Eduardo Kobra: "A arte traz respiro, como vacina, antídoto, melhorando o visual urbano" - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Eduardo Kobra: "A arte traz respiro, como vacina, antídoto, melhorando o visual urbano"

Revista algomais

O muralista paulistano Eduardo Kobra deixou sua marca em murais gigantes pelo mundo inteiro. Nascido na periferia, foi pouco a pouco ganhando um espaço na arte urbana, que praticamente não existia. Seu legado, distribuído desde metrópoles a cidades pequenas espalhadas pelo mundo, abriu espaço para que muitas outras trajetórias seguissem a trilha que ele deixou.

Nesta edição em que discutimos a instalação de diversos megamurais no Recife, o repórter Rafael Dantas entrevistou por telefone o muralista, que entre suas obras pintou o painel de 77 metros de altura de Luiz Gonzaga no Prédio da Prefeitura do Recife, em 2017.

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Como você começou na arte urbana?

Sou artista desde 1987. Tenho hoje 49 anos, comecei bem menino, numa época em que a arte de rua era totalmente discriminada. As pessoas viam os artistas como vagabundos ou entendiam a arte de rua como inferior.

Como eu não tinha emprego, quando me vi na necessidade de pagar conta de água, luz e aluguel, comecei a fazer trabalhos encomendados de pintura em sacolão, pet shop, oficina mecânica… Tem que partir para cima e tentar usar as armas disponíveis até que a consciência [da valorização dessa atividade] chegue. Eu sinto muito orgulho de ter feito parte da transformação da mentalidade das pessoas. Eu mesmo sofri todo tipo de preconceito. Hoje esse cenário ainda se repete em muitas cidades e situações.

Qual sua percepção dos projetos públicos para incentivar essa arte?

Toda e qualquer atitude voltada a apoiar esses artistas é muito bem-vinda. São atitudes de vanguarda. Muitos desses meninos e meninas que pintam nas ruas fazem de forma voluntária e espontânea. Mas muitos artistas, como foi minha história, não tinham dinheiro nem para comprar seu material.

Muitos desistem por causa de toda dificuldade. O movimento para apoiar esses artistas tem um significado importantíssimo. Não existe diferença entre arte na rua, galeria e museu. Como não existe diferença do artista que vem de classe alta e estudou nas melhores universidades dos artistas autodidatas. A arte vem de dentro para fora. É impossível estabelecer parâmetros por classe social ou oportunidade de estudo.

Não conheço o projeto do Recife diretamente, mas consigo imaginar muitos artistas de origem simples recebendo essa visibilidade e apoio. São incentivos que fazem toda a diferença. Meu trabalho começou nas ruas e periferias, sem incentivo ou apoio, mas hoje um artista desse tem que ser incentivado. É um privilégio o nosso País ter essa quantidade de arte importante pelas ruas, como no Recife, São Paulo, no Rio de Janeiro e nos interiores.

Quais os efeitos que você percebe da presença dos murais gigantes pelas grandes cidades?

Muitos artistas nas ruas estão se doando e transformando o ambiente urbano. As artes estão onde as pessoas andam estressadas, preocupadas com violência, com ansiedade. A arte traz respiro, alívio, como vacina, antídoto, melhorando o visual urbano. Inspirando as pessoas em áreas degradadas.

A arte de rua tem papel fundamental para as cidades. Hoje é inimaginável pensar nessas grandes cidades sem esse movimento de arte urbana. O Brasil é um dos principais países em relação a street art, com qualidade dos artistas que fazem coisas fantásticas. Quanto houver mais intervenção é bacana, pois transforma cidade em galerias a céu aberto.

Quais seus próximos planos? O Recife está neles?

Eu sigo recebendo muitos convites pelo mundo. Apesar de tanto tempo pintando, sigo entusiasmado por fazer o que faço. É um privilégio conhecer cidades do mundo ou brasileiras, grandes ou pequenas, trabalhar em Nova Iorque, onde tenho 21 murais, ou na África, onde tenho 2. Todos lugares trazem conhecimento.

Mas o mais importante neste momento é a entrega do legado do Instituto Kobra. Damos trabalho e formação a meninos da comunidade, pessoas simples que podem ter a arte como uma saída. Busco incentivá-los a seguir em frente com meu instituto. Esse é o trabalho mais importante da minha vida. Quem sabe posso expandir, com células em várias partes do Brasil, sem dúvida o Recife está nessa minha programação.

Gostaria muito de voltar à cidade também para restaurar o mural que foi feito no Prédio da Prefeitura do Recife. Seria bem legal ter essa oportunidade.

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