Governadora, em palestra no Pernambuco em Perspectiva, fez um balanço do seu governo, apontou as diretrizes para desenvolver o Estado nas próximas décadas e alertou ser preciso qualificar os investimentos para o Nordeste não se tornar um mero exportador de energia, sem gerar um desenvolvimento interno e emprego qualificado. Também salientou a necessidade de as forças políticas se unirem em benefício do crescimento econômico.
*Por Rafael Dantas
“O futuro é hoje”. Essa foi a declaração da governadora Raquel Lyra durante o último encontro de 2025 do projeto Pernambuco em Perspectiva – Estratégia de Longo Prazo, promovido pela Revista Algomais e pela Rede Gestão. Além do balanço dos últimos três anos, a governadora apontou que, diante do momento político nacional e internacional, de interesse no Estado, os próximos cinco anos serão definidores para as próximas cinco décadas. Porém, destacou a necessidade da costura de uma unidade pelas pautas estratégicas para o desenvolvimento.
Durante o relato das principais ações do Governo do Estado desde 2023, Raquel Lyra ressaltou que existe um grande interesse dos investidores de fora do País em aproveitar oportunidades na geração de energias renováveis e também no Porto de Suape. No momento em que o mundo faz um esforço pela descarbonização das atividades produtivas, todo o Nordeste e Pernambuco se posicionam dessa forma com grande potencial de atração de novos empreendimentos.
“Nós temos uma janela de oportunidade da nova economia. E o mundo enxerga isso em nós”, declarou a governadora. “Nós geramos no Nordeste energia superavitária. Mas a gente precisa trazer para cá os investimentos certos. O que é que nós vamos trazer para cá para aproveitar essa energia limpa? Ou a gente vai [apenas] jogar na rede?”, provocou Raquel Lyra.

A governadora, portanto, alertou para o fato de o Estado aproveitar esse olhar dos investidores não para seguir sendo um produtor de commodities, mas aproveitando a disposição de energia produzida a partir de matrizes renováveis para atrair novas indústrias. Essa perspectiva é fundamental para o adensamento das cadeias produtivas no novo ciclo de desenvolvimento de Pernambuco.
Ou seja, Raquel Lyra defendeu que Pernambuco não pode se limitar a ser exportador de energia, grãos ou combustíveis. Para ela, o Estado precisa converter esses ativos, como o parque de energia renovável, o porto e ou potencial para instalação de data centers, em desenvolvimento interno, com empregos qualificados, inovação e criação de inteligência.
“Não é sobre instalar 10 data centers. É sobre o que eles trazem junto de emprego, tecnologia e da nova economia”, afirmou. “A gente precisa agregar a nova economia, com o combustível que a gente tem, com a logística que a gente tem, com a posição geográfica que a gente tem.”

Em um Estado com limitações hídricas, por exemplo, vender apenas produtos agrícolas como commodity seria vender a água. O desafio, nesse caso, seria promover o refinamento do açúcar ou a transformação em novos produtos e desenvolver a agroindústria para gerar mercadoria com mais valor agregado
Raquel Lyra criticou a lógica de Pernambuco atuar apenas como corredor logístico ou mero exportador de matéria-prima, defendendo uma inflexão estratégica no modelo econômico. Segundo ela, é fundamental adicionar valor localmente, fortalecer a inteligência produtiva e converter o potencial energético e a infraestrutura já instalada em empregos qualificados, capazes de elevar o patamar de desenvolvimento do Estado.
UNIDADE PARA CONSTRUIR O FUTURO
Uma das queixas da governadora Raquel Lyra, que ela classificou como o primeiro desafio de Pernambuco, é a união política. Durante o evento ela fez críticas à falta da construção de pactos para tratar dos assuntos estratégicos para Pernambuco. Ela comparou, por exemplo, a quantidade de emendas parlamentares concedidas ao Estado do Ceará. “O Ceará agora fechou com R$ 400 milhões de emenda de bancada. Nós fechamos esse ano com R$ 20 milhões. Todo mundo me pede obra, mas as pessoas também precisam me ajudar a fazer as obras”.
Mais uma vez ao comparar a experiência local com os Estados vizinhos da região, ela defendeu que Pernambuco alcance um patamar mais elevado de investimentos para dar sustentação a um novo ciclo de desenvolvimento. “O Ceará está crescendo, a Bahia está crescendo. E nós? Se a gente não tiver capacidade de nos unirmos, se não tivermos uma agenda única estratégica, vamos continuar brigando uns com os outros, pensando sempre na próxima eleição. A agenda de Pernambuco não é a da próxima eleição, mas da próxima geração”.

Apesar de ter relatado uma série de avanços no volume de investimentos na atual gestão, Lyra revelou a preocupação com a frustração do Governo do Estado com o crescimento de ICMS de 2% esse ano. “Investimento público alavanca o investimento privado e é um ciclo virtuoso. O investimento privado vai alavancar novos investimentos públicos a partir do crescimento da nossa economia. A gente precisa continuar investindo em Pernambuco, seja em concessão, seja em parceria privada, seja com recurso do Governo Federal, pouco importa. Nós precisamos ter um patamar de investimento alto”. A governadora lembrou ainda que a Paraíba cresceu 10% do PIB e que Alagoas chegou a direcionar 20% da sua receita líquida para investimento. “A gente estava investindo entre 2% e 3%”, comparou.
TEMPO DE OPORTUNIDADE
Os feitos do Estado para o horizonte de planejamento de longo prazo para 2037, muito mencionado nos encontros do Pernambuco em Perspectiva, na opinião da governadora, será definido nos próximos cinco anos. A motivação dessa percepção de urgência para definir os projetos estruturadores e estratégicos para Pernambuco, além da janela de oportunidades da descarbonização da economia, está ligada a um fator restritivo: com a recém-aprovada Reforma Tributária, a partir de 2033, Pernambuco e os demais estados brasileiros não terão mais benefícios fiscais para atrair empreendimentos.
Diante das diferenças de competitividade com os estados do Sul e Sudeste, por décadas, o Nordeste conseguiu atrair grandes investimentos com esses incentivos. “Temos que ter inovação, tecnologia e garantir que tenhamos competitividade. E com a Reforma Tributária até 2033 não teremos mais benefícios fiscais e quem seremos nós se não tivermos infraestrutura, pessoal qualificado?”, indagou a governadora.
BALANÇO DOS TRÊS ANOS DE GESTÃO
Em diversas oportunidades, Raquel tem repetido a mensagem de que o primeiro ano de governo foi “arrumar a casa”, recuperando a saúde fiscal do Estado. Além disso, criou uma agenda de reconstrução administrativa, com o levantamento de um inventário de 450 obras paradas e a reconstrução da relação com o Governo Federal para viabilizar convênios e destravar obras estruturadoras.
Nesse percurso, o Governo do Estado conseguiu R$ 3,5 bilhões de operações de crédito para fazer investimentos. Entre as principais realizações, ela citou a reativação de obras federais paralisadas (como a BR-104 e empreendimentos do Minha Casa Minha Vida), o avanço do programa habitacional estadual e investimentos recordes em estradas (mais de 1.400 km requalificados).

Um destaque relevante do balanço da governadora foi para a área hídrica. Com um Estado que tem 90% do seu território no semiárido, ela destacou a retomada de barragens prometidas desde 2011, a aceleração das obras da Adutora do Agreste e a entrega de água antecipada por meio de módulos móveis.
No campo social, enfatizou o reforço da assistência (com orçamento quatro vezes maior que o anterior), o programa Mães de Pernambuco e a cozinha comunitária ampliada para um milhão de refeições mensais. Ela mencionou ainda a criação da Secretaria Executiva de Periferias e grandes intervenções de encostas e urbanização em áreas vulneráveis, como Jardim Monte Verde e Peixinhos, além da completa reestruturação da Defesa Civil.
Na educação, destacou que os avanços não dependem de crédito, mas do uso correto dos recursos do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério). Entre as ações, listou a compra de R$ 1 bilhão em ônibus escolares e outros R$ 1 bilhão em creches, essenciais para elevar a alfabetização na idade certa, que já passou de 28% para 58%.
TRANSNORDESTINA E ARCO METROPOLITANO
Raquel Lyra ressaltou projetos estruturantes como o Arco Metropolitano, dragagem dos portos, expansão aeroportuária e a duplicação da BR-232 até Belo Jardim. Além disso, a construção da Transnordestina foi apontada como uma das pautas estratégicas para a logística pernambucana. Durante o evento, Raquel comemorou o fato de a linha pernambucana da ferrovia, que foi excluída no Governo Bolsonaro, ter voltado dentro do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
“Muitos me disseram: ‘Vai esquecer a Transnordestina, que ela não seria retomada”, relembrou Raquel Lyra. Apesar disso, a ferrovia foi elencada como uma das prioridades nas suas agendas com o Governo Federal. Ela ressaltou ainda que foi uma decisão política essa retomada, que não poderia ser uma escolha empresarial. “Essa não é uma decisão de um empresário que junta a mina dele com a siderúrgica que vai definir para onde vai a Transnordestina, mas é uma estratégia de desenvolvimento de uma região.”

Durante o evento, porém, o economista e ex-prefeito de Bonito, Laércio Queiroz, alertou a governadora sobre a necessidade de acelerar as obras da ferrovia até Suape, já que o Ceará começa a operar a Transnordestina no ano que vem, e para o porto pernambucano a previsão é somente em 2030. Em entrevista na edição passada à Algomais, ele também ressaltou que a bitola dos trilhos de Salgueiro a Suape não têm a mesma dimensão do trajeto do Piauí até Pecém, o que limita as oportunidades de carga no terminal de Pernambuco. Para ele, somente uma pressão de políticos e empresários pode reverter essa situação e que apenas a governadora tem a capacidade de fazer essa articulação. “A senhora tem força política. Governadora haja politicamente para trazer os recursos que faltam para a Transnordestina. Pernambuco não pode perder, estamos ficando isolados na questão da logística ferroviária!”, conclamou.
Já em relação ao Arco Metropolitano, prometido há décadas, Raquel Lyra garantiu que ele será realizado após a divisão do projeto em etapas para viabilizar sua execução. Segundo a governadora, questões ambientais travaram o avanço da obra, que agora começa pela ligação entre Moreno e Suape, com investimento de R$ 640 milhões provenientes de operação de crédito do Estado. Raquel Lyra afirmou que a primeira etapa será iniciada “daqui a poucos dias” e que a expectativa é entregar o trecho até o final de 2026, acelerando o cronograma.
Ela explicou ainda que o governo estadual assumiu o protagonismo na elaboração dos projetos: “Fizemos o projeto, entreguei a Renan [Filho, ministro dos Transportes], entrou no PAC e eles vão licitar a obra”, relatou. No entanto, após quatro meses sem avanço no Governo Federal, solicitou de volta a responsabilidade pela licitação da segunda etapa, que vai da BR-408 até a BR-232. A terceira fase deverá ser estruturada como concessão. Segundo a governadora, com esse modelo, Pernambuco finalmente conseguirá tirar o Arco Metropolitano do papel.
PRÓXIMOS PASSOS DO PERNAMBUCO EM PERSPECTIVA
O consultor Francisco Cunha, que realizou uma palestra prévia à da governadora, sobre a necessidade de o Estado conceber um novo ciclo de desenvolvimento para Pernambuco, informou os próximos passos do Pernambuco em Perspectiva. Após as discussões realizadas entre 2024 e 2025, o corpo técnico do projeto fará a condensação dos debates e propostas em um livro.
Além da publicação desse material, no ano de 2026, que marcará as eleições estaduais, novos seminários serão promovidos para apresentação dessas reflexões aos candidatos ao governo do Palácio do Campo das Princesas. O Pernambuco em Perspectiva, dessa forma, se propõe a qualificar o debate político com temas estratégicos para a formulação do modelo de um novo ciclo de desenvolvimento.
*Rafael Dantas é repórter da Revista Algomais e assina as colunas Pernambuco Antigamente e Gente & Negócios (rafael@algomais.com | rafaeldantas.jornalista@gmail.com)
