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Por que os brasileiros jogam lixo na rua?

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O Brasil é o quarto mercado mundial em produtos de limpeza, depois dos EUA, China e Japão, segundo pesquisa realizada pelo Euromonitor. Isso significa que o brasileiro é muito cioso da limpeza da sua casa. O mesmo, porém, não acontece da porta para fora. Basta observar as ruas das cidades brasileiras e constatar a grande quantidade de lixo acumulada. Para se ter ideia, no Recife, em vias como as Avenidas Conde da Boa Vista e Guararapes, o trabalho de varrição chega a acontecer sete vezes por dia.

Para o antropólogo Roberto DaMatta, esse comportamento tem origem na conflituosa relação que o brasileiro tem com as áreas privadas e públicas. A rua, sendo de todos, é tratada como se fosse de ninguém. “A representação da casa denota uma apropriação de um espaço que você possa chamar de seu. Já a rua é o lugar onde cada um deve zelar por si”, explica o estudioso que abordou o assunto na obra A Casa & a Rua.

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DaMatta ainda explica que o descaso com o que é público tem origens históricas. “Surge desde a época dos grandes impérios, onde se tinha uma lei para os nobres e, outra, para o povo, e um mesmo crime era julgado de forma diferente”, explicou. Para o professor, essa ideia de impunidade foi se perpetuando por gerações resultando no chamado “jeitinho brasileiro”. “A diferença é que hoje na Europa, por exemplo, existam multas severas para quem despeja o lixo no lugar inadequado. Mas nós brasileiros vamos sempre achar que podemos driblá-la ou que a punição não vai acontecer com a gente, então continuamos mantendo esse hábito e jogando a responsabilidade para o outro”, destaca.

Cidades como o Rio de Janeiro e Jaboatão dos Guararapes já dispõem dessa legislação. Mas, em outras localidades, essas ações punitivas não ganharam tanto alcance por falta de regulamentação. A psicóloga social, Helenilda Cavalcanti, da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), também acha, como DaMatta, que leis são importantes, mas não resolvem o problema. “Acredito ser fundamental uma formação como cidadão, que não se aprende necessariamente na escola”, afirmou. “Muitas vezes não temos uma atenção com o espaço público, por pensarmos que a responsabilidade é do outro, mas não damos conta de que vivemos em sociedade e nossas atitudes, por menores que sejam, como realizar a coleta seletiva, pode mudar tudo”, avaliou. “As leis podem ser importantes, mas também tem que partir de nós mesmos querer ajudar”, concluiu.

Implicações históricas também são o ponto de partida da análise de Tiago César, professor de história da Universidade Católica (Unicap). A falta de atenção do poder público, segundo o acadêmico, levou as populações a jogarem seus lixos em locais baldios ou desabitados. “Essa prática era comum desde o Brasil Colônia e, embora as Câmaras Municipais legislassem sobre o assunto, sabemos que, mesmo sob o risco de multas, a população continuava a jogar seus dejetos em locais inapropriados. Estamos falando de um costume de longa duração que necessita de tempo e de um trabalho intensivo de parceria dos políticos com a sociedade”, analisa.

“Hoje se quisermos mudar essa prática precisaríamos ter, primeiramente, reformas básicas e inteligentes nos locais mais degradados de nossas cidades, permitindo com que as classe sociais mais atingidas se sintam parte dela, começando por ter acesso a uma infraestrutura de qualidade, além de se potencializar uma escolarização de nível, paralelamente, e um trabalho de conscientização”, sugeriu o professor Tiago. Entretanto, ele explica que o descuido com o que é público não é um fenômeno associado unicamente a um grupo ou classe social. “Já vi gente muito instruída, estudando em ótimos colégios, jogando o papel do sanduíche no chão, tendo ao lado uma lixeira”, ressalva.

DaMatta também acredita que a alternativa para resolver o problema seriam medidas de conscientização. “Possíveis programas educacionais, aliados a campanhas eficientes que incentivem a população e atendam as camadas mais necessitadas”, explicou. Já o secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade, Sérgio Xavier, salienta que se deve levar em conta a dimensão cultural em relação a políticas públicas voltadas para os resíduos. “Nós convivemos com o lixo e não ficamos indignados. Os japoneses, por exemplo, se sentem incomodados, porque já faz parte da cultura deles. O brasileiro vai para o estádio, vê a sujeira no chão e pode até não ficar confortável, mas não toma nenhuma iniciativa para mudar aquilo”, destaca.

Entre as soluções apontadas por Sérgio Xavier está um sistema de coleta seletiva eficiente, uma economia que valorize o resíduo – através da reciclagem, por exemplo, campanhas de integração com cooperativas, uma logística que facilite a entrega do material para reciclar. No entanto, Xavier ressalta as dificuldades de efetivar medidas que visem a conscientização da população. “Temos um grande analfabetismo ambiental no nosso País e no mundo, muitas vezes as pessoas não sabem que o lixo pode ser reaproveitado, que uma casca de uma fruta pode virar um adubo, por exemplo”, observa.

*Por Paulo Ricardo

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