Como a melhora nos indicadores econômicos do Brasil impacta Pernambuco? - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Como a melhora nos indicadores econômicos do Brasil impacta Pernambuco?

Revista algomais

*Por Rafael Dantas

A estimativa do Boletim Focus do Banco Central para o avanço do PIB do País em 2023 estava entre 0,7% e 0,8% no final do ano passado. Seis meses depois, a projeção alcançou o patamar de 2,19%. Mais otimista, o Ministério da Fazenda tem a perspectiva de crescimento entre 2,5% e 3% no ano. Esses não são os únicos números animadores registrados no início do terceiro mandato do Governo Lula. Avanço da Reforma Tributária e do Arcabouço Fiscal no Congresso, o controle da inflação e a baixa do dólar integram a paisagem mais esperançosa para o País. Como o PIB pernambucano tem forte relação com o desempenho nacional, as expectativas também são de melhorias na economia local em 2023.

“O desempenho da economia tem surpreendido. Não só nacionalmente, como internacionalmente, o cenário era de negatividade muito grande. Mas o crescimento do primeiro semestre está nos fazendo revisar todas as expectativas”, avalia o economista e coordenador do curso de administração da Unit-PE, Edgard Leonardo. “A economia tem se mostrado mais resiliente do que pensávamos. A China começou a ter resultados positivos também, o que é muito bom para aumentar a venda de commodities brasileiras. Contamos ainda com uma supersafra e um aumento importante também da produção de petróleo”.

Além das boas notícias vindas do agronegócio e do aquecimento chinês, a valorização da moeda e o controle da inflação estão no equilíbrio de indicadores positivos de 2023. O dólar, que fechou o ano de 2022 cotado em R$ 5,28, chega na segunda semana de julho em R$ 4,82. Mais surpreendente que a baixa do dólar tem sido a taxa de inflação. O País registrou em junho deflação do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de 0,08%. No acumulado dos últimos 12 meses, a inflação brasileira é de 3,16%. A projeção do Boletim Focus para o índice inflacionário do ano é de 4,95%, que ainda está acima do teto da meta, que é de 4,75% (o centro da meta é 3,25%). A projeção da instituição, no entanto, é menor que os 5,26% previstos no final do ano passado para 2023.

No Painel Mensal da Agenda TGI, promovido em parceria com a Revista Algomais, o consultor Francisco Cunha ressaltou o desempenho da balança comercial e também a melhora da avaliação do País nas agências internacionais de risco. “O cenário internacional está mais favorável. Enquanto no ano passado inteiro tivemos um saldo de US$ 61 bilhões, com a contribuição do agronegócio, com praticamente metade das exportações, neste ano a balança comercial já teve um saldo de US$ 45 bilhões. O valor já é 33% superior ao de 2022. A economia vai bem do ponto de vista do comércio exterior”.

O conjunto da melhoria econômica já começa a ser percebido pelas agências de classificação de risco. A S&P Global Ratings alterou a perspectiva da nota de crédito do Brasil de estável para positiva. A classificação positiva não acontecia desde 2019. Mesmo com a melhoria, o Brasil ainda segue na categoria de “especulação” na classificação das três principais agências de rating, ou seja, ainda fora do grau de investimento que obteve durante o segundo mandato de Lula, em 2008, e onde o País permaneceu até 2015, um ano antes do impeachment de Dilma Rousseff.

Após a melhora no cenário econômico, Edgard Leonardo destaca que para conseguir bons resultados no curto prazo, o Governo Federal tem o desafio de estimular o consumo interno. Apesar de ser uma receita semelhante à usada em outros momentos do País, inclusive nas primeiras gestões do Governo Lula, o cenário é um pouco mais desafiador em 2023 por fatores como o endividamento das famílias e a taxa de juros.

“As famílias brasileiras estão endividadas e com linhas de crédito muito altas. O setor varejista está muito sofrido. A dificuldade de financiamento do capital de giro das empresas é um dos pontos cruciais nesse momento. Estamos acostumados a resolver alguns problemas econômicos via estímulo ao consumo interno, mas temos a questão da taxa de juros que é alta”, afirma Edgard Leonardo.

O economista afirma que não está no grupo dos que crucificam o Banco Central pela taxa de juros atual, pois avalia que há pontos de preocupação que a justificaram. Mas ressalva que ela deverá começar a cair nos próximos meses. Dados da última pesquisa Genial/ Quaest apontaram que 100% do mercado financeiro prevê uma redução da Selic neste ano. Para 92% dos entrevistados (gestores, economistas, analistas e tomadores de decisão das maiores casas de investimento) a redução já será anunciada na reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) do mês de agosto.

“A redução da Selic ajudará a melhorar o desempenho dos setores, isso porque um patamar elevado de taxa de juros real restringe o consumo, principalmente de bens duráveis, contrai os investimentos das firmas e inibe o empreendedor. A redução da Selic permitirá que investimentos voltem a ser viáveis, que os financiamentos fiquem mais baratos e que o incremento de mão de obra seja possível. Incentivará todos os setores da economia”, destacou o presidente da Fecomércio-PE, Bernardo Peixoto.

A reação da economia, após uma prova de fogo dos primeiros meses de Fernando Haddad no Ministério da Fazenda, acontece ainda antes do anúncio do novo Programa de Aceleração do Crescimento, que deve ser feito nas próximas semanas. Com foco em infraestrutura nas suas primeiras versões, o programa tem capacidade de dinamizar o setor da construção civil que tem ainda alto potencial de empregabilidade.

“Agora é a hora da microeconomia, aonde o PAC tem um desempenho importantíssimo, porque vai dinamizar a economia pela realização de obras, já que muitas estão paralisadas. Vai começar a girar a roda do emprego. Até então, muita gente deixou de procurar trabalho por desalento. Estamos lutando para que a Transnordestina no seu trecho pernambucano entre no PAC. O que tira a economia do fundo do poço e promove a volta do dinamismo econômico é obra”, afirmou Francisco Cunha.

No arremate do semestre, a aprovação da Reforma Tributária na Câmara dos Deputados, que aguardava há décadas ser votada, foi a grande cartada da agenda macroeconômica. A medida é vista por economistas como Joaquim Levy e Maílson da Nóbrega como o caminho para o País alcançar um novo crescimento econômico significativo. O Arcabouço Fiscal e o projeto de lei que altera o voto no CARF (Conselho de Administração de Recursos Fiscais) são outras duas vitórias da atual gestão em direção ao equilíbrio das contas públicas e, consequentemente, aumento da confiança.

O conjunto de mudanças no cenário nacional tem potencial de melhorar o ambiente de retomada do crescimento do Estado, na avaliação do cientista político Antonio Henrique Lucena. “O conjunto de reformas e os primeiros dados das melhorias econômicas terminam afetando Pernambuco. O grande gol a favor do Governo Lula foi justamente a Reforma Tributária. Está se tentando unificar vários tributos para evitar taxação em cascata. Se vingar, pode ser que essa reforma fique mais ou menos ali no mesmo nível do que seria um Plano Real do Governo Lula. Então estamos vendo que algumas coisas estão caminhando, uma melhoria dos índices, tudo isso pode afetar Pernambuco”.

Ricardo Essinger, presidente da Fiepe, considera que o setor industrial tem bastante a comemorar com esse novo marco tributário. “A Reforma Tributária, recém-aprovada na Câmara dos Deputados, acarretará redução da complexidade e ineficiência do sistema tributário brasileiro, além da pesada carga sobre o setor industrial, que é um dos maiores entraves ao desenvolvimento da indústria no País, contribuindo com a baixa competitividade das empresas nacionais frente às de países com sistemas tributários mais racionais”.

EFEITOS EM PERNAMBUCO E NO RECIFE

Os dados econômicos nacionais possuem poucos recortes regionalizados no curto prazo. Porém, a estimativa dos especialistas é que a economia pernambucana se beneficie dessa melhoria. “Somos um Estado que depende do desempenho nacional. Não tem como Pernambuco estar bem se o Brasil não estiver. Somos parte componente no cenário do País”, afirmou Edgard Leonardo. A inflação do Grande Recife, um dos indicadores regionalizados já publicados, foi medida em 0,28% em junho. No entanto, no acumulado dos 12 últimos meses é de 2,47%, menor que a média nacional registrada no período.

Ele lembra, porém, que tanto Pernambuco como a Bahia sofreram de forma mais acentuada a crise econômica e perderam algumas posições nos últimos anos, dentro desse balanço nacional. “Temos índices de desemprego muito elevados. Somos um Estado com muito potencial, mas junto com a Bahia estamos nos últimos cinco anos numa corrida pelos últimos lugares. É muito importante olharmos para nossas mazelas sociais, senão não vamos conseguir vencê-las e Pernambuco seguirá com muito desemprego, muito desigual e com renda média abaixo do Sul e Sudeste”, avalia o economista.

Apesar de a governadora Raquel Lyra não estar em um dos partidos da base do Governo Lula, as expectativas são de que o Estado consiga voltar a atrair recursos federais, como nos mandatos anteriores do petista no Palácio do Planalto. Está na mira da classe empresarial pernambucana, por exemplo, a conclusão da Transnordestina. Desde a privatização no final dos anos 90, o setor de transporte de carga sobre trilhos entrou em decadência, prejudicando a competitividade da economia pernambucana.

Nesta semana, a governadora Raquel Lyra anunciou que conseguiu aprovar uma operação de crédito junto ao Governo Federal, em contrato com a Caixa Econômica Federal para o Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa) de R$ 1,7 bilhão. Anteriormente, durante a última passagem do presidente pelo Recife, a tucana assinou uma operação de crédito de R$ 900 milhões, junto ao Banco do Brasil, para recuperação das rodovias do Estado.

No Recife, o grande anúncio do primeiro semestre foi a captação de R$ 1,5 bilhão, numa operação com o BID (Banco Interamericano do Desenvolvimento), para investimentos em infraestrutura, no programa Promorar. O aporte será aplicado em obras de saneamento, pavimentação, proteção de encostas, construção de espaços de convivência e de macrodrenagem na bacia do Rio Tejipió. Outros R$ 500 milhões foram aprovados para investir em eficiência fiscal. O prefeito João Campos anunciou no final de junho que a primeira remessa desses recursos, R$ 126 milhões, já chegou à Prefeitura do Recife.

“As obras alavancam o crescimento da oferta de emprego. Com essa operação de crédito que a Prefeitura do Recife conseguiu com o BID para o enfrentamento das condições urbanísticas precárias teremos um grande volume de obras. R$ 1,5 bilhão é muita coisa para uma cidade como o Recife. Isso provavelmente fará girar e ter mais recursos internos. Isso melhora o comércio, o astral e a situação da população mais carente. E cresce a possibilidade de se enfrentar esse período com mais recursos na economia local. Isso é um aspecto positivo”, destacou Francisco Cunha.

Índustria local ainda estagnada, mas otimista

De acordo com o presidente da Fiepe, Ricardo Essinger, o desempenho industrial no Estado ainda está fraco, mas as expectativas são boas com o novo cenário econômico. “A análise dos Indicadores Industriais e a Sondagem Industrial de Pernambuco sugerem uma atividade ainda fraca ao longo do primeiro trimestre de 2023. O Índice de Confiança dos Empresários da Indústria de Pernambuco continua acima dos 50 pontos (54,6 em junho), porém abaixo da média histórica de 55,72. Normalmente, os meses de junho sempre elevam a confiança do empresário pernambucano por causa das festividades juninas”. A produção industrial em Pernambuco subiu 5,6% em maio mas, no acumulado do ano, caiu 2,1% segundo o IBGE.

Ele informou que a atividade produtiva revelada na Sondagem Industrial de maio, ficou em 43,2, bem abaixo dos 50 pontos. Esse resultado está sendo impactado pelo desempenho das empresas de pequeno porte (40,8), que estão menos produtivas no período. Na média do ano (janeiro a maio) do índice do volume de produtividade se encontra em torno de 48,1 pontos percentuais.

Essinger considera que o PAC trará impacto benéfico para o setor industrial. “O tema infraestrutura é convergente com nossa política industrial de Pernambuco. O Novo PAC deve incluir não só as ‘grandes obras’, em sua maioria de infraestrutura logística, como o trecho Salgueiro/Suape da Transnordestina. O País carece, e muito, de infraestrutura social, aí compreendidas as obras de saneamento, hospitais, unidades básicas de saúde, habitação, escolas, resíduos sólidos, iluminação pública, entre outras. Há condições de o País dar um salto com o Novo PAC, respondendo a uma forte pressão de demandas em quase todas as áreas produtivas. Porém, é fundamental que ele venha alicerçado em um conjunto de medidas que lhe deem sustentação”.

COMÉRCIO E SERVIÇOS EM SITUAÇÕES DISTINTAS

A partir dos dados do primeiro quadrimestre do ano, do IBGE, o presidente da Fecomércio-PE, Bernardo Peixoto, avalia uma retração do comércio no início de 2023. “De acordo com o IBGE, de janeiro a abril de 2023, houve um recuo de 3,4% em comparação ao mesmo período do ano anterior. Uma das principais influências para essa queda, especialmente no comércio varejista ampliado, está na relação negativa entre o consumo de bens duráveis, o endividamento e a inadimplência das famílias, juntamente com o aumento dos preços dos automóveis”.

Ele destaca, no entanto, uma recuperação nos serviços, outra força da economia pernambucana. “No setor de serviços há um contraste, com um crescimento de 6,8% entre janeiro e maio de 2023 em comparação ao mesmo período do ano anterior. Após uma leve desaceleração em abril, os dados mais recentes de maio mostram uma reaceleração nesse setor, que é o que mais emprega no País”.

Entre as medidas em desenvolvimento para reaquecer a economia, o presidente da Fecomércio-PE destaca um programa que ainda não teve tanta visibilidade quanto às reformas. “A recente portaria que regulariza o programa Desenrola do Governo Federal promete retirar boa parte da população da inadimplência. Atualmente, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência da CNC, 8 a cada 10 famílias pernambucanas estão endividadas e há cerca de 162 mil pernambucanos inadimplentes. O retorno dessa população impedida de consumir a prazo por causa do nome sujo para o comércio de bens e serviços é um importante incremento no volume de vendas dos setores. É um projeto promissor e é esperado que haja forte aderência popular”.

ENTRE O PALÁCIO DAS PRINCESAS E DO PLANALTO

O cientista político Antonio Henrique Lucena avalia que tanto o presidente Lula como a governadora Raquel Lyra viveram um semestre de ajustes na máquina pública após dois episódios mais críticos dos primeiros dias de gestão. No plano federal, ele destacou o ato golpista de 8 de janeiro, como um fato que “não pode passar impune”. No contexto local, ele considera que a exoneração em massa no início do ano foi uma medida “atabalhoada”, gerando uma certa paralisia. Após os primeiros dias mais problemáticos, a negociação com o Poder Legislativo foi o desafio de ambos.

“Esse primeiro semestre foi de ajustes, pois são governos que iniciaram seu ciclo. O presidente Lula, já no seu terceiro mandato, assume 2023 num cenário político muito diferente do contexto lá atrás. Raquel Lyra, já teve seu mandato de prefeita, mas agora no Governo do Estado o processo é diferente. Lula enfrenta um legislativo mais hostil para questões progressistas. Raquel Lyra tem que, obviamente, negociar com a Alepe devido às características da Assembleia, tanto da esquerda, como da direita. Essa necessidade de negociar, eu acredito que os dois foram aprendendo ao longo do tempo. Os dois têm feito uma tentativa de gestos apartidários no sentido de trazer mais gente para a base”.

A comunicação entre o Governo Federal e Estadual, que não aconteceu nos anos do Governo Bolsonaro, tende a beneficiar Pernambuco. Mesmo em campos políticos opostos, Lula e Raquel têm aparecido em agendas conjuntas e garantido investimentos ao Estado. “Pernambuco ainda é muito dependente de recursos do Governo Federal. O Governador de Pernambuco não pode ficar ‘brigado’ com o Governo Federal porque ele é extremamente importante para o desenvolvimento de uma série de projetos. Raquel Lyra e Lula buscam certo grau de aproximação”.

Alguns resultados práticos desse relacionamento dos poderes, ressaltados pelo cientista político, foi a resolução da gestão do arquipélago de Fernando de Noronha. A visita de Lula à fábrica da Stellantis, ao lado da governadora, foi outro gesto dessa aproximação. “Eu classificaria a relação entre o Governo Lula e o Governo Raquel Lyra como uma equidistância pragmática. Não é aquela coisa de todo mundo se abraçando, dando beijo, ao mesmo tempo não é completamente afastado, mas os dois entendem que são extremamente importantes. Raquel Lyra porque precisa atrair investimento para o Estado, Lula porque precisa manter uma base eleitoral forte no Nordeste.”

Turbulências passadas dos primeiros meses de gestão, Lula e Raquel permanecem com desafios imensos no País e em Pernambuco, que não cabem em quatro anos de governo, nem nos orçamentos disponíveis para o Governo Federal e para o Governo do Estado. O desafio de viabilizar investimentos estratégicos (que dinamizem a economia e melhorem a infraestrutura) e de reduzir o déficit social são dois alvos para os próximos meses e anos de governo.

*Rafael Dantas é repórter da Revista Algomais (rafael@algomais.com | rafaeldantas.jornalista@gmail.com)

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