Crítica: “Rafiki”

*Houldine Nascimento

O Quênia é um país regido por leis e costumes conservadores. O cotidiano da sociedade sofre grande influência da religião, a ponto de a homossexualidade ser considerada crime pelo Estado e um motivo para encarcerar pessoas. É nesse contexto que surge “Rafiki” (2018), o primeiro filme queniano a ser exibido no Festival de Cannes, que estreia nas salas de cinema do Brasil a partir desta quinta-feira (8).

Há um romance impossível no centro da trama, que lembra uma clássica tragédia shakespeariana num primeiro olhar: a história de amor de duas jovens de Nairobi, Kena (Samantha Mugatsia) e Ziki (Sheila Munyiva), que são filhas de políticos rivais. O ambiente inóspito é um aditivo, já que a homofobia impera, seja no comportamento agressivo de amigos ou até num discurso de um líder religioso local.

Com 15 minutos de projeção, já há várias informações à disposição do espectador. Subtramas que poderiam ter um desenvolvimento melhor se para a diretora Wanuri Kahiu o que mais importasse não fosse a dificuldade enfrentadas pelas protagonistas. Outro ponto que merece destaque é a forma como Kahiu apresenta a sociedade de seu país, com muita dignidade e distante do coitadismo com que boa parte do ocidente encara a África. Uma linguagem ágil, com a presença de músicas pop, permeiam a obra.

Se apenas levássemos em conta a cultura de diversos países ocidentais, o enredo soaria inocente por retratar com delicadeza e aparente simplicidade a história central e a grande preocupação em enfatizar a hostilidade que as duas protagonistas enfrentam, mas tudo isso soa necessário, sobretudo pela rigidez com que população e governo se comportam diante da homossexualidade.

No fim, “Rafiki” — amigo, numa tradução — deve ser encarado como um filme transgressor. Sua abordagem incomodou o departamento de censura queniano, que baniu o filme, sob a alegação de “promover o lesbianismo”. É um belo exemplar do cinema africano.

*Houldine Nascimento é jornalista

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