A menor inflação acumulada desde 1998 e a menor taxa básica de juros (Selic) desde o início da série histórica, em 1986, foram alguns dos destaques econômicos da última semana. Segundo economistas, os números mostram que o país está começando a sair da crise. Eles alertam, que a recuperação ainda é lenta e que é preciso ter cautela e adotar medidas para que essa janela de oportunidade não se feche.
“A gente pode ser otimista ou pessimista. Se somos pessimistas, dizemos que está tão ruim que qualquer pequena melhora é muito boa e, se somos otimistas, dizemos que o país está crescendo e temos sinais que dão suporte, são pontos de vista. Para mim, está crescendo, sim, devagar, porque partimos de uma base muito baixa”, diz o professor Marcos Melo, que leciona finanças na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas Ibmec-DF.
A inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgada na sexta-feira (8), registrou acumulado de 2,5% de janeiro a novembro, o menor resultado para ese período desde 1998, quando a taxa ficou em 1,32%. Na última quarta-feira (6), o Banco Central anunciou a redução da Selic de 7,5% ao ano para 7% ao ano. Com a redução, a taxa atinge o menor nível desde o início da série histórica do Banco Central.
“Acho que sim, há recuperação. O Brasil chegou ao fundo do poço, na maior recessão da história, que começou no segundo semestre de 2014 [e foi] até o final de 2016. Agora há uma recuperação, lenta, mas recuperação”, concorda o pesquisador Marcel Balassiano, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). Balassiano ressalta que parte da redução da inflação deve-se à crise. “Em um período de crise, as pessoas ficam com menos dinheiro, há mais pessoas desempregadas, compra-se menos, e o preço não sobe tanto.”
Mesmo que a causa seja, em parte, a recessão, Melo afirma que o país tem de aproveitar esse momento. “Com a inflação controlada, abre-se a possibilidade para o Banco Central diminuir a taxa de juros. Isso permitirá um aumento da atividade econômica. Empresas têm maiores possibilidades de fazer investimentos, e isso significa abertura de vagas de trabalho, que aumentam o consumo e fazem a roda girar”, diz Melo.
Percepção da população
Os especialistas concordam que os indicadores apontam melhoras. No entanto, são mudanças graduais, ainda são sentidas pela população, em geral. “Uma coisa é a percepção da população, e outra é a realidade. A realidade mostra que, aos poucos, [a recuperação] está chegando para as famílias, para as pessoas em geral. Mas não significa que cada um dos brasileiros tenha melhora na qualidade de vida”, ressalta Melo. “É um processo lento e discrepante entre setores e até mesmo entre as regiões do país. Algumas estão se recuperando mais rapidamente e outras, encolhendo.”
Para Balassiano, a taxa de desemprego, que afeta diretamente a população, está em um nível muito alto, o que faz com que os indicadores ainda não sejam amplamente percebidos. O desemprego é sempre o último a “sair da crise”,, explica.
“O desemprego está diminuindo lentamente, ainda vai ser demorado. Fica difícil falar que está diminuindo, quando temos milhões de desempregados [12,7 milhões]. A taxa de emprego informal está crescendo mais que o formal, o que é normal em períodos de crise”, diz. “Para a população, o emprego é a variável mais importante”.
Essa situação ainda deve se manter. Conforme projeções do Ibre/FGV, o ano de 2017 deve fechar com 12,1% de desempregados. A média, ao longo do ano, deve ficar em 12,8%. No ano que vem, a média deverá ser de 12,4%, levemente inferior, e o ano deve fechar com taxa de desemprego de 11,5%.
Medidas são necessárias
Apesar de apontarem para melhorias, os números também mostram que é preciso cautela, observa o economista Fábio Bentes, chefe da Divisão Econômica da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Preços de produtos e serviços como energia e gás continuam subindo, e isso pode voltar a impactar nos demais produtos, aumentando os custos.
“Sempre que energia, butijão de gás, combustível aumentam, isso acaba se espalhando para outros preços”, afirma. Segundo o economista, nos últimos 12 meses, esses itens, chamados de preço administrado, tiveram aumento de 7,8%, enquanto os demais de preços livres, como roupas e alimentos, registraram alta de 1,2%.
“É preciso que o governo consiga calibrar melhor para o ano que vem esses reajustes, que consiga equilibrar suas contas para não precisar de taxas de juro reais tão elevadas. A inflação está em 2,5% e a taxa de juro real, em 4,5%. É muito alto. E sabemos que o calcanhar de Aquiles é a Previdência”, acrescenta Bentes. “Temos uma janela de oportunidade, é preciso preservar esse cenário para o ano que vem, dar sustentabilidade para não chegar à inflação absurda de 2015 [que foi de 10,67%].”
(Agência Brasil)