Próximo ao Ceasa, agricultores plantam e geram renda - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Próximo ao Ceasa, agricultores plantam e geram renda

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Rodovias, viadutos, trânsito intenso e a silhueta dos prédios da cidade à vista. No mesmo quadro, plantação de várias hortaliças, capim e até plantas medicinais. A rotina do urbano se mistura com o cenário e as práticas rurais nas margens da BR-101. A maioria dos recifenses que passa pelas proximidades do Ceasa conhece das janelas dos carros ou ônibus o cultivo do Projeto Integrado das Hortas Comunitárias, que completa 10 anos e já alcança a extensão de 73 hectares.
O incentivo do uso das nove alças no entorno do Ceasa para a prática da agricultura urbana surgiu após um processo de desapropriação de ocupações irregulares nessa região. Ao identificar que várias dessas famílias que permaneceram nas vizinhanças estavam em situação de vulnerabilidade social e tinham origens rurais, nasceu a ideia de garantir renda para elas por meio da produção de alimentos.

Hoje são 162 agricultores e agricultoras que sustentam suas famílias com uma diversidade de hortaliças que são comercializadas no Ceasa e também destinada a compradores diretos que param nas proximidades da BR-101 em busca de alimentos e ração. “Parte dessa produção, que é muito grande, segue também para as feiras dos bairros vizinhos, como Jardim São Paulo, Roda de Fogo e Engenho do Meio”, relata a coordenadora do projeto, Jaciara Pereira.
As principais variedades produzidas no projeto são quiabo, alface, coentro e, principalmente, o capim mian, destinado à alimentação de pássaros, que é o principal responsável pelo faturamento desses produtores. Há ainda o cultivo de macaxeira e milho.

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Altair de Souza, 47 anos, é um dos agricultores que tirou seu sustento do projeto desde o início. Natural de uma família da zona rural de Vitória de Santo Antão, ele veio ao Recife há 25 anos em busca de um emprego formal. Trabalhou oito anos na área de serviços gerais até ficar desempregado. Cultivar dentro da capital foi a saída para garantir renda para sua família. “Quando cheguei aqui no Recife trabalhava pela comida. Não acreditava que poderia plantar na cidade. Mas cada um tem um destino. Está dando certo”.

O agricultor diz que os seus sonhos – de ter uma casa própria, um carro e de financiar os estudos dos filhos – já foram realizados. Sua filha mais velha, inclusive, acabou de entrar na faculdade de educação física. “Não tenho mais sonhos. Os planos de futuro são de continuar”, conta.
Também natural de Vitória de Santo Antão, Silvano dos Santos, 50, trabalha há 20 anos na agricultura, sendo 10 dentro do projeto. Ele relata que veio para o Recife já pensando em viver da agricultura. “Vim para cá porque é melhor para viver.

Produzimos muito e tem muito cliente. Quando sobra, levamos para o Ceasa”. Ele divide o trabalho do plantio com a esposa, um irmão e um filho.
Apesar de ter como carro-chefe da produção também o capim mian e as alfaces, o trecho que a família de Silvano cultiva tem algumas árvores frutíferas, plantas medicinais e ornamentais. Essas produções, realizadas pela mulher, Elenilda Lins, além de serem importante para o autoconsumo, geram uma renda complementar para a família.

A produção que garante o sustento das famílias é fruto de um trabalho integrado do Sindfrutas (Sindicato do Comércio de Hortifrutigranjeiros, Flores e Plantas de Pernambuco), da ONG Pedra D’água, do Ceasa e da UFRPE (Universidade Federal Rural de Pernambuco), que prestam assistência técnica e oferecem infraestruturas que são fundamentais para o trato da terra e para a comercialização.

Uma equipe de 12 pessoas trabalha no apoio desses trabalhadores rurais. Dentro dessa equipe estão, por exemplo, um agrônomo e um técnico agrícola. A professora da UFRPE Rosimar Musser, que é engenheira agrônoma e doutora em botânica, faz a supervisão do projeto.
“Após o trabalho de orientação técnica, a produtividade por hectare desses agricultores aumentou em até cinco vezes”, destacou o presidente do Sindfrutas e da ONG Pedra D’água, Alex Oliveira da Costa, que foi um dos idealizadores do projeto.

Há um trator e parte de um galpão no Ceasa à disposição desse trabalho sem custo para os agricultores. Eles recebem também adubos e equipamentos de proteção individual (EPIs). Além do apoio na melhoria da tecnologia para a produção, essas instituições foram responsáveis também pelo cadastramento dos agricultores no Sindicato Rural de Jaboatão, que garante o acesso dessas famílias ao INSS.

O presidente do Sindfrutas e da ONG Pedra D’água destaca ainda outros benefícios da destinação desses terrenos para hortas comunitárias. “Ao dar uma destinação para essa área, evitamos que outras ocupações irregulares acontecessem na região. Isso garantiu também mais segurança para os mais de oito mil funcionários que vêm diariamente para o Ceasa”, afirmou, referindo-se ao fato de o local não se transformar num terreno baldio.

Costa destacou também que o uso dessas terras para a agricultura trouxe um benefício ambiental. Nos períodos de chuvas mais intensas, essas terras usadas para o cultivo acabam sendo o destino da água que antes não tinha onde escorrer e causava alagamentos nessa região.

Jaciara Pereira ressaltou outro benefício para a cidade: o estético. “É muito bonito ver o trabalho da agricultura em plena cidade. No período do verão, principalmente, vemos todos trabalhando, felizes, podendo produzir em meio aos veículos e aviões que passam”, emociona-se a coordenadora do projeto. Silvano confirma a avaliação de Jaciara, destacando os olhares dos recifenses que circulam pela rodovia. “Essa plantação chama muito a atenção das pessoas que passam por aqui. Vemos muita gente nos carros filmando”.

São muitas as funções que essa experiência rurbana, como conceituou no passado Gilberto Freyre, cumprem na cidade. O relato dos gestores do projeto e dos próprios agricultores reforça os benefícios sociais (de geração de trabalho e renda para as famílias envolvidas), alimentar (de produção em proximidade aos consumidores), ambiental (de cuidado dessas terras e prevenção aos alagamentos) além da manutenção de uma paisagem mais verde, que se contrapõe à urbanização totalizante, tão criticada por Freyre.

Para qualificar mais o trabalho desses agricultores, as instituições de apoio estão buscando parcerias para construir pequenas estruturas nos lotes com local para assepsia dos alimentos, para guardar seus pertences, além de banheiros e poços artesianos. O investimento estimado para beneficiar todos os produtores é de R$ 400 mil.

*Por Rafael Dantas

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