A Zona-da-Mata de Pernambuco era o território preferido por Gilberto, para viajar e viver, incorporar técnicas recentes do field work, uma evidente herança de Boas ( anos 1920). A pesquisa de campo, o estar em campo, enquanto maneira de fazer sociologia e antropologia e, no caso, fazer ecologia, reflete indicadoras de vertentes culturais para o entendimento complexo do homem regional. Os jeitos já nacionais, regionalmente nordestinos, são trabalhados como soluções que indicam a formação de identidades, de padrões culturais, de encarar e se relacionar com o mundo natural. São assim vistas, como avisa Gilberto, as chegadas etnoculturais do luso, do africano, dos relacionamentos com os autóctones. De qualquer forma, há uma sinalização de amor à terra.
As peculiaridades da Região Nordeste e as destinações naturais do litoral, da Zona-da-Mata, do agreste e do sertão oferecem distintas ocupações em um diálogo permanente entre o sol e a água. Em visão ancestral e mitológica. O masculino e o feminino. Uma relação onde os resultados idealizados são a fertilidade, a vida da terra, as plantas e os animais.
Há também no livro Nordeste, um avanço da etnobotânica, quando, em quantidade e variedade, espécimes chegaram do Oriente, da Europa, da África e aqui no Brasil nacionalizaram-se, aclimataram-se, ganharam novos usos, preservaram outros usos, junto àqueles tradicionais, convivendo com as plantas da terra, como os bichos da terra, quando e onde Gilberto explicitamente é telúrico, é nordestino, é pernambucano, é cabra: cabra pelo poder de resistir, enfrentar, adaptar e, principalmente, de criar. Os usos botânicos, foram feitos nas casas, nos engenhos, nas feiras e mercados, fazendo com que a natureza assumisse um Sentido/Sentimento profundamente integrador e ao mesmo tempo, singular.
Incluir é um verbo da preferência de Gilberto Freyre na sua permanente auto-referência de compreensão do Nordeste.
Exemplo disso, em símbolo e uso, é o tão celebrado coco verde, que é da Índia. Considerado pelos orientais como uma planta providencial, porque dos seus órgãos se tira tudo aquilo que o homem necessita para viver, desde o alimento ao vestuário, do material para construir habitação até aqueles para se defender das doenças, do sol. Se algum dia tivesse havido paraíso terrestre, com certeza o coqueiro ocuparia nele um lugar de destaque.
Mas, se há uma fruta emblemática para Gilberto, essa fruta é a pitanga. Há uma devoção quase religiosa perante o fruto e a folha de aroma tão peculiar, marcado, determinado como o próprio homem nordestino. Homem situado no trópico. Realmente da terra, a pitanga, ou pitanga-da-praia, ou Eugenia pitanga; em tupi, vermelho, é a fruta que Gilberto uniu a sua história de vida. Uniu com a boa cachaça, da cana sacarina, compreendendo assim uma civilização que se autentica pela boca. A pitanga, na forma e no estilo de conhaque (conhaque de pitanga) –foi a escolha ecológica de Gilberto por uma fruta da terra e por uma bebida que, de maneira muito particular, ritualizava as relações na sua casa em Apipucos, Recife.
Beber o conhaque de pitanga sob os olhos atentos de Gilberto e de D. Madalena era um ato de inclusão, uma quase confraria de amigos. Amigos ungidos pela boca, pelo açúcar, pela fruta, pelo cenário da casa, pela paisagem do sítio e pela proximidade do Rio Capibaribe. E assim ,eu ao beber ritualmente este conhaque me senti mais gilbertiano.
O ideal tropical ecológico de Gilberto, além de dedicar total atenção à morfologia da natureza, o compreendia, e como o compreendia, sensivelmente, por meio de texto, pintura e desenho realizados como linguagens intercomplementares e que têm sua comunicação perfeitamente integrada na formação da sua obra.