Uma tarde perdida no trânsito caótico do Recife, conhecido por ser um dos piores do mundo, foi o estopim para o arquiteto, urbanista e artista plástico Luiz Rangel perceber que algo estava errado nisso tudo. Daquela situação nasceram os esboços iniciais de “Exílio”, o primeiro dos nove quadros feitos por Rangel e que compõem a exposição “Autos Retratos”, que chega ao Museu da Cidade do Recife nesta quinta-feira, 22 de setembro, o Dia Mundial Sem Carro.
“Me senti isolado e confinado naquele engarrafamento. A sensação na hora foi de frustação, mas que logo se transformou em um processo criativo interessante”, conta Rangel. A partir dali, brotaram esboços despretensiosos que, aprofundados e com base nas experiências cotidianas no trânsito, se transformaram em quadros abordando a temática da mobilidade e a dependência da sociedade por seus carros. “A reflexão me trouxe um questionamento: precisamos mesmo estar dentro de um veículo?”, indaga. O quadro “Destino”, por exemplo, segue esta linha. “A ideia surgiu de uma expressão comum: ‘fiquei rodando atrás do endereço’. As pessoas sempre querem chegar a algum lugar, mas a sensação da cidade engolida por carros parece sugerir que, no fundo, nunca chegamos a lugar algum”, diz.
São nove trabalhos em óleo sobre tela, em formato quadrado, com exceção de “Reflexo”, em tamanho diferenciado (1m x 2m, retangular), que traz um olhar de futuro dentro da temática principal e aponta para a importância de espaços compartilhados. “A obra mostra o trânsito com o retrovisor de um carro simbolizando o passado, repleto de veículos, e o amanhã com outros partícipes da mobilidade: bicicletas e pedestres em perfeita harmonia”, explica Rangel.
DEBATE – Com curadoria de Plinio Santos Filho e Daniel Dobbin, “Autos Retratos” não será inaugurada casualmente no dia 22. Nessa data, é celebrado o Dia Mundial sem Carro, reforçando o propósito da exposição: mostrar um retrato provocador da sociedade atual, um “auto retrato”, como brinca Luiz Rangel, com uma cidade refém dos veículos, com poucas interações interpessoais e espaço reduzido para pedestres e ciclistas. A abertura da mostra, a oitava da carreira artística de Luiz Rangel, tem início às 19h, com debate com o artista, o curador Plinio Santos e o militante da mobilidade a pé Francisco Cunha, dando seguimento ao vernissage, às 20h. O evento é gratuito e aberto ao público. A mostra fica em cartaz no Museu da Cidade do Recife, no Forte das Cinco Pontas até 2 de outubro, também com entrada franca.
SOBRE O ARTISTA – Arquiteto e urbanista formado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o recifense Luiz Rangel iniciou sua ligação com desenho e pintura na infância, de forma autodidata. Desenvolveu suas aptidões artísticas durante a graduação e a vida profissional, com projetos arquitetônicos feitos à mão – na época em que não se utilizava o computador – e, posteriormente, em curso de pintura no Espaço Vitrúvio, em 2010. Desde então, já participou de sete exposições – no próprio Espaço Vitrúvio, no festival Olinda Arte Em Toda Parte e por duas ocasiões em Frankfurt, na Alemanha: em 2012, com a mostra “Follow me” e, em 2014, “Onze – Abaixo do Equador”, ambas na Galeria Eulengasse. Atua também como conselheiro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Pernambuco (Cau-PE).