Nova tecnologia permite classificar o tumor cerebral mais comum em crianças - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Nova tecnologia permite classificar o tumor cerebral mais comum em crianças

Revista algomais

André Julião – Uma metodologia de baixo custo para classificar os diferentes tipos de meduloblastoma, tumor maligno do sistema nervoso central mais comum em crianças, foi desenvolvida por um grupo de pesquisadores em São Paulo em colaboração com colegas de instituições na Suíça e na Alemanha.

O novo método tem precisão semelhante à das caras tecnologias para sequenciamento de última geração e dá subsídios para a tomada de decisão quanto ao melhor tratamento mesmo em países com poucos recursos.

Agenda TGI

Os resultados da pesquisa, apoiada pela FAPESP, foram publicados na revista Acta Neuropathologica Communications.
Os pesquisadores avaliaram tumores de 92 pacientes, de 1 a 24 anos de idade, atendidos no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, em São Paulo, e no Centro Infantil Boldrini, em Campinas.
Para isso, usaram o método conhecido como PCR (reação em cadeia da polimerase) em tempo real (qPCR), que demanda o uso de equipamento que custa em média US$ 30 mil e é bastante comum em laboratórios de genética e em alguns hospitais brasileiros, de acordo com Gustavo Alencastro Veiga Cruzeiro, que realizou o trabalho durante o doutorado na FMRP-USP, com Bolsa da FAPESP.

Em uma primeira rodada, os cientistas verificaram a expressão de 20 genes associados ao meduloblastoma, dois a menos que os normalmente analisados em tecnologias mais caras, como o NanoString nCounter. O custo da análise de cada amostra foi igual em todas as tecnologias: US$ 60, valor idêntico às tecnologias de alta precisão disponíveis para a avaliação da expressão dos genes em tumores, de modo a permitir sua classificação em subgrupos.

Mas os pesquisadores foram mais longe: observaram também por qPCR que a expressão de apenas seis genes-chave nas amostras tumorais era suficiente para definir o grupo a que pertenciam. Com isso, o custo baixou para US$ 26 por amostra.

Os resultados foram confirmados por meio de um programa de computador e da aplicação de um algoritmo em 763 amostras de meduloblastomas, depositadas em um banco de dados e previamente classificadas em institutos internacionais.
Por fim, 11 amostras aleatórias, das 92 coletadas no Brasil, foram enviadas para o Hospital Infantil de Zurique, na Suíça, e para o Centro de Câncer DKFZ em Heidelberg, na Alemanha, para serem analisadas por tecnologias mais caras e usadas rotineiramente. As análises foram autorizadas pelos doadores das amostras.
“Os equipamentos usados nos países desenvolvidos para a classificação têm valor aproximado de US$ 280 mil na América do Sul. Os insumos usados na análise também têm preço elevado. Isso torna bastante oneroso identificar o subgrupo em que o tumor está inserido e, assim, selecionar o tratamento mais adequado”, disse Cruzeiro.
Mudança de protocolo

A pesquisa é parte do Projeto Temático “Interação entre alvos terapêuticos emergentes e vias de desenvolvimento associadas à tumorigênese: ênfase em neoplasias da criança e do adolescente”, coordenado por Luiz Gonzaga Tone, professor na FMRP-USP.
“O projeto tem como objetivo obter novos conhecimentos sobre os mecanismos moleculares envolvidos na carcinogênese de alguns tumores pediátricos e as possíveis interações nas vias moleculares de desenvolvimento, procurando viabilizar melhores critérios de classificação e de abordagem do tratamento. No caso do meduloblastoma, vimos que o critério de classificação molecular é fundamental”, disse Tone, que coordena o Grupo de Pesquisa em Oncologia Molecular Pediátrica (GPOMP).
O protocolo padrão para o tratamento do meduloblastoma, que pode afeta diferentes áreas do cerebelo, é normalmente composto por remoção cirúrgica do tumor, quimioterapia e radioterapia.
Recentemente, porém, foram descritas quatro variedades do tumor, que requerem terapias com diferentes graus de agressividade. Dentre elas, há duas que respondem melhor ao tratamento.
Entre os pacientes com tumores do subgrupo conhecido como WNT, a sobrevida pode ser de até 90% em cinco anos após o término do tratamento, um prognóstico considerado muito bom. Esse grupo, portanto, pode receber uma carga menor de radiação ou mesmo ser dispensado dessa terapia, que pode deixar sequelas como problemas no desenvolvimento, na cognição, de locomoção e de fala.
A segunda variedade tumoral, conhecida como SHH, tem prognóstico intermediário, com uma parcela dos pacientes respondendo bem ao tratamento e outra nem tanto. O tratamento mais sugerido para esses casos é a chamada terapia-alvo, com inibidores específicos de uma proteína-chave. No entanto, os estudos existentes mostram que parte dos pacientes ainda não responde a esse tratamento em razão da diversidade na população de células desse tipo de tumor.
As outras duas variedades são conhecidas como Grupo 3 e Grupo 4 e são as que mais apresentam metástase. Por esse motivo, exigem uma abordagem mais agressiva de tratamento. No entanto, a biologia desses subgrupos continua pouco conhecida.
“No Brasil, não há a adoção dessa abordagem molecular usada na Suíça, Alemanha e Canadá, entre outros países. Nesses locais se faz a verificação do subgrupo do tumor e, então, opta-se por um tratamento de maior ou menor intensidade”, disse Cruzeiro, que atualmente faz estágio de pós-doutorado no Massachusetts General Hospital, da Harvard Medical School, nos Estados Unidos, com apoio da FAPESP.
No Brasil, segundo Cruzeiro, os pacientes com meduloblastoma seguem basicamente o mesmo protocolo de tratamento, com ressecção, quimioterapia e radioterapia, com exceção de alguns casos, como crianças com menos de três anos.
Com isso, um paciente do grupo WNT, por exemplo, que talvez não precisasse de radioterapia, acaba recebendo um tratamento que seria indicado para uma pessoa com risco de metástase. Mesmo eliminando o tumor, o tratamento pode afetar a qualidade de vida da criança para sempre.
Cruzeiro alerta, porém, que nem sempre o qPCR possibilita um resultado preciso. Existe de 5% a 10% de chance de o método não classificar o tumor em nenhum grupo. Esses casos, porém, correspondem a uma minoria que precisa ser submetida aos métodos mais onerosos.
“Em países da América Latina, da África e na Índia, esse método de baixo custo pode classificar satisfatoriamente a maior parte desses tumores e proporcionar informações importantes para a tomada de decisões clínicas”, disse.

Por Agência FAPESP

Deixe seu comentário

+ Recentes

Assine nossa Newsletter

No ononno ono ononononono ononono onononononononononnon