“Sou um radical de centro”

Publicado originalmente no dia 14/12/2015 por Rafael Dantas às 14:03

Há cinco anos sem exercer cargo público, Joaquim Francisco, hoje atua como advogado. Mas não abandonou a política. Participa de debates sobre o cenário político em rádios pernambucanas e alega não estar totalmente descartada uma candidatura em 2018. Nesta entrevista, concedida aos jornalistas Rafael Dantas e Cláudia Santos, ele fala de como se dedica a hobbies como a música e comenta fatos dos quais participou e que marcaram a história recente do País.

Como foi sua infância?
Nasci no Recife, onde vivi a infância, com fins de semana no interior. Meu pai tinha propriedade rural em Macaparana, Mata Norte. Quando eu tinha 12 anos ele arrendou uma propriedade de João Santos, em Goiana, aí passei anos indo para lá. Minha vida sempre foi urbana e rural. Hoje tenho um sítio pequeno, de dois hectares, em Gravatá. Tenho uma vaca, um garrote e dois cavalos. O segundo lazer é a música, toco de ouvido, mau, e faço aula de canto no Conservatório de Música.

Que instrumento o senhor toca?
Acordeão, violão, bateria e pandeiro. Mas só para consumo interno. Meu estilo é baião, músicas italianas e brega: Aracy de Almeida, Núbia Lafayette, Alcione, Nelson Gonçalves, Lupicínio Rodrigues. Nesse campo não me modernizei. Também gosto de Valesca, que é mais atual e é uma querida amiga.

Quando se formou em direito?
Em 1970, aos 22 anos. Meu pai era advogado. Eram três irmãos e 10 irmãs. Naquela época meu avô não dispunha de recursos para todos estudarem. Só podia fazer um doutor, que vinha para o Recife fazer os preparatórios. Meu pai foi prefeito de Macaparana, cidade dele, e deputado estadual.

Como foi sua entrada na política?
Posso dizer que foi na minha casa. Nasci em 1948, meu pai foi constituinte de 1946 e fundador do PSD. Quando fiz 18 anos, Nilo Coelho, que tinha sido constituinte com meu pai, foi governador e me convidou para ser oficial de gabinete. Depois fui secretário do Trabalho no governo de Moura Cavalcanti, que era primo de meu pai. Dos 18 aos 62 anos tive atividade política permanente, como secretário do trabalho, como diretor do Incra, como oficial de gabinete do governador, ou como coordenador da campanha de Roberto Magalhães, que foi bastante renhida. Na época havia o programa de debates A Marcha das Apurações na rádio Clube, comandado por Geraldo Freire. Tinha o maior índice de audiência da rádio de Pernambuco. Era primeira eleição depois de anos. Como a apuração demorava naquela época, ficamos 14 dias debatendo durante duas horas de programa. No final ganhamos por 89 mil votos. Depois fui prefeito do Recife, depois deputado constituinte, depois fui prefeito de novo, em seguida governador e deputado.

Como constituinte em que área trabalhou?
Em desenvolvimento urbano. Fui vice-presidente da Comissão de Reforma Urbana. No capítulo da família, defendi o planejamento familiar.

Por que?
Entendia que naquela época precisávamos ter critérios para que não explodisse a população. Só que havia contra isso os militares que defendiam a tese: homens sem terra para ir para terra sem homens, que era a Amazônia, o Mato Grosso. O que não era o melhor caminho porque são áreas de preservação. Hoje as classes A, B, C, D estão com um nível próximo à taxa de reposição. Mas a classe E ainda apresenta taxa maior. O planejamento familiar tem que ser feito, às vezes, com estímulo à diminuição do número de filhos, outras vezes, para estimular casais a terem mais filhos, como estão fazendo alguns países da Europa. As pessoas entendiam que o planejamento familiar era vasectomia, laqueadura de trompa, política dos países desenvolvidos para segurar o desenvolvimento dos demais países. Mas a visão era ter 1,8 a 2 filhos por casal, que seria taxa de reposição, quando se conseguisse o equilíbrio. O Brasil está terminando a fase do bônus demográfico, temos ainda 8 anos, ou seja, ter uma grande população jovem sustentando uma população velha que está aumentando. Em 2023 atingiremos 9 milhões de pessoas com mais de 80 anos, 14 milhões entre 70 e 80 anos e fora do trabalho, e o número de jovens estagnou. Talvez lá para 2040 faremos o que países da Europa fazem. Se tivéssemos feito o dever de casa nessa área teríamos uma situação mais confortável, nossa população teria se estabilizado em torno dos 160 milhões e não dos 204 milhões. Porque, ao mesmo tempo em que se tinha esse processo, tinha a tecnologia vindo atrás, cada dia mais expulsando a mão de obra.

Qual a diferença das campanhas anteriores para as atuais?
Estávamos 20 anos sem eleições, houve uma euforia pelo retorno delas. Participei de alguns atos da campanha das Diretas Já, verdadeiras apoteoses. Você queria o direito de votar e de transformar o País. Hoje o eleitor está chocado, não acreditando. A gente nem sabe para aonde vão coisas. Uma hora é reforma política – que não foi feita – outra hora é reforma econômica, uma visão de que se teria que fomentar o emprego e o crédito, do outro lado, tem que cortar e fazer o ajuste fiscal.

O senhor concorda com o ajuste?
Sem dúvida. Gastou-se muito pelo menos nos três últimos anos. Todos os programas estouraram o orçamento, como Fies, subsídios do BNDES, incentivos fiscais. O Estado brasileiro não cabe mais no PIB. Tem que fazer redução, melhorar a eficiência e promover cortes transitórios. As previsões antes eram de que 2015 teria um semestre de corte e no outro começaria o crescimento. Mas já engoliu 2015 com previsão de redução de – 3% no PIB e vai entrar 2016 com -2% . Acho que o Brasil nunca precisou tanto de centralidade, radicalizar o centro. Eu sou radical de centro. Pejorativamente o centro é visto como quem está em cima do muro. Não é isso. Existem experiências exitosas numa área em sistemas socialistas, outras, em países de economia puramente capitalista. Um país que está se desenvolvendo pode buscar o que Aristóteles buscou: a virtude está no meio. O Brasil só sai desse impasse com entendimento, como foi feito com Itamar.

Existe algum personagem político que possa hoje fazer esse papel?
Não. Está todo mundo ferido, inflamado, os partidos são uma multidão: 37 partidos! O eleitor sem acreditar que é possível sair da crise. Mas o País vai sair da crise por causa da vivência de tantas crises. Você tem as instituições funcionando, tem resposta em alguns setores, então dá para fazer alguma coisa. Mas não sem trauma.

O senhor foi governador numa época turbulenta. Como vê o cenário atual?
Iniciei o governo e durante dois anos Collor era presidente, depois veio um ano e meio com Itamar e seis meses de Fernando Henrique Cardoso. Então tive três presidentes, seis presidentes do Banco Central, seis ministros da economia. Tudo isso num governo. A avaliação que fiz: fui eleito com 51% dos votos no primeiro turno, ganhei a eleição para Jarbas Vasconcelos. Saí do governo com 57% de aprovação. Até pouco tempo, ter 57% não era uma coisa boa, mas ter 88% de aprovação. Eu andava no interior onde havia um prefeito com 94% de aprovação. Então fiquei calado, não tinha o que dizer. Agora Dilma chegou em 8%, aí agora eu é que sou herói (risos). Nada como o tempo, não é? O ideal não era se situar entre os 60%? Mas as pessoas são gulosas. No fim é 8 ou 80. Não é melhor ficar no meio?

E como chegar a esse caminho do meio?
É preciso acabar com esse impasse na Câmara, no Senado e no Executivo. Há turbulência em todos os setores: na área fiscal, na área política (porque é até difícil fazer uma reunião para discutir com 37 partidos). Eu votei e achei que ia ser um capítulo encerrado da história política do Brasil a cláusula de barreira para limitar a criação de partidos que não tivessem pelo menos 5% dos votos em 10 Estados. Foi aprovada essa lei. Recorreram e o Supremo revogou. Teríamos hoje 6 a 7 partidos. Seria um universo ótimo.

Falando em partido, o senhor era do PSB e agora filiou-se ao PSDB, por que?
Achei que concluí a minha missão no PSB. O governador Eduardo Campos me convidou para um projeto que tinha um longo prazo de execução, que passava por reformas de instituições, reformas no PSB, que ainda está em dívida com a memória de Eduardo, tem que fazer a reforma. As coisas mudaram, o mundo mudou, o partido precisa se modernizar, fazer alianças, etc. Só que eu perdi o ânimo com a saída de Eduardo.

E por que o PSDB?
Porque eu fiquei num ambiente onde sempre estive. Eu votei em cinco candidatos à Presidência da República do PSDB. Em 1986 fui convidado por Mário Covas para fundar o PSDB, que seria um partido à esquerda do PMDB. Mas por causa das disputadas locais não pude entrar no partido. Logo depois saiu como candidato a vice de Mário Covas, Roberto Magalhães. Aí nova briga, o PSB daqui vetou Roberto, porque diziam que era candidato da direita e não podia ser candidato do PSDB. Aí apoiei Color que ficou dois anos e aí veio Itamar, que já o conhecia. Ele me deu uma posição de muita aproximação, tanto que pela primeira vez na história Pernambuco teve um ministro da Fazenda que fui eu que fiz, que foi Gustavo Krause. Itamar Franco me chamou e disse: “o Quércia está me pressionando para dar a ele o Ministério da Fazenda. Eu não dou porque São Paulo já tem muito poder econômico. Não dou a Minas Gerais que já tem a mim. Vou fazer uma experiência nova, vou entregar a chave do cofre a uma pessoa que eu confio que é você”. Disse que eu não teria condições de ser ministro da Fazenda, por não ter suficiente conhecimento nem iria renunciar ao governo para ser ministro. Ele disse: “não, estou dizendo para você indicar.” Aí indiquei o meu secretário da Fazenda, Gustavo Krause, que foi ministro durante três meses.

Está nos seus planos se candidatar?
No momento não. Quando decidi sair do PSB, a primeira pessoa que comuniquei foi o governador. Entreguei uma carta e disse que possivelmente iria passar um período sabático sem filiação partidária. Depois imaginei: sou motorista, gosto de dirigir, tenho uma carteira de motorista. Gosto de viajar para o exterior, tenho um passaporte. E se de repente eu quiser ser candidato, por que vou ficar sem partido? Mas não é meu plano, sobretudo em 2016. Para 2018 eu poderei voltar a ser candidato. Mas não tenho a pressa que aniquila o verso. Já tenho a sedimentação da tranquilidade. Ocupei praticamente quase todos os cargos da República. Mas não posso dizer que estou fora porque tenho espírito público. Acho que agora é que estou no ponto, se fosse um doce de goiaba, estava saindo do tacho: maduro, experiente e com reconhecimento nos círculos onde caminho.

Na família tem alguém que segue os passos da política?
Não. Não sou muito favorável a não ser que isso brote de alguma vocação efetiva. Tenho duas filhas que, como eu, são advogadas, uma trabalha comigo e a outra em Brasília. E tenho outra que é engenheira civil. Quiseram lançar a candidatura de minha mulher uma vez, mas ela não quis.

Dizem que o senhor conhece muitos “causos” da política. Lembra-se de algum?
Num debate na TV, na eleição para governador de 1986, José Múcio tinha 42 anos e disse que ele representava o novo contra o velho, que era Arraes, com 76. Perguntaram a Arraes o que achava da comparação. Ele disse: “gosto de referências: Nero incendiou Roma com 33 anos, e Adenauer salvou a Alemanha com 84”. Imagine chamou José Múcio de Nero e ele de Adenauer! Foi uma campanha belíssima para nós que apoiávamos Zé Múcio, porque o pessoal trabalhava motivado, e para os que apoiavam Arraes, que tinha saído do palácio preso e ia voltar.

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