O velho Raul Moraes – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

O velho Raul Moraes

“(…) Na alta madrugada o coro ensaiava | Do bloco a marcha Regresso | E era o sucesso dos tempos ideais do velho Raul Moraes (…)”

Nesses tão poucos versos, o grande Nelson Ferreira homenageou, na sua Evocação nº 1, Raul Moraes, aquele que está em um dos frevos de maior sucesso, mas que, mesmo assim, poucos sabem dele. Agora, se você está no rol dos que não sabem, nestas poucas palavras vai passar a saber.
Para começar, o recifense Raul Moraes nasceu no dia 2 de fevereiro de 1891 e morreu no dia 6 de setembro de 1937. Acabou-se a narrativa? Não. É pelo que ele fez no intervalo entre as duas datas 46 anos demasiadamente breves, que na já falada Evocação o maestro Nelson Ferreira classificou o tempo em que ele viveu como os tempos ideais do velho Raul Moraes.
Mas, afinal, quem foi Raul Moraes? Foi um compositor, instrumentista e regente que, graças ao seu talento, ganhou merecido reconhecimento. Músico formado na Alemanha, foi um dos principais compositores de frevo do início do século passado. Era o irmão mais velho do também músico Edgard Moraes, com quem participou de diversos blocos carnavalescos.
No começo da carreira foi pianista, tocando nas grandes casas de diversões do Recife, entre elas, o Café Chic Juventude e o Cineteatro Helvética. Depois passou a atuar como pianista da dupla de cançonetistas Os Geraldos, com quem excursionou pelo País, percorrendo-o de norte a sul.
No Sul, após apresentar-se em Porto Alegre, foi convidado para ministrar aulas na respeitada Academia de Canto Musical daquela cidade. Aceitou, e gostou tanto daquelas paragens, que lá viveu durante os 10 anos que se seguiram. Estava aclimatado, mas como a força do amor pela cidade onde se nasce e cresce é, muitas vezes, tão grande que se torna incontrastável, ele retornou ao Recife, onde passou a se dedicar integralmente à música. Teve início uma fase de vibrante criatividade, em que ele compôs marchas de Carnaval para inúmeros blocos da cidade, participou de vários festivais de música, trabalhou como maestro na Rádio Clube de Pernambuco, regeu as orquestras dos blocos Pirilampos de Tejipió e o Bloco das Flores e foi sagrado Príncipe das Marchas de Bloco.
Aqui, Raul Moraes compôs algumas das suas mais belas melodias. Foram marchas, valsas, hinos religiosos, foxtrotes, dobrados e marchas patrióticas, das quais muitas vieram a ser gravadas por alguns dos maiores nomes da música popular brasileira de então. A canção Na praia, por exemplo, foi gravada na Odeon pelos Turunas da Mauriceia, com o cantor Augusto Calheiros como vocal.
Em 1930, Francisco Alves, o Rei da Voz, naquela época o maior cantor do Brasil, gravou as marchas Cruzes…figa pra você e Aguenta quem pode. No mesmo ano, mais 10 das suas composições foram gravadas. Paraguaçu e Zilda Morais gravaram o samba Meu bem vem cá e o maxixe Tá tudo se acabando. Elsie Houston gravou a modinha Por teu amor, por ti.
Januário de Oliveira gravou as marchas Eu só gosto é de você e Regresso, e em dupla com Elsie Houston gravou a marcha Tá zangadinha? Tem mais: a canção Rosa do sul foi gravada por Paraguaçu, a marcha Eu só digo a você, por Ildefonso Norat, a canção O beijo, por Abgail Parecis, e o coco Lenhadô, por Stefana de Macedo. Em 1999 a sua Marcha da folia foi gravada por Antônio Nóbrega no CD Na pancada do ganzá e em 2008, teve a música Valores do passado gravada por André Rio, no CD Cem Carnavais.
Antes, em 1974, foi lançado pela então existente gravadora pernambucana Rozenblit o LP Edgar e Raul Moraes, contendo algumas das músicas de sua autoria, com destaque para Marcha da folia, Adeus pirilampos, Despedida e Batutas brejeiros, esta feita em homenagem ao Bloco Batutas da Boa Vista.Raul Moraes está presente na discografia brasileira desde 1918 com o samba carnavalesco Iaiá me Diga, gravado por Geraldo Magalhães e lançado pela gravadora Phoenix, hoje inexistente.
Você, provavelmente, acaba de conhecer um pouco do compositor, letrista, pianista e arranjador Raul Moraes, um artista pernambucano que produziu um grande repertório de ritmos diversos, que compôs tango, valsa, foxtrote, marcha, frevo de bloco, fado, e que criou, além da música, classificações curiosas para as suas obras, tais como samba carnavalesco, canção regional, cantiga carnavalesca, marcha patriótica..
Adeus pirilampos, Aguenta quem pode, Batutas brejeiros, Cruzes… figa pra você, Despedida, Eu só digo a você, Eu só gosto é de você, Lenhadô, Marcha da folia, Meu bem vem cá, Na praia, O beijo, Por teu amor por ti, Regresso, Rosa do sul, Tá tudo se acabando, Tá zangadinha?, Valores do passado são algumas das suas músicas. Como se vê, trata-se de obra vasta, múltipla, versátil, que embalada nas asas das apresentações de Raul Moraes levou o talento pernambucano a diversos países, a exemplo de Argentina, Alemanha e Portugal. Foi uma criatividade que venceu limites, divisas e fronteiras.
Raul Moraes pertenceu a um tempo em que o Carnaval era uma festa do corso, das batalhas de confete e serpentina, de amores que foram infinitos enquanto duraram e de outros tantos que duraram toda a vida, embalados pela beleza e poesia. Foi um tempo em que as letras das músicas não tinham duplo sentido, que simplesmente cantavam o amor e mais pareciam, assim, poemas musicados.
Quer um exemplo? Atente para a letra da Marcha da folia e veja por que Raul Moraes está, eternamente, na memória do carnaval pernambucano: Bloco das Flores por onde passa/ Semeia com tal graça ao som de lindas canções/E os esplendores dessa alegria/ Que as almas extasia | E apaixona os corações./Viva a folia do Carnaval | Intensa alegria sem outra igual/Que olvidar faz a dor ferina/E nos ensina a sorrir e amar/Temos na vida só dissabores/Tristezas, amargores e a desilusão final/Mas de vencida o mal levamos/E esqueçamos que sofremos divertindo o Carnaval/ Viva a folia do carnaval|Intensa alegria sem outra igual/Que olvidar faz dor ferina | Que nos ensina a sorrir e amar.

*Por Marcelo Alcoforado

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