Infraestrutura Atual Não Atrai Novos Ciclistas, Alerta Ameciclo - Revista Algomais - A Revista De Pernambuco
Infraestrutura atual não atrai novos ciclistas, alerta Ameciclo

Revista Algomais

Apesar do aumento na quilometragem das ciclovias, infraestrutura segue precária, com baixo padrão de segregação e integração quase inexistente com outros modais.

Mesmo com o crescimento no número de quilômetros de ciclovias na Região Metropolitana do Recife (RMR), a percepção de quem pedala segue marcada por insegurança e frustração. Para a Ameciclo, os avanços ainda não são capazes de atrair novos usuários nem de garantir conforto e proteção aos ciclistas. Em entrevista ao repórter Rafael Dantas, o coordenador da entidade, Daniel Valença, aponta os principais gargalos da mobilidade ativa, critica a ausência de integração entre modais e defende que o poder público precisa, enfim, priorizar investimentos na mobilidade sustentável.

bicicleta carro recife

Como a Ameciclo avalia o aumento da infraestrutura para a ciclomobilidade na RMR? O que avançamos e o que permanece como ponto crítico?

A Ameciclo avalia que houve um avanço no número de quilômetros de infraestrutura cicloviária, principalmente na cidade do Recife. No entanto, é preciso qualificar esse avanço: será que ele está trazendo, de fato, benefícios para quem pedala e para a população em geral? Investir em quem pedala é investir em uma cidade mais segura, menos poluída e com menos engarrafamentos — mas o que temos visto é uma infraestrutura extremamente precária.

Grande parte da malha cicloviária é composta por ciclorrotas e ciclofaixas. As ciclorrotas não têm segregação do fluxo de veículos motorizados e muitas vezes estão localizadas em vias de alto fluxo e velocidade, como a Rua do Riachuelo (dividindo espaço com o BRT) e a Avenida Beberibe (em frente ao mercado), onde ciclistas disputam espaço com ônibus e todo o caos da via. Já as ciclofaixas, geralmente em vias secundárias ou terciárias, têm pouca segregação e sofrem com invasões por motos em movimento ou carros estacionados.

A pergunta que fazemos é: deixaríamos um filho, uma mãe ou uma pessoa idosa usar essas vias com segurança? A resposta, para quem pedala no Recife, é não.

O que os estudos mostram sobre as expectativas dos ciclistas em termos de infraestrutura?

Nossa pesquisa Perfil Ciclista mostra que, em 2013, quando havia pouca infraestrutura, os ciclistas apontavam arborização e educação no trânsito como principais demandas. Hoje, com a infraestrutura visível, mesmo que precária, a principal reivindicação é justamente mais estrutura cicloviária. Isso indica que quem já pedala se fideliza ao modal, mas o sistema atual não atrai novos ciclistas. O número de pessoas que pedalam há mais de cinco anos aumentou, enquanto o de iniciantes caiu — ou seja, não estamos conseguindo renovar esse público.

bicicleta recife ciclovia radial

A infraestrutura precisa oferecer segurança imediata, com mais segregação e melhor tratamento nos cruzamentos, mas também precisa ser atrativa: mais larga, confortável, permitindo que as pessoas pedalem lado a lado. A Prefeitura até tem um bom Manual de Desenho de Ruas, com padrões adequados de qualidade, mas ele precisa ser efetivamente seguido.

A infraestrutura precisa oferecer segurança imediata, com mais segregação e melhor tratamento nos cruzamentos, mas também precisa ser atrativa.

Quais os números de violência no trânsito referentes aos ciclistas? O medo de atropelamento é hoje um dos principais entraves para que mais pessoas adotem o modal?

Os números são assustadores. Entre 2022 e 2024, a violência no trânsito em geral mais do que dobrou — um aumento de 140%, com crescimento mês a mês. Os dados da CTTU mostram que saímos de 2 mil sinistros para mais de 4.400. E vale lembrar que a CTTU chega em apenas cerca de 40% dos sinistros. Isso significa que, no Recife, mais de dez pessoas por dia são vítimas de sinistros no trânsito.

Em relação aos ciclistas, o relatório mais recente de segurança viária da CTTU, lançado em 2023, aponta que dez ciclistas morreram em 2023 em solo recifense. Além disso, quase 500 ciclistas foram vítimas de sinistros com atendimento do SAMU. Esse número é considerado com vítima justamente porque o SAMU foi acionado. É importante destacar que esse dado de 473 ciclistas vítimas é muito maior que o de 2022, mas também porque passaram a incluir os atendimentos do SAMU, o que não era feito anteriormente. Mesmo assim, é alarmante: dá quase um ciclista ferido por dia e um morto por mês.

WhatsApp Image 2025 07 03 at 16.04.33

O medo de pedalar, de fato, não está necessariamente associado apenas a morrer atropelado. A sensação de insegurança no trânsito é o que afasta as pessoas da bicicleta e as empurra para outros modos, mesmo que mais perigosos, como as motos, ou menos sustentáveis, como os carros.

Como é a integração entre a bike e os demais modais na RMR? Avançamos em algo?

Olha, eu vou até citar um fato curioso que eu vi: um terminal integrado, que foi privatizado — acho que em Paulista — recebeu até um bicicletário novo, supermoderno, que tem identificação biométrica para você colocar a sua bicicleta lá dentro. Então, é uma novidade pra gente ter conseguido saber desse bicicletário em terminais de integração.

Mas, não há nenhuma integração. O que tinha um pouco era o bike-metrô, mas o metrô está completamente precarizado. E a própria Bike PE, que também tem diminuído a qualidade das bicicletas, não consegue fazer realmente uma integração com Olinda e Paulista. Pela distância entre as estações e pela falta de infraestrutura cicloviária que integre essa região.

ciclovia Marlon Diego

O que previa o plano diretor era que toda a infraestrutura cicloviária estivesse conectando o Recife e as cidades vizinhas por bicicleta. E isso poderia fazer essa integração modal. Mas não há nenhum avanço, na verdade, de integração entre bicicleta com ônibus ou com metrô.

Fala-se muito em mobilidade sustentável atualmente. O deslocamento por bicicletas traz vantagens para a cidade, para a saúde e ainda não polui. As políticas públicas locais e nacionais apontam para uma maior atenção e investimento ao modal?

Existe, sim, um arcabouço legal já muito consistente para priorizar os modos sustentáveis — bicicleta, caminhada e transporte coletivo. A Política Municipal de Mobilidade Urbana e o Manual de Desenho de Ruas são avanços. Mas, na prática, falta vontade de mudar a infraestrutura e atacar o problema na raiz.

Os investimentos ainda se concentram no automóvel. Mais de R$ 140 milhões são investidos em asfaltamento e ruas, enquanto ciclovias recebem migalhas. O transporte público está sucateado. A última faixa de ônibus foi em 2021. As pessoas estão migrando para motos por aplicativo, que são perigosíssimas, porque os ônibus estão engarrafados e a bike não tem segurança nem estrutura.

bicicleta onibus

Nacionalmente, se fala em PACs de mobilidade, mas a gente não vê reflexos disso nas cidades. Às vezes, esses programas ainda reforçam modelos arcaicos, baseados no automóvel. Tivemos avanços como a unificação das tarifas nos anéis A e B, mas o metrô está sendo sucateado e os gestores públicos continuam presos à lógica da "carrocracia".

Quais as principais batalhas atualmente da Ameciclo?

A principal batalha da Ameciclo está sendo a segurança viária. A gente diz que a nossa principal pauta é a efetivação da Política Municipal de Mobilidade Urbana, que é uma lei desde 2021. Mas dentro de tudo que está ali, na política de mobilidade urbana, a gente tem enfrentado mais ainda a batalha da segurança viária.

Depois de a gente fazer várias solicitações à prefeitura, e depois de todo esse aumento das mortes no trânsito, a gente resolveu judicializar a nossa batalha. Infelizmente, a gente teve que tomar essa providência, que é pela redução das velocidades máximas nas avenidas — de 60 para 50 km por hora — e pela ativação das lombadas eletrônicas, da fiscalização eletrônica 24 horas por dia, conforme a lei.

A gente pretende ainda estar nesse embate por segurança no trânsito. Claro, sem esquecer, obviamente, que as ciclovias, principalmente as avenidas , como na Agamenon Magalhães e em breve na Mascarenhas de Moraes.

Mas está faltando na Abdias de Carvalho, na Caxangá, na Avenida Norte, na Avenida Recife, que estão entre as 10 vias mais perigosas do Recife, que deveriam ter infraestrutura cicloviária.

mobiliade violencia bikes

Deixe seu comentário

Assine nossa Newsletter

No ononno ono ononononono ononono onononononononononnon