Em encontro do projeto Pernambuco em Perspectiva, o presidente do BNB mostrou dados do crescimento expressivo da concessão de crédito na gestão do atual Governo Federal, mas ressaltou a necessidade de ampliar as alternativas de investimento, como as PPPs
*Por Rafael Dantas / Fotos: Tom Cabral
Para superar os déficits históricos sociais e de infraestrutura, o Nordeste precisa de muito investimento. Diante da escassez de recursos públicos e dos desafios da transição tecnológica e da descarbonização que o mundo atravessa, o projeto Pernambuco em Perspectiva – Estratégia de Longo Prazo recebeu o presidente do Banco do Nordeste do Brasil, Paulo Câmara, para analisar as fórmulas para resolver essa equação do desenvolvimento do Estado.
O evento, realizado pela Revista Algomais e pela Rede Gestão, com o patrocínio do BNB e do Governo Federal, apresentou o cenário de crescimento do crédito na região e destacou a necessidade do avanço das PPPs (parcerias público-privadas) para tracionar os investimentos. Em paralelo, o ex-governador pontuou ameaças que estão no horizonte do médio prazo, como o fim dos incentivos fiscais encaminhado pela Reforma Tributária.
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EXPANSÃO DO CRÉDITO
Após os desafios impostos pela pandemia e as tensões políticas com o Nordeste durante o Governo Bolsonaro, o Banco do Nordeste apresentou um crescimento expressivo. No biênio 2023-2024, a média de contratações em Pernambuco alcançou R$ 6 bilhões, superando os R$ 3,8 bilhões registrados entre 2019 e 2022. Considerando toda a região, o crescimento no mesmo período foi de 41%.
Para se ter ideia do salto, em 2024, o banco desembolsou R$ 60,6 bilhões. São 23% acima de 2022, último ano antes da troca de gestão. Quando comparado com 2019, o avanço é de 72%. Um recorde de movimentação na história da instituição que atende os nove estados do Nordeste, além do norte de Minas Gerais e do Espírito Santo.
Na contabilização do desempenho nesses dois anos à frente da gestão do BNB, Paulo Câmara ressaltou a participação da instituição em setores estratégicos para a região, como turismo, infraestrutura e agropecuária. Além desse destaque da pauta do crédito, o banco de fomento tem uma forte atuação no microcrédito, que estimula o empreendedorismo entre os micros e pequenos produtores.
“Crédito é uma força motriz muito forte tanto para geração de renda, como para geração de emprego. O BNB participa disso. É um banco muito ligado ao desenvolvimento regional, temos os dois maiores programas de microcrédito do País: o Agroamigo e CrediAmigo. Além disso, administramos o FNE (Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste), que teve valores recordes do ano passado, e somos executores de outros programas governamentais também”, elencou Paulo Câmara.
Apenas no FNE, que é o instrumento financeiro da Política Nacional de Desenvolvimento Regional, o montante total de contratações de operações de crédito em 2024 foi de R$ 44,8 bilhões, representando um aumento de 39% em relação a 2022. No Crediamigo (linha de microcrédito produtivo e orientado) foram contratados R$ 12,1 bilhões, enquanto o Agroamigo (voltado para agricultores familiares) alcançou R$ 8,6 bilhões, com avanços respectivamente de 13% e de 125%.
FOMENTO E SETORES ESTRATÉGICOS
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Do total de créditos de longo prazo no Nordeste, 49,7% são operados pelo Banco do Nordeste. Dentro dos setores industrial e comercial chega a 52,5%. O perfil de quem toma esse tipo de operação inclui principalmente empresas, produtores rurais e empreendedores que buscam financiamento para expansão, modernização e infraestrutura, em busca de prazos estendidos e taxas reduzidas.
Na lista de setores apoiados pelo FNE, há uma percepção de onde estão as oportunidades de desenvolvimento da região. Há programas voltados para a indústria, investimento em energia solar, infraestrutura, turismo, entre outros. Em um período de estímulo à reindustrialização no País, com o programa Nova Indústria Brasil, e de empreendimentos de grande porte para produção de energias renováveis, a da fluidez das políticas de financiamento é fundamental para tirar os projetos do papel.
“O Nordeste é o maior produtor de energia renovável. Hoje a região é exportadora e avançou muito em muitos setores estruturadores importantes, como nos portos e aeroportos” , exemplificou Paulo Câmara, mencionando ainda setores como o saneamento, as rodovias e a ferrovia.
Especialmente em infraestrutura, a região acompanha a construção da Transnordestina, um empreendimento marcado por anos de atraso. Anunciado em 2006, o projeto avança atualmente rumo ao Porto de Pecém sob responsabilidade da concessionária encarregada. Já o trecho Salgueiro-Suape, retirado do plano nos últimos momentos do Governo Bolsonaro, está agora sob gestão da Infra SA, com previsão de retomada das atividades ainda neste ano. As instituições e instrumentos de fomento e de desenvolvimento regional são fundamentais para que a ferrovia se torne realidade.
Durante a apresentação prévia da palestra, o consultor Francisco Cunha, sócio da TGI, destacou a discrepância entre a experiência da região e da China em relação às linhas férreas. Enquanto o Nordeste viu a sua malha ferroviária praticamente desaparecer após a concessão à iniciativa privada no final dos anos 90 e aguardar há quase 19 anos a conclusão da Transnordestina, o gigante asiático, em pouco mais de uma década, multiplicou a quantidade de conexões ferroviárias. “Não é só a Transnordestina que está faltando, mas toda a secular malha ferroviária do Nordeste. Se a exclusão da ferrovia até Suape não for revertida, todo o Nordeste oriental (Rio Grande do Norte até Alagoas) estará alijado do modal ferroviário nacional para sempre”, alertou.
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Questionado no momento das perguntas dos participantes sobre os caminhos para financiar a ferrovia em Pernambuco, Paulo Câmara reafirmou que o Governo Federal assumiu a responsabilidade para fazer os projetos. Porém, para dar celeridade, ele considera que é necessário ter esforços de todos os atores locais para buscar parcerias. “Parcerias são fundamentais para um negócio como a Transnordestina. Essa equação financeira precisa ser muito bem trabalhada, pois uma obra estruturadora como essa precisa de uma atenção especial”. Ele afirmou que o BNB tem investido no setor e que o ramal para Pecém, no Ceará, já tem sido beneficiado.
PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS
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Além de destacar os avanços do BNB e a parceria com outras instituições de fomento, como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), o ex-governador ressaltou a necessidade de o Estado e a região avançarem na pauta das parcerias público-privadas. Paulo Câmara explicou que esse viés, inclusive, é um dos componentes do Novo PAC, que busca incentivar a participação da iniciativa privada nos investimentos estruturadores do País. “As PPPs precisam se consolidar mais. A gente vê o BNDES muito forte em projetos estruturadores, mas não consegue fazer tudo. O Banco do Nordeste tem começado a se inserir em PPPs menores no âmbito estadual para ser um agente financiador também nesse segmento, que dará velocidade aos investimentos da região Nordeste e em Pernambuco. A junção do setor público e privado é uma solução para muitos dos desafios que temos pela frente”.
Em celebração aos 20 anos da Lei Federal das PPPs, o Governo Federal anunciou a criação do Fundo de Desenvolvimento da Infraestrutura Regional Sustentável. Com esse novo mecanismo, a gestão Lula se comprometeu a investir R$ 1 bilhão para fomentar parcerias público-privadas e concessões no Brasil.
Essa modalidade, no entanto, apresenta desconfianças devido aos insucessos na implementação de várias concessões. Um exemplo é a Malha Nordeste que, após a privatização em 1998, encerrou todas as operações de transporte de carga em Pernambuco. Outra situação emblemática é a própria Transnordestina, cujo avanço tem sido marcado por atrasos sucessivos, estendendo-se por quase duas décadas sem uma conclusão definitiva.
UMA AMEAÇA NO HORIZONTE DO FINANCIAMENTO
Os incentivos fiscais que foram fundamentais nas últimas décadas para atração de empreendimentos para o Nordeste e para a distribuição deles no interior enfrentam algumas ameaças com o avanço da Reforma Tributária. Por princípio, o novo regime encerrará a maioria dos incentivos fiscais no País.
Sem a infraestrutura robusta já alcançada em outras regiões industrializadas no País, com rodovias e ferrovias, por exemplo, o Nordeste sofreria uma grande ameaça de se tornar menos atrativo. “Os benefícios fiscais tiveram ameaças em relação à Reforma Tributária. Espero que as discussões sejam bem formatadas para que essas ameaças não nos levem a perder a atratividade, porque a gente ainda precisa disso”, avaliou.
O presidente do BNB destacou que os três principais pilares que os investidores observam para decidir aonde levar um empreendimento são justamente as atratividades fiscais e de crédito, além da infraestrutura e da mão de obra.
CAPTAÇÃO DE RECURSOS EM NOVAS FONTES
Uma das novidades apresentadas pelo presidente do BNB foi o avanço na captação de recursos em organismos multilaterais. Já está em execução, por exemplo, € 150 milhões (aproximadamente R$ 900 bilhões) com a AFD (Agência de Desenvolvimento Francesa) e estão em fase de contratação recursos na ordem dos US$ 300 milhões (R$ 1,7 bilhão) com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
Em preparação, outras três captações estão progredindo. Também de US$ 300 milhões, com o New Development Bank (o Banco dos Brics). Junto aos Fundos de Investimento Climático (CIF - Climate Investmente Funds) avança a obtenção de US$ 67 milhões (R$ 380 milhões). A maior de todas as operações, no entanto, é com o Banco Mundial, em um total de US$ 500 milhões (R$ 2,8 bilhões). Além desses, ainda está em discussão a captação de € 200 milhões (R$ 1,2 bilhão) com o KFW, que é um banco estatal alemão de investimento e desenvolvimento, sediado em Frankfurt.
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O executivo do BNB ressaltou também a importância da ativação ou reativação de parcerias com outros fundos nacionais, como o caso do Finep (voltado para inovação e pesquisa), o Fungetur (Fundo Geral do Turismo) e do avanço nas articulações com o próprio BNDES nos projetos de interesse estratégico regionais.
Diante dos desafios históricos e estruturais do Nordeste, a ampliação do crédito, as parcerias público-privadas e a captação de recursos internacionais foram apresentadas no Pernambuco em Perspectiva como estratégias para o desenvolvimento da região e do Estado. Para sustentar a expectativa de um futuro mais promissor para Pernambuco, será fundamental a mobilização de todos os setores — público, privado e sociedade civil — em busca de soluções inovadoras e sustentáveis para impulsionar o crescimento do Nordeste.
*Rafael Dantas é repórter da Revista Algomais e assina as colunas Pernambuco Antigamente e Gente & Negócios (rafael@algomais.com | rafaeldantas.jornalista@gmail.com)