Sem ketchup (por Joca Souza Leão) - Revista Algomais - a revista de Pernambuco

Sem ketchup (por Joca Souza Leão)

Claudia Santos

Meu neto João Francisco é tarado por ketchup. Quando lhe disse que não existia ketchup antigamente (pra ele, tudo com mais de oito anos é “antigamente”), ele interrompeu a mordida no hambúrguer cheio de ketchup e me olhou perplexo: “Então, você comia o quê, vovô?” Antes de responder, acrescentei: “Também não havia maionese pronta.” Ele pensou qu’eu tava brincando: “Danou-se!” E lá fui eu explicar a João.

“Quando eu tinha a sua idade, rapaz, não havia pizzarias no Recife. Minha mãe fazia pizza em casa aos domingos. Meus amigos, que nunca tinham comido nada nem parecido, passavam o dia puxando o saco da gente (meu, de Caio e de Lula) pra serem convidados. Não sabiam nem pronunciar o nome direito: ‘Pi... o quê?’ Pense numa pizza boa, João. A que você mais gosta. Pensou? Pois a que mamãe fazia era muito, muito mais gostosa. E era grossinha, viu? Nada de pizza fininha como hóstia. Quem diz que quanto mais fina melhor é porque não sabe o que é uma massa boa e bem assada, fofinha e crocante. Hoje, por pirangagem, pra render mais, ralam o queijo mozzarella. Mamãe a cobria com fatias de queijo; aí, sim, fininhas. Ketchup? Nada disso. Molho de tomate pessoalmente, temperado e feito na hora. Maravilha.

Agenda TGI

“Agora, bom mesmo, João, bom de lascar era a maionese que mamãe fazia. Não era pra comer com hambúrguer, não, rapaz. Mas com lagosta e camarão. (‘Lagosta? Eu acho que nunca comi lagosta...’) A maionese era batida com não sei quantos ovos, mostarda francesa, azeite português, limão, alho... e, depois, misturada com pedaços de lagosta, camarão, passas, cubinhos de batata e maçã. Pronta, ficava como um bolo. Decorada. Servida gelada. Como entrada. Mas, pra mim, era o prato principal.

“Quer ver outra coisa que também não existia, João? Sanduicheira elétrica doméstica. Só profissional. Nas casas de lanche (lanchonetes, como se diz de um tempo pra cá) e algumas sorveterias. Mas tinha uma sanduicheira lá em casa que prensava o sanduíche e a gente botava na boca do fogão; de um lado, depois do outro. O sanduba ficava igualzinho ao da Pérola, uma sorveteria famosa. E tinha um detalhe, João. Queijo, presunto e manteiga eram muito melhores do que são hoje. Mas bota melhores nisso! E o misto-quente lá de casa também fazia o maior sucesso entre os amigos da vizinhança.”
Você, cara leitora, caro leitor, não faz ideia do comentário de João Francisco depois de todo o meu empenho narrativo:
“Por isso, vovô, tio Caio, tio Lula e você ficaram gordinhos, né?”

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