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Avanços e desafios após 4 anos do BRT na Região Metropolitana do Recife

A experiência das grandes metrópoles do mundo mostra que mobilidade urbana não se revolve com mais rodovias e estacionamentos, mas com incentivo ao transporte público. Inspirado no modelo do TransMilenio, em Bogotá, e do sistema de ônibus rápido de Curitiba, nasceu o BRT (Bus Rapid Transit) do Recife nas vésperas da Copa do Mundo de 2014. Em operação há quatro anos, essa nova proposta de deslocamento coletivo de massa comemora avanços, mas enfrenta ainda alguns desafios. Quem era acostumado ao sistema convencional de ônibus e passou a ter a opção de usar o BRT aponta a grande vantagem da mudança: a velocidade. "Passamos bem menos tempo no trajeto. O mesmo percurso em que gastava uma hora ou mais no ônibus, hoje faço em 40 minutos", compara a universitária Nayara Duarte, moradora do município de Paulista. De acordo com pesquisa recentemente realizada pelo Instituto de Políticas de Transporte & Desenvolvimento (IPTD), o tempo médio de deslocamento foi reduzido em 28% no corredor Leste-Oeste e em 16% no Norte-Sul. No entanto, Nayara considera que o novo sistema ainda deixa a desejar em questões que passam pelo conforto e segurança. Ela reclama do calor nas estações onde o ar condicionado está quebrado e da ocorrência de assaltos em trechos mais longos entre as paradas. Em sintonia com a avaliação da passageira, o arquiteto César Cavalcanti, gerente de planejamento de transporte público do Instituto da Cidade Pelópidas Silveira, aponta três fragilidades do sistema que precisam ser resolvidas para a sua melhor operação: a melhoria do pavimento das vias para aguentar o peso desses veículos, um maior investimento em segurança e, principalmente, a segregação da via em toda a extensão da operação. "Esses fatores ainda precisam de resolução, mas, mesmo assim, é importante enfatizar que o sistema já consegue demonstrar para a população que é uma alternativa muito cômoda e objetiva do transporte coletivo. Os números comprovam que é um serviço com uma qualidade diferenciada da que estamos acostumados", comentou o especialista. Além de constatar o crescimento do número de passageiros ano a ano, a pesquisa do IPTD identificou a migração, mesmo que ainda lenta, de motoristas dos carros e motos para o BRT. Do público que viaja diariamente nesses ônibus especiais, 3% faziam o mesmo trajeto em transporte individual. A redução dos veículos particulares e dos ônibus convencionais que transitavam nos trajetos hoje operados pelo BRT trouxe também um benefício ambiental. A pesquisa apontou que os dois corredores do sistema evitaram o lançamento de 17,7 mil toneladas de CO2 por ano. Isso representa uma diminuição de 61% das emissões, quando comparado com a poluição gerada antes do início da operação. Do total dessa redução, "33,5% seriam resultantes da supressão de viagens em carros particulares, que transportam um número significativamente inferior de pessoas por veículo do que os articulados do BRT", apontou o estudo. O corredor Leste-Oeste, operado pela MobiBrasil, cresceu em número de passageiros de 10,4 milhões em 2015 para 12,2 milhões em 2016. Bateu um novo recorde no ano passado, com a marca de 17,8 milhões de usuários transportados. E as estimativas para este ano são de se aproximar dos 21 milhões. Para a vice-presidente da empresa, Andréa Chaves, a conclusão das obras na Avenida Conde da Boa Vista foi fundamental para o aumento do fluxo de passageiros no ano passado. No entanto, ela avalia que esse avanço contínuo é fruto de uma série de características do BRT que tem atraído novos usuários. "O sistema trouxe um avanço significativo no conforto dos passageiros, com a operação desses veículos diferenciados, com ar condicionados e baixo nível de ruído. Nas estações há o embarque em nível, o que reduz também o tempo no acesso aos ônibus. O tempo de viagem é menor, pois é corredor exclusivo, mas infelizmente ainda não está totalmente segregado". Andréa refere-se aos trechos do final da Caxangá e do Derby, nos quais os ônibus articulados dividem a via com veículos particulares, fazendo com que velocidade média caia dos 18km/h a 20 km/h para 6 km/h. "Precisamos melhorar ainda mais a velocidade comercial para que os veículos possam fazem mais viagens, e assim, beneficiar ainda mais o serviço para os passageiros", defende Andréa. Além da conclusão das obras do corredor que é de responsabilidade do Governo do Estado, outra medida defendida pela empresa para acelerar mais as viagens é o uso de semáforos inteligentes. Gbson Pereira, diretor institucional da Conorte, empresa que opera o corredor Norte-Sul, aponta os mesmos benefícios do sistema para os usuários e destaca ainda o pagamento antecipado das passagens, que contribui para o embarque mais rápido e para mais segurança nas estações. No trajeto desse corredor, ele afirma que a redução do tempo de viagem é em torno de 25 minutos. "Esse ganho não se verifica ainda na totalidade da capacidade do sistema porque os ônibus articulados dividem espaço com os demais veículos quando chegam ao Centro Expandido do Recife. Apesar de ser o menor trecho, é o de maior complicação no tráfego". Além dos desafios internos do sistema, o diretor de operações do Consórcio Grande Recife, André Melibeu, defende que a operação mais adequada do BRT depende também de investimentos urbanos na qualificação da caminhabilidade dos pedestres da RMR. "A acessibilidade das pessoas é fundamental para o nosso serviço. As calçadas e a iluminação pública bem mantidas, com segurança no entorno das estações, são importantes para que o pedestre chegue no nosso sistema". Um dos problemas identificados na pesquisa do IPTD foi justamente a falta de manutenção das calçadas, que segundo o estudo "torna a circulação de pedestres pouco atrativa". Além disso, Melibeu ressalta a importância de estimular a integração do sistema com outros modais, como bicicletas. "Essas medidas contribuem para melhorar as possibilidades de deslocamento dos pedestres e aumentar a participação do sistema BRT dentro das cidades, para integrá-lo de forma mais plena", comenta o diretor do consórcio. OBRAS De acordo com a Secretaria das Cidades do Governo de Pernambuco, no corredor Leste-Oeste a próxima obra a ser entregue é o TI da IV Perimetral,

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O mal-estar da mobilidade (Por Gustavo Costa)

A expectativa era de padrão Fifa. A execução das primeiras concessões de serviço de transporte de passageiros da Região Metropolitana do Recife foi iniciada durante a Copa. Os dois primeiros lotes de linhas (sete licitados), beneficiados por BRTs, passavam a integrar a operação transitória dos Corredores Norte- -Sul e Leste-Oeste. Após dois anos, e três das “Jornadas de Junho”, grassa o mesmo mal-estar coletivo com o padrão do serviço de mobilidade. Apesar dos vultosos investimentos públicos e privados, a operação segue transitória; da boa aceitação dos BRTs, a infraestrutura de vias e terminais segue inacabada, travada e insegura; dos ganhos de escala e velocidade em algumas linhas, caras estações depredadas e dezenas de BRTs depreciando em garagem são o pior retrato da ineficiência, do desperdício e improviso. Afinal, o que deu errado? Seguramente, o impacto da maior crise econômica da história brasileira explica muito. Não tudo. Outra parte da explicação está em velhos e conhecidos gargalos da gestão pública, cujas soluções demandam diagnóstico, esforço e prioridade na agenda política metropolitana e local. Em primeiro lugar, há a secular cultura da insegurança jurídica nos contratos públicos. Não é eficiente licitar às pressas para fazer bonito na Copa. São indispensáveis planejamento e regras que projetem estabilidade, equilíbrio entre direitos e obrigações, proteção contra casuísmos burocráticos, além da garantia de retorno do investimento a taxas de mercado. Em síntese, expressivos investimentos público-privados em infraestrutura de mobilidade reclamam marco legal e contratual estável, equilibrado desburocratizado e previsível. A falta de concorrentes na recente licitação internacional, as prenunciadas dificuldades nos contratos em execução e o atraso dos contratos pendentes sinalizam que o gargalo da insegurança jurídica não tem sido bem compreendido pela gestão pública. O segundo gargalo é a ineficiência da gestão e regulação. Quando de sua criação (2007), o Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano, sucessor da extinta EMTU, era uma inovadora ideia no papel: a primeira empresa pública multifederativa destinada à gestão do complexo sistema de transporte metropolitano, com estrutura societária, organizacional e financeira. Quase 10 anos depois, a ideia não pegou: os municípios consorciados não compraram o projeto, o governo estadual banca sozinho o “consórcio”, com escassos repasses, e o Grande Recife, apesar do esforço de alguns técnicos abnegados, segue desestruturado, sem equipe e receitas à altura da sua missão. É uma grande ideia fora do lugar, a reclamar urgente simplificação. Por fim, o mais importante: o atual modelo de financiamento da mobilidade está esgotado. As “Jornadas de Junho” de 2013 deixaram claro que a sociedade não suporta mais expansão de tarifas sem contrapartida eficiente. Por outro lado, o retorno da inflação a partir daí, potencializada pelo represamento artificial de preços administrados, confirma que a alternativa não é o “lanche grátis”. No mundo rico, a sociedade financia boa parte da conta com subsídio público. No Brasil, e em Pernambuco, o sistema é dependente de tarifa, paga pelos pobres e sem subsídio eficiente. A conta da mobilidade é injusta e não fecha. A solução do complexo problema do financiamento passa pelo fim da dependência tarifária, com a ampliação das fontes de receita, inclusive subsídios orçamentários. Alternativas existem, algumas delas impopulares para a classe média, a exigir muita prioridade política. E há também alternativas mais sofisticadas, como os fundos de infraestrutura, tal como previsto na recente MP 727/2016. Pernambuco já ensaiou um fundo garantidor de mobilidade, mas abortou a ideia. É hora de retomá-la, agora com impulso federal. A mobilidade entrou na agenda política pelo grito das ruas de 2013. A Copa e a crise político-econômica secundarizaram sua pauta, mas o mal- -estar coletivo e silencioso continua. O silêncio das ruas acabará cedo ou tarde. Já passou da hora de os atores políticos locais e metropolitanos formularem respostas para um problema que também é seu.

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