de tecnologia do Porto Digital para contratar mulheres. Acatamos uma pauta que era muito importante para mudar o cenário da diversidade de gênero. Participaram mais de 22 empresas de tecnologia, algumas, inclusive, de São Paulo para contratar mulheres do Recife para trabalhar de forma remota.
Também fechamos rodadas de negócios para que o Hotel Marina, que é uma empresa de São Paulo, possa contratar fornecedores locais aqui da cidade. Um outro exemplo foi o Mix Mateus, com quem articulamos para que inserissem vagas na plataforma Go Recife para que recebessem os currículos de pessoas que haviam passado por cursos da Secretaria de Trabalho e Qualificação.
É isso, mais ou menos, que vem mudando a realidade, é ter uma gestão pública muito próxima do privado que é quem gera emprego e renda. E, quando falamos dos microempreendedores, das empresas de pequeno porte que representam quase 90% do Recife, temos várias parcerias com o Sebrae. Tudo isso com base no estudo de dados dentro da Secretaria de Desenvolvimento Econômico.
E qual é o maior desafio da economia no Recife?
O maior desafio da nossa economia é espaço, porque a gente não consegue trazer indústrias que seriam estruturantes. O Recife é uma cidade pequena com muita gente. Hoje temos o Porto Digital, então tentamos potencializar essa área de tecnologia, bem como as áreas médica e de construção civil. O ideal seria uma cidade maior, com mais capacidade de conseguir atrair também empresas de logística com grandes galpões. Outra dificuldade, que é uma grande realidade do Brasil, é em relação à disparidade de classes sociais. Temos uma desigualdade de renda muito alta, e essas políticas públicas que criamos é justamente para tentar diminuir um pouco essa distância.