“Mercado de imóveis econômicos está otimista com os programas habitacionais” – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

“Mercado de imóveis econômicos está otimista com os programas habitacionais”

Presidente da Ademi-PE, Rafael Simões, analisa como as novas políticas voltadas para a habitação de interesse social podem solucionar os problemas de acesso ao crédito para a população de baixa renda. Afirma também que o segmento de médio e alto padrão pode aquecer com a melhora da economia em 2024.

Pesquisa da FipeZap revela que dos 10 bairros mais caros para morar de aluguel no Nordeste, sete estão no Recife. Segundo o presidente da Ademi-PE (Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Pernambuco), Rafael Simões, isso acontece em razão da baixa oferta de imóveis na cidade e de dificuldades no acesso ao crédito, o que afeta, em especial, a população de baixa renda que se vê obrigada a morar fora da capital.

Apesar dessa situação, Pernambuco tem um orçamento de R$ 2,3 bilhões ao ano, proveniente do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), para investir no Minha Casa Minha Vida. Mas o Estado só executa R$ 1,7 bilhão desse total. Uma contradição que se explica, de acordo com Simões, pela incapacidade dessa parcela da população de arcar com o valor da entrada, que não é financiada pelo programa.

Mas o presidente da Ademi-PE diz estar otimista com a implantação do programa Morar Bem Pernambuco, que subsidia até R$ 20 mil para complementar o financiamento do Minha Casa Minha Vida. Nesta entrevista a Cláudia Santos, ele afirma que esses subsídios estaduais trazem boas perspectivas para o mercado imobiliário em 2024. Rafael Simões também comenta as iniciativas para incentivar a moradia no Centro do Recife e as ações da sua gestão à frente da entidade.

Assistimos a uma melhora da economia, com inflação menor, a Selic em queda lenta e gradual, além de uma estabilidade política. Esse cenário ajuda o mercado imobiliário?

Os ciclos são muito longos no nosso setor, por isso temos que ler o cenário a partir de quatro anos para trás e quatro anos para frente. Nos últimos quatro anos, saímos daquela crise de 2017, dos distratos, quando as empresas tiveram que devolver boa parte do seu faturamento. Isso balançou o mercado nacional inteiro, várias empresas entraram em recuperação judicial, algumas ainda estão. Hoje, isso já mudou o cenário, temos uma lei dos distratos de 2018.

Depois, veio a pandemia. Contratamos uma pesquisa e ela reforça o número que eu sempre repito muito: em 2017 tínhamos 10.500 unidades novas para morar em estoque e hoje temos pouco mais de 4 mil. Houve uma redução de 60%. E habitação é uma demanda inelástica, é igual à comida, as pessoas vão comer de todo jeito, ninguém adia um casamento ou deixa de ter um filho porque está esperando licenciar uma obra ou lançar naquele terreno um apartamento de três quartos.

Quando há uma redução brusca no estoque de unidades novas, isso vai refletir, sobretudo, nos preços do aluguel. A pesquisa da FipeZap mostra que dos 10 bairros mais caros para morar de aluguel no Nordeste, sete estão no Recife. Quando a gente olha a oferta de imóveis econômicos, a Região Metropolitana do Recife produz 6.500 unidades habitacionais/ano, sendo que a capital faz apenas 300 mas tem quase metade da população da RMR. As pessoas de baixa renda enquadradas no Minha Casa Minha Vida são obrigadas a morar fora da cidade porque não tem oferta.

Quando pensamos em política habitacional, após superadas questões de serviços, como mobilidade, nós dependemos de: crédito, que são juros e funding (captação de recursos financeiros para aplicação em um investimento), de demanda, que é demografia e renda, e do item mais importante e um dos mais subestimados que é a política urbana. Ou seja, se tenho um baita estímulo da política urbana, existe o potencial desse terceiro fator superar as dificuldades que o crédito e a demanda oferecem.

Qual a análise que o senhor faz desses três itens?

O crédito é um problema, o mercado não entende que a Selic baixando de imediato vai respingar nos juros baratos da pessoa física, porque existe uma regra do Banco Central que obriga que 65% do dinheiro da caderneta seja destinado ao crédito imobiliário. Se a Selic baixa, naturalmente a poupança também baixa? Não é bem assim, porque o estoque de poupança já está esgotado e a oferta de crédito imobiliário hoje é uma mistura de recursos da poupança com LCI (Letra de Crédito Imobiliário), outros instrumentos mais modernos que têm juros mais altos. Essas questões são relativas ao mercado de médio e alto padrão.

Já o Minha Casa Minha Vida trabalha com recursos do FGTS. Essa montanha de dinheiro, que está em torno de R$ 700 bilhões, é destinada, principalmente para habitação de interesse social. Esse dinheiro a Caixa empresta a 4% e paga 3% para o dono do capital. Está em discussão no STF o ajuste desses 3% para pagar igual à poupança, que hoje daria 6,17%. Então, vai dobrar a remuneração do dono do capital e o custo de aquisição da Caixa. O mercado está um pouco apreensivo com essas questões em relação ao crédito. Vamos agora para a segunda variável, a demanda. Estamos otimistas quanto ao governo. Estamos saindo de crises, fala-se da retomada de Suape em várias obras que podem aumentar a renda. Em relação à demografia, não temos saída e a chegada de pessoas na cidade, não é uma coisa que influencia. Talvez sim do ponto de vista turístico; as passagens estão muito caras e há uma explosão de ofertas de imóveis na área turística. Ninguém sabe o que vai acontecer quando as passagens voltarem aos preços normais. É um ponto a ser observado.

Quanto à terceira variável, a política urbana, é importante que sejam criados instrumentos que estimulem a produção de habitação. Um exemplo: até 2016 não existia oferta de apartamentos econômicos na cidade de São Paulo. Quando verificávamos quantos andares tinha o Programa Minha Casa Minha Vida, era zero. Hoje é metade da produção, sem reduzir o que já era produzido de médio e alto padrão.

O que aconteceu de 2016 para cá?

Simplesmente a prefeitura de São Paulo determinou: quem for construir num terreno destinado à habitação de interesse social, o potencial construtivo será aumentado em 50%. O que é potencial construtivo? As prefeituras, por meio de seus planos diretores e lei de uso e ocupação do solo, definem manchas na cidade nas quais você pode construir coeficientes de 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 enfim. No Recife é até 5. O que isso quer dizer? Coeficiente 1 significa construir uma vez a área do terreno, coeficiente 2, duas vezes e assim vai. Se eu tenho um terreno de 1.000 m² e tenho coeficiente 1, só posso constituir 1.000 m², se o terreno é coeficiente 5, posso construir 5.000m². Então se um terreno é coeficiente 2 e eu vou vendê-lo para alto padrão por, vamos supor, R$ 10 mil ou R$ 20 mil o metro quadrado. Se eu for usar o mesmo coeficiente de área para fazer imóvel econômico, não tem como eu pagar o mesmo valor pelo terreno porque não vou vender por R$ 10 mil ou R$ 20 mil o metro quadrado.

Se as prefeituras entenderem que podem compensar esse efeito aumentando o potencial construtivo, pode ter o resultado que teve em São Paulo. O Recife é a quarta menor capital em área, metade da cidade é unidade de conservação da natureza e rio, 10% são Zeis (Zonas Especiais de Interesse Social). Poucas áreas são corredores de coeficiente 5, fora as regiões de áreas de marinha.

A leitura que fazemos é que as pessoas continuam querendo comprar e estão comprando, o estoque está baixando. Existe aí, talvez, uma oportunidade, há muita demanda e pouca oferta. Não existe setor forte com cidade fraca, a cidade tem que ser forte para o setor ser forte. Para a cidade é muito ruim ter pouca oferta. Se não tem habitação nova, regular, adequada, as pessoas vão consumir que tipo de moradia? Coabitação, aluguel excessivo, habitação precária e, sobretudo, longe de onde estão as ofertas de trabalho.

Existem estudos e intenções da prefeitura para estimular a moradia no Centro do Recife, inclusive recorrendo ao retrofit. Como o setor encara essa iniciativa que tem acontecido também em outras capitais?

Achamos a iniciativa maravilhosa, são regiões que são dotadas de infraestrutura, bem localizadas, acessíveis, têm água, esgoto, luz, transporte, mas existem três problemas brutais em áreas históricas. O primeiro é a questão fundiária, em que um imóvel pode ter 10 ou 20 matrículas, cada matrícula tem 40 herdeiros. Ninguém entra nessa briga. A segunda barreira é a dificuldade de licenciar esse tipo de obra, com o Iphan, a Fundarpe, o Corpo de Bombeiros. Há imóveis que não tem nem janela. E como fazemos? A terceira barreira é que são obras caras. Por que não fazer como Lisboa fez? Só preserva a “casca”, dentro faz o que você quiser.

Mas isso é um processo. Um outro ponto é que a prefeitura disse: “vamos criar um programa e dar redução de ITBI, IPTU e ISS”. É legal, mas não animou o mercado. Tivemos uma reunião recente com o pessoal do Recentro e levantamos a possibilidade de criarmos bonificação, ou seja, se a construtora construir no Centro ela é bonificada com o título que dá direito a ela adensar mais em regiões que têm restrições de construção, como em Boa Viagem que tem restrição de gabarito. Isso foi feito em Belo Horizonte, no Rio. Levamos essa proposta muito embrionária, que precisa mexer em plano diretor. Não é algo fácil reabrir essa caixa preta que foi fechada até o próximo ciclo do plano diretor em 2028.

Como estão as discussões da Ademi com as instâncias governamentais para encontrar soluções que aumente a oferta de imóveis na RMR?

A Prefeitura do Recife está muito antenada. Acho que a equipe do João Campos, as áreas de planejamento, inovação, habitação, licenciamento, o próprio Recentro, são nota 10. Eles fazem as rodadas para escutar vários setores, o comércio, a indústria, e isso é muito positivo porque sentimos que conseguimos transmitir a nossa visão.

Participamos de escutas para a implantação de instrumentos urbanísticos como o EIV, o estudo de impacto de vizinhança. Em Jaboatão fazemos um acompanhamento do novo plano diretor; em Paulista fizemos uma proposta da nova lei de uso e ocupação do solo; no governo do Estado, temos uma relação muito boa com a Simone [Nunes], secretária de Habitação. Ela pediu que contratássemos um estudo para calcular quanto R$ 1 investido no programa Morar Bem volta para o Estado em termos de renda e arrecadação. Estamos formatando esses números, mas podemos adiantar que eles são fantásticos, o governo investe R$ 200 milhões e volta muito mais de R$ 200 milhões para o Estado. Então, estamos bem ativos e antenados com o que os órgãos públicos estão fazendo.

Qual é a previsão do desempenho do setor este ano e a perspectiva para 2024?

Para responder essa pergunta, é sempre importante pensar em dois mercados que possuem componentes próprios de incentivos: o mercado de imóveis econômicos e o de médio e alto padrão. De forma geral, o cenário atual apresenta uma demanda estável/alta e uma oferta em queda, proporcionando condições favoráveis para um aumento na produção de novas unidades. Além disso, há indicadores positivos, como a redução do desemprego do ponto de vista de renda, taxas de juros em queda e um mercado de capitais disposto a oferecer crédito, além do anúncio da prefeitura e do Estado de programas de subsídios complementares ao Minha Casa Minha Vida, o que é uma excelente notícia.

Há um fator interessante. Pernambuco tem um orçamento de R$ 2,3 bilhões ao ano de FGTS, que é o grande ponto de recursos do Minha Casa Minha Vida. Mas só realiza R$ 1,7 bilhão, não consegue executar o orçamento que o FGTS destina. Vários Estados no Brasil são mais eficientes na contratação, como São Paulo, Paraná, Mato Grosso, Goiás. Pernambuco executa 30% a menos do seu orçamento e esses estados executam 30% a mais porque eles têm programas próprios de subsídio às famílias que complementam o Minha Casa Minha Vida.

Isso é necessário porque o programa não financia 100% o valor do imóvel e as famílias que têm um orçamento de, por exemplo, R$ 2 mil não têm capacidade de poupança para arcar com a parte que não é financiada. É aí onde entra o Programa Morar Bem, que vai permitir que o valor da entrada fique praticamente zero.

O mercado de imóveis econômicos está otimista com esses novos programas, que tem o potencial de aumentar a capacidade de pagamento da parcela não financiada. Em Pernambuco, a expectativa do setor é que o Estado performe da mesma forma que outros estados que já possuem programa próprios, ou seja, aumentar o volume de vendas de R$ 2,56 bilhões ano para R$ 4,3 bilhões ano.

Como tem sido a sua gestão na Ademi?

Assumi a Ademi em abril e tenho um perfil um pouco diferente do padrão, porque sou jovem. A gente vem mesclando as gerações que já estão na entidade há muito tempo com as pessoas que estão entrando. Estamos mudando um pouco a dinâmica. Criamos um comitê de política urbana para centralizar essas demandas, temos um trabalho sendo feito com as concessionárias, agora conseguimos uma cadeira na Adepe (Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco) para participar de reuniões com Celpe e Compesa, reativamos a cooperativa de compras que é uma intermediadora, temos 1 milhão de metros quadrados sendo executados dentro da cooperativa. Vamos ter uma empresa incubada na Ademi que fará essa intermediação com grandes fornecedores, para conseguir preço mais barato. Criamos um grupo de loteamentos, que é fantástico, tem uma capilaridade no Estado inteiro. Também criamos um grupo de tecnologia na Ademi muito forte que só reúne os diretores de engenharia das empresas. Estamos criando alguns movimentos dentro da entidade para fortalecê-la.

Recuperamos o troféu Ademi, que é a nossa premiação do mercado imobiliário, com uma baita festa para 600 convidados no Mirante do Paço, que acabou de ser inaugurado. Premiamos os principais empreendedores e os empreendimentos que mais se destacaram. Temos um prêmio de sustentabilidade, que é uma premiação nova dando esse enfoque ao meio ambiente. O grande objetivo foi confraternizar e poder mostrar a Ademi. Só dos inscritos no troféu Ademi, temos 700 mil m² em quatro anos e R$ 4,1 bilhões de investimento. Estamos falando de uma fábrica da Fiat a cada quatro anos de um pequeno grupo, que gerou empregos e arrecadação para o Estado e os municípios. Então, é um setor muito forte que merece ter a atenção para o tamanho que ele tem.

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