Adepto do verso livre, do lirismo e da irreverência, Manuel Bandeira foi escritor, professor, crítico e historiador literário e talvez seja aquele que melhor cantou o Recife. Neste mês, quando se completa 50 anos de sua morte (13/10/1968), memória e obra do poeta mantêm-se vivas através de seus poemas, prosas e antologias.
Seu estilo coloquial e elegante arrebatou a admiração e os corações em todo o País, em especial dos pernambucanos. Por isso, perguntamos a quatro deles qual o poema preferido do poeta modernista. Confira a seguir:
“Conheci a poesia de Bandeira nas estantes de casas de amigos dos meus pais. Lá em casa também havia uma coletânea de poemas dele. Foi a primeira vez que li alguém que falava de lugares que eu conhecia. A poesia dele, pra mim, tem jeito de azulejo. Uma coisa meio colonial, casa antiga. Estante de madeira escura. Não como algo aristocrático. Parece que é algo que um amigo escreveu. É impossível de profanar porque não é sagrado”, relata Juliano Holanda, cantor e compositor recifense.
Bandeira é uma das inspirações de Juliano, e lhe possibilitou conhecer outros autores, como Carlos Pena Filho, João Cabral de Melo Neto e Celina de Holanda. “Escrevo, mas nunca me considerei um poeta. Poeta é Manuel Bandeira, que faz as coisas parecem simples. Até mesmo quando de fato são”, complementa o compositor.
Já o arquiteto e sócio da TGI Francisco Cunha ressalta a relação do poeta com o Recife. Ele considera Manuel Bandeira o maior poeta do Brasil, e o que conseguiu melhor cantar a história do Recife. “A qualidade da obra literária dele é revelada na capacidade que teve de evocar o Recife e de retratar uma característica muito peculiar da capital pernambucana que é essa beleza e a densidade histórica que a cidade tem. Acho que ele é um poeta do Recife e, portanto, tem uma importância muito grande para preservação da nossa memória e da memória da cidade”, declara.
A poesia de Bandeira cativa também os leitores mais jovens, como Emília Prado, de 20 anos. A estudante de jornalismo começou a gostar e ler obras do poeta quando conheceu a história do modernismo e da Semana de Arte Moderna de 1922, que reuniu os artistas modernistas brasileiros que buscavam abolir a estética perfeccionista dos textos do Século 19.
Bandeira causou escândalo com a poesia Os Sapos, lançada no evento e na qual defendia o verso livre e ridicularizava o apego à métrica dos parnasianos. “Eu gosto de imaginar os poetas escrevendo determinado poema e pensando no que os outros pensariam. Será que sentiam medo? Mas acho que Bandeira não tava nem aí, porque ele tava sendo ele, não tinha muita noção do tamanho do movimento que tava participando”, supõe Emília.
A estudante ainda destaca a importância da relevância de toda a sua obra. “Todo escritor que deixa clássicos merece um alto respeito. Bandeira escreveu Pasárgada! Esse poema é tão honesto que aposto que ele não imaginava a proporção que suas palavras tomariam. Era o seu lugar conhecido, familiar, mas para tantos, ainda hoje, é o lugar ideal muitas vezes inalcançável”. Sua frase predileta do escritor é Não quero mais saber do lirismo que não é libertação. Trata-se de um verso de Poética, outro poema apresentado na Semana de 22.
MELANCOLIA
“Bandeira da Minha Vida Inteira”, exalta o escritor Marcelino Freire parafraseando o livro Estrela da Vida Inteira, publicado em 1965 e que reúne poesias completas do pernambucano. “Manuel Bandeira foi o primeiro poeta que eu li”, conta Marcelino, que nasceu em Sertânia, e por duas vezes, foi vencedor do Prêmio Jabuti de Literatura. “Eu devia ter uns 10 anos e já morava no Recife. Bandeira pegou na minha mão e não largou mais. Tive contato com a poesia melancólica dele e fui ficando um menino doente, febril. Eu queria a tuberculose do Manuel. Eu fiquei com vontade de morar em Pasárgada”, recorda.
Quando pequeno, Marcelino sentia-se orgulhoso pelo fato de o poeta também ser pernambucano. “Eu me lembro de ter pedido a uma professora para me levar até a casa do avô do Bandeira, ali na Rua da União. Foi uma emoção saber que naquela casa Manuel havia ficado à janela, observando os mascates passarem. Manuel é muito o Recife. As pontes, as águas, a saudade. Era um poeta que sentia tremenda saudade da infância, que fazia uma poesia que comunicava. Simples, diretamente lírica”, elogia. “Durante um tempo, repito, eu quis ficar doente, pensava que iria morrer cedo, que meu destino teria a mesma sorte do que a do Manuel. Ele morreu velho, mas eu digo da sorte que a maldição dos poemas nos traz. Bandeira me contaminou com a sua poesia. É uma referência constante que eu trago no peito, assim, de tudo o que escrevo”.
*Por Laís Arcanjo