Além de revelar traços da personalidade, como defendem alguns, a posição em que a pessoa dorme pode ser importante fator associado à intensidade das dores de cabeça, segundo estudo defendido no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFPE. A dissertação "Postura cervical ao dormir e sua influência sobre a dor miofascial na cabeça e pescoço", de autoria de Albery Lins da Silva, aponta que "a posição em que fica a coluna cervical enquanto dormimos tem influência sobre a anteriorização da cabeça; o que traz sobrecarga aos músculos cervicais e dor miofascial na áreas da cabeça e pescoço". A anteriorização, neste caso, é a leve inclinação da cabeça para frente e a fáscia é o tecido que envolve o músculo (mio).
Composta por dois artigos científicos, a dissertação revela em um deles - o que dá nome ao trabalho acadêmico -, que a maior prevalência e intensidade da dor, no universo das 187 pessoas observadas, está dentre os que dormem em flexão cervical e que, portanto, apresentam menor ângulo craniovertebral, ou seja, os que mantêm a cabeça em inclinação maior para a frente. "Uma postura mantida por tempo prolongado, que coloque o tecido miofascial em encurtamento ou alongamento, pode ser considerada um estímulo mecânico nociceptivo", explica.
No estudo, que contou com a observação de um grupo de graduandos de Enfermagem da UFPE, distribuídos em nove turmas do curso e submetidas à situação análoga à postura adotada ao dormir, a maior frequência de postura cervical adotada foi uma combinação de, pelo menos, duas posições entre rotação, inclinação e flexo-extensão, com predileção pelo decúbito lateral, o comumente denominado "dormir de lado".
Ressaltando a necessidade de mais evidências para esclarecer como estas posturas cervicais ao dormir interferem no metabolismo muscular, o autor da dissertação destaca que a cefaleia frontotemporal foi a mais encontrada entre as pessoas observadas, o que corrobora com os padrões de dor miofascial dos músculos cervicais.
Participaram do estudo 187 graduandos de Enfermagem, distribuídos em nove turmas do curso, englobando os que contam ou não com histórico de dor na cabeça e pescoço. Foram excluídos aqueles que estiveram sob qualquer tratamento fisioterapêutico ou de acupuntura. A orientação e coorientação do trabalho ficou sob responsabilidade das professoras Eliane Maria Ribeiro de Vasconcelos e Luciana Pedrosa Leal.
PONTOS-GATILHO | No outro artigo, que se propõe a uma revisão integrativa de literatura sobre a causa de um dos 'disparadores' das dores musculares, intitulado “Etiologia dos Pontos-Gatilho Miofasciais (PGM): uma revisão integrativa”, o autor oferece aos profissionais o acesso rápido aos resultados relevantes que fundamentam as condutas ou a tomada de decisão, além de verificar lacunas do conhecimento. "A formação do PGM envolve uma cascata de eventos bioquímicos, com participação de estruturas musculares e neuronais, ainda não completamente esclarecidas", analisa o autor.
Em contrapartida, segundo Albery, "vários estudos correlacionam o PGM como fonte primária de dor, principalmente em cefaleia e enxaqueca, apesar de não haver consenso acerca de critérios de diagnóstico". Para o pesquisador, são necessários mais estudos a fim de elucidar que tipos de estímulo mecânico estão envolvidos clinicamente na formação do PGM. "O que há de comprovado é que estímulo mecânico nociceptivo foi capaz de ativar PGM, juntamente com câimbras musculares e dor", afirma.
O fisioterapeuta ressalva que o número de participantes foi um fator limitante no estudo, "pois a postura cervical não se mostrou estatisticamente associada à dor miofascial". "No entanto", explica, "por meio das frequências e médias, observou-se que ela foi capaz de mudar o padrão doloroso". O que sugere, segundo o autor, que, na prática clínica, os pacientes com dor miofascial na cabeça e pescoço devem ser investigados quanto à maneira de dormir, solicitando que demonstrem como dormem. E prescreve: "O travesseiro no decúbito lateral (posição de quem dorme de lado) deve ser alto o suficiente para que deixe o nariz alinhado à linha média do corpo e colocado de tal forma que apoie toda a face da mandíbula, a fim de evitar rotação durante o sono".
(PCR/ Renata Reynaldo)