Nove dicas de filmes irresistíveis – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

Nove dicas de filmes irresistíveis

*Por Beatriz Braga

De vez em quando eu penso em Wadjda. Ela queria ter uma bicicleta, mas vivia na Arábia Saudita, onde coisas muito simples são difíceis se você é uma garota. Seu melhor amigo tinha uma magrela e ela só descansaria quando ganhasse dele em uma corrida. Entre a menina de 12 anos e seu objeto de consumo existia um mundo machista e cruel. A bicicleta era seu ato de resistência.

O filme é o “Sonho de Wadjda” e me lembro dele frequentemente, quando penso nas barreiras que enfrentamos no Ocidente por sermos mulheres. Visualizo nelas a bicicleta, penso na persistência da garota árabe e recarrego meu otimismo. Do mesmo jeito, toda vez que me enxergo presa às agruras da busca da beleza inalcançável ou da pressão da vida perfeita que nos rodeia, eu penso em Frances. Desajeitada, meio patética e sorridente dançando Bowie nas ruas de Nova York. Ninguém disse que seria fácil, então fazer o que? Bailemos!

As personagens dos meus filmes preferidos me cercam no dia-a-dia, me energizam e me inspiram. De vez em quando, por exemplo, me encontro no carro com Thelma e Louise, naquela estrada revolucionária, afugentando os machismos encontrados pelo caminho.

São tantas mulheres poderosas que me rodeiam, não apenas na vida real, mas na ficção também. Por isso decidi apresentar uma lista de filmes que me acompanha, quem sabe algumas personagens vocês ainda não conhecem e possam virar suas parceiras também.

1 – O SONHO DE WADJDA (2012)

Foi o primeiro filme produzido dentro da Arábia Saudita e tem uma mulher como diretora, Haifaa A-Mansour. Wadjda é a garota que quer a bicicleta verde e tem atitudes que são pequenas revoluções no seu dia a dia, tais como usar tênis e ter um melhor amigo. O filme é a visão da vida das mulheres árabes aos olhos de uma garota que ainda está aprendendo o lugar que reservaram para ela. Ela não tem nada a ver com o mundo em que vive e isso é lindo, inspirador e delicioso. Um filme que você não verá o tempo passar e talvez leve para sua vida como eu fiz.

2 – TRANSPARENT (2014)

Beatriz outubro 6

Existe vida além do Netflix! O melhor seriado lançado nos últimos tempos é produção da Amazon (disponível no Amazon Prime Video) e já está na quarta temporada. Recomendo que você não fique mais nem um dia sem assisti-lo. A trama conta a história de um pai de três filhos, Morton, que decide assumir a identidade na qual se reconhece, Maura. O começo não é fácil, mas o relato delicado, sensível e divertido do dia a dia da família vai mostrando a evolução dos personagens, que vão confrontando suas próprias sexualidades e preconceitos. “Transparent” (perceba o jogo de palavras) fala sobre família, autoconhecimento, coragem, afeto e amor. Não lembro de nenhum outro seriado que tratou o tema tão bem como esse. Além de importantíssimo, é uma série leve e deliciosa de assistir. Vida longa à produção!

3 – SHE´S BEAUTIFUL WHEN SHE´S ANGRY (2014)

beatriz outubro 8

Um documentário sobre as mulheres corajosas dos anos 1960, que fizeram parte da segunda onda do movimento feminista. O título é uma menção à forma condescendente com que somos tratadas em nossas lutas diárias, que ainda persiste neste século, assim como muitas das pautas retratadas no filme.
O documentário é uma ótima introdução a nomes importantes da briga pelos direitos femininos. Além de ser uma lembrança de que avançamos muito por conta dessas mulheres e, em memória de suas lutas e esforços, é preciso persistir e continuar lutando. Disponível no Netflix.

4 – A MULHER MAIS ODIADA DOS ESTADOS UNIDOS (2017)

Most Hated Woman In America
Most Hated Woman In America

Esse não é um dos melhores filmes que já vi, mas o considero bem importante, principalmente para nós, brasileiros. Se você tiver um tempinho, conheça a história de Madalyn Murray O’Hair, que militou em favor da causa ateísta, tornando-se odiada por muitos cristãos nos Estados Unidos. Um assunto que deveria ser discutido no nosso país, mas é deixado de lado. Enquanto isso vemos a religião tomar o lugar da política de forma muito perigosa.
Madalyn foi a criadora da associação Ateus Americanos e conseguiu feitos como acabar com a oração matinal e a leitura da Bíblia das escolas onde vivia. A mulher decidiu agir quando seu filho disse uma frase que volta e meia me vem à cabeça: “Você sempre diz o que há de errado com as pessoas, mas nunca faz nada a respeito. Você só reclama”. Disponível no Netflix.

5 – FRANCES HA (2012)

https://www.youtube.com/watch?v=73z_w-wbz_Q

Frances já não é tão nova e ainda não tem um rumo certo na vida. Desajeitada, muito bem humorada, se mete em situações desastrosas e patéticas, sem perder a vocação para sonhadora e o sorriso no rosto. A protagonista vai aprendendo que os planos que tinha nem sempre foram os mais certeiros, ao mesmo tempo em que o resto das pessoas parece estar com o futuro todo organizado.
A trilha sonora é maravilhosa, a protagonista é adorável e acho que, em algum momento, é sempre possível nos identificarmos com Frances. Uma comédia com toques dramáticos, amável e inspiradora. A vida nem sempre vai “dar certo”, mas Frances nos lembra que o importante é não perder o gingado. Disponível no Netflix.

6 – AS SUFRAGISTAS (2015)

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Estrelado, dirigido e produzido por mulheres. “As Sufragistas” conta a história do grupo de mulheres britânicas que lutou contra o sistema machista inglês no começo do século passado. Elas sabiam que eram dignas do voto e resolveram lutar por isso, mesmo que significasse uma vida de prisões, perseguições e sofrimentos. Tudo para que, hoje, esse direito também seja nosso.
Inicialmente pacífico, o movimento recebe respostas truculentas da polícia e responde na mesma moeda. “A guerra é a única coisa que o homem ouve. Vocês nos bateram e nos traíram e agora não nos sobrou mais nada”, diz a protagonista, Maud Watts.
Quando o filme acaba, a tela em preto é um soco no estômago. Sobe uma lista com datas nas quais o sufrágio feminino foi aceito em vários lugares do mundo. Menos de 100 anos atrás, Inglaterra, França, Brasil e a grande maioria dos países ainda considerava que apenas os homens eram dignos o bastante para votar. Um filme intenso, belo e inspirador.

7 – PERSEPOLIS (2007)

persepolis
Meu preferido! Uma animação linda e emocionante sobre uma garota de 10 anos que vê seu país, o Irã, entrar em uma onda conservadora e avassaladora após a Revolução Islâmica. De repente, Marji é brigada a usar véu, perde o direito de caminhar tranquilamente na rua e de fazer coisas banais, como ouvir música. A animação francesa é baseada nos quadrinhos autobiográficos da escritora Marjane Satrapi e a protagonista é seu alter ego.
A derrocada da esperança, a tristeza em ver seus pais presos ao regime totalitário, a busca por liberdade fora dali, tudo em uma narrativa muito sensível que, surpreendentemente, não deixa de lado o bom humor. Entre risadas e pequenas resistências, esse filme se faz extremamente necessário. Lindo, lindo e lindo.

8 – HISTÓRIAS CRUZADAS (2011)

Beatriz outubro 5
No Mississippi dos anos 1960, o racismo e o machismo comandavam a vida das mulheres negras da cidade. O filme conta a história de Skeeter, uma garota branca e privilegiada, que decide entrevistar as mulheres negras da região e contar as batalhas dos seus dia a dia. A vida das mulheres que precisam deixar suas vidas para cuidar dos filhos brancos e ricos de seus patrões se cruza com a vida de uma mulher rica que, apesar de sua posição, também sofre com os machismos do mundo em que vive. Prepare os lenços e o coração! Um relato emocionante e muito relacionado com a herança escravocrata ainda presente nos dias atuais. Disponível no Netflix.

9 – THELMA E LOUISE (1991)

thelma e louise
Esse é clássico, mas ele não poderia deixar de estar aqui. É uma delícia rever despretensiosamente as aventuras da garçonete radical e da dona de casa previsível. Elas jogam tudo para o alto e vão se divertir, on the road, se metem em confusões irreversíveis e acabam em apuros.
Existe aí uma linda metáfora de duas mulheres transgredindo em um mundo machista, com regras feitas por e pelos homens. Elas estão cansadas de serem comandadas, de terem que lidar com a violência, do assédio e da monotonia. Elas são revolucionárias e vão até o fim. Eu amo esse filme e, quem sabe, mais tarde, não vou rever tudo de novo até me deleitar com a última cena e recarregar minhas energias.

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