Quem nunca teve um dia de fúria? Nesse mundo acelerado em que vivemos, com uma montanha de coisas para fazer num dia de “apenas” 24 horas, estresse e preocupações, não é difícil se render ao mau humor. Mas cuidado: esse sentimento de irritação pode fazer mal a sua saúde, o que vem sendo comprovado por estudos científicos.
Mau humor é uma resposta emocional a uma situação desagradável, que nos tira o bem-estar. “Nosso humor tem variações durante o dia”, informa o psicólogo Leopoldo Barbosa, professor da Pós-graduação de Psicologia da Faculdade Pernambucana de Saúde. E nem sempre, reconhece Barbosa, é tarefa fácil manter o alto astral no cotidiano. Imagine um dia em que você está atrasado para o trabalho e no meio do caminho o seu carro quebra. Como não ficar irritado?
Porém, segundo Leopoldo Barbosa existem estilos de vida que podem levar um indivíduo a ser um verdadeiro rabugento. “Pessoas com nível de estresse elevado, em estado de esgotamento, tornam-se mais irritadas”, esclarece o psicólogo. Esse dia a dia estressado acaba por afetar o sono e uma noite mal dormida é um ambiente fértil para o mau humor. “Um sono irregular deixa você cansado e consequentemente irritado” explica Barbosa. A privação do sono inibe a produção de hormônios, como a serotonina, que geram a sensação de prazer e relaxamento.
É certo, porém, que algumas pessoas são mais mal-humoradas que outras. Muitas incorporam o jeito “Seu Lunga” de ser e são o que se pode chamar de pavio curto. Reagem de forma irascível a situações que provocam um mínimo de desconforto. O que leva um indivíduo a se comportar dessa maneira?
Para responder a essa pergunta, segundo o segundo o psiquiatra Everton Botelho Sougey, professor do Departamento de Neuropsiquiatria da UFPE, é necessário compreender como é composta a personalidade de uma pessoa. Ela é constituída por três dimensões: o ambiente cultural que estamos inseridos, a herança familiar e o temperamento, isto é, como somos afetivamente, como nos relacionamos com as pessoas e como como reagimos às situações favoráveis e desfavoráveis. “Uma pessoa pode ter um componente da personalidade que a faz de reagir às situações de forma pouco tolerante, instável, às vezes, explosivas”, explica Sougey, que também é presidente da Sociedade Pernambucana de Psiquiatria (SPP).
A maneira como se convive com as adversidades tem relação, de acordo com Leopoldo Barbosa com a história de vida de cada um, de como se aprendeu a lidar com os problemas, ou seja, pelos traços da personalidade que se moldam ao longo da vida. “Há casos em que se tem um sentimento de culpa, frustração ou tristeza e na tentativa de se livrar desse sentimento buscam respostas como o mau humor. É uma resposta automatizada, um mecanismo de defesa”, resume.
Existem casos, porém, que vão muito além da mera irritação, e se constitui de fato uma doença chamada distimia. A principal característica é quando o estado de mau humor perdura por no mínimo dois anos. São indivíduos com baixa autoestima, de difícil relacionamento, que reclamam muito e só veem o lado negativo das situações. “Trata-se de um humor depressivo, mas não que chega a preencher os critérios de um quadro depressivo”, distingue Souvey.
Para tratar é imprescindível acompanhamento psiquiátrico. Porém o presidente da SPP ressalta que esse tratamento aliado à psicoterapia traz melhores resultados. Mesmo em indivíduos que não apresentam distimia, a psicoterapia pode ser de grande ajuda. E esta é a boa notícia: é possível reverter o mau humor! Na linha psicoterapêutica denominada terapia cognitiva comportamental, o processo acontece levando o paciente a desenvolver o raciocínio para entender o emocional e praticar um pensamento de bom senso. “Ter flexibilidade cognitiva é ter repertório de habilidades para não se chegar ao estado de mau humor. Pessoas mal-humoradas entram num ciclo vicioso e reclamam tanto que se tornam alvo de críticas”, destaca Barbosa.
Um bom exemplo disso é o trânsito. Aí, tem-se duas opções: ou aumenta-se o nível de irritação com os congestionamentos ou aceita-se a situação e busca-se soluções. Leopoldo Barbosa, por exemplo, conta que sai para o trabalho às 6h30. “Se eu sair às 6h40 fico no engarrafamento”. Mais do que se irritar com a situação é pensar nas alternativas.
Outra dica é identificar o que causa alteração de humor para poder modificar a reação. Muitas vezes, como salientou o psicólogo, pode estar relacionado com algum sentimento, como frustração ou tristeza e a psicoterapia também pode ajudar nesse caso. Também é fundamental ter tempo para você, ter horário para se alimentar e manter uma dieta saudável, além de realizar atividade física. “Exercícios físicos são um grande modelador do nosso bom humor, porque estimulam a liberação no nosso corpo das substâncias endorfina, dopamina e serotonina, que são relacionadas ao bem-estar e ao sono”, aconselha Barbosa.
E como mente corpo não podem estar dissociados, saiba que o mau humor traz um prejuízo enorme para o nosso organismo. As pessoas mal-humoradas apresentam tendência a terem mais adrenalina, o que provoca o aumento da glicogenose, isto é, altera a quantidade de glicogênio, substância que está presente nas células e com mais abundância no fígado e nos músculos. Nela são armazenados a glicose obtida pela alimentação. “Essa situação pode provocar falta de ar, hipertensão e aumentar o risco para desenvolver a diabetes tipo 2”, alerta Souvey.
O estado de mau humor também eleva a quantidade de cortisol, hormônio que em excesso pode interferir no sono, provocar desequilíbrios da quantidade de açúcar no sangue e até causar problemas os neurológicos. “Pode inibir a proteína necessária para realizar a conectividades entre os neurônios, a BDNF (sigla em inglês para fator neurotrófico derivado do cérebro).
Portanto, se você quer manter sua saúde física e psíquica, espante o mau humor do seu cotidiano.