O Estado brasileiro é insaciável e gasta mal. Nos últimos 25 anos, os gastos federais vêm crescendo 6 % ao ano acima da inflação e com velocidade duas vezes superior à do Produto Interno Bruto (PIB). Desde 2011, esse desequilíbrio fiscal se aprofundou rapidamente. Só de 2013 para cá a dívida bruta do País em relação ao PIB elevou-se de 52% para 72%, uma trajetória insustentável e preocupante. O estrago fiscal feito pelo governo anterior foi extenso e profundo, resultado de inúmeros erros de política econômica e de descontrole nos gastos que foram mascarados por vários truques de contabilidade pública. Existem, como nós sabemos, outras formas de gastança.
O dinheiro público é desperdiçado em inúmeros privilégios remuneratórios descolados do mercado de trabalho, geradores de desigualdades na distribuição da massa salarial, e disseminados nos três níveis de governo, mas que assumem especial destaque no judiciário, legislativo, Ministério Público e em algumas carreiras de Estado hospedadas no executivo federal. O dinheiro público também escapa pelos dutos da corrução sistêmica, pela má qualidade na elaboração, gestão e execução de políticas públicas e pelos subsídios contidos em programas recentes de apoio aos empresários e a grandes empresas que somaram, em média, R$ 63 bilhões por ano durante o período 2012-2016. Qualquer brasileiro conhece e pode apontar como se gasta muito e sobretudo como se gasta mal apesar de pagarmos impostos em montante equivalente a 36% do PIB. Quanto maior o tamanho do Estado, no contexto de uma cultura politicamente patrimonialista e corporativa, maior tende a ser o desperdício de recursos públicos e irrefreável a tendência para aumentar os impostos.
O Estado não gera riqueza, quem produz riqueza são os empresários e trabalhadores. O Estado tributa pessoas e empresas, arrecadando, de um lado, e gastando, de outro para poder prover serviços públicos tais como educação, saúde e segurança. O Estado deve também, como arrecadador e gastador, mediar o conflito distributivo ao se defrontar com os diversos grupos de interesse dentro e fora do setor público que disputam os recursos disponíveis. Quando o Estado gasta mais do que arrecada gera inflação, juros altos, mais impostos e dívida, criando as condições para uma recessão e, por conseguinte, para o desemprego.
A história recente indica que é necessário limitar os gastos públicos. O estrago, como visto acima, foi grande e profundo nas contas públicas e na economia. O PIB per capita recuou 9% nos últimos dois anos. A PEC 241 em votação terminal no Congresso Nacional tem esse objetivo. A legislação se propõe a limitar o crescimento do gasto público à inflação do ano anterior medida pelo IPCA. Ou seja, os gastos públicos se manterão constantes em termos reais por 20 anos, sendo permitido a partir do décimo ano uma revisão em cada período de gestão. A medida é dura e polêmica, mas é necessária conhecendo-se o ímpeto irrefreável para gastar do Estado brasileiro.
Esse limite nos gastos vai gerar bons desafios para os políticos e para a gestão pública. Os recursos serão agora ainda mais escassos, exigindo a elaboração de um orçamento realista baseado em prioridades e em critérios claros e bem fundamentados para justificar as despesas primárias. O Executivo Federal e o Congresso Nacional vão, ainda mais, ser a arena e o locus do conflito distributivo onde os grupos de interesse incrustados nos diversos nichos do aparelho de Estado vão lutar para defender suas corporações que, aliás, já se manifestaram previamente por meio de questionamentos a PEC 241 realizados pela Procuradoria Geral da República e pelo Superior Tribunal de Justiça. Dois desafios se colocam com a possível aprovação da legislação: ser racional na elaboração e execução do orçamento e enfrentar os grupos de interesse, acostumados à cultura do Estado Pai-Patrão. Se tudo funcionar corretamente muito desperdício será reduzido e muitos privilégios extintos. O gasto terá que ser mais racional e bem focado.
Os dois setores – educação e saúde –, que alguns críticos temem que terão seus orçamentos reduzidos, não possuem, de fato, limites exclusivos. Cabe ao Executivo, ao Congresso Nacional em interação com a sociedade civil, na definição das prioridades posicionarem bem esses setores no conjunto dos recursos livres da limitação. Aí teremos o teste da prioridade. Apenas 16% do orçamento federal é gasto com os 45% mais pobres. Os restantes 84% são despendidos com aqueles brasileiros que se situam entre os 55% mais ricos (STN/MF). Os gastos sociais poderão ser preservados e eventualmente ampliados. Um dos méritos da PEC 241 é que ela revelará as verdadeiras prioridades do Estado brasileiro e a força política dos grupos de interesse.
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