“Queremos tornar o Bairro do Recife a Disneylândia da Assombração” – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

“Queremos tornar o Bairro do Recife a Disneylândia da Assombração”

César William Costa, integrante do Recife Mal-Assombrado fala do projeto que divulga a história e a cultura da cidade por meio de divertidos passeios em que atores interpretam apavorantes lendas recifenses. Para manter o clima de mistério, ele não revela sua identidade e se mostra ao público como o personagem Mestre Devas.

I magine caminhar pelas ruas escuras do Bairro do Recife e, de repente, se deparar com ninguém menos que o temível Papa-Figo? Essa é a proposta assustadoramente lúdica do Recife Mal-Assombrado. O projeto promove excursões pela cidade, nas quais atores, na figura de apavorantes lendas recifenses, surgem entre os caminhantes. Eles também podem se defrontar com um fantasma de algum personagem da história local, a exemplo de Maurício de Nassau ou Frei Caneca.

Além de provocar sustos, o projeto, segundo um dos seus integrantes, César William Costa, visa a divulgar a história do Recife, seus locais históricos e sua arquitetura, de uma maneira muito divertida. Para não quebrar a magia apavorante da proposta, nenhum dos atores do Recife Mal-Assombrado mostra seu rosto. Por isso, César, concedeu esta entrevista a Cláudia Santos, com o figurino do personagem sacerdote Devas C. William Costa, mestre de uma ordem hermética. Com sua roupa negra e seu imenso capuz, “Mestre Devas” falou à Algomais no deslumbrante Palácio do Comércio, no Marco Zero, com sua bela escadaria, magníficos vitrais e cercado de símbolos da maçonaria. Um cenário que compôs um clima a mais de mistério. Segundo o “sacerdote” mais de 22 mil espectadores já se divertiram e se assustaram com o tour assombrado, cujo roteiro é inspirado nas obras de Gilberto Freyre, Roberto Beltrão, Carneiro Vilela e até em notícias de jornal.

O que é o projeto Recife Mal-Assombrado?

O Recife Mal-Assombrado já fez sete anos e tem inspiração em autores da literatura fantástica. Ele é um misto de espetáculo místico, turístico e cultural. Nós convidamos o turista e o público local a se encontrarem conosco em determinado local, geralmente na praça do Arsenal e, de lá, fazemos uma viagem ao passado, percorrendo os lugares reais das lendas antigas. E, no meio do passeio, eles se deparam com aquelas personalidades que, tempos atrás, assombraram os habitantes do Recife. Os mais variados espectros são encontrados no meio da rua.

Mais do que somente um passeio de susto, o projeto traz a nossa cultura e traz também – até fisicamente – o que nossos antepassados viam e percebiam nas ruas do Recife naquele tempo. Dessa forma, consolida as lendas, os milagres, os fantasmas, as assombrações de outrora. Nesses sete anos, já tivemos uns 22 mil espectadores.

Você poderia dar um exemplo de um desses roteiros?

Temos dezenas deles, mas vamos falar dos principais: Fazemos a Caminhada Assombrada pelo Bairro do Recife, que geralmente sai às sextas-feiras, fazemos uma caminhada que dura uma hora e meia e durante o caminho, nas ruas mais vazias, mais soturnas, mais escuras, de repente, se materializa uma assombração. Pode ser o Seu Amorim, que é o Papa-Figo, pode ser uma Feiticeira, Antônia Maria ou Felícia Turim da nossa história, pode ser uma pisadeira, ou um cocheiro mencionado por Gilberto Freyre em seu livro. São mais de 120 personagens. O público nunca sabe quem aparece. Já o passeio de ônibus tem quatro horas de duração. Pegamos o nosso ônibus assombrado e visitamos, durante a noite, quatro a cinco locais assombrados, onde viviam as lendas.

Temos um roteiro destinado só para os bairros mais antigos: Bairro do Recife, São José, Santo Antônio, Boa Vista, às vezes Santo Amaro, e outro que vai até a casa de Gilberto Freyre. Passa pelas Graças, Casa Forte, Parnamirim, Poço da Panela até Apipucos. A proposta é explorar mesmo. Pode ser um casarão, um museu, pode ser um teatro, um palácio. Podemos estar às 22h no Palácio do Governo, ou, nos casos mais extremos, como agora em outubro, quando há Halloween, podemos estar às 23h no Cemitério dos Ingleses.

Nesses passeios não há luz, no máximo velas. Então, quando entramos no Forte de Cinco Pontas ou do Brum, por exemplo, só com as luzes de velas, pode surgir, de repente, um soldado que conta sua história, porque ele está ali sofrendo, preso naquele local. Fatalmente ele fala como era aquele lugar antigamente. O público começa a se surpreender: “puxa! Não havia prédios e o mar batia no muro do forte? Isso aqui foi aterrado?”. O passeio abrange muita coisa, de arquitetura à história e os ingressos podem ser adquiridos no site www.recifemalassombrado.com.

Como são as reações do público?

Ah, são as mais variadas. Imagine você ter crescido ouvindo as histórias do Papa Figo, da Loira do Banheiro, da Mulher do Algodão, da Comadre Fulozinha e, eles aparecem, de supetão, na sua frente? Aí, é um misto de alegria, de susto, de medo. Tem gente que corre, tem gente que cai na gargalhada nervosa, tem de tudo.

Qual a importância de se resgatar e preservar essas assombrações do Recife?

Raízes. Precisamos ter em mente quem somos, de onde viemos. Temos um problema no Brasil de ausência de laço ancestral, geralmente não sabemos nem o nome de nossos avós. Se tivéssemos uma ligação maior com essa ancestralidade, principalmente com a ancestralidade do Recife, teríamos mais amor à cidade. É isso que o Recife Mal-Assombrado propõe:

que tenhamos mais amor pela cidade, que percebamos mais a sua cultura, seus aspectos arquitetônicos, históricos e culturais. Isso vai criando um link e sem perceber as pessoas vão tendo esse conhecimento, vão construindo esse amor e daqui a pouco estão envolvidas na preservação de um local histórico.

Você precisa ver os olhos brilhando de quem faz o Recife Mal-Assombrado. Eles não se atentam somente para a assombração, mas ao contexto da assombração na sua época, na sua cidade. Essas assombrações podem ser históricas. De repente na caminhada pode aparecer o espectro de Domingo José Martins, Frei Caneca, Maurício de Nassau, e darem a versão deles sobre os fatos da época.

Leia a entrevista completa na ediçãp 199.2 da Revista Algomais: assine.algomais.com

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