Com lançamento no próximo dia 8/3, no Museu do Estado, “Casa Caiada – Uma História Entre Linhas” é lançamento inaugural da editora Usina de Arte
Em meados dos anos 1960, na Zona da Mata e Agreste pernambucano, sob a sombra da ditadura militar, uma tia e uma sobrinha decidem compartilhar seus saberes lúdicos-criativos adquiridos no fazer cotidiano de tapetes com outras mulheres. Pelas mãos de Maria Digna e Edith Pessôa de Queiroz, as habilidades manuais empregadas exclusivamente no ambiente doméstico passa a significar autoestima e independência feminina para mulheres dessas regiões, ao tempo que inaugura um novo estilo de tapeçaria, com a elaboração do Ponto Casa Caiada, aplicado no resgate de identidades étnicas e artísticas que tramam o Brasil ao longo dos séculos.
Os quase 60 anos dessa história ganham registro no livro “Casa Caiada – Uma História Entre Linhas”, organizado por Maria Eduarda Marques, com lançamento no Dia da Mulher, 8/3, no Museu do Estado de Pernambuco (Mepe), a partir das 19h. Com 225 páginas, a obra é a capa inaugural da Editora Usina de Arte, braço literário do projeto artístico, botânico e cultural Usina de Arte, que prevê o lançamento posterior de biografias e narrativas sobre empreendedores da região Nordeste que marcaram a historiografia local, mas ainda não tiveram a devida reverência por suas contribuições.
No texto de abertura, o artista Paulo Bruscky evidencia o lugar histórico da Tapeçaria Casa Caiada na fotografia da arte pernambucana não só por verter Brennand, Pedro Federico, elementos figurativos e abstracionistas em tapetes, “mas por agrupar as rendeiras em associações que permanecem e resistem até hoje”. Essa relevância histórica e cultural conduz a Casa Caiada a promover novas leituras e a implantar valores simbólicos ao trabalho manual feito por mulheres.
Da demanda espontânea de conhecidos e familiares ao mercado internacional, as manualidades incorporaram alguns dos principais estilos artísticos de períodos anteriores e contemporâneos a sua trajetória, como Arts and Crafts, Modernismo Brasileiro e Art Déco. Casa Caiada também esteve em simbiose com a literatura e a cultura pernambucana, contribuindo para a constituição da identidade estética do Movimento Armorial e inspirando-se no resgate regionalista, proposto por intelectuais como Manuel Bandeira e Gilberto Freyre, com a adoção de ruas e bairros do Recife para nomear várias de suas peças em um ato de valorização da história da cidade.
A Tapeçaria, então, inovou-se em si mesma e revigorou o tradicional ponto cruz com a introdução do Ponto Casa Caiada. Entre os temas de inspiração para tantos bordados, estão a azulejaria portuguesa, formas geométricas, pinturas étnicas, animal print e a fauna e flora brasileira. Se em décadas anteriores o trançar de linhas era uma limitação imposta às jovens, tornou-se, então, escolha vertida em geração de renda, em um ofício realizado de forma coletiva, acolhedora e colaborativa. Uma vez associadas à Tapeçaria, as mulheres de Lagoa do Carro conquistam sua independência financeira e, muitas delas, libertam-se de estruturas que as aprisionavam, como relações abusivas e carência de acessos diversos.
Presidente da Usina de Arte, que editora o livro, Bruna Pessoa de Queiroz pontua o simbolismo de lançar “Casa Caiada – Uma História Entre Linhas” em um 8 de março, Dia Internacional da Mulher. “Ao conhecer a história que conduz a Casa Caiada até aqui, salta aos olhos o compromisso da marca com a capacitação e a valorização dos saberes e capacidades manuais das mulheres, que com o ofício foram bordando também os seus propósitos de existência com autoestima, liberdade e autonomia. Para quem é mulher, tecer um tapete também é metáfora do dar as mãos para somar, realizar e sair mais forte, individual e coletivamente. Há muitas belezas na expressão da tapeçaria, e a Casa Caiada tem contribuído para que elas sejam vistas.”
Cores, prismas e texturas
Com colorido e vivacidade à altura da história que conta, “Casa Caiada – Uma História Entre Linhas” permite que o leitor desbrave a tessitura histórica desse ícone da tapeçaria pernambucana atravessado pelo primor visual do trabalho manual que alcança os olhos em fotografias realistas de texturas e manualidades. Entre linhas, lãs e letras, um mergulho nas vidas de mulheres que encontraram na produção de tapetes qualidade de vida e resiliência. Em especial, os caminhos de suas fundadoras, Maria Digna e Edith, cujas histórias possuem vasos comunicantes com os avanços e transformações do Recife nas décadas passadas, sendo, portanto, também parte da história de Pernambuco. Com versão em português e inglês, a obra propõe ainda uma viagem aos primórdios da arte tecelã, com convite à uma reflexão em torno do desenvolvimento dessa prática no Estado como um marco identitário e patrimonial.
Serviço:
Lançamento: Casa Caiada – Uma História Entre Linhas (Editora Usina de Arte, 225 págs.)
Quando: 8/3, às 19h
Onde: Museu do Estado de Pernambuco (Mepe)
Avenida Rui Barbosa, 860, Graças
Valor da livro: R$ 300