*Por Geraldo Eugênio
A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), oficialmente completou 50 anos em 2023. Há de se reconhecer, inicialmente, que junto com a Fiocruz, a Embraer e a Petrobras, a Embrapa constitui-se entre as mais prestigiadas e reconhecidas instituições do governo brasileiro, aqui e no exterior. Surgiu em um momento crítico da história do País que se defrontava com um endividamento crítico após o "milagre brasileiro". Na primeira metade da década de 1970, o mundo testemunhava as consequências da Guerra do Yom Kippur (a quarta das guerras árabe-israelenses) com a formação da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), quando o preço do barril do petróleo cru saltou de US$ 4 para US$ 40. Para o Brasil isto representava uma catástrofe. Dependente da compra de gasolina e diesel do exterior, atingiu um estágio falimentar.
Por outro lado, a acelerada urbanização e a industrialização em algumas regiões metropolitanas demandavam alimentos para uma massa numerosa de trabalhadores, o que também não havia. A agricultura nacional ainda era centrada em produtos como o café e o açúcar, que representavam mais da metade do mercado exportador, mas débil na produção de gêneros alimentícios o que fazia do País um costumaz freguês no mercado internacional de alimentos, incapaz de alimentar sua população e expondo o Brasil como um caso grave de insegurança alimentar.
O diagnóstico de alguns pensadores econômicos, entre os quais o engenheiro agrônomo Eliseu Roberto de Andrade Alves, de que a principal limitação da agricultura brasileira era de base tecnológica, parecia surpreendente para alguns, mas sua hipótese prevaleceu no Governo Federal liderado pelo então presidente Emílio Médici. Ele concordou com seu ministro da Agricultura, o gaúcho Luiz Fernando Cirne Lima, em criar um grupo de trabalho para redesenhar a pesquisa agropecuária do País. Daí, surgiu a ideia de contar com um novo arranjo institucional, uma empresa pública de direito privado, que contasse com maior flexibilidade de gestão, uma nova dinâmica de formação de seus quadros e com amplitude em todo o País.
A Empresa herdou parte da estrutura existente do DNPEA (Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária do Ministério da Agricultura), com autonomia para proceder a escolha de uma nova equipe. Centenas de jovens foram contratados, enviados para programas de pós-graduação em universidades brasileiras e estrangeiras, o que demonstra como se deu a gênese dessa nova entidade, o que coincide com um momento de inflexão na agricultura brasileira.
Dentre os novos centros de pesquisas, a decisão técnica e política pela instalação do CPATSA (Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico Semiárido), atual Embrapa Semiárido, em Petrolina, foi uma iniciativa singular para o semiárido brasileiro, para Pernambuco e para a região semiárida do Brasil que passou a contar com uma das unidades mais estratégicas e emblemáticas de seu conjunto de mais de 40 ambientes de pesquisa e difusão tecnológica. Nesse momento, a Embrapa Semiárido comemora seu cinquentenário com todos que fazem essa empresa, Pernambuco e o Nordeste, participando desta conquista.
CONTRIBUIÇÕES PARA O SEMIÁRIDO
A história da Embrapa normalmente é associada à transformação do Cerrado, uma vitória de tal monta que alterou a geopolítica da segurança alimentar em todo mundo. O Brasil, antes um cliente obrigatório do mercado de alimentos, tornou-se o terceiro mais importante parceiro comercial em commodities agrícolas. Hoje, dezenas de países contam com as safras brasileiras crescentes para assegurar o abastecimento de produtos como carnes de frango e bovina, milho, grão e farelo de soja, açúcar, café, suco de laranja, melão, manga e uva, por exemplo.
Esse caminho, em se tratando da região semiárida, tem a impressão digital da Embrapa Semiárido na criação de uma base técnica para agricultura irrigada em condições tropicais e em tornar o submédio São Francisco um dos centros produtores de frutas irrigadas mais importantes do planeta. São centenas de empresas, milhares de empregos e uma fração substancial da exportação nacional de frutas que caracteriza a fruticultura regional. Não é exagero dizer que a tecnologia empregada condiz com o que de mais moderno se encontra em regiões irrigadas da Espanha, Israel ou Estados Unidos.
Foram batalhas difíceis de superação, contando com o reconhecido esforço de empresários locais, de outros estados e do estrangeiro que para lá foram atraídos e de um grande número de entidades técnicas e de fomento, destacando-se a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco) e a Embrapa Semiárido.

Importante não esquecer que a Embrapa Semiárido contou, durante mais de uma década, com a Unidade de Execução de Pesquisa de Solos, no Recife, atualmente vinculada a Embrapa Solos, com um conjunto de colaboradores dedicados a estudos de pedologia, zoneamento agroclimático e modelagem ambiental. Esse time realizou o Zoneamento Agroecológico do Nordeste e presenteou ao Estado de Pernambuco, na virada do Século 20 para o Século 21, com o zoneamento pedológico (do solo) de todo território do Estado na escala de 1:100.000, um fato inédito e o primeiro a contar com um instrumento dessa magnitude entre todas as unidades da Federação.
PRÓXIMOS PASSOS
A questão que fica é severa. E para o semiárido que não se encontra próximo aos rios São Francisco e Parnaíba, qual foi a contribuição? Essa questão remete a uma forte discussão de caráter estratégico que é o objetivo da Embrapa Semiárido: apoiar a agricultura irrigada ou a de sequeiro?
Em primeiro lugar, é importante chamar a atenção para contribuições isoladas ou em parceria com universidades, associação de produtores, instituições de pesquisa no desenvolvimento de tecnologias voltadas ao aproveitamento das águas pluviais e o aproveitamento de águas salobras, de manejo da Caatinga, da introdução de espécies forrageira como a leucena, a gliricídia, os sistemas consorciados, o monitoramento das alterações do bioma e do clima, o manejo do gado em condições de secas e, em especial, inserir a agropecuária regional na quadro de controle das demandas estratégicas para a nação.
Há muito o que ser feito e a Embrapa Semiárido, as demais unidades da Embrapa no Nordeste, a exemplo: da Embrapa Cocais, em São Luiz; da Embrapa Agroindústria Tropical, em Fortaleza; da Embrapa Caprinos e Ovinos, em Sobral; da Embrapa Meio Norte, em Teresina; da Embrapa Alimentos e Territórios, em Maceió; da Embrapa Tabuleiros Costeiros, em Aracaju; da Embrapa Mandioca e Fruticultura, em Cruz das Almas. Em conjunto com as instituições de ensino superior, as entidades de pesquisa e extensão dos estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Sergipe, as fundações de amparo à pesquisa do Nordeste, as empresas privadas, as associações de produtores da agricultura familiar têm o firme propósito de avançar com a construção de uma agricultura de semiárido para este século respeitando os desafios e aproveitando-se das oportunidades.
Há que se demonstrar o melhor uso dos recursos naturais e humanos e da base tecnológica disponível: a inteligência artificial; a interpretação de imagens geradas por drones e satélites; os sensores de umidade e fertilidade do solo; os modernos equipamentos usados na automação da irrigação e das práticas agrícolas; o mercado online de alimentos e produtos processados; a qualificação técnica e gerencial. Esses serão lugares comuns para o pequeno e médio imóvel rural da região.
Parabéns, Embrapa Semiárido, sua equipe e o conjunto de entidades que contribui com o desenvolvimento da agropecuária e o agronegócio de Pernambuco e do Nordeste. Aproveitando o momento, parabéns à pesquisadora Mariângela Hungria, da Embrapa Soja, agraciada com o World Food Prize 2025, equivalente ao Prêmio Nobel da Agricultura por suas contribuições na área de fixação biológica de nitrogênio, de microbiologia do solo e de agricultura de baixo carbono.