*Por Matheus de Abreu & Tatiana Roldan | Imagens: Freepik
Há um brilho que encanta e captura: as telas. Nelas, a infância encontra imagens rápidas, gestos ensaiados, falas que muitas vezes pertencem ao mundo adulto. Entre risadas automáticas e coreografias repetidas, a criança parece, por vezes, vestir um figurino que não lhe cabe ainda. A velocidade da tela é fascinante, mas também apressa o tempo, encurtando os silêncios e os intervalos em que a imaginação poderia florescer livre.
Não se trata de negar a tecnologia, mas de reconhecer que, no excesso, ela rouba espaço do essencial. O brincar espontâneo, o corpo em movimento, a pausa do ócio criativo e a leitura sem pressa correm o risco de se perder quando a tela se torna o principal horizonte da criança. Pedagogicamente, sabemos que a atenção se fragmenta, o vocabulário e a sensibilidade narrativa se enfraquecem quando não há equilíbrio. A infância precisa de múltiplas linguagens: o gesto, o desenho, a palavra escrita, a conversa face a face. A tela é apenas uma delas e não pode ocupar o lugar de todas.
Entre telas e livros, entre casa e escola, existe um território comum: a formação humana. É nesse território que a parceria se torna indispensável. Não basta que a escola aponte caminhos, nem que a família, sozinha, imponha limites: é no diálogo entre ambas que nascem estratégias mais justas e consistentes. Afinal, a infância não é responsabilidade de uma instituição ou de um lar apenas: é uma obra coletiva, feita de encontros e cuidados compartilhados. Essa parceria entre escola e família se torna ainda mais urgente diante de um cenário em que crianças crescem imersas em telas, estímulos constantes e excesso de informações. Cada vez mais distantes da escuta atenta e do vínculo humano, elas precisam de adultos alinhados, tanto no discurso quanto nas expectativas. Educar, hoje, é mais do que ensinar: é resistir ao ruído, proteger valores e cuidar, juntos, do que é essencial ao desenvolvimento infantil.

Família e escola devem ser aliadas, não ilhas. O trabalho conjunto, traz à criança o que nenhuma tela entrega: segurança, presença e sentido. E é isso que, mais do que nunca, elas estão pedindo, ainda que em silêncio. A escola não quer, nem pode, substituir o papel da família. São os pais os primeiros responsáveis por mediar tudo o que se apresenta à rotina de seus filhos, incluindo o uso da tecnologia. Os pais devem ser os primeiros a estabelecer rotinas, acompanhando o conteúdo consumido e oferecendo um porto seguro para o diálogo. A escola estará pronta para complementar esse trabalho, ampliar debates e propor alternativas seguras ao uso da tecnologia, mas de forma alguma poderá caminhar sozinha.

O uso de tecnologia exige mediação ativa. Não é sobre proibir, mas sobre estar presente: saber o que assistem, com quem interagem, por que estão tão conectados. A criança não precisa de mais autonomia digital, ela precisa de direcionamento. Mais do que nunca, é a escuta mútua entre escola e família que garantirá o desenvolvimento equilibrado da criança nesse mundo digital.
Preservar a infância exige ação conjunta. Mais do que reconhecer os desafios, é preciso enfrentá-los com propostas concretas. A tela não é um problema isolado, mas um recurso ao qual se tem recorrido para entreter as crianças a todo custo. O diálogo e a reflexão nos trazem que já não é mais possível viver sem telas, mas reduzir o seu uso, e experimentar possibilidades sem o uso constante delas é muito mais fácil do que se pensa.

Pais e educadores devem buscar um resgate constante da infância pura, criando momentos coletivos sem telas para as crianças. Podem resgatar o valor das leituras compartilhadas, incentivar brincadeiras criativas, propor rodas de conversa, participar de contação de histórias, e incentivar atividades físicas que devolvam à criança o prazer do corpo em movimento e do olho no olho. A escola pode, e deve, abrir espaço para encontros com as famílias, promovendo reflexões e buscando que as famílias firmem compromissos que ultrapassem os muros da instituição. Proteger a infância não é tarefa isolada, é um esforço cotidiano, coletivo, feito de presença, atenção, doação, escolhas intencionais e cuidado partilhado.
*Matheus de Abreu e Tatiana Roldan são coordenadores pedagógicos da Rede Maple Bear Global Schools

