Uma análise, bem-humorada e profunda, sobre saúde mental Por Manu Siqueira Remédio para dormir, remédio para acordar. Remédio para emagrecer e remédio para não esquecer de tomar o remédio para emagrecer. Toma sol, bebe água- com limão de preferência-, vai à feira, tudo caro! E bota mais veneno no prato. Ah! E não esquece de comprar a comida do gato! O mundo está melhor ou pior, indago. Acho mesmo que o mundo está ao contrário e ninguém reparou. Conseguiu mostrar que é feliz na rede social, hoje? Ah! Também não esquece de trabalhar após o expediente, de responder às mensagens madrugada adentro e de treinar, mesmo depois de um dia exaustivo. Tira foto no espelho, do elevador ou da academia, tá? Tem que correr, tem que suar, tem que malhar. Vamos lá!? Tá pago! Um chopp pra distrair... e aquele doce lindo? Açúcar vicia, mas não é proibido, então posta a foto mesmo que a gostosura não esteja tão gostosa assim. Entra no aplicativo de paquera, sai correndo do aplicativo de paquera. Desmarcou a reunião? Não se preocupe, porque você terá mais cinco ao longo do dia. Como assim se atrasou por causa do trânsito? Foi assaltada? Foi assediada? Já fez aquele procedimento estético? Comprou pão sem glúten? Já tomou seu Ômega 3? E a vitamina D? Ou seria melhor um multivitamínico? Já assistiu ao tutorial no YouTube para fazer a make perfeita? Engoliu mais uma grosseria com medo de perder o emprego ou o cliente? Meditou? Ah! E não esquece de produzir conteúdo para a internet. Afinal, só existe... quem posta. Todo dia, de preferência. Ufa! Parece que viver nunca foi tão cansativo. Tenho uma leve impressão de que o mundo pós-pandêmico está mais difícil. Penso que nunca foi tão complicado e burocrático se relacionar com o outro e ter tempo para dar conta de tantos afazeres. Em toda roda de conversa, sempre tem um caso de alguém que não está bem, e que anda com a saúde mental abalada. Crises de ansiedade, ataques de pânico e depressão passaram a ser parte cotidiana da vida adulta, cada vez mais jovem, diga-se de passagem. Um antidepressivo ali, um floral acolá e, de repente, todos estamos medicados. Ainda sentimos? Ou anestesiamos todas as nossas dores? Antes de se falar massivamente em saúde mental, as violências, muitas vezes, aconteciam, de forma silenciosa, nas famílias. Afinal, qual mulher nunca foi chamada de louca, desequilibrada, maluca ou doida, por um homem? Essa violência tem um nome difícil de pronunciar, mas fácil de denunciar. O “gaslighting” é um tipo de violência psicológica, que consta no artigo 7º da Lei Maria da Penha. Geralmente, o abusador distorce, mente e induz a vítima a achar que está enlouquecendo. É bem pesado! Para ampliar o assunto, bati um papo super bacana com a psicanalista Diana Carneiro. Segundo a profissional, que tem 37 anos de carreira, a principal queixa, em consultório, de mulheres com mais de 40 anos, é a solidão. Elas possuem um desejo imenso de querer compartilhar a vida com alguém, mas esse alguém não existe. Há uma vontade de ser amada e de dar amor, mas não existe para quem. E esse desejo, de acordo com a especialista, é independente da escolha do objeto do amor, seja hétero ou homossexual. Quebrando a referência de gerações anteriores, muitas mulheres, hoje, são independentes financeiramente, graduadas, pós-graduadas, mestres e doutoras, sendo, em alguns casos, divorciadas, casadas ou solteiras. Algumas são mães solo, por escolha ou não. Muitas trazem uma satisfação profissional, enquanto outras amargam uma frustração quanto à profissão escolhida, muitas vezes, de forma equivocada, ainda na juventude. Diana Carneiro diz que, essas mulheres chegam ao consultório com queixas relacionadas à angústia e tristeza, associadas à insônia, ansiedade e pânico. Quando questionadas sobre o porquê desses sentimentos, sempre vem à tona a solidão, com base no desamparo. De acordo com a psicanalista, a noção de desamparo designa o estado ou condição de alguém que se encontra “sem ajuda”, “desamparado”. Refere-se a um estado objetivo de dependência do recém-nascido para com o adulto, no que diz respeito à satisfação de suas necessidades vitais, segundo Freud. Em paralelo, embora essas mulheres enfrentem, no decorrer de suas vidas, situações adversas e, por muitas vezes, as superem, ainda assim, algo do vazio e da impotência ressurge mascarado pelo sentimento de solidão, levando o retorno ao nome do pai. Para a psicanalista, através de um tratamento analítico baseado na escuta e no fortalecimento do ego, é possível que cada mulher compreenda o seu próprio desamparo, acolhendo-o e realizando um processo com autoconhecimento e reconstrução do amor-próprio, baseados em uma importante compreensão de que amar nunca foi e nunca será colocar a vida, as decisões e o próprio caminho nas mãos do outro. Pois é, talvez a solidão seja, definitivamente, um gatilho que gera várias doenças mentais. Porém, sempre é necessário lembrar que vivemos em sociedade, embora o ser humano, que faz guerras após o mundo paralisar diante de uma pandemia, não seja tão legal assim. Mas a própria pandemia mostrou muito bem o poder da coletividade, pois era preciso se preservar para não passar o vírus adiante. Parece piegas e soa clichê, eu sei, mas viver a solitude, na sua mais intensa complexidade, pode ser muito libertador e pacificador, ou seja, uma ótima experiência para espantar a solidão. Estamos vivendo uma nova revolução feminina com uma explosão de movimentos de mulheres, dentro e fora das redes sociais, que entendem que não dá mais para viver como estávamos vivendo há séculos: sem aceitar os nossos corpos, perdoando traições dos parceiros, escondendo abusos, normalizando violências, desempenhando as mesmas funções, mas ganhando menos. Acredito que, com essa mudança comportamental, e com a criação de uma nova consciência, a mulher segue mais atenta aos pequenos sinais de comportamentos inadequados e não aceitáveis. Aos poucos, espero eu, possamos reestruturar a sociedade, de forma que viver e se relacionar não seja mais tão difícil. E que a gente não precise mais de nenhum remedinho para ser feliz. Agora, se