Pediatra, folião, cantor e compositor - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Pediatra, folião, cantor e compositor

Claudia Santos

Acorda Recife, Acorda/ Que já é hora de estar de pé/Levanta o Carnaval começou/No Bairro de São José. Carnavalesco pernambucano que se preze certamente já cantou esses versos do Frevo do Galo, seguindo o cortejo do maior bloco do mundo. O que poucos foliões talvez saibam é que um dos compositores da canção, Fernando Azevedo, é um renomado pediatra. Mas não é difícil perceber, logo no primeiro contato, o artista que existe neste médico elegante de sorriso largo. Sua voz forte e tranquila revela o cantor de serestas e clássicos da música popular.

Um talento que foi descoberto ainda na infância por sua tia, que o estimulou a tocar piano. “Aos 5 anos já fazia audições no Teatro Santa Isabel com outros alunos e professores”, recorda o médico cantor. A carreira de pianista, porém, foi interrompida por um velho preconceito muito presente na sociedade recifense dos anos 50: piano não era homens, mas exclusividade do universo feminino. “Era o presente de 15 anos das mulheres”, resume. Para preservar a imagem de sua masculinidade, ele resolve desistir do piano, para desconsolo da tia.

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Inconformada com a desistência e ciente que o sobrinho era um músico nato, presenteou-o com um violão. “Tive, então que enfrentar outro preconceito, já que se dizia na época que violão era instrumento de vagabundo e boêmio. Mas essa barreira enfrentei e acabei virando um militante da boemia”, conta sorrindo, Fernando Azevedo, recordando-se do período em que frequentava os bares famosos do centro do Recife como o Canavial e Capibaribe. Com seu violão, ele se apresentava em programas de rádio e tv cantando bossa nova e serestas.

Porém, aos 18 anos, veio o momento de decidir a profissão e o legado do pai médico, fundador da Faculdade de Ciências Médicas, falou mais alto. Nessa trajetória encontrou com o mestre Fernando Figueira, fundador do Imip, que despertou nele o interesse para ser pediatra. “A pediatria tornou-se uma paixão”, revela, categórico. Hoje, aos 75 anos atende a terceira geração de muitas famílias. “Fui médico da avó de pacientes atuais. Esse é o lado bom da pediatria, participo da vida desses familiares e faço com gosto”, afirma o médico, ostentando orgulhoso mais de 50 anos de medicina.

E a aposentadoria não consta dos seus planos. A medicina, no entanto, não o fez separar da sua outra paixão, a música. E, nesse meio tempo, até voltou a dedilhar um piano. Afinal, os tempos são outros. A retomada aconteceu quando a amiga Josefina Aguiar, famosa pianista erudita, pediu para guardar o seu instrumento na espaçosa residência onde o médico morava com a mulher e os filhos. Anos depois, casa foi vendida a uma construtora que ergueu no local, um edifício em que Azevedo hoje possui um apartamento.

Mas na decoração do novo lar, um piano tem um lugar de destaque. Seu talento o levou também a compor canções inspiradas como o Frevo do Galo – bloco em que desfila desde a fundação. Teve composições gravadas por intérpretes como Amelinha e se apresentou com artistas como Cauby Peixoto. Há um momento também em que as duas paixões – a arte e a medicina – se entrelaçam. Ele e outros seis médicos criaram a Orquestra de Médicos do Recife, que se apresenta em hospitais dentro da filosofia da musicoterapia. “A música é uma terapia para quem faz e para quem ouve. Alegra o paciente e alivia seu sofrimento”, constata o médico, cantor, músico e compositor

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