O médico infectologista do Hospital das Clínicas da UFPE/Ebserh, Evônio de Barros Campelo Júnior, foi um dos pesquisadores pernambucanos que viajaram em missão humanitária ao Maláui, país do Sudeste da África, atingido pelo ciclone Idai, em março. Ele participa do projeto “Bio and Health Drones” financiado pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Engenharia de Software (INCT) e foi acompanhado pelos também pesquisadores do Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami (Lika) da UFPE, Jones Albuquerque (UFRPE) e Lucas Sampaio (UFPE). A viagem foi financiada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
Além da ajuda humanitária, a missão de 37 dias também teve como objetivo desenvolver trabalhos de detecção de doenças infecciosas e monitoramento em diversas áreas para prevenir novas inundações e surtos de epidemias, como cólera e malária, por exemplo.
Os pesquisadores foram convocados pelo Unicef em caráter emergencial em virtude da situação de crise do país, após a passagem do ciclone em 14 de março, que provocou destruição, inundações e afetou mais de 1,5 milhão de pessoas no Maláui e nos vizinhos Moçambique e Zimbábue. Mais de 700 pessoas morreram e milhares sofrem com doenças endêmicas como cólera, sarampo, malária, além dos casos de tuberculose.
A relação entre o grupo de pesquisadores e o Unicef surgiu com a formalização do convênio entre o Unicef, a UFPE, a UFRPE e as empresas Epitrack e Healthdrones, em janeiro deste ano, para a criação de projetos de troca de conhecimento para uso de tecnologias aplicadas à saúde.
As atividades desenvolvidas no Maláui consistiram em visitar áreas alagadas para capturar imagens por satélite da região, voos com drones, desenhos de estratégias no controle e detecção digital de epidemias (monitoramento da qualidade da água) na região evolvendo principalmente cólera, sarampo e malária, além da assistência prestada à população local com testes rápidos para diagnósticos e tratamento para essas doenças. “Usamos tecnologias inovadoras para realizar o mapeamento das áreas atingidas e foram elaborados algoritmos de predição e prevenção de doenças infecciosas”, explica Evônio.
Quando a equipe foi chamada ao Maláui algumas pesquisas foram feitas previamente sobre o país e devido ao fato de a região não possuir quase nenhuma infraestrutura de internet e de recursos, a equipe constatou que era necessário desenvolver uma tecnologia que não precisasse da internet do local, então, surgiu a possibilidade do uso de satélites. O grupo estudou artigos científicos da Nasa sobre análises de água (potável ou imprópria) por satélite e partir daí desenvolveram a tecnologia. “Nos baseamos na teoria contida nos artigos científicos da Nasa como modelo para criarmos a nossa tecnologia e aplicá-la na prática, dentro da realidade do Maláui”, afirma Jones Albuquerque.
Há precariedade também de infraestrutura de saúde na região. “O cenário é muito difícil, boa parte dos hospitais são precários, não tem médicos todos os dias e muitos dos atendimentos são realizados em clínicas mobile (itinerantes). Também faltam muitos medicamentos e os que têm são provenientes de doações da Organização Mundial da Saúde (OMS). O povo é bem sofrido, mas demonstra grande gratidão. São bem receptivos e bastante solidários”, afirma Evônio, que já havia trabalhado três meses na Nigéria, durante a residência médica, em 2008.
A experiência no Maláui sensibilizou a equipe. “Trouxe a reflexão do que estamos fazendo e o que tem valor, de fato, para a gente, o que tem valor para a vida. Já estive no Maláui antes, mas agora fomos em caráter emergencial, trabalhamos sob demanda. A gente recebia as demandas e executávamos de acordo com as possibilidades que a gente tinha”, explica Lucas Sampaio, do Programa de Pós-Graduação em Biologia Aplicada da UFPE.
“Se não fossem organizações como Unicef e Médicos sem Fronteiras, entre outras, o país não teria assistência pois, aproximadamente 80% da saúde do local não vêm do governo local, mas sim dessas organizações de fora. É realmente uma ajuda humanitária”, explica Jones Albuquerque, pesquisador e professor do Departamento de Estatística e Informática da UFRPE.
O grupo pretende voltar ao Maláui em julho, mas ainda sem uma data específica. Até lá, os pesquisadores monitoram a situação daqui do Brasil mantendo o contato com a equipe do Unicef lá no país africano, por meio de análises sistemáticas de satélite.