"Com a duplicação da refinaria e a Transnordestina sairemos de uma movimentação de 24 milhões t/ano para 50 milhões". - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

"Com a duplicação da refinaria e a Transnordestina sairemos de uma movimentação de 24 milhões t/ano para 50 milhões".

Revista algomais

Inovação é uma característica do Complexo Portuário e Industrial de Suape desde quando foi concebido, ao promover uma integração entre porto e indústria e atrair para Pernambuco projetos estruturadores. Ao completar 45 anos de atividade, Suape consolida sua importância na economia local. A previsão é que neste ano movimente 24 milhões de toneladas de carga, mantendo o patamar de 2022, e exiba um faturamento de R$ 407,3 milhões, o que representa um crescimento de 13,43% comparado aos R$ 359 milhões do ano passado. O presidente Marcio Guiot afirma, nesta entrevista a Cláudia Santos, que a inovação continua a ser um norteador, como nas ações de sustentabilidade. Um dos projetos ainda em concepção prevê uma parceria com a Unesco e as empresas instaladas em Suape, com a possibilidade de elas contribuírem no financiamento da administração do complexo.

Guiot está otimista com o salto que o porto dará com a Transnordestina e a duplicação da produção da Refinaria Abreu e Lima. As perspectivas do hidrogênio verde também são motivo de otimismo, embora estados, como o Ceará, tenham tomado a dianteira com projetos em andamento do chamado combustível do futuro. Marcio Guiot afirma que a estratégia de Suape não é a exportação do H2V, como visam os estados vizinhos, mas que o hidrogênio verde seja um atrativo para empreendimentos se instalarem no complexo. “Estamos mais empenhados em atrair empresas que venham beber da matriz energética limpa e que gerem valor aqui”.

Agenda TGI

Qual o balanço que o senhor faz desses 45 anos de Suape?

O conceito de Suape nasceu há mais de 50 anos e seus idealizadores tiveram a ideia visionária de construir um porto em uma área que fosse distante do grande centro, mas não muito. Foi concebido de forma que pudesse integrar desenvolvimento com sustentabilidade. Temos um cinturão verde que dificulta a ocupação, bem diferente do que vemos na maioria dos portos brasileiros, principalmente os centenários, nos quais as cidades cresceram no seu entorno, sem o cuidado devido.

Em relação a números, conquistamos hoje a liderança na movimentação de granel líquido, consolidando Suape no cenário nacional. No cenário regional, somos líderes no Nordeste na movimentação de contêineres e estamos nos consolidando como hub de veículos. Devemos chegar a 100 mil veículos movimentados este ano, quase dobrando o que movimentamos ano passado. Somos considerados no cenário nacional portuário um equipamento que se destaca na gestão ambiental. Falar de sustentabilidade no cenário portuário é falar de Suape.

Somos referência, tudo que é feito para gerir os 59% de área de preservação no complexo é muito diferenciado. Somos conhecidos também como um porto inovador, temos projetos que são reconhecidos no cenário nacional portuário.

Na área ambiental, quais as ações realizadas?

São várias frentes. Temos iniciativas que se destacaram, como as agendas azul, verde e amarela. Na azul, que é relacionada ao mar, temos o selo Amigo do Oceano. É o terceiro ano que concedemos o selo aos terminais arrendatários que cumprem com a legislação rigorosamente para evitar degradar o oceano.

Na agenda verde trouxemos o conceito de SAF (Sistema Agroflorestal) que é novo, uma forma de integrar as pessoas que moram no território para que possam produzir uma agricultura familiar de forma sustentável. Em relação à agenda amarela, no passado, fizemos todo o levantamento de emissões de CO2 do complexo. Este ano terminamos o inventário de captura. Agora, estamos debruçados para ver como conseguimos materializar isso num produto que possa ser revertido em recursos para o complexo e ser reinjetado na gestão do território, chegando até o nível de crédito de carbono, que é algo que ainda precisa ser normatizado no Brasil.

Temos o potencial de neutralizar as empresas que estão no território, só precisamos encontrar o melhor caminho para isso. Estamos terminando, no final deste mês, um estudo de materialidade, não apenas de Suape como prioridade portuária, mas de todo o complexo e em cima desse estudo vamos priorizar quais os ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável) que vão ser mais aderentes à nossa realidade e traçar projetos. Do ponto de vista social, temos o desafio enorme de lidar com as mais de 17 mil pessoas que vivem no território e que até ano passado não eram previstas no Plano Diretor.

Estamos estruturando uma iniciativa junto à Unesco e vamos trazer as empresas para trabalhar essas pautas conosco porque hoje temos Suape sendo um catalisador de demandas e de obrigações que, muitas vezes, não são nossas, são dos municípios. Mas temos as grandes empresas no complexo, cada uma com as suas estratégias de ESG e o que queremos é fazer de uma forma que seja coordenada, centralizada. Acreditamos que trazendo essas empresas mais próximas de Suape, para a gestão do território, além de trazer mais recursos, traremos mais ideias, novas formas de fazer essa gestão.

Estamos tentando formatar de maneira que a Unesco se faça presente. Isso dá uma credibilidade para os órgãos reguladores, e para o setor privado também ter essa relação com o público. No passado, Suape não foi concebido prevendo uma taxa de condomínio. As indústrias que não estão na zona portuária se estabelecem aqui, adquirem a área e não propiciam uma receita recorrente que ajude Suape nessa administração do grande condomínio que somos. Queremos fazer isso, não necessariamente batendo na porta e cobrando uma taxa, mas com uma proposta de geração de valor e isso pode ter uma eficácia maior na gestão do território. E com todo o movimento ESG entrando no valuation das empresas, acho que é bem mais fácil de ser recebido hoje do que alguns anos atrás.

Vamos agora falar um pouco do futuro. Qual será o impacto da construção do segundo trem na refinaria?

A movimentação de Suape nos últimos anos tem variado entre 23 a 25 milhões de toneladas. Temos a capacidade para movimentar mais. No nosso planejamento estratégico vimos que temos dois movimentos importantes para acontecer que vão nos colocar num outro patamar. Um deles é a duplicação da refinaria, que antes de ter o trem 2, terá duas fases que vão acontecer agora em 2024 e 2025, quando vai sair de 90 mil para 130 mil barris por dia. Existe a possibilidade de mais do que dobrar a movimentação portuária com a refinaria. Eles têm como principal produto o diesel para atender o Nordeste e o que produzem hoje já atende à demanda.

Com a duplicação da refinaria, vamos ter um diesel excedente para poder movimentar para as outras regiões do País e, fatalmente, uma boa parte disso vai voltar para demandar a estrutura portuária. Hoje isso não acontece, daqui já é distribuído via terrestre. Portanto, a gente espera sair de um patamar de quase 5,5 a 6 milhões de toneladas de movimentação só com a refinaria, para de 11 a 12 milhões facilmente, ainda mais se a gente for cogitar esse retorno.

Outra grande obra é a Transnordestina, questão que está sendo liderada pela governadora e pelo secretário de Desenvolvimento, que são as pessoas mais capacitadas para demandar isso porque não é uma obra para Suape, mas para o Estado. Com a duplicação da refinaria mais o minério, que é o carro-chefe da ferrovia, sairemos de uma movimentação de 24 toneladas/ano para quase 50 milhões de toneladas/ano. Trazendo a ferrovia, tenho convicção que teremos um terminal especializado para exportação de gesso. Toda a região do Araripe que tem um potencial absurdo, que hoje é um movimento em torno de 2 milhões de toneladas/ano, a tendência é que aumente muito mais. A Copergás está empenhada em levar uma solução de energia. A principal prioridade deles hoje é sair da lenha para uma forma mais sustentável. Passando a ferrovia na porta deles, vamos botar a nossa gipsita num outro patamar de movimentação.

Uma outra demanda que vai entrar no radar vai ser a do agro de toda a região do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). Hoje nossa movimentação de agro é muito tímida, não chega a um milhão de toneladas por ano e com a ferrovia conectando com a Norte/Sul, vai colocar Suape num outro patamar. Quando olhamos para a frente, a perspectiva é muito boa só com esses dois investimentos. Além disso, o terminal de contêiner [da APM Terminals, subsidiária da Maersk que será construído] arrasta uma série de outras empresas e outras atividades.

Então, com certeza, teremos demanda. Temos a pauta de transição energética, hidrogênio de baixo carbono, temos todo o potencial para atender a demanda do ponto de vista de infraestrutura portuária. Quando olhamos para o Plano Diretor, saímos dos 2 km de cais que temos hoje e podemos chegar a 10 km. São várias frentes de possibilidades que são muito animadoras para os próximos anos.

Em relação à Transnordestina, qual é a sua expectativa de que esse projeto vai sair do papel?

Nossa convicção é que vai acontecer. Mas a melhor fonte para falar de Transnordestina, hoje, para eu não cometer um deslize, seria o secretário de Desenvolvimento e o próprio governo. Do nosso lado, concluiremos, até ao final do ano, o projeto executivo.

O que seria esse projeto executivo?

Há um trecho de 8,5 km que vai ser responsabilidade de Suape construir. O que está previsto hoje, é que quando a ferrovia chegar na cidade do Cabo, vamos puxar esse ramal de 8,5 km, que vai da fronteira do território até o terminal de minério.

O projeto para uma margem já está pronto. Para o ano que vem, queremos fazer o projeto da ferrovia para outra margem para garantir que o ferro chegue tanto na margem esquerda de Suape como na direita. Isso mostra a nossa convicção de que a ferrovia, sim, tem que acontecer e vai acontecer. Pernambuco tem uma condição diferenciada, tem um presidente que é pernambucano, o ministro dos portos é pernambucano. Tenho a convicção de que as coisas vão sair pela liderança da governadora Raquel.

O senhor mencionou o hidrogênio verde. Como estão as articulações para a sua produção em Suape? O Ceará e a Bahia saíram na frente com projetos em implantação. Estamos ficando para trás nesse combustível do futuro?

Acho que depende do que usarmos como indicador, porque precisamos vencer a questão regulatória e para que o hidrogênio seja viável, uma outra demanda importante é com relação aos offtakers, os compradores. Ainda existe hoje um grau de incerteza considerável do ponto de vista de armazenamento e transporte de hidrogênio verde. Então, pode-se ter uma grande planta em construção, mas tem offtaker mesmo, a construção já começou? Não estou colocando em dúvida o que está sendo feito nos outros estados, acho que todo mundo tem a sua agenda.

Temos tratado de hidrogênio verde com tranquilidade. Quando tivermos o projeto maduro, ele vai ser conectado à nossa estrutura portuária porque não temos problema de espaço, de área de crescimento. Do ponto de vista de zona industrial, esse é um outro questionamento: a produção de hidrogênio tem que estar próxima ao porto? Depende. Se o foco for só exportação é meio que lógico, mas e se o hidrogênio verde for conduzido para trazer a indústria, para gerar valor no nosso País?

Espero que aproveitemos essa oportunidade de energia e deixemos de ser o eterno país do futuro porque temos uma grande chance. Estamos mais empenhados em atrair empresas que venham beber da matriz energética limpa que nós já temos hoje e que gerem valor aqui. Ao invés de só focarmos na exportação do minério, vamos viabilizar siderúrgicas aqui para fazer o aço verde.

Podemos não estar muito na mídia, mas estamos bem atentos, temos participado da maioria dos fóruns, temos falado com bastante gente e estamos hoje numa iniciativa mais concreta, que está mais em voga hoje, que é a parte da inovação aberta, justamente para responder a esses questionamentos, que é a parceria do Techub Hidrogênio Verde junto com o Senai. O modelo a gente espera estar operacional já no primeiro semestre do ano que vem e fomentaremos projetos para gerar soluções para as empresas que já estão no complexo, para que tenhamos os offtakers aqui na região. Só assim vamos conseguir viabilização para pensar em exportação.

Temos uma comissão liderada pela Secretaria de Desenvolvimento junto com as secretarias de Meio Ambiente e Tecnologia e Inovação, temos feito reuniões na Fiepe e o assunto está sendo tratado. Eu não entendo que a gente esteja ficando para trás. Quem sabe, na frente, a gente anuncie alguns empreendimentos, mas vamos deixar o tempo dizer.

O Projeto BR do Mar, que estimula o transporte por cabotagem, foi aprovado mas alguns dispositivos ainda precisam de regulamentação. Como Suape pode se beneficiar desse programa?

Já temos um destaque importantíssimo na cabotagem. Se não estou equivocado, todas as linhas de cabotagem passam em Suape, somos líderes nessa movimentação. Há uma nova empresa que está sendo formada, uma joint venture da Hapag-Lloyd com a Norsul, que é Norcoast que está anunciando escalas em Suape. A movimentação hoje da cabotagem já está muito presente, o que temos que trabalhar é para voltarmos a ter as principais rotas chamando Suape também.

Quais seriam essas principais rotas?

As rotas de cargas em contêiner, que são as que vão principalmente para Europa, Estados Unidos e Ásia. Hoje estamos limitados a uma ou duas escalas e só numa direção. Precisamos ser competitivos para conseguir voltar ao mapa das grandes rotas e concentrar a carga aqui da região. Hoje estamos fazendo o papel inverso, a carga sai daqui, vai para Santos em sua maioria para conectar com as principais rotas e subir. Isso tira a competitividade da exportação e na importação é a mesma coisa. Ou então, parte da carga sai daqui de caminhão, vai para Salvador ou Pecém, a exemplo do que acontece com a fruta do Vale do São Francisco, isso principalmente pela ausência de rotas.

Tal situação tem alguma relação com o preço do terminal de contêiner (Tecon Suape)?

Em parte, sim. Vamos tomar um posicionamento para eles ainda este ano sobre o pedido de reequilíbrio que foi iniciado em 2017. Nós nos debruçamos sobre isso não só pela questão do reequilíbrio (repactuação contratual), mas também para poder amparar a chegada de um novo terminal. Suape merece ter dois terminais de contêiner e estará muito bem servido com dois operadores globais, tanto ICTSI como APM são empresas de ponta e nada melhor que concorrência porque quando não tem concorrência a gente acaba se acomodando.

Com o novo terminal, vamos abrir oportunidades, os terminais vão ter que buscar melhoria em todas as formas. O Tecon que está chegando faz parte de um grupo que tem uma companhia de navegação, e pela configuração do terminal e o tamanho dos navios que vão demandar, temos quase certeza de que eles vão utilizar Suape como um hub. Parte da carga vai ser carga de trânsito que vai descer dos grandes navios e que vai ser conectada para alguns portos no Nordeste ou, eventualmente, Manaus.

Eu não vejo o terminal da APM Terminals vindo só para concorrer com o que a gente movimenta hoje, pelo contrário, eles vão trazer novas rotas, novas cargas e logicamente, o que prestar o melhor serviço, com preço mais competitivo, vai acabar tendo algum tipo de oportunidade.

Em relação aos motivos de não termos hoje as principais rotas, eles são multifatoriais: preço, nível de serviço, a questão da carga é importante, aí conecta com a questão do hidrogênio de trazer indústrias para cá. Porque quanto mais carga nós tivermos sendo produzida aqui, mais potencializamos e fidelizamos as escalas. Isto tudo é um conjunto que não é só o preço. O preço é um problema que está inserido dentro de um contrato de arrendamento que foi conquistado em 2001 e que era uma situação sabida dos arrendatários que eles mesmos propuseram lá atrás para ganhar a licitação.

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