Após 30 anos sem avanços na área, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acaba de aprovar o primeiro tratamento inicial para pacientes com câncer de pulmão de pequenas células em caso de doença extensa: a imunoterapia atezolizumabe, da Roche, adicionada à quimioterapia. Esse é um tipo agressivo de tumor, com taxa de mortalidade de 87%. O novo tratamento de primeira linha diminui o risco de progressão do câncer e morte, aumentando assim o tempo de vida.
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o Brasil tem 31,2 mil novos casos de câncer de pulmão ao ano - o segundo mais incidente em homens (atrás do de próstata) e o quarto em mulheres (depois de mama, intestino e colo do útero). Em torno de 15% dos casos são de pequenas células e, entre esses, 70% correspondem a doença extensa. O paciente com esse subtipo de câncer tem, em média, 65 anos e sintomas agudos como tosse (geralmente com sangue), dor no tórax, cansaço e perda de peso sem causa aparente. A maioria é fumante ou tem histórico de exposição por tempo prolongado ao tabaco.
O atezolizumabe já é utilizado no Brasil para tratar câncer de pulmão de não pequenas células, tumores uroteliais e, em breve, câncer de mama triplo-negativo, cuja indicação foi aprovada pela Anvisa em maio. Essa imunoterapia bloqueia o PD-L1, proteína encontrada no tumor que impede o sistema imunológico do paciente de atacar o câncer. Ao minar este mecanismo de defesa do tumor e associar a quimioterapia, o tratamento consegue ser mais eficiente contra a doença.
O estudo IMpower 133 avaliou 403 pacientes e mostrou que 52% do grupo que recebeu atezolizumabe mais quimioterapia ainda se mantinham vivos (sobrevida global) em 12 meses em comparação com 38% no grupo que usou apenas quimioterapia. Em sobrevida livre de progressão, que é quanto tempo os pacientes viveram sem que o câncer piorasse, a diferença foi que, em 6 meses, havia 31% dos pacientes sem piora no grupo da combinação de imunoterapia com quimioterapia contra 22% no grupo de apenas quimioterapia e, em 12 meses, 13% contra 5%.
Desde a década de 1970, mais de 40 estudos de fase III avaliaram cerca de 60 moléculas em primeira linha de tratamento, manutenção e segunda linha, mas falharam por fatores diversos. “Durante décadas, ficou inalterado o padrão de tratamento para câncer de pulmão de pequenas células com doença extensa. Após muitas tentativas de buscar opções, os resultados com a imunoterapia representam um momento marcante para a oncologia”, afirma Gilberto Castro Júnior, professor da Faculdade de Medicina da USP e presidente do Grupo Brasileiro de Oncologia Torácica (GBOT). “Trata-se de um avanço real nesse cenário, tornando o atezolizumabe mais a carboplatina e etoposídeo [quimioterapia] o novo tratamento padrão para a primeira linha, enquanto continuam os esforços no campo da pesquisa em torno dessa doença, que ainda permanece sendo muito agressiva”, conclui o especialista.