O Que Faz Teus Olhos Brilharem? - Revista Algomais - A Revista De Pernambuco
Reticências

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Manu Siqueira

O que faz teus olhos brilharem?

Outubro de 2025. Belo Horizonte. Depois de alguns dias de férias colecionando histórias por Inhotim, Ouro Preto, Mariana e Lavras Novas, chego finalmente a BH para conhecer pessoalmente Marina. Marina Mendes, ou Sá Marina, como ela gosta de ser chamada. Virtualmente, já éramos amigas há, pelo menos, seis anos.

Marina vivia em Toulouse, na França, onde mostrava seu cotidiano no Instagram e todas aquelas pâtisseries maravilhosas. Eu, que amo doces, tratei logo de segui-la, depois de ver seu perfil compartilhado por uma amiga. Chegamos a ensaiar um projeto juntas, veio a pandemia, o projeto foi engavetado, mas a amizade seguiu firme e forte.

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Uma série de acontecimentos me levou a querer estar em Minas Gerais este ano. E, claro, com Marina. Esperei ela lançar seu evento, o Origem, para, a princípio, fazer uma surpresa. Passagens compradas e voilà: rumo a esse encontro tão esperado por mim.

No local do Origem, uma experiência que reúne os cinco sentidos, Marina desceu as escadas acompanhada por um sanfoneiro, que tocava um forrozinho. A sensação foi de voltar pra casa, pra um aconchego que parece que só o Nordeste tem. Marina, que é baiana, arriscou uma cantoria improvisada, com poemas e causos do homenageado da noite: Ariano Suassuna.

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Eu não sabia disso. Meus olhos marejaram instantaneamente. Fui vizinha de Ariano no começo dos anos 2000, quando morava em Casa Forte, na zona norte do Recife. A noite, que misturava sons, sabores, cenas e cheiros, ficou ainda mais especial com um convite: trocarmos de lugares e criarmos conexões.

Marina, irradiando uma luz tão forte, preparava os pratos ali mesmo, na nossa frente, enquanto nos divertíamos e conversávamos com o recém-conhecido ao lado. Uma noite memorável, longa, gostosa, degustada gole a gole.

Em um dado momento, ela lança: “O que faz teus olhos brilharem?” Todo mundo tinha que responder. Eu fui uma das últimas. Fiquei meio em pânico com a pergunta simples, mas profunda. Aliás, aqui em casa, na porta de entrada, tenho uma plaquinha que diz: “Te desejo brilho nos olhos.”

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Voltando à pergunta, eu não sabia o que responder. Tava meio apavorada. Todo mundo estava dando respostas tão bonitas, e eu simplesmente não sabia o que dizer. Pensei: faz muito tempo que não sinto meus olhos brilharem. Faz tempo que não me jogo em algo novo, que não subo no palco pra cantar com meu cantor preferido, que não tenho um projeto que me deixe eufórica, que não me arrisco em paixões fulminantes, que não descubro uma nova arte.

Aquela pergunta me paralisou por um momento. Será que todas nós estamos meio assim? Meio sem brilho nos olhos? Respondi que, mesmo diante da perversidade humana, algo que me faria brilhar os olhos seria voltar a acreditar no ser humano. Voltar a acreditar que um dia a paz vença a guerra e que viver seja só festejar, como bem diz a música.

Voltei para o hotel cheia de brilho nos olhos.

Dois dias depois, fui me despedir de Marina. Ela me recebeu em sua casa, seu lugar sagrado no mundo. Um espaço tão impregnado dela, não só na decoração e no piso de ardósia, mas também em toda a atmosfera. Café quentinho, coado na hora; bolinho de fubá com coco e pão de queijo com mel para “chunchar”.

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Ela contou que conheceu Vitinho, seu marido, aos 16 anos, e que pediu muito a Deus para ter uma filha diferente. E teve. Eduarda, uma encantadora menina de 13 anos, é “fora da caixa”. Vocalista de uma banda de rock, ela ama arte, idiomas e natureza. Não faz dancinhas no TikTok nem tutoriais de maquiagem na internet. Está preocupada com o futuro do planeta e com como vamos reverter os males ambientais da Terra. É emocionante vê-la falar da filha!

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Acho que a vida é, sim, a arte dos encontros. Despedi-me de Marina, no portão da casa dela, com a nítida impressão de que já nos conhecíamos. E o melhor: com a certeza de que uma amizade pode se construir longe ou perto, mas, se ela se constrói dentro, essa nunca mais se esvai.

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*Manu Siqueira é jornalista

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