O inhame da Costa - Revista Algomais - a revista de Pernambuco
Cultura bem temperada

Cultura bem temperada

Raul Lody

O inhame da Costa

Ingredientes, receitas, e comidas em âmbito cultural, social e litúrgico, identificam as matrizes africanas, trazem memórias ancestrais, sabedoria e identidades de povos e de civilizações. Destaque para as tradições do golfo do Benin, também conhecido como Costa, “costa dos escravos”, “costa da malagueta”, “costa dos grãos”, “costa do ouro”. Nela estão os Iorubá/Nagô, co-formadores dos patrimônios culturais do Nordeste, em especial, de Pernambuco.

O inhame, raiz tuberosa, da família das Aráceas, está integrado ao imaginário da criação do mundo para o povo Iorubá, e às tradições religiosas dos Iorubá/Nagô no Brasil. .
A designação inhame, ainda hoje, é dada às diversas espécies dos géneros Dioscorea, Colocasia, Alocasia e Xanthosoma.

O inhame, ou “inhame branco”, é chamado em Pernambuco de “inhame da Costa” e “cará-inhame São Tomé”, o que preserva a sua identidade de procedência africana, no que se pode entender por “terroir”.

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O inhame é base para diferentes cardápios, consagradamente de matriz africana, e de consumo litúrgico nas comunidades de terreiro. Ao mesmo tempo, o inhame é uma base alimentar do cotidiano, juntamente com a macaxeira, a farinha de mandioca, o jerimum; entre os demais ingredientes que dão identidade à mesa regional.

Por representar a fertilidade, o inhame integra vários pratos dedicados a diferentes orixás. O orixá Ogum, também agricultor e caçador, gosta do inhame assado e coberto com azeite de
dendê; ou ainda o inhame cru. As bolas feitas com a massa do inhame apenas cozido na água, e insosso, é um complemento para receitas de caças, peixes e legumes. Essas bolas também podem ser condimentadas com pimentas, dendê, e outros temperos. O amalá é um pirão feito de farinha de inhame, segundo as receitas tradicionais iorubá; que também pode ser feito com o inhame cozido e amassado, e complementado com um guisado de quiabos, azeite de dendê, carne, pimenta e outros temperos. Esse guisado, em Pernambuco, chama-se begueri, comida ritual do orixá Xangô.

Outro prato do cardápio litúrgico é o “peté” ou “ipeté” é feito com o inhame cozido, acrescido de camarões, cebola e azeite de dendê, sendo comida ritual do orixá Oxum.
Inhame cozido na água e sal, feijões cozidos no azeite de dendê, milho branco cozido, pedaços de coco seco, carne temperada de aves, formam uma comida ritual dos orixás gêmeos – ibejis.

_ Isso me traz a lembrança de um cântico especial para oferecimento dessa comida:
“Epo mbe, ewà mbe, isu mbe”
(tem azeite de dendê, tem feijão, tem inhame)
Muitos outros pratos são criados a partir do inhame para a cozinha ritual e para a cozinha do cotidiano nas casas, nas feiras, nos mercados, nos restaurantes. O inhame é rico em ferro, cálcio, fósforo, vitaminas do complexo B.
O maior produtor de inhame no mundo é a Nigéria, país da África Ocidental, onde se encontram os Iorubá/Nagô.
Contudo, o inhame abrasileirou-se e integra as nossas receitas, compõe o nosso paladar. É uma escolha cultural, uma forma de marcar identidade à mesa.

RAUL LODY.

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