Arquivos Manu Siqueira - Página 2 de 2 - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Manu Siqueira

Já tomou seu remedinho hoje? 

Uma análise, bem-humorada e profunda, sobre saúde mental  Por Manu Siqueira Remédio para dormir, remédio para acordar. Remédio para emagrecer e remédio para não esquecer de tomar o remédio para emagrecer. Toma sol, bebe água- com limão de preferência-, vai à feira, tudo caro! E bota mais veneno no prato. Ah! E não esquece de comprar a comida do gato!  O mundo está melhor ou pior, indago. Acho mesmo que o mundo está ao contrário e ninguém reparou. Conseguiu mostrar que é feliz na rede social, hoje? Ah! Também não esquece de trabalhar após o expediente, de responder às mensagens madrugada adentro e de treinar, mesmo depois de um dia exaustivo. Tira foto no espelho, do elevador ou da academia, tá? Tem que correr, tem que suar, tem que malhar. Vamos lá!? Tá pago! Um chopp pra distrair... e aquele doce lindo? Açúcar vicia, mas não é proibido, então posta a foto mesmo que a gostosura não esteja tão gostosa assim. Entra no aplicativo de paquera, sai correndo do aplicativo de paquera. Desmarcou a reunião? Não se preocupe, porque você terá mais cinco ao longo do dia.  Como assim se atrasou por causa do trânsito? Foi assaltada? Foi assediada? Já fez aquele procedimento estético? Comprou pão sem glúten? Já tomou seu Ômega 3? E a vitamina D? Ou seria melhor um multivitamínico? Já assistiu ao tutorial no YouTube para fazer a make perfeita? Engoliu mais uma grosseria com medo de perder o emprego ou o cliente? Meditou? Ah! E não esquece de produzir conteúdo para a internet. Afinal, só existe... quem posta. Todo dia, de preferência.  Ufa! Parece que viver nunca foi tão cansativo. Tenho uma leve impressão de que o mundo pós-pandêmico está mais difícil. Penso que nunca foi tão complicado e burocrático se relacionar com o outro e ter tempo para dar conta de tantos afazeres.  Em toda roda de conversa, sempre tem um caso de alguém que não está bem, e que anda com a saúde mental abalada. Crises de ansiedade, ataques de pânico e depressão passaram a ser parte cotidiana da vida adulta, cada vez mais jovem, diga-se de passagem. Um antidepressivo ali, um floral acolá e, de repente, todos estamos medicados. Ainda sentimos? Ou anestesiamos todas as nossas dores? Antes de se falar massivamente em saúde mental, as violências, muitas vezes, aconteciam, de forma silenciosa, nas famílias. Afinal, qual mulher nunca foi chamada de louca, desequilibrada, maluca ou doida, por um homem? Essa violência tem um nome difícil de pronunciar, mas fácil de denunciar. O “gaslighting” é um tipo de violência psicológica, que consta no artigo 7º da Lei Maria da Penha. Geralmente, o abusador distorce, mente e induz a vítima a achar que está enlouquecendo. É bem pesado! Para ampliar o assunto, bati um papo super bacana com a psicanalista Diana Carneiro. Segundo a profissional, que tem 37 anos de carreira, a principal queixa, em consultório, de mulheres com mais de 40 anos, é a solidão. Elas possuem um desejo imenso de querer compartilhar a vida com alguém, mas esse alguém não existe. Há uma vontade de ser amada e de dar amor, mas não existe para quem. E esse desejo, de acordo com a especialista, é independente da escolha do objeto do amor, seja hétero ou homossexual.  Quebrando a referência de gerações anteriores, muitas mulheres, hoje, são independentes financeiramente, graduadas, pós-graduadas, mestres e doutoras, sendo, em alguns casos, divorciadas, casadas ou solteiras. Algumas são mães solo, por escolha ou não. Muitas trazem uma satisfação profissional, enquanto outras amargam uma frustração quanto à profissão escolhida, muitas vezes, de forma equivocada, ainda na juventude. Diana Carneiro diz que, essas mulheres chegam ao consultório com queixas relacionadas à angústia e tristeza, associadas à insônia, ansiedade e pânico. Quando questionadas sobre o porquê desses sentimentos, sempre vem à tona a solidão, com base no desamparo.  De acordo com a psicanalista, a noção de desamparo designa o estado ou condição de alguém que se encontra “sem ajuda”, “desamparado”. Refere-se a um estado objetivo de dependência do recém-nascido para com o adulto, no que diz respeito à satisfação de suas necessidades vitais, segundo Freud.  Em paralelo, embora essas mulheres enfrentem, no decorrer de suas vidas, situações adversas e, por muitas vezes, as superem, ainda assim, algo do vazio e da impotência ressurge mascarado pelo sentimento de solidão, levando o retorno ao nome do pai.  Para a psicanalista, através de um tratamento analítico baseado na escuta e no fortalecimento do ego, é possível que cada mulher compreenda o seu próprio desamparo, acolhendo-o e realizando um processo com autoconhecimento e reconstrução do amor-próprio, baseados em uma importante compreensão de que amar nunca foi e nunca será colocar a vida, as decisões e o próprio caminho nas mãos do outro.   Pois é, talvez a solidão seja, definitivamente, um gatilho que gera várias doenças mentais. Porém, sempre é necessário lembrar que vivemos em sociedade, embora o ser humano, que faz guerras após o mundo paralisar diante de uma pandemia, não seja tão legal assim. Mas a própria pandemia mostrou muito bem o poder da coletividade, pois era preciso se preservar para não passar o vírus adiante. Parece piegas e soa clichê, eu sei, mas viver a solitude, na sua mais intensa complexidade, pode ser muito libertador e pacificador, ou seja, uma ótima experiência para espantar a solidão. Estamos vivendo uma nova revolução feminina com uma explosão de movimentos de mulheres, dentro e fora das redes sociais, que entendem que não dá mais para viver como estávamos vivendo há séculos: sem aceitar os nossos corpos, perdoando traições dos parceiros, escondendo abusos, normalizando violências, desempenhando as mesmas funções, mas ganhando menos.  Acredito que, com essa mudança comportamental, e com a criação de uma nova consciência, a mulher segue mais atenta aos pequenos sinais de comportamentos inadequados e não aceitáveis. Aos poucos, espero eu, possamos reestruturar a sociedade, de forma que viver e se relacionar não seja mais tão difícil. E que a gente não precise mais de nenhum remedinho para ser feliz.  Agora, se

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Existe vida após o divórcio? 

Por Manu Siqueira  Medo. Tontura. Taquicardia. Desespero. Angústia. Solidão. Choro, muito choro. Tristeza. Melancolia. Raiva. Desilusão. Dor, muita dor.  Alívio. Sorriso. Empatia. Descobertas. Renascimento. Solitude. Amor-próprio, muito amor-próprio. Amigos. Diversão. Viagens. Novidades. Vida, muita vida.  Tentei procurar algumas palavras que se encaixassem bem nessa ampla e complexa palavra chamada divórcio. Confesso que o segundo parágrafo foi mais fácil de escrever, embora eu tenha passado por todos esses sentimentos, ora gradativamente, ora tudo misturado.  Anunciado com letras garrafais em manchetes sensacionalistas, o divórcio sempre ganha as capas de jornais e revistas, principalmente nesta era digital, quando a rapidez da notícia consegue ser tão grande quanto a quantidade de likes que ela recebe. Penso que parte da curiosidade do público seja apenas pela fofoca. Se o divórcio acontecer com um ídolo então, mais textão nas redes sociais ele ganha. Porém, acredito que, em alguns casos, o consumo de notícias desse tipo deva acontecer por meio de identificação.  Embora muitas mulheres com mais de 40 anos já sigam em seus segundos ou terceiros casamentos, muitas delas ainda buscam amparo e consolo em fatos que as aproximem daquela situação. Se reconhecer na dor ou no alívio, compartilhando esses sentimentos com outro alguém que passa por situação semelhante, abranda a agonia de uma separação. Tenho a impressão de que, quando os divórcios acontecem entre casais com filhos, o assunto tende a ser ainda mais doloroso. Afinal, filhos são laços eternos.  Dizem que apenas conhecemos verdadeiramente o nosso parceiro ou parceira quando nos separamos. Ali, descobrimos quem fica com o faqueiro e com o conjunto de louça e quem fica com a paz; quem quer as fotos do filho guardadas numa caixa amarelada ou quem prefere ficar com o apartamento; quem quer o carro ou quem prefere trocá-lo pela liberdade.  Eu sempre acreditei que as relações amorosas devam existir até quando fizerem sentido para o casal, e nunca porque juraram amor eterno na frente de qualquer líder religioso. Tenho algumas amigas que já me confidenciaram que o segundo casamento é mais gostoso, mais tranquilo e que, com o tempo, a gente vai aprendendo a selecionar melhor os parceiros e, consequentemente, fazer escolhas mais acertadas. Concordo. Vibro junto. Torço demais.  Há quem, depois de um divórcio traumático, também escolha “jogar luz” em outras áreas da vida, o que é completamente entendível. Porém, deixo aqui um alerta importante: reconstruir a vida não significa necessariamente casar de novo. Às vezes, precisamos recolher nossos cacos para seguir adiante. E isso leva tempo.  Porém, o mais importante é realmente seguir em frente, do jeito que der e puder. Conheço uma mulher que viveu em um casamento por 30 anos, se divorciou e escolheu não mais se relacionar amorosamente. Durante o casamento, ela abriu mão de muitos desejos como estudar e viajar. E, após o divórcio, segue formada, trabalhando e conhecendo o mundo.  Lembro de ter visto uma entrevista da atriz Eliane Giardini que, após um longo casamento com o ator Paulo Betti, disse ter preguiça de se relacionar. Que ocupava essa lacuna com o trabalho, amigos, viagens, filhos e netos. Eu achei aquilo tão sensacional, que nunca mais esqueci. Sim, às vezes dá preguiça mesmo. A gente “enche o saco”, se ilude, se desilude, arrisca, volta atrás, desiste, insiste, se arrepende, cansa. Algumas mulheres seguem tentando, outras desistem, e outras simplesmente não ligam.  A escritora Ana Holanda escreveu uma declaração de amor, semana passada, para o novo namorado. Após um divórcio doloroso, ela encontrou o amor quando menos esperava. Ela escreveu: “Eu não estava mais à espera de um grande amor. Nem acreditava mais em um grande amor. Já havia amado bastante e capotado na mesma medida. Já estava de bom tamanho para uma vida. Talvez por não estar à espera, não coloquei peso nem expectativas. Apenas permiti que entrasse”, diz ela em relação ao seu companheiro, Marcos.  Aos 20 anos, quando comecei a namorar o meu ex-marido, eu não estava exatamente como a Ana, mas lembro de não estar disponível para me apaixonar por ninguém. Eu cursava o terceiro ano na faculdade, estava com vários planos, amigos novos, projetos e um mundo de descobertas e “azaração”. Nesse momento a gente entende que não consegue mandar no destino, nem controlar os sentimentos.  Quando o amor bate na nossa porta, a gente simplesmente deixa ele entrar. Hoje, claro, possivelmente o amor tenha que bater mais de uma vez na porta, ou talvez tente pular a janela, ou ainda quem sabe, possa passar por uma trilha pedregosa, mas certamente ele encontrará uma vista tão incrível e deslumbrante, que rapidamente se esquecerá dos percalços.  Sim, existe vida após o divórcio. Muita vida, eu diria. Uma vida nova, interessante, sedutora. Uma vida novamente de solteira, sem que isso soe como fracasso ou algo parecido. Simplesmente uma vida que começa a ser vivida com mais intensidade e plenitude. Uma vida em reconstrução. Uma vida cheia de novas escolhas e possibilidades.   *Manu Siqueira é jornalista (mmsiqueira77@yahoo.com.br)

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Uma mulher trocando de pele

*Por Manu Siqueira Um dia desses, ouvi esse termo da atriz Isabel Teixeira, em uma entrevista na qual ela falava sobre envelhecer e todos os processos que cercam essa fase da vida. Tive tanta conexão com a frase, que pensei, por milésimos de segundos, em perpetuá-la na minha pele, a mesma que habito há 46 anos, e que está perdendo colágeno e ganhando algumas tatuagens, manchas e rugas. Tudo junto!  Envelhecer é um processo natural e que deveria ser visto de tal forma. Na natureza, podemos observar o envelhecimento de algumas espécies. Em casa, com os animais domésticos, também acompanhamos essa fase.   E assim, como uma serpente ou camaleoa, também me vejo trocando de pele, só que em uma proporção mais ampla. Além de ganhar celulites, enxergo essa “troca de pele” como uma mudança, um renascimento, uma nova oportunidade de ser, finalmente, quem sempre desejei me tornar. É como se despir em camadas, fazendo aflorar uma essência verdadeira, que muitas vezes é suprimida ou esmagada por situações abusivas. A cantora Maria Bethania fala que gosta dos seus cabelos brancos, das rugas. Diz que pertencem a ela, que o tempo a presenteou, que ela mereceu ganhar, e completa: “envelhecer é um privilégio”. Pegando carona nesse pensamento, te pergunto: “não seria mais prático e fácil a gente simplesmente aceitar pacificamente o nosso processo de envelhecimento?”. E já te respondo: “NÃO!”. Exatamente assim, com letras garrafais. Ir de encontro a um sistema mundial gigante e devastador, que venera a juventude e despreza os velhos pode ser muito, mais muito exaustivo. Desde crianças, na própria família, aprendemos que não podemos ser gordas, mesmo que as nossas taxas sanguíneas estejam normais. Também não podemos ter cabelos brancos. Se surgir uma ruga, já devemos fazer um procedimento estético ou passar algum creme como se aquilo fosse uma doença. Aprendemos que as unhas devem estar sempre bem feitas e pintadas, e que não podemos sair sem maquiagem e, muito menos, sem sutiã. “Já passei da idade”, “estou velha demais para isso”, “não tenho mais corpo para usar biquíni”, “meu tempo já passou”. Quem nunca ouviu uma dessas frases, dita, geralmente, por uma tia, mãe ou avó? Depois de um tempo tentando entender essa avalanche de nomenclatura para mulheres que estão em processo de envelhecimento, entendi que madura, coroa, loba ou ageless (sem idade), por mais que esse movimento seja interessante, são algumas expressões usadas pela mídia apenas para camuflar a palavra velha.  De um lado, eu entendo essa linguagem, criada pela indústria estética, que te leva a acreditar em uma juventude eterna, que sabemos, é inexistente, mas que, mesmo assim, movimenta milhões de reais todos os anos. Afinal, se você parar essa leitura agora e for pesquisar no Google alguns sinônimos para mulher velha, você vai encontrar as seguintes palavras: caduca, decrépita, engelhada, anciã, arcaica, antiga, antiquada, idosa e obsoleta.  Do outro lado, continuo sonhando com o dia em que a palavra ‘velha’ não ressoe como xingamento, não tenha conotação pejorativa e nem venha associada à demência. Quero ter orgulho de estar me tornando uma velha. Nesse momento, você deve estar se perguntando se eu não estou exagerando, já que tenho 46 anos, apenas. Apenas? Pois bem antes disso eu já sofri etarismo, acredita? Mas esse é outro papo. Quero abrir aqui, porém, um parêntese em luz neon: “Não sou fruta para ser ou estar madura, e acumulo idade sim, aliás, coleciono. E isso, caro leitor, nunca deve ser motivo de vergonha. Afinal, só não envelhece quem morre jovem”. Anotou? Nas culturas indígenas, que enobrecem a ancestralidade e os antepassados, os mais velhos são tratados com imenso respeito, se tornando responsáveis pela liderança e condução de vários rituais. Na China, Japão e na cultura judaica, eles têm um papel importante por serem vistos como sábios.  Quando eu tinha 39 anos, escrevi em um blog que mantinha na época, quase em tom de confissão: “nos últimos anos vividos, em quase quatro décadas, os sinais do envelhecimento já são latentes. No pescoço, certo enrugamento. Os seios, antes firmes, já começam a dar sinais de flacidez. A gravidade insiste em pô-los para baixo. O metabolismo é bem mais lento, a gordura se acumula nos braços e quadris. E agora? O que se faz? Vive-se! Apenas vive-se”. Continuo compactuando com esse pensamento. Claro que agora, sem tanto foco estético no corpo e sim, na saúde, destacando os cuidados com a mente, com o emocional e com o espiritual. Dessa forma, todos os dias, eu arranjo uma maneira de exercitar o meu olhar pueril e encantado pela vida. E garanto: com o tempo, isso só melhora e se aperfeiçoa. A gente encontra mais felicidade nas horinhas de descuido e observa os detalhes que ninguém reparou. E isso é mágico! Ah! E uma das coisas mais importantes que tenho feito nos últimos anos é escolher bem a minha rede de apoio e de afeto. São essas pessoas que não vão te julgar, te abandonar e nem largar a sua mão quando você estiver em uma guerra. Essa presença será mais importante que a própria trincheira, como diria Ernest Hemingway. Por isso, cultive as pessoas que lhe querem bem e siga rodeada de boas energias. Só quem conhece a profundidade das sombras, reconhece um olhar iluminado.  *Manu Siqueira é jornalista (mmsiqueira77@yahoo.com.br)

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