No embalo do Oscar: Quais as expectativas para o cinema pernambucano? - Revista Algomais - a revista de Pernambuco
No embalo do Oscar: Quais as expectativas para o cinema pernambucano?

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O Sucesso de Ainda estou aqui traz a perspectiva de aumento de público para o cinema brasileiro e local. O setor audiovisual local abriu mercado para profissionais, mas precisa de mais investimentos públicos e despertar a iniciativa privada para financiar as produções.

*Por Rafael Dantas

O País está vibrando pelo primeiro Oscar do Brasil com Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles, e diante de toda a visibilidade que a história de Eunice Paiva ganhou. Em meio às expectativas de Hollywood, outro longa-metragem, O Último Azul, com a direção do pernambucano Gabriel Mascaro, venceu também o Urso de Prata do Festival de Berlim. Com salas de cinema lotadas e um orgulho do cinema nacional tomando os brasileiros, as expectativas para o setor audiovisual nacional e do Estado, que é uma das referências na sétima arte, são de atrair mais investimentos e público.

Ainda Estou aqui
Ainda estou aqui foi o primeiro filme brasileiro vencedor do Oscar

O furacão de sucesso de Ainda Estou Aqui, que já levou 5,7 milhões de pessoas para as telonas, aumentou o percentual de salas dedicadas ao cinema nacional. O longa, estrelado por Fernanda Torres, já representa 30,2% das vendas gerais da Ingresso.com, que é a maior tiqueteira do País. O setor cinematográfico nacional comemorou 3.509 salas de cinema em funcionamento em 2024, quebrando o recorde pré-pandemia de 2019. Pernambuco registrou 118 salas, que é o mesmo número do último ano antes da pandemia. 

Evolução do número de salas de cinema em funcionamento em Pernambuco

grafico Salas cinema
Em 2024 de 3.509 salas de cinema em funcionamento no País, quebrando o recorde pré-pandemia de 2019, Pernambuco registrou 118 salas, mesmo número do último ano antes da pandemia. Fonte: Ancine

Neste momento de valorização do público com as produções nacionais e do impulso de voltar às salas de cinema, após anos de perda de cinéfilos para os streamings, há um otimismo, mesmo que contido, com o futuro do setor audiovisual. “Um Oscar não garante nada mas, certamente, é um fator que dá aval para que nosso cinema tenha capacidade de alcance de público e de competitividade, em um nível industrial internacional”, considera Nina Velasco, docente do curso de Cinema da Universidade Federal de Pernambuco.

A pesquisadora ressalta que as produções nacionais e pernambucanas têm uma história de receber premiações em festivais de qualidade cinematográfica, especialmente festivais de arte. Festivais de Cannes (França), de Veneza (Itália) e de Berlim (Alemanha) sempre ofereceram espaços privilegiados ao cinema brasileiro. O reconhecimento da Academy Awards com o Melhor Filme Internacional traz um outro tipo de reconhecimento.

“Concorrer e conquistar o Oscar nos leva a outro patamar de disputa e de visibilidade para o mundo. Se já havia esse reconhecimento internacional de qualidade, talvez não tivesse essa competitividade de público internacional. Ainda Estou Aqui é um fenômeno que dependeu também do público nacional para estar nesse lugar de disputa internacional”, avalia Nina Velasco.

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"Concorrer e conquistar o Oscar nos leva a outro patamar de disputa e de visibilidade para o mundo. Se já havia o reconhecimento internacional de qualidade, talvez não tivesse essa competitividade de público internacional". Nina Velasco

UM MERCADO QUE PREMIA E EMPREGA MUITA GENTE

Kleber Mendonça Filho, Gabriel Mascaro, Guel Arraes, Cláudio Assis, Lirio Ferreira, Marcelo Gomes… são muitos os cineastas pernambucanos com premiações nacionais e internacionais nas suas estantes. Com filmes que levaram as histórias e paisagens de Pernambuco para o mundo. Em paralelo, essas produções geram empregos e renda para muita gente.

Se são os atores que estão nas telas e são reconhecidos pelo público, a mágica da sétima arte se faz com o trabalho de diretores, produtores, roteiristas, editores/montadores, figurinistas, cenógrafos, entre tantas outras posições. De acordo com dados do IBGE de 2021, ainda em plena pandemia, Pernambuco tinha registradas 262 empresas ou organizações que atuavam no segmento das atividades cinematográficas, que engloba ainda produção de vídeos e de programas de televisão, gravação de som e edição de música. No País, o Anuário Estatístico do Audiovisual Brasileiro de 2023 (o último publicado) indica que o setor gerou 86.227 empregos formais em 2022.

 Isadora Gibson é uma profissional multifacetada que viveu as experiências de estar na frente e por trás das câmeras, atuando tanto como atriz quanto na direção de arte. Arquiteta de formação, seu envolvimento com o cinema começou de forma espontânea, influenciado por amigos da área. Dentre suas experiências mais marcantes, Isadora destacou sua atuação no filme O Som ao Redor e na série Lama dos Dias, da Globoplay. No campo da direção de arte, atuou como assistente de produção de arte e objetos em O Último Azul, o filme premiado de Gabriel Mascaro. 

Além das produções que vão para as telonas, ela afirma que os profissionais locais estão entrando também no mercado dos streamings, onde ela já teve experiências na direção de arte. "Onde mais trabalho são em produções selecionadas em editais públicos, mas já trabalhei em streaming para Cangaço Novo, que foi em Campina Grande. Há várias produções em São Paulo e no Rio de Janeiro, isso deu uma fomentada no nosso mercado”. 

Ela ressalta que, apesar da profissionalização do setor, os desafios persistem, sobretudo com a carga tributária elevada para os profissionais autônomos. Contudo, mantém o otimismo em relação ao futuro, torcendo por mais investimentos e valorização do cinema nordestino. “Pernambuco é um lugar rico culturalmente como um todo, na área musical, na dança, no teatro. O cinema pernambucano é forte porque junta a grande base de capital cultural, com certa precariedade que torna tudo mais criativo. Fazemos na raça, mas está mudando. Com a profissionalização e com os recursos. Com o Oscar, esperamos melhorar os investimentos para o setor”, almeja Isadora.

Isadora Gibson cinema

"O cinema pernambucano é forte porque junta a grande base de capital cultural com certa precariedade que torna tudo mais criativo. Fazemos na raça, mas está mudando. Com a profissionalização e com os recursos. Com o Oscar, esperamos ter mais investimentos". Isadora Gibson

Outra que atua na direção de arte é Sephora Silva. Também arquiteta, ela ingressou no audiovisual após ser convidada para trabalhar como assistente em um projeto de um amigo que estava realizando seu primeiro filme. Essa experiência inicial despertou sua paixão pelo cinema e a levou a buscar capacitação técnica, incluindo um curso de formação no México. Ao longo de sua trajetória, ela já assinou trabalhos em longas-metragens e curtas, além de atuar na publicidade e no teatro, refletindo versatilidade.

Mesmo atuando principalmente em direção e arte, ela já dirigiu os curtas A Felicidade Não É Deste Mundo e Sihem (que integra o projeto Olhares Sobre Lilith) e também já atuou como roteirista. Sobre o mercado de trabalho local, Sephora avalia que nos últimos anos, houve uma valorização das produções regionais, com o apoio do FSA (Fundo Setorial do Audiovisual) que descentralizou recursos. No entanto, a pandemia trouxe um impacto significativo, paralisando produções e dificultando o acesso a orçamentos, o que levou a uma difícil reestruturação que ainda está em andamento no setor.

Após a valorização dos profissionais locais, que passaram a ocupar vários departamentos da produção cinematográfica, neste momento pós-pandêmico, o Estado voltou a receber técnicos de outros Estados para os projetos desenvolvidos em Pernambuco. Ela considera que essa conexão é importante mas que o mercado local ainda é muito restrito.

“Chegamos a um momento em que trabalhamos com praticamente todas as pessoas do Recife, cerca de 90%. No período pós-pandemia, além de lidarmos com orçamentos bastante defasados, de projetos aprovados até em 2018, notamos um grande fluxo de profissionais de fora atuando aqui, enquanto a demanda local ainda não é tão expressiva. As trocas de experiências são valiosas, isso é incrível, mas o volume de projetos disponíveis não é suficiente para absorver tantos profissionais”, advertiu Sephora, ressaltando a necessidade de ampliar investimentos e oportunidades no setor.

Sephora Silva cinema

"No pós-pandemia, além de lidarmos com orçamentos bastante defasados, de projetos aprovados até em 2018, notamos um grande fluxo de profissionais de fora atuando aqui, enquanto a demanda local ainda não é tão expressiva." Sephora Silva

CRESCIMENTO DA FORMAÇÃO LOCAL

Uma pesquisa nacional realizada pela Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro), em 2023, revelou que para 72,3% das empresas do audiovisual, encontrar mão de obra qualificada é um desafio no País. Pernambuco tem alguns anos de uma trajetória de fortalecimento da formação de profissionais para o setor, com cursos na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e na Aeso (Centro Universitário AESO-Barros Melo). Em breve, o IFPE (Instituto Federal de Pernambuco) deverá também abrir turmas para capacitação audiovisual na sua nova unidade no Recife.

A professora Nina Velasco, que chegou à capital pernambucana em 2006 para atuar no ensino de cinema, lembra que, naquela época, ainda não havia uma formação acadêmica estruturada para profissionais do audiovisual. “Aqui sempre foi um polo produtor de talentos mas sem formação superior específica. Vi esse cenário mudar com a abertura das primeiras turmas, primeiro em especializações e, depois, na graduação em cinema que se consolidou entre 2008 e 2009”, recorda-se. Desde então, a oferta de cursos se expandiu, abrangendo não apenas a formação de diretores mas, também, a capacitação de técnicos em áreas como fotografia e som, reduzindo a necessidade de contratar profissionais de fora do Estado.

Com a implementação de políticas como o Reuni (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) e o Sisu (Sistema de Seleção Unificada), o perfil dos estudantes também mudou significativamente. “Percebemos mais alunos vindos do interior e de outras regiões. Muitos são netos de famílias que migraram para o Sudeste e agora retornam ao Nordeste para cursar o ensino superior”, explica Nina. Esse movimento ajudou a fortalecer a produção local, trazendo novas perspectivas e narrativas para o cinema nordestino. Além disso, a ampliação do ensino superior na área permitiu que um número crescente de jovens diretores e técnicos passasse a integrar o mercado, impulsionando uma nova geração de cineastas com diferentes origens e experiências.

Um dos jovens egressos do curso de cinema que já experimentou ver seus projetos circularem em festivais é Thor Neukranz. Ele decidiu fazer cinema em 2014 mas, antes mesmo de entrar na universidade, percorreu formações gratuitas e aprendeu com a rede de contatos que formou no setor. Foi com um documentário doméstico, feito com imagens que estavam com a família, que ele concluiu a graduação de cinema e ocupou outros espaços.

“Fiz um documentário sobre a minha avó com imagens de arquivo e, durante a pandemia, eu a filmei com o meu celular, sem equipe nem acessórios como tripé ou microfone. Não é o ideal, mas funcionou. Elos da Matriarca (2021) foi o meu TCC no curso de Cinema & Audiovisual na UFPE e circulou em diversos países”, conta o cineasta. “Após as exibições conversei com pessoas de outros países, o que me tocou, como o ponto de vista de culturas diferentes, e me fez ver outras camadas e detalhes que nunca havia pensado sobre meu trabalho, minha vó e até o meu país. A experiência também deixou claro que a nossa arte, mesmo a de baixo orçamento, quando bem feita, é bem-vinda e valorizada pelo mundo”.

Thor

"Fiz um documentário sobre minha avó com imagens de arquivo e, na pandemia, eu a filmei com o meu celular, sem equipe nem acessórios como tripé ou microfone. Não é o ideal, mas funcionou. Elos da Matriarca foi o meu TCC e circulou em diversos países". Thor Neukranz

O filme já circulou em festivais no exterior, como no Festival Brésil en Mouvements (em Paris), o First Nations Film and Video Festival (de Chicago) e o Squish Movie Camp (em Roterdã), que contou com a participação do cineasta. Apesar de uma trajetória breve, ela já foi marcada pelos prêmios de melhor montagem na III JED - Jornada de Estudos do Documentário e da menção honrosa do MOV Festival, ambos no Recife, e da menção honrosa no Student World Impact Film Festival, de Nova Jersey, nos Estados Unidos.

A evolução do setor em Pernambuco também se reflete na visibilidade conquistada por cineastas nordestinos no cenário nacional e internacional. “Estamos vivendo um momento de renovação, com uma geração consolidada e um novo grupo batalhando para viabilizar seus primeiros longas”, observa Nina. No entanto, ela ressalta que, apesar do talento e da formação, o financiamento segue sendo um dos principais desafios. “Cinema é uma arte cara, e muitos jovens cineastas dependem de editais regionais e políticas afirmativas para viabilizar seus projetos. Ainda é fundamental garantir investimentos para que esses talentos possam ultrapassar a barreira universitária e se estabelecer no mercado”, defende a professora da UFPE.

UM ESTADO DE FESTIVAIS E DE UM PÚBLICO AMANTE DO CINEMA

cinema sao luiz
Cinema São Luiz

O cenário de exibição cinematográfica em Pernambuco tem passado por transformações relevantes ao longo dos anos, especialmente com a ampliação das salas de cinema mantidas por instituições públicas. A Fundação Joaquim Nabuco, por exemplo, começou sua trajetória em 1998 com uma única sala no Derby, no Recife. Desde então, novos espaços foram abertos, como a unidade de Casa Forte, em 2015, e, mais recentemente, a sala localizada no Porto Digital. Ainda assim, a oferta de cinemas de rua permanece limitada na capital e, sobretudo, no interior do Estado.

Cinema da Fundacao
Cinema da Fundação

Apesar da presença de espaços tradicionais como o Cine São Luiz e o Cine Teatro do Parque, que são patrimônios históricos da cidade, ambos enfrentam desafios. "O Cine Teatro do Parque está com a programação interrompida, e o São Luiz está funcionando em um modo soft. Mas eu quero acreditar (e torço para) que isso seja temporário", anseia Luiz Joaquim, coordenador do Cinema da Fundação. No interior do Estado, há esforços para manter cinemas de rua em funcionamento, como em Afogados da Ingazeira, mas a realidade ainda é de escassez. "A quantidade de salas é pequena, e essa não é uma realidade exclusiva de Pernambuco, é algo nacional", lamenta.

Luiz Joaquim Fundaj

"O Cine Teatro do Parque está com a programação interrompida, e o São Luiz está funcionando em um modo soft. Torço para que isso seja temporário. A quantidade de salas é pequena, e essa não é uma realidade exclusiva de Pernambuco, é algo nacional." Luiz Joaquim

Já no campo dos festivais de cinema, Pernambuco se destaca como um dos Estados com maior número de eventos do tipo, viabilizados, em grande parte, por políticas públicas de incentivo. "Isso é excelente, porque a gente descobre cada vez mais talentos", ressalta Joaquim. Enquanto na capital, os eventos se concentram mais nos espaços da Fundaj, no interior, há festivais de destaque em Triunfo, em Belo Jardim, em Afogados da Ingazeira e, também, em municípios da Zona da Mata. Uma agenda cultural que desempenha um papel importante na descentralização do acesso ao cinema.

Além de eventos como a Janela Internacional de Cinema do Recife e o Festival Cine PE, a capital pernambucana tem um espaço de destaque também para o cinema de animação, com o Animage, que está completando 15 anos. “Pernambuco é um Estado privilegiado em relação a festivais de cinema. Poucos locais têm a mesma quantidade de festivais e todos com abordagens distintas. O Animage é um deles, posicionado hoje como o maior e mais importante festival de animação do País. Acredito que isso decorre, em parte, pela existência de editais específicos para o audiovisual e o bom número de salas públicas e bem equipadas disponíveis. Isso não é tudo, mas contribui, mesmo havendo necessidade de buscarmos outras fontes de patrocínio para que o festival aconteça”, afirma o diretor Antonio Gutierrez.

Antonio Gutie Gutierrez Victor Juca

"O Animage, com suas atividades formativas e por se apresentar como um espaço de networking e plataforma de exibição da produção de Pernambuco, juntamente com o que existe de mais atual e relevante na animação mundial, atua como um estímulo aos realizadores locais." Antônio Gutierrez

Ele conta que desde o surgimento do Animage, há um incremento na produção de cinema de animação em Pernambuco. Na última edição do festival, por exemplo, o grande prêmio da Mostra Competitiva de Curtas foi para o filme pernambucano A Menina e o Pote, de Valentina Homem e Tati Bond. A inclusão na programação de uma mostra especial de curtas pernambucanos, seguido de um bate-papo com os realizadores, é outro indicativo desse crescimento local. “Acredito também que o Animage, com suas atividades formativas e por se apresentar como um espaço de networking e plataforma de exibição da produção de Pernambuco, juntamente com o que existe de mais atual e relevante na animação mundial, atua como um estímulo aos realizadores locais”, avalia.

Além dos festivais, o Estado também tem um movimento cineclubista que resiste como alternativa para a difusão do cinema no Estado. Presente desde a década de 1940, esse movimento já formou gerações de realizadores nesses espaços. Thor, que é o idealizador do projeto Encontros do Cinema Pernambucano, faz parte dessa tradição. "Comecei no cineclube THCine, em 2014, trabalhando na produção e curadoria. Os filmes assistidos e os debates com pesquisadores foram fundamentais para a minha formação", conta. 

Com essa experiência e o desejo de criar um espaço voltado para curtas independentes e pernambucanos, surgiu a parceria com o Bar Super 8, que já sediou mais de 135 sessões desde janeiro de 2024, recebendo cineastas de diferentes trajetórias, desde nomes consagrados como Gabriel Mascaro e Cláudio Assis até realizadores das periferias, quilombos e comunidades indígenas.

DESAFIO DO FINANCIAMENTO E A DEPENDÊNCIA DOS EDITAIS PÚBLICOS

Alexandre Mapa estudou no Curso de Rádio, TV e Internet na UFPE, no mesmo departamento que hoje dispõe do curso de cinema. Apesar dos primeiros passos no Recife, ele seguiu para São Paulo onde trafegou pela produção de videoaulas, peças para o marketing digital e chegou ao seu objetivo: a produção para o streaming e para o cinema. Nos últimos anos, ele trabalhou como assistente de edição em produções como a série Senna, da Netflix, em Arcanjo Renegado, da Globoplay, no documentário Apocalipse nos Trópicos, dirigido por Petra Costa (exibido em festivais internacionais, como o de Veneza), e no filme Oeste Outra Vez (que conquistou o prêmio de melhor filme no Festival de Gramado), de Erico Rassi, que está circulando em outros festivais. Há quatro anos está exclusivo nesses trabalhos como montador audiovisual.

Deixar o circuito pernambucano no começo da carreira para seguir para São Paulo abriu portas para um mercado que é escasso em Pernambuco. Enquanto muito da produção local é mantida via verbas públicas na maior cidade da América Latina, é a iniciativa privada que movimenta o setor. “É incrível como é grande a quantidade das pessoas que trabalha com cinema e com audiovisual em Pernambuco a partir de recursos públicos.  Em todos os estados deveria ser assim. Quando Bolsonaro extinguiu o Ministério da Cultura foi um baque para todo mundo, deixou o setor muito frágil e é uma área em que a iniciativa privada não tinha uma representatividade sólida”, afirmou Alexandre Mapa.

Alexandre Mapa
Formado em Pernambuco, Alexandre Mapa seguiu para o mercado de São Paulo, onde foi assistente de edição em produções premiadas, como Oeste Outra vez, e streamings, como Senna. Ele afirma que a produção local deveria ter mais recursos públicos e abrir oportunidades de financiamento no setor privado.

Em São Paulo, praticamente 100% dos trabalhos que ele executou nos últimos anos foram de produções do setor privado. No currículo estão trabalhos para a Netflix, Disney e Globoplay, algumas das maiores empresas audiovisuais do mundo, com seus pés também na capital econômica do País. Apesar do mercado mais sólido, Alexandre considera que o mais saudável é um equilíbrio. Com oportunidades da iniciativa privada mas, também, com fortes políticas de fomento públicos.  “Deveria haver muito mais investimento público mas diminuir, também, a dependência dos editais em Pernambuco, que é o principal polo cinematográfico descentralizado do País atualmente”.

As políticas públicas de incentivo ao audiovisual no Brasil contam com um arcabouço legislativo sólido, na análise da diretora e ex-codeputada Carolina Vergolino. No entanto, enfrentam desafios que impactam diretamente a produção e distribuição das obras, tanto no Estado, como no panorama nacional. 

No âmbito federal, o FSA ( Fundo Setorial do Audiovisual) é um dos principais instrumentos de financiamento, porém ainda há uma grande concentração de recursos em grandes produtoras. Além disso, a falta de incentivo nos governos anteriores interrompeu linhas de investimento fundamentais. “Toda essa paralisação e ainda o antigo formato de desclassificação automática fez com que houvesse uma demanda reprimida, e o último edital do FSA de produção de cinema teve 1.514 projetos inscritos, que demandariam R$ 4 bilhões, enquanto a chamada só conta com R$ 160 milhões”, destaca Carol. Para ela, é essencial que o Governo Federal retome a agenda de editais e amplie o volume de recursos destinados ao setor.

Em Pernambuco, o Funcultura Audiovisual e a Lei do Audiovisual são instrumentos importantes para o fomento da produção local, mas o montante investido ainda é insuficiente diante da relevância do cinema pernambucano no cenário nacional. “Caso o Governo do Estado investisse mais, Pernambuco, que é celeiro de obras e profissionais, poderia ampliar a influência cultural no País e no mundo”, avalia a diretora. 

Carol Vergolino

"A principal necessidade é de investimentos públicos e também de empresas privadas para que se possa produzir e principalmente distribuir as obras brasileiras. Também a regulação do streaming se faz urgente para o setor." Carol Vergolino

Uma das maiores reivindicações do setor audiovisual é a ampliação dos investimentos, tanto por parte do poder público quanto da iniciativa privada, garantindo não apenas a produção mas, também, a circulação dos filmes nacionais. “A principal necessidade é de investimento público e também de empresas privadas para que se possa produzir e principalmente distribuir as obras brasileiras. Também a regulação do streaming se faz urgente para o setor”, ressalta Carol. A medida está em debate no Congresso mas ainda não avançou.

Com um público cada vez mais interessado nas narrativas nacionais e tendo os olhos do mundo para o Brasil após o Oscar, o audiovisual pernambucano se encontra em um momento de oportunidade para consolidar sua posição. Enquanto as políticas públicas não elevam seus investimentos e a iniciativa privada não assume maior protagonismo local, o Estado segue desafiando a realidade com produções muito esperadas, com o lançamento de novos talentos e a realização de festivais de alto relevo. Uma película quase que de superação que aguarda novidades para construir as próximas cenas.

*Rafael Dantas é repórter da Revista Algomais e assina as colunas Pernambuco Antigamente e Gente & Negócios (rafael@algomais.com | rafaeldantas.jornalista@gmail.com)

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