Arquivos Manu Siqueira - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Manu Siqueira

Então é Natal! E o que você fez?

*Por Manu Siqueira Fracassei. E fracassei com sucesso. Dezembro é meio assim. A gente fracassa o tempo todo. Existe até uma síndrome batizada de Síndrome de Fim de Ano, que coloca em ebulição, sentimentos confusos ou mal digeridos como ansiedade, cansaço, exaustão, fadiga, estresse e tristeza. Eu perdi prazos. Não dei conta de tudo. Esqueci de tomar o suco verde pela manhã e de fazer aquele exercício matinal para diminuir as dores da Fascite Plantar. Na correria, mal tive tempo de produzir o texto desta coluna, que segue bem atrasada. Dezembro é ligeiro como um raio, repleto de confraternizações, presentes para comprar, ceia de Natal para fazer, filas quilométricas e abomináveis pra absolutamente tudo. Engarrafamentos por todo o lado. Piscamos e terminou o ano. Você também tem a sensação de que o mundo está ao contrário e ninguém reparou? Sim, precisamos sair do piloto automático, de estar disponíveis 24h pelo WhatsApp, de tentar dar conta de tudo o que já sabemos que não daremos conta. Equilíbrio. Sei que nem sempre conseguimos, mas é possível. Esta semana, em meio a tantas e infinitas tarefas do meu dia a dia, desliguei o celular por meia hora, fiz um café e comi com bolo de cenoura no final da tarde, assistindo uma novela na televisão. Foi a meia hora mais feliz do meu dia. Este texto é um lembrete para você não se deixar levar pela correria do cotidiano, que nos engole cruelmente, às vezes. É só pra te lembrar de largar um pouco o celular, tomar um chá ou alguma bebida refrescante enquanto olha o pôr do sol pela sua janela. Também vale aquela caminhadinha até a padaria para comprar pão fresquinho. Ah! E deixo o celular em casa. No caminho, sempre gosto de observar os muros das casas, as janelas, se a rua é arborizada, sempre encontro alguma árvore mais frondosa para olhar a sua copa, ver se ela está carregada de frutos ou flores. Gosto de ver o encaixe das pedras na calçada. Sempre encontro algo bonito no caminho. E é isso que te desejo em 2025: que você sempre encontre algo bonito no seu caminho. *Manu Siqueira é jornalista (mmsiqueira77@yahoo.com.br)

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Há uma menina, há uma moleca morando sempre em meu coração

Uma crônica de Manu Siqueira recheada de sonhos e fantasias de criança Milton Nascimento, certamente, estava muito inspirado quando compôs “Bola de meia, bola de gude”. A letra e a melodia se misturam em um balé harmonioso que toca profundamente as memórias infantis de qualquer pessoa. Não quero aqui romantizar as infâncias difíceis. Sei que muitas intempéries desse período ainda estão impressas na parede da memória de muita gente. Mas espero que este texto seja um sopro de esperança, aliviado, dizendo ao pé do ouvido: “já passou”. Quero também, assim como na música, que esta leitura traga uma nostalgia gostosa e que cada leitor e leitora possa fechar os olhos e viajar comigo no tempo. Na infância dos anos de 1980, os quintais das casas de nossas avós pareciam um universo particular, onde a gente subia nas árvores e brincávamos nas poças d'água olhando para o céu azulzinho e imaginando criaturas que se formavam com a movimentação das nuvens. A gente fazia comidinhas para as nossas bonecas com barro, água, folhas e flores, e, também, comíamos frutas diretamente do pé, sem precisar lavar antes. Nas vendas, que eram bem populares, meus olhos brilhavam quando via aquela bomboniere giratória recheada de pirulitos, chicletes e bombons. Lembro muito da sensação de liberdade: de andar descalça, de levar minha prima no bagageiro da bicicleta que, na época, ainda não era chamada de bike, e de “ganharmos” o mundo, sem preocupações, sem medo, apenas sendo crianças alegres. Os pais, em sua maioria, permitiam que a gente brincasse ao ar livre, criando nossas próprias regras e explorando o mundo ao nosso redor. A gente sonhava. E muito. Sonhávamos em ser paquitas, em namorar algum Menudo, em ter os poderes da “Jeannie é um gênio”. Brincávamos de esconde-esconde, de “Gato mia”, de “Passarás”, da brincadeira do anel e de Amarelinha. Quem foi criado em contato com a natureza, com certeza, deve sentir, até hoje, o sabor do leite tirado da vaca na mesma hora em que o galo cantava, anunciando que o dia estava nascendo. Dizem que a vida na roça começa cedo e deve ser fascinante. Tenho uma amiga que, sempre que estamos juntas, arranja uma forma de reviver a criança que habita em nós. No último encontro, este ano, tentamos subir em uma árvore em um parque, lá em Brasília. Não deu muito certo; afinal, nossa coluna já não é a mesma, mas eu amo a tentativa dela de resgatar isso em mim. Minha criança interior, confesso, sempre anda adormecida. Mas de vez em quando, é bom deixá-la acordada, com os olhos atentos e brilhantes. Outra amiga, dia desses, disse que está com vontade de colocar um balanço em casa. Achei a ideia fantástica. Quando paramos de nos balançar? Uma brincadeira tão simples e tão maravilhosa... Assistindo recentemente ao documentário sobre as Paquitas, pude revisitar um sentimento que tomou conta dos anos 80: a Xuxa. Ela foi importante para a comunidade LGBTQIAPN+, que sempre encontrou conforto em seus programas e acolhimento nas letras das músicas, enquanto, muitas vezes, era hostilizada nas escolas e na vizinhança simplesmente por ser quem é. Você não precisa gostar da Xuxa, mas é preciso admitir que sim, ela foi bastante importante para esse público e também para uma multidão de crianças que sonhava em trabalhar na televisão. E eu era uma delas, sem ao menos saber a complexidade que isso representava. Mas o documentário deixou claro o “alto preço” que essas crianças pagaram para realizar esse sonho que depois se transformou em pesadelo. Impossível também não lembrar da Turma do Balão Mágico e do Trem da Alegria que marcaram uma geração com músicas que são cantadas até hoje. Na TV, imperdível eram os finais de tarde com o Sítio do Pica-Pau Amarelo e os domingos com Os Trapalhões. As festinhas de aniversário também estão na memória de muita gente, tenho certeza. Eram simples, feitas em casa, brigadeiro por brigadeiro, enrolados um a um por mães, primas e avós. Tenho saudade de alguns sabores da infância: dos lanches, na hora do recreio; do leite em pó que tinha um gosto que não existe mais; vitamina com farinha láctea era uma delícia; geladinho de coco sempre presente nos domingos na praia; claro, não podiam faltar o chiclete Bubbaloo, chocolates Surpresa e Lollo; e as balinhas Xaxá. Quando fiz 40 anos, comemorei com uma festa temática dos anos 80, com todos os brinquedos, músicas e decoração que tive direito. Foi lindo e emocionante rememorar essa época feliz! Dizem que, quando ficamos velhos, voltamos a ser crianças. Espero que o ditado se concretize no sentido de poder levar a vida de forma mais leve e divertida. Belchior pode até ter razão quando disse que o passado é uma roupa que não nos serve mais; porém, sempre é bom lembrar que toda vez que uma bruxa te assombra, a menina te dá a mão. E te fala coisas bonitas que acredito que não deixarão de existir: amizade, palavra, respeito, caráter, bondade, alegria e amor. Que a gente nunca perca nosso olhar pueril e encantado pela vida! Feliz Dia das Crianças! *Manu Siqueira é jornalista (mmsiqueira77@yahoo.com.br)

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Novo point da paquera no Recife – Parte II

A continuação de uma crônica bem-humorada para quem permanece acreditando no amor Por Manu Siqueira Sete meses. A vida passa rápido, não é mesmo? Eu pisquei os olhos e já faz sete meses que me mudei. A nova casinha é pequena, sem área de serviço e, portanto, sem espaço para uma máquina de lavar e secar roupas. Por isso, aos fins de semana, andei me aventurando a lavar minhas roupas na casa da minha mãe. Que tarefa cansativa! É um tal de separar roupas, lavar, estender, recolher, trazer para casa, estender de novo, dobrar, guardar. Ufa! Até que descobri as lavanderias self-service. Aqui, na zona norte, onde moro, tem uma praticamente em cada esquina. O esquema é simples. Você paga um determinado valor por um cesto de roupas, coloca na máquina, espera meia-hora e pronto! Roupas limpas e cheirosas sem gastar energia elétrica, sabão e amaciante. Ainda tem a opção de secar e já levar a roupa pronta para ser guardada. Em algumas lavanderias, existem mesas e cadeiras, caso a pessoa precise trabalhar ou usar o computador enquanto espera a lavagem. Em várias idas à lavanderia que frequento, iniciei conversas com algumas pessoas, mas um detalhe me chamou a atenção: muitos homens usam o serviço. Talvez pela praticidade e rapidez. É muito comum encontrar ainda jovens viajantes que usam as lavanderias para dar um “grau” nas roupas. Encontrei vários homens 40+ usando esses serviços também. Uma amiga me confidenciou que usa, estrategicamente, uma lavanderia que fica dentro de um hotel, em Boa Viagem, na zona sul do Recife. Aí não há receita melhor: turista + bate-papo + troca de telefones. Alguns deram match e renderam alguns encontros, outros, somente uma conversinha fiada mesmo. Achei interessante o relato dela. Comigo, só conversas mesmo. Superficiais. Mas também quem pensa em flertar em uma lavanderia? E eu te digo: você! Neste exato momento! Pois, acredite: não existe lugar certo para paquerar, e sim, a circunstância certa. Meu pai amava um filme chamado “Ensina-me a viver”. Assisti diversas vezes. É uma película de 1971 e conta a história de uma mulher de 79 anos e de um jovem, de 20, que se conhece em um funeral. Não vou dar spoiler aqui, mas é um filme lindo que tem um ensinamento precioso sobre o amor e a efemeridade da vida. E sobre as oportunidades da vida, há duas semanas cheguei de viagem. Estive com amigas queridíssimas em Brasília, lugar que aprendi a amar, por amar pessoas que vivem lá. Embarquei com uma mala pequena e uma mochila. No avião, no compartimento após a minha fileira, pedi ajuda a um homem para colocar a minha mala, que estava bem pesada, no local correto. Ele, muito sorridente, me concedeu a gentileza. Trocamos sorrisos. Quem troca sorrisos hoje em dia, alguém sabe? Sentei duas fileiras à frente. Depois, me distraí, e não mais o vi. - moço, se estiver lendo este artigo, gostaria de te agradecer a gentileza pessoalmente, tá? Vai que dá certo, né? Sim! Me descuidei um segundo e deixei o flerte escapar. É raro, mas acontece muito comigo. Ah! Quase ia esquecendo. Ano passado eu celebrei o casamento de vizinhos que se conheceram em plena pandemia. Por isso, a partir de hoje, pode ficar de olho nos vizinhos, tá? E não precisam ser os seus, necessariamente. Podem ser os vizinhos dos seus irmãos, da sua mãe, da sua melhor amiga. Importante lembrar aqui também que, em vários condomínios há lavanderias de uso coletivo para os condôminos. Imagina flertar com o seu vizinho enquanto ele observa a sua calcinha centrifugar? Já pensou que cena incrível? Agora falando sério: muito mais importante que um point da paquera no Recife, é você estar aberta e receptiva para os flertes. Afinal, quando as peças de roupa limpa e cheirosa se encaixam perfeitamente, não há mais espaço para a “roupa suja” permanecer. E, de vez em quando, é bom namorar debaixo das cobertas. E se o edredom tiver o cheirinho de Comfort ou Downy, melhor ainda. *Manu Siqueira é jornalista (mmsiqueira77@yahoo.com.br)

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A história de Maria, minha amiga de infância

Por Manu Siqueira Este não é um texto qualquer. É um texto-memória-nostálgico de gratidão à vida. Um daqueles escritos que quero reler daqui a alguns anos. Parece um roteiro novelesco, algo cinematográfico, mas aconteceu comigo recentemente.  “Recife, 24 de abril de 1987. Prezada amiga Manoela: você é a minha melhor amiga do colégio. Como você fez a prova? Eu acho que fiz bem. Minha melhor amiga do colégio era Carol, mas agora é você. Somos muito amigas. Um beijo e um abraço precioso da sua amiga de sempre, Maria”. Essa cartinha, escrita à mão em um papel de carta cor de rosa, está prestes a completar 40 anos, e guardo comigo até hoje, na esperança de reencontrar Maria, minha melhor amiga da época de escola. Quem me acompanha aqui já sabe que travo uma luta diária para frequentar a academia, que fica a 100 metros da minha casa. Pois bem, em uma terça-feira ensolarada, fui a uma aula de dança no início da manhã. A maior parte das alunas é formada por mulheres com mais de 60 anos. Falei com uma, puxei papo com outra e, enfim, começou a aula. Que foi ótima! No final, percebi um rosto familiar. Me aproximei e perguntei: “você é Vera, mãe de Maria?”. Ela me olhou com uma cara de espanto e disse que sim. Eu, com os olhos já marejados, disse: “sou Manu, a melhor amiga de infância da sua filha”. Ela, incrédula, me abraçou, e eu, já chorando, disse que sempre sonhei com esse momento.  Dias depois, Maria me passou uma mensagem. Ela também faz exercícios na mesma academia que estou frequentando. E mais! Estamos morando na mesma rua e no mesmo bairro em que ficava a nossa escola, na infância. Ou seja, somos quase vizinhas. A vida é ou não é uma caixinha de surpresas? Dizem que Recife é um ovo, mas posso provar que não é. Nunca nos cruzamos em nenhum shopping ou restaurante, ou supermercado ao longo desse tempo todo. Seria fácil reconhecê-la porque ela não mudou nadinha. Demos uma pausa nas nossas agendas superlotadas e decidimos tomar um cafezinho em uma cafeteria ao lado da academia. Fui disposta a gravar no celular a minha reação ao vê-la. Mas quem disse que consegui? Eu me emocionei tanto que simplesmente esqueci de filmar. A gente se abraçou longamente e tentamos colocar em dia os 37 anos de conversas atrasadas. Na infância, Maria mudou de colégio. Lembro de sentir uma tristeza profunda com a saída dela. Depois desse dia, nunca mais soubemos notícias uma da outra. Ainda arrisquei procurá-la nas redes sociais, mas não a encontrei. Depois do café, nos despedimos com a promessa de nunca mais nos largarmos. Voltei para casa eufórica, feliz, radiante e escrevi essa mensagem para ela: “Maria, a sensação que tive hoje mais cedo, te reencontrando quase 40 anos depois, foi que, naquele café, a gente ainda tinha 7 anos e continuávamos conversando, como conversávamos, na hora do recreio. Foi muito bacana poder relembrar um monte de coisas que já estavam totalmente apagadas pela poeira do tempo. Nesse processo de envelhecimento, tenho procurado fortalecer os meus laços afetivos de amizade e isso tem sido uma das principais prioridades da minha vida. Que bom te perceber doce, assim como Bárbara falou. A gente não muda nossa essência, né? E como você bem disse: que a gente nunca mais se perca. Um beijo enorme! Adorei nossa tarde! Manu”. Maria está na minha memória afetiva mais bonita. Ela é um tesouro da minha infância. Fecho os olhos e relembro a nossa amizade pairada no ar: ela está na nossa pureza de criança, nas brincadeiras simples e divertidas, nas trocas dos lanches, na nossa doçura, nas intermináveis conversas, na nossa parceria e cumplicidade, nas infinitas trocas de papeis de carta, no encantamento pela vida, e nos sonhos que sonhávamos juntas.  Encontrá-la me permitiu fazer um mergulho dentro em mim e encontrar novamente com esses sentimentos que, às vezes, ficam perdidos dentro da gente.  A nossa comemoração do Dia do Amigo, celebrado no dia 20 de julho, já está marcada e, tenho certeza, vai ser muito especial e divertida. Tenho que concordar com Mário Quintana que disse: “a amizade é um amor que nunca morre”. É sim. Ela pode se ausentar, se perder, ficar guardada num cantinho do coração, mas sempre está lá, viva e pulsante.  

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Olha pro céu, meu amor!

Por Manu Siqueira As festas de São João, sem dúvida, são um dos momentos mais esperados do ano, principalmente aqui, no Nordeste. Elas carregam uma bagagem cultural muito rica. É um balaio cheio de tradições e memórias afetivas que atravessam gerações. Lembro, com carinho, das festas juninas de quem, assim como eu, foi criança no final dos anos de 1980, quando a simplicidade e a tradição eram as protagonistas da celebração. Naquela época, as quadrilhas eram o ponto alto da festa. As crianças da vizinhança se reuniam para ensaiar os passos ao som de “alavantú”, “balancê” e “anarriê” para depois brincar, dançar e se divertir livremente nas ruas. Todo mundo participava: vizinhos, irmãos, colegas de escola, primos. Tenho certeza de que essas quadrilhas deixaram registros na memória de cada criança que ali dançava. Os vestidos coloridos não eram comprados em shoppings, geralmente eles eram confeccionados pelas avós ou por costureiras que, nessa época, ficavam lotadas de encomendas. Além dos vestidos, as camisas xadrez e os chapéus de palha formavam o traje oficial do matuto e da matuta, mas o que realmente importava eram a alegria e a diversão que a gente compartilhava. O cenário das festas era um espetáculo à parte. Lembro das ruas enfeitadas com bandeirinhas coloridas, feitas à mão, com recortes de restos de tecidos, jornais e revistas, e que criavam uma atmosfera mágica e sustentável, antes mesmo da gente saber o significado da palavra sustentabilidade. A grande mesa, recheada de comidas típicas deliciosas, era um convite irrecusável. Havia bolo de milho, pamonha, canjica, pé de moleque, arroz doce e tantas outras delícias que enchiam os olhos e forravam o estômago. Embora nunca tenha gostado de fogos de artifício, é impossível não lembrar os traques de massa e os chuveirinhos, que exalavam um cheiro forte de pólvora, mas garantiam a diversão das crianças. As fogueiras, também, não podiam faltar, embora até hoje eu me pergunte que santo ficaria feliz em receber um monte de fumaça em sua homenagem. Enfim, o mundo mudou, mas as noites chuvosas de junho, até hoje, continuam sendo o centro de muitas histórias, encontros, e muita diversão. No início dos anos 2000, no Poço da Panela, Zona Norte do Recife, descobri um forró que teimava em resistir. Uma casinha simples, uma palhoça no quintal, chão de terra batida, um trio de sanfoneiros. Resultado: forró até o dia clarear. Pena que nunca mais soube notícias desse forrozinho cheio de aconchego e tradição. Essa simplicidade das festas de antigamente pode até ter se transformado, mas a alegria e o espírito de comunidade parecem continuar vivos. Hoje em dia, as festas de São João continuam a ser celebradas com entusiasmo, mas com algumas mudanças. A modernidade trouxe novas tecnologias e influências, fazendo com que algumas tradições sejam adaptadas. As quadrilhas ainda existem, mas agora são exibidas para grandes públicos, e não mais nas ruas dos bairros. As festas cresceram e, em muitos lugares, se tornaram grandes eventos com shows e atrações variadas. Apesar das mudanças, a essência das festas de São João ainda resiste, pelo menos em algumas capitais. Ainda nos reunimos para celebrar com amigos e família, desfrutar das comidas típicas e dançar ao som de um trio de forró. Aliás, o São João, para mim, sem o forró autêntico, genuíno, “de raiz”, simplesmente não é São João. E, falando nisso, deixo aqui a minha indignação por ter que ver, todo ano, sanfoneiros e mestres do forró implorando por espaços nos shows produzidos na capital e no interior de Pernambuco. Não dá para enterrar a riqueza cultural desse jeito. Em contrapartida, fico feliz por ver o movimento de novos cantores trazerem ao seu público, tão jovem quanto eles, pérolas e clássicos do forró eternizados por Luiz Gonzaga, Domiguinhos, Anastácia, Marinês, Jorge de Altinho, Quinteto Violado e tantos outros. É muito bonito e revigorante presenciar as belas canções passando de geração em geração. Guardo as lembranças das festas juninas da minha infância como quem guarda tesouros no coração. Elas me lembram, o tempo todo, que a felicidade está nas pequenas coisas: nas adivinhações ao redor da fogueira, nos passos desajeitados nas quadrilhas, na partilha de uma mesa farta. Hoje, ao olhar para o céu estrelado das noites de São João, sou transportada de volta àquela época mágica, revivendo memórias que nunca se apagarão. Para mim, as festas juninas são um elo entre o passado e o presente, um momento de celebração e união que, embora se modernize, nunca perde seu encanto original. Que possamos sempre olhar para o céu, meu amor, e reviver a mesma alegria de antigamente. Esse é o meu desejo. Feliz São João!

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O vídeo que mudou a minha vida

Por Manu Siqueira Quem me acompanha por aqui já sabe que mudei de casa e de bairro há três meses. Casinha nova, hábitos novos, pensei. Ledo engano. A correria do dia a dia e as demandas intensas nem sempre permitem que mulheres frequentem, regularmente, uma academia de ginástica. Ainda mais, mulheres como meu tipo que é aquele que quando sente vontade de me exercitar, deita e espera a vontade passar. Não que eu seja uma preguiçosa profissional, mas também estou longe de ser uma atleta. Mas, acredite: não sou sedentária. Fiz dança popular na infância e na adolescência e retomei essa antiga paixão, em 2022, mas tive que parar devido a uma lesão no joelho. Depois que fui mãe, também fiz aulas regulares com uma personal trainer, em um grupo de mulheres, no antigo condomínio em que morava. Aulas sempre eram regadas a movimento e dança. E antes da pandemia, ainda frequentei uma academia, embora fosse apenas para as aulas de dança. A minha relutância sempre foi com a tal da musculação. Ô prática insuportável. Como uma pessoa pode pagar caro para sofrer levantando peso? Nunca consegui entender essa lógica. Até que um dia, tudo mudou. Primeiramente, me mudei para uma rua que tem uma academia a 100 metros de onde eu moro. Então, já não podia resmungar que era longe e que perderia tempo para me deslocar. No caminho para o supermercado, a gente sempre flertava. Eu olhava para a academia e dizia: será que um dia eu vou conseguir ter prazer fazendo musculação? Nas caminhadas, e até nas poucas corridinhas que arrisquei, a tal da endorfina nunca me visitou. Ficava esperando o frenesi que todo mundo sentia e...nada. Isso me desestimulava demais. Pois bem, uma noite, zapeando o Instagram, me deparei com um vídeo da jornalista e influencer Viviane Rolemberg. Viviane, aos prantos, com roupa de ginástica e uma toalhinha na nuca, destilava toda angústia e raiva que estavam também dentro dela e, de alguma forma, também dentro de mim. Choramos juntas. Ela falava no vídeo que toda a sua família era sedentária e que ela é a primeira mulher a romper esse padrão. Mas não é fácil, sabemos. É sofrido, é dolorido, é um processo, às vezes, bastante lento. E o nosso objetivo era o mesmo: não perder a autonomia durante a velhice. Nunca pensei em me exercitar para ter a barriga estilo tanquinho, e sim, para poder respirar e dormir melhor, sentindo menos dores no corpo. Ao contrário da família de Vivi, minha mãe sempre se exercitou. E sempre admirei isso nela. Sempre pensei: “sou das artes, fiz teatro, fiz curso de expressão corporal, nunca vou gostar de musculação”. Isso é verdade. Talvez eu nunca consiga gostar de levantar peso, mas, aos 47 anos, entendi que, se quero chegar aos 80 sem precisar usar cadeira de rodas ou muletas, eu vou precisar fortalecer os meus músculos. Não há escapatória. É isso ou isso. Ainda não consigo frequentar regularmente a academia, mas já dei o primeiro passo: eu me matriculei e estou frequentando uma aula de dança semanal. Depois sigo para a musculação e tento alternar os dias em que pego no pesado. Em uma hora e meia, eu consigo avisar ao meu corpo que ele não está mais morto, e sim, segue vivíssimo e pronto para novas aventuras. Quando eu não consigo ir à academia, tento pegar meia hora livre para me alongar, dançar ou “mexer o esqueleto” de alguma forma. Trabalhar escrevendo em frente a um computador o dia inteiro, como é o meu caso, pode trazer sequelas imensas para a coluna, pés, pernas, braços e ombros. Por isso, eu convido você a ler essas palavras com carinho, assim como eu assisti ao vídeo da Vivi. Reflita e veja o que você pode mudar agora. Precisamos plantar bem para termos uma colheita farta. Quem sabe eu não me transforme naquelas mulheres 60+ que escalam montanhas ou pedalam com vigor e paixão pela vida? Acho que, no final das contas, é isso. Se exercitar é manter viva a paixão pela vida. Vamos juntas? Ah! E para quem teve curiosidade, o vídeo da Viviane Rolemberg está disponível no Instagram: @reviravivi

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Novo point da paquera no Recife

Uma crônica bem-humorada para quem continua acreditando no amor Por Manu Siqueira Eu mudei de endereço recentemente. Uma mudança muito esperada e repleta de significados. Mudei a casa, a decoração e meus cabelos. Parece que quando uma mudança vem, ela chega como uma avalanche. Mudamos o CEP várias vezes ao longo da vida. Mudamos de emprego. Mudamos o visual. Mudamos o parceiro amoroso. Mudamos os hábitos. O que antes era importante, hoje não passa de um detalhe insignificante. Isso vale para pessoas também. Em meio à mudança, vivenciei um caos completo. Ainda com o tornozelo quebrado, ergui uma nova morada em poucos dias, apenas com um caminhão de mudança e uma vontade imensa de ser feliz. Recomecei quase do zero: comprei do abridor de garrafas à geladeira nova, que ainda vai chegar. Nessas infinitas idas às lojas de utensílios domésticos, de móveis e armazéns de construção, percebi que esses lugares são recheados de inúmeras possibilidades de encontros. Sim! Eu finalmente descobri que uma ida ao Atacado dos Presentes, no sábado à tarde, pode ser mais interessante que um chopp num barzinho. E que os domingos, na Ferreira Costa, que considero atualmente a minha segunda casa, pode ser um programa ideal para quem gosta de flertar. Não sou especialista na arte da paquera, mas creio que identificar uma pessoa interessante na seção de copos e taças, pode ser, no mínimo, divertido. -“Licença, tudo bem? Você sabe se esta taça é para água ou para suco? Sempre me confundo...” Você pode iniciar um papo assim, despretensiosamente, em meio a um sorriso e uma mexida de cabelo, igual a Mônica Martelli, no filme Minha Vida em Marte, na qual ela usa o cabelo como sua principal arma de sedução. Vai que você encontra um amor entre um espremedor de alho e uma tábua de cortar legumes? A gente nunca sabe, né? Outra dica para quem cansou de usar os famigerados aplicativos de paquera é ir aos supermercados, de preferência à noite ou nos finais de semana. Sempre há um solteiro perdido na seção de chocolates, cervejas e pipocas. Tente ir aos mercados menores, de bairro, geralmente frequentados pela vizinhança. Vai que o amor mora ao seu lado e você não sabe... Li recentemente, em uma matéria, que livrarias e supermercados têm o poder de criar uma cultura de conexão entre pessoas de diferentes estilos de vida e faixas etárias. E eu concordo plenamente com essa possibilidade. Acredito que empresas podem contribuir para combater a solidão e promover encontros entre as pessoas. Em Amsterdã, a marca holandesa Oma’Soep lançou uma campanha para facilitar a interação entre seus clientes. As cestas verdes, por exemplo, indicam que os compradores estão abertos a uma boa conversa durante as compras. No local ainda há folhetos que orientam as pessoas a como iniciar uma conversa. Há, também, um espaço para troca de telefones para futuros bate-papos. A iniciativa foi um sucesso e já começou a ser implementada em outras cidades da Holanda. Por aqui, sigo acreditando que o amor pode nascer entre a seção do repolho e a do leite sem lactose. Mal posso esperar o fim de semana para dar o meu rolê no Atacado dos Presentes e na Ferreira Costa, novamente. Será que a gente se encontra por lá?

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Nós somos madeira de lei que cupim não rói

Por Manu Siqueira Quebrei o tornozelo. Após três segundos de dor lancinante, pensei imediatamente: não vou conseguir brincar o Carnaval. A minha previsão, infelizmente, se concretizou. A fratura e o rompimento de um ligamento me colocaram com uma bota ortopédica imobilizadora por cruéis cinco semanas, no mínimo. É! Não vou brincar o Carnaval. Esses dias precisei ir a uma loja, mancando e munida do meu mais novo companheiro: o estabilizador de tornozelo, que é menos incômodo que a bota. Ao fundo, um frevo me fez lembrar do meu pai. Comecei a chorar no meio do estabelecimento. Uma jovem, ao me ver mancar, disse: tá doendo, moça? Quer ajuda? Eu respondi: sim. Tá doendo demais meu coração por não poder brincar meu Carnaval este ano. Demos uma boa gargalhada. Mas nem sempre fui essa foliã que chora de emoção ao escutar um frevo. Eu fui uma criança que não gostava de Carnaval. Toda foto das matinês nos clubes que eu ia, apareço apática e com a cara desanimada. Só gostava mesmo da guerra de confetes. Acho que despertei oficialmente para essa ofegante epidemia lá para os meus 12 ou 13 anos. Por essa idade, eu comecei a fazer dança popular, no Balé Popular do Recife, e a minha professora, Aninha, colocava os frevos, que eu ouvia quase todo dia em casa, para a gente se alongar na aula. Então, aos poucos, fui me apaixonando pela dança e pela música, aprendendo a sua história e origem, entendendo a diferença entre o frevo de bloco, de rua e o frevo-canção. Sou filha de pai e mãe carnavalescos. Meu pai ouvia frevo o ano inteiro. Lembro com riqueza de detalhes das capas dos LP’s de Capiba, Claudionor Germano, Levino e Nelson Ferreira... e tantos outros, que tocavam na radiola que ficava na sala de casa. Morei na mesma rua que Capiba morou, no Espinheiro. Lembro de, ainda criança, a caminho da escola, vê-lo, cotidianamente, no portão da sua casa. Eu tenho uma relação inexplicável com o Carnaval. Talvez por ter nascido em um. Talvez por não resistir ao glitter. Talvez por me permitir ousar, debochar e ironizar através das fantasias. Talvez seja meramente por considerar a festa mais democrática do planeta. Para mim, o Carnaval horizontaliza pessoas, nem que seja por um breve momento. Já entoei “Madeira do Rosarinho” com um senhor que catava latinhas e tinha um brilho alegre e cantante em seu sorriso que nunca vou esquecer. Carnaval é, para mim, uma profusão de amor. Sem gênero, sem sexo, sem preconceito. É abraçar desconhecidos e é fazer dos desconhecidos, amigos. É tomar uma bebida quente, sem saber sua origem, e brindar com uma pessoa que você estava paquerando e que acabou de conhecer. É tomar banho de chuva ou de mangueira sem se preocupar com a maquiagem derretida ou com o cabelo desgrenhado. Eu só acredito nesse Carnaval: o real, com cheiro de gente, calor e banho de mangueira, multidão, alegria esfuziante e exaustão na volta para casa. Eu sempre me emociono ao ouvir os primeiros acordes de um frevo rasgado. E também me arrepio em toda saída de bloco, ao ouvir os fogos e a orquestra em seguida. Quem consegue não se arrepiar com isso, meu Deus? Acredito que, de alguma maneira, o Carnaval é muito mais que um período de descanso ou de folia. O Carnaval é um sentimento que deixa a gente em um estado letárgico. Tem um cheiro característico. A comida tem um sabor diferente. Os ouvidos estão sempre atentos e a postos para aquela música que arrepia e aquece a alma. Como em um coral, numa energia só, todos cantando juntos. É lindo demais! Os olhos brilham tanto quanto purpurina. De encanto, de magia e de esplendor. Sim, quebrei o pé, mas descobri que o Carnaval é muito além de quatro dias de folia e brincadeira. O Carnaval é um estado de espírito que devemos deixar vivo dentro da gente o ano inteiro. Brincar, pular e escolher brilhar, todo dia do ano. Essa é a verdadeira essência, pura e pueril, do Carnaval. Mas há de se lembrar que a injustiça dói e que sempre seremos madeira de lei que cupim não rói. *Manu Siqueira é jornalista (mmsiqueira77@yahoo.com.br)

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Antes que termine o ano

Por Manu Siqueira Você é do tipo que ama ou odeia dezembro? Ou melhor, você é do tipo animado ou é a pessoa que fica chocha, capenga, anêmica, frágil e inconsistente com a aproximação do fim de ano? Se você me perguntar se eu gosto ou não de dezembro, eu não saberia te responder. Talvez dependa do ano. Do que aconteceu nele. Com quem convivi, o que aprendi. Já tive a sensação de, no fim do ano, estar tão exausta, que a única coisa que eu queria era dormir e descansar o meu corpo e a minha mente. Já tive anos em que quis celebrar com amigos e com a família em festas regadas a alegria e diversão. Mas acho que, geralmente, o fim de ano é um período para refletir, recalcular a rota, se desfazer de coisas e de pessoas, fazer faxina no armário, nos arquivos, doar algo e, se doar para alguém. Fazer a energia circular, me parece, espanta o mau agouro. E sim, sou a favor de todos os rituais que façam os seres humanos acreditarem que serão mais felizes no ano que se inicia. Desde que me tornei celebrante de casamentos, estou ressignificando certos rituais. Acho que os ritos de passagem são importantes para fechar ciclos e abrir novos espaços no coração. É uma ótima oportunidade, inclusive, de praticarmos o respeito às religiões, doutrinas e filosofias. Uma rosa branca para Iemanjá, uma reza para Nossa Senhora das Graças e um pedido aos espíritos superiores. Por que não? Esta época, talvez seja o período em que as pessoas fiquem um pouco mais sensíveis. E, sinceramente, como estamos precisando de sensibilidade no mundo, não é mesmo? Abaixo o ódio gratuito, as opiniões não solicitadas e os julgamentos na internet (e na vida real). E viva a compaixão, a solidariedade e a amizade! Ah! A amizade. Taí uma coisinha pra me emocionar. Sempre me comovo com declarações e gestos vindos dos meus amigos ou direcionados por mim, a eles. Na minha vida, eles não chegam a meia dúzia, mas são amigos com letras maiúsculas, escritas com luzes neon, piscantes, em alguma válvula do meu coração. Assim como Vinícius de Moraes disse um dia: “Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos”. Amigos são verdadeiras dádivas, mesmo. Agradecer por ter, em volta, gente que te quer bem e que torce por você, genuinamente, é sagrado... e cada vez mais raro. Sabe aquelas pessoas curativas? Que te acalmam e que dizem exatamente as palavras que você precisa ouvir naquele momento de dor ou de profundo estresse? Assim como há pessoas malignas, existem as bondosas, e é nessas que devemos concentrar todas as nossas energias. Nos alimentar de bem... Manter essas pessoas por perto, sempre é um bom jeito de iniciar um ano. Por isso, antes que termine o ano, fale, digite, grave um vídeo, desenhe, cante para alguém que foi imprescindível para você. Comemore ter essa pessoa em sua vida. Se o seu ano foi duro, amargo e difícil, é hora de aprender com as experiências dolorosas e seguir adiante. Não, eu não sou do time de perdoar quem te feriu. Há uma comoção geral nas festas de fim de ano de que devemos praticar o perdão a qualquer custo. Não! Sou do time de: afaste-se imediatamente de quem te feriu e, se possível, mantenha-se afastada eternamente. Antes que termine o ano, faça lista, faça planos, faça o que quiser. Permita-se ser livre de ter que ser ou ter que fazer. Nós não temos que nada. Fazemos se quisermos. Claro, com sabedoria e inteligência. Antes que termine o ano, eu quero te desejar um 2024 livre, leve, divertido e alegre. Que, no ano que se inicia, a gente possa ser feliz, antes que termine o ano. *Manu Siqueira é jornalista (mmsiqueira77@yahoo.com.br)

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Já tomou seu remedinho hoje? 

Uma análise, bem-humorada e profunda, sobre saúde mental  Por Manu Siqueira Remédio para dormir, remédio para acordar. Remédio para emagrecer e remédio para não esquecer de tomar o remédio para emagrecer. Toma sol, bebe água- com limão de preferência-, vai à feira, tudo caro! E bota mais veneno no prato. Ah! E não esquece de comprar a comida do gato!  O mundo está melhor ou pior, indago. Acho mesmo que o mundo está ao contrário e ninguém reparou. Conseguiu mostrar que é feliz na rede social, hoje? Ah! Também não esquece de trabalhar após o expediente, de responder às mensagens madrugada adentro e de treinar, mesmo depois de um dia exaustivo. Tira foto no espelho, do elevador ou da academia, tá? Tem que correr, tem que suar, tem que malhar. Vamos lá!? Tá pago! Um chopp pra distrair... e aquele doce lindo? Açúcar vicia, mas não é proibido, então posta a foto mesmo que a gostosura não esteja tão gostosa assim. Entra no aplicativo de paquera, sai correndo do aplicativo de paquera. Desmarcou a reunião? Não se preocupe, porque você terá mais cinco ao longo do dia.  Como assim se atrasou por causa do trânsito? Foi assaltada? Foi assediada? Já fez aquele procedimento estético? Comprou pão sem glúten? Já tomou seu Ômega 3? E a vitamina D? Ou seria melhor um multivitamínico? Já assistiu ao tutorial no YouTube para fazer a make perfeita? Engoliu mais uma grosseria com medo de perder o emprego ou o cliente? Meditou? Ah! E não esquece de produzir conteúdo para a internet. Afinal, só existe... quem posta. Todo dia, de preferência.  Ufa! Parece que viver nunca foi tão cansativo. Tenho uma leve impressão de que o mundo pós-pandêmico está mais difícil. Penso que nunca foi tão complicado e burocrático se relacionar com o outro e ter tempo para dar conta de tantos afazeres.  Em toda roda de conversa, sempre tem um caso de alguém que não está bem, e que anda com a saúde mental abalada. Crises de ansiedade, ataques de pânico e depressão passaram a ser parte cotidiana da vida adulta, cada vez mais jovem, diga-se de passagem. Um antidepressivo ali, um floral acolá e, de repente, todos estamos medicados. Ainda sentimos? Ou anestesiamos todas as nossas dores? Antes de se falar massivamente em saúde mental, as violências, muitas vezes, aconteciam, de forma silenciosa, nas famílias. Afinal, qual mulher nunca foi chamada de louca, desequilibrada, maluca ou doida, por um homem? Essa violência tem um nome difícil de pronunciar, mas fácil de denunciar. O “gaslighting” é um tipo de violência psicológica, que consta no artigo 7º da Lei Maria da Penha. Geralmente, o abusador distorce, mente e induz a vítima a achar que está enlouquecendo. É bem pesado! Para ampliar o assunto, bati um papo super bacana com a psicanalista Diana Carneiro. Segundo a profissional, que tem 37 anos de carreira, a principal queixa, em consultório, de mulheres com mais de 40 anos, é a solidão. Elas possuem um desejo imenso de querer compartilhar a vida com alguém, mas esse alguém não existe. Há uma vontade de ser amada e de dar amor, mas não existe para quem. E esse desejo, de acordo com a especialista, é independente da escolha do objeto do amor, seja hétero ou homossexual.  Quebrando a referência de gerações anteriores, muitas mulheres, hoje, são independentes financeiramente, graduadas, pós-graduadas, mestres e doutoras, sendo, em alguns casos, divorciadas, casadas ou solteiras. Algumas são mães solo, por escolha ou não. Muitas trazem uma satisfação profissional, enquanto outras amargam uma frustração quanto à profissão escolhida, muitas vezes, de forma equivocada, ainda na juventude. Diana Carneiro diz que, essas mulheres chegam ao consultório com queixas relacionadas à angústia e tristeza, associadas à insônia, ansiedade e pânico. Quando questionadas sobre o porquê desses sentimentos, sempre vem à tona a solidão, com base no desamparo.  De acordo com a psicanalista, a noção de desamparo designa o estado ou condição de alguém que se encontra “sem ajuda”, “desamparado”. Refere-se a um estado objetivo de dependência do recém-nascido para com o adulto, no que diz respeito à satisfação de suas necessidades vitais, segundo Freud.  Em paralelo, embora essas mulheres enfrentem, no decorrer de suas vidas, situações adversas e, por muitas vezes, as superem, ainda assim, algo do vazio e da impotência ressurge mascarado pelo sentimento de solidão, levando o retorno ao nome do pai.  Para a psicanalista, através de um tratamento analítico baseado na escuta e no fortalecimento do ego, é possível que cada mulher compreenda o seu próprio desamparo, acolhendo-o e realizando um processo com autoconhecimento e reconstrução do amor-próprio, baseados em uma importante compreensão de que amar nunca foi e nunca será colocar a vida, as decisões e o próprio caminho nas mãos do outro.   Pois é, talvez a solidão seja, definitivamente, um gatilho que gera várias doenças mentais. Porém, sempre é necessário lembrar que vivemos em sociedade, embora o ser humano, que faz guerras após o mundo paralisar diante de uma pandemia, não seja tão legal assim. Mas a própria pandemia mostrou muito bem o poder da coletividade, pois era preciso se preservar para não passar o vírus adiante. Parece piegas e soa clichê, eu sei, mas viver a solitude, na sua mais intensa complexidade, pode ser muito libertador e pacificador, ou seja, uma ótima experiência para espantar a solidão. Estamos vivendo uma nova revolução feminina com uma explosão de movimentos de mulheres, dentro e fora das redes sociais, que entendem que não dá mais para viver como estávamos vivendo há séculos: sem aceitar os nossos corpos, perdoando traições dos parceiros, escondendo abusos, normalizando violências, desempenhando as mesmas funções, mas ganhando menos.  Acredito que, com essa mudança comportamental, e com a criação de uma nova consciência, a mulher segue mais atenta aos pequenos sinais de comportamentos inadequados e não aceitáveis. Aos poucos, espero eu, possamos reestruturar a sociedade, de forma que viver e se relacionar não seja mais tão difícil. E que a gente não precise mais de nenhum remedinho para ser feliz.  Agora, se

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