*Por Rafael Dantas
As atividades dos Arranjos Produtivos Locais contribuem para o desenvolvimento econômico e social de várias cidades do interior de Pernambuco e representam um incentivo à manutenção das populações no campo. Além do cultivo e da criação de animais nas zonas rurais, esses produtores avançaram nos últimos anos com o beneficiamento e regularização de seus produtos, agregando mais valor ao seu trabalho e alcançando novos mercados.
A pandemia também os afetou, em especial no escoamento da produção. Nesta entrevista concedida à Revista Algomais, Álvaro Eugênio, gerente geral de fomento dos Arranjos Produtivos Locais da Adepe (Agência de Desenvolvimento de Pernambuco), fala sobre como os diversos APLs de Pernambuco estão enfrentando os efeitos nocivos da chegada da Covid-19 e quais as contribuições do programa Força Local para a maior competitividade e retomada das atividades desses pequenos produtores.
Qual o cenário atual dos Arranjos Produtivos em Pernambuco?
Os Arranjos Produtivos Locais de Pernambuco possuem várias nuances e potencialidades. Hoje a gente trabalha com uma concepção mais ampla de Arranjos Produtivos Locais. Pelo conceito, precisaria ter uma governança, estar situado dentro de uma região geográfica específica para ter acesso às instituições de crédito e pesquisa.
Atuamos no apoio de vários arranjos produtivos importantes. A produção de café, de mel e de leite de cabra são relevantes, mas não só trabalhamos apenas com esses. Há diversos segmentos econômicos que julgamos importantes também, como a mandioculturura. Há alguns produtos que podem se concentrar em algumas regiões, mas há outros estão presentes no estado inteiro.
Como acontece o apoio do poder público para esses produtores?
Temos um programa formatado para fortalecer esse programa que é o Força Local, da Adepe. Ele foi constituído desde 2019, onde nossa atuação se dá por meio de editais. As entidades privadas sem fins lucrativo submetem o projeto e se for aprovada recebem o fomento não reembolsável. É uma politica de desenvolvimento econômico para o interior do Estado.
Qual o impacto da pandemia nesses APLs?
A pandemia criou uma situação um pouco complicada. O escoamento da produção realmente ficou mais comprometido. Algumas feiras locais tiveram dificuldade de abrir, o isolamento necessário levou a falta de escoamento de produção do campo, um problema maior para os produtos mais perecíveis. A atividade da caprinovinocultura, por exemplo, teve dificuldade de expor seus produtos nas feiras municipais. A pandemia complicou esses APLs e a agricultura familiar de forma geral.
Qual o momento desses segmentos?
Vivemos um momento de retomada. O programa tem dado certo no apoio a esses produtores. Temos contato com muitas associações de produção, mais de 90 projetos foram aprovados desde 2019. Já foi investido, somadas as contrapartidas, mais de R$ 20 milhões.
Quais as principais demandas dessas associações?
Todo arranjo produtivo que pudemos adentrar tem 3 grandes gargalos em sua produção. O primeiro é de gestão. São entidades privadas sem fins lucrativo, então apoiamos o coletivo. Existem muitas pessoas que são mais individualistas. Então é preciso investir na coletividade, na gestão e na regulamentação desses grupos, até porque todos os seus produtos precisam estar regulamentados. Então o primeiro trabalho é de sensibilização à formalização.
A segunda demanda é da aquisição de equipamentos para estrutura física, investimentos na própria unidade de produção fabril. Tacho para produção de doce, despolpadeiras para fzer polpa e em algumas situações até pequenas construções.
O terceiro gargalo está na logística de escoamento da produção. Apoiamos tanto para disponibilizar esses produtos em grandes feiras que acontecem no Estado, como na aquisição de caminhões. Alguns precisam de caminhão-baú refrigerado para escoar queijo ou carne, por exemplo.
Qual a importância do APL de Café em Taquaritinga do Norte?
Esse é um projeto muito bom. Temos um café de Pernambuco que os próprios pernambucanos precisam conhecer, mas poucas cafeterias que fornecem. Taquaritinga é o maior produtor do Estado. O APL vive um processo de retomada após alguns anos de seca que prejudicaram nossos cafezais. Estamos colocando nosso café de novo em evidência, são mais de 400 produtores de café nessa região que tem um microclima adequado e diferenciado para quem é consumidor de cafés especiais. Temos um projeto em execução. A associação de produtores de café fez o requerimento de uma série de equipamentos, como torra, embaladoura a vácuo, tem um equipamento específico para detectar unidade. São investimentos para beneficiar o café. Esse segmento viveu um crescimento bem razoável e tem cerca de 9 marcas proprias de café na região, de produtores distintos. Mas são produtos que precisam ser mais conhecidos, ter mais ações de marketing para que a RMR os conheça.
Qual o cenário da produção de mel no Estado?
Mel é um produto que sou apaixonado. É muito incrível. Primeiramente, é importante ressaltar que temos mel no Estado inteiro, do litoral ao sertão. A grande concentração é na chapada do Araripe, em municípios como Ipubi, Araripina e Moreilândia. São centenas de produtores de mel e muitas associações em atividade
A gente tem um gargalo bem interessante nesse segmento. Temos um desafio de justamente promover a montagem e estimular a operação das casas de mel. São estabelecimento onde se faz o beneficiamento do mel. As colmeias vem do campo, é retirada a cera, coloca na centrífuga, depos é filtrada e embalada. É necessario um selo de insperção estadual da Adagro. Nosso desafio é na formalização disso, estamos trabalhando junto às associações de mel para ter selos e vender esses produtores nos supermercados. Os desafios estão estão em garantir a produtividade das casas de mel com certificação e também buscar o selo do Serviço de Inspeção Federal. Hoje não temos um estabelecimento com esse selo que permitiria exportar esse mel, que é muito procurado. Esse é um problema conhecido. Sem esse selo não poderia sequer ir para outro estado.
No força local tem uma série de projetos de todas naturezas para apoiar essa cadeia, como na compra de equipamentos, melhoria das estruturas físicas e vários projetos de regulamentação, organizando esses apicultores. Exitem alguns projetos de apoio ao escoamento também.
Qual a contribuição da produção de leite de cabra e seus derivados em Pernambuco?
Essa é uma questão muito interessante. Eis um produto que pode ressignificar o semiarido produtivo. Uma cabra leiteira consome muito menos que uma vaca. A vaca come equivalente a sete cabras. Mas no mesmo nível de manejo, uma vaca produz 15 litros de leite e uma cabra 3 litros por dia. Além disso, o leite da cabra é mais valorizado, logo naturalmente é mais caro. O gargalo que notamos é que temos uma demanda em potencial grande, mas falta transformá-la em demanda real. É preciso tornar mais conhecido o queijo do leite de cabra.
No Sertão do Pajeú se concentra mais essa produção. Mas existem produtores no agreste também. Queijo e outros produtos derivados do leite de cabra.
Em Alagoinha, por exemplo, a demanda para o Força Local foi para a compra de equipamentos para o laticínio deles, como uma câmara fria. No sertão, a parceria com Sebrae tem contribuído para ajustar a gestão e o posicionamento estratégico deles, com o melhoramento da marca, elaboração de novos rótulos, por exemplo.
O programa caminha num passo interessante. Observamos os gargalos no setor produtivo e temos clareza sobre o ganho econômico e desenvolvimento a curto prazo possível desse e de outros segmentos que estão sendo apoiados.
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*Rafael Dantas é repórter da Revista Algomais e mestre em Extensão Rural e Desenvolvimento Local pela UFRPE (rafael@algomais.com | rafaeldantas.jornalista@gmail.com)