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Francisco Cunha

É urgente recuperar a capacidade pública de planejamento em Pernambuco

A partir a década de 1950, mais precisamente a partir de 1952, Pernambuco iniciou a instalação de uma capacidade pública de planejamento que terminou por se tornar referência no Brasil, influenciando, inclusive, a própria criação da Sudene que se deu em 1959.

Em 1952, o então governador Agamenon Magalhães, criou a Codepe – Comissão de Desenvolvimento de Pernambuco que, em 1954, convidou o padre dominicano francês Louis-Joseph Lebret, economista, criador do Movimento Economia e Humanismo, para fazer um estudo que viria a se tornar pioneiro no Nordeste e, mesmo, no Brasil.

O Padre Lebret, como ficou conhecido, depois de um diagnóstico aprofundado, elaborou o relatório Estudo sobre o Desenvolvimento e Implantação de Indústrias, Interessando a Pernambuco e ao Nordeste. Neste documento que se tornaria lendário, o Padre Lebret reconhece a vocação portuária de Pernambuco, sugere a ampliação do Porto do Recife para o sul, recomenda a industrialização do Estado com a implantação de estaleiro, polo metalmecânico, produção farmoquímica e, até, uma refinaria e uma montadora de veículos. Além disso, reforçou a importância da rede rodoferroviária, e a necessidade do reforço econômico e urbano das cidades médias do Estado para evitar a explosão demográfica do Recife (ou seja, que ele chegasse “ao limiar da monstruosidade de um milhão de habitantes”), coisa que, infelizmente, não se conseguiu impedir. De quebra, ainda fez uma proposta de zoneamento urbano para o Recife e de urbanização dos morros para moradia operária. Esse “empurrão” formulativo funcionou como uma espécie de alavanca para a transformação da Codepe em Condepe – Instituto de Desenvolvimento de Pernambuco e, posteriormente, em 1973, a criação da Fidem – Fundação de Desenvolvimento da Região Metropolitana do Recife, fortemente influenciada pela teoria regional/metropolitana desenvolvida pelo engenheiro Antônio Bezerra Baltar, amigo e discípulo do Padre Lebret.

Na esteira e como âncora deste movimento de organização da capacidade pública de planejamento para o desenvolvimento foi que surgiu o complexo industrial-portuário de Suape que abrigou inúmeras indústrias, os estaleiros, a refinaria, o polo petroquímico- têxtil e só não a montadora automobilística por conta de falta de espaço de qualidade suficiente para a implantação das extensas áreas requeridas pelo projeto.

O Porto de Suape representou e representa ainda uma espécie de síntese virtuosa desta capacidade de planejamento instalada em meados do Século 20 que perdurou até o início do Século 21 quando, nos governos Jarbas Vasconcelos e Eduardo Campos, foram implantados os projetos-âncora finais do desenho esboçado meio século antes.

A partir daí, junto com o esgotamento do modelo industrial- -portuário desenhado para o Estado, deu-se a perda acelerada da capacidade de planejamento desenvolvida, numa espécie de envelhecimento da estrutura junto com falta de renovação e o desmantelamento das estruturas de planejamento para o desenvolvimento em todos os níveis. A começar pelo nível federal que culminou, no governo passado, com o desaparecimento do próprio ministério do Planejamento, passando pelo nível regional que foi vítima da criminosa extinção da Sudene e de sua recriação como uma pálida imagem do que já foi, chegando no nível municipal com o esvaziamento dramático das estruturas que chegaram a existir na segunda metade do Século 20.

No nível estadual, a fusão do Condepe com a Fidem, no início do Século 20, configurou-se como uma espécie de tentativa um tanto quanto desesperada de interromper a decadência e retomar a capacidade formulativa o que, infelizmente, não aconteceu.

Hoje, nos deparamos com o esgotamento do modelo de desenvolvimento (tanto nacional quanto estadual), com o desafio das mudanças climáticas num estado pequeno e socialmente dos mais injustos do País, que tem quase 90% do seu território no semiárido em expansão, além de historicamente mutilado como nenhum outro no Brasil (com a perda das comarcas das Alagoas e do São Francisco como punição pelas revoluções de 1817 e 1824). E, como se não bastassem essas mazelas, ainda se coloca pela frente a necessidade de enfrentamento da disrupção digital, turbinada pela inteligência artificial, que promete destruir incontáveis postos de trabalhos num estado já severamente penalizado por indicadores sociais dramáticos.

Diante de tudo isto não há outra alternativa do que recuperar urgentemente a capacidade pública de planejamento para o desenvolvimento com o objetivo de enfrentar, de forma inteligente e criativa, as adversidades e aproveitar as oportunidades existente. Afinal, não há vento favorável para quem não sabe com clareza para onde quer ir (se o barco tiver poucos recursos num mar revolto, pior ainda!). Caso contrário, no médio prazo (que vai além de um ou dois períodos de governo) a tragédia está anunciada e contratada.

Que o espírito do profeta Padre Lebret nos ilumine!

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