As novas tecnologias estão mudando todos os setores econômicos e muito do cotidiano dos indivíduos do mundo inteiro. As inovações digitais invadiram os hospitais, as salas de aula, a indústria, mudaram o comércio, além de impactarem uma diversidade de serviços. Elas também têm sido empregadas na busca de soluções para as cidades.
De acordo com Roberto Montezuma, nosso entrevistado do mês, as cidades são a maior invenção do homem. Mas, ao mesmo tempo, é nelas que está concentrada uma série de problemas que aguardam alternativas para tornar a vida urbana mais agradável e eficiente para as pessoas e para o desenvolvimento econômico municipal. Um desafio para todos os centros urbanos, que vão concentrar dois terços da população mundial até 2050, segundo a ONU. E também para o Recife, que conta com um parque tecnológico de ponta na sua região central.
Para Sílvio Meira, presidente do Conselho do Porto Digital, apesar dos países conterem as cidades, são nelas, no entanto, onde a vida acontece e onde atualmente se dá, de forma mais acentuada a competição global econômica. “Estamos vivendo numa época de ‘microeconomificação’ do mundo, no sentido de que a cidade passa a ser pensada e repensada como centro da atividade criativa, econômica e logística”, conceitua.
Se as cidades passam a ter cada vez mais um papel central nas decisões econômicas e é nelas onde acontece um processo contínuo de concentração populacional, como usar os avanços tecnológicos para melhorar a qualidade de vida urbana? As respostas estão sendo construídas em várias frentes. Talvez passe despercebido para você, mas os sistemas de compartilhamento de bicicletas é um exemplo de como a tecnologia está no cotidiano das cidades. Outro case é o monitoramento eletrônico para fiscalização de excesso de velocidade ou para o apoio da segurança urbana.
Segundo Guilherme Cavalcanti, diretor executivo da Agência Recife para Inovação e Estratégia (Aries) as contribuições se dão em diferentes estágios. “Antes de ser uma plataforma de automação para trazer benefícios na rotina da cidade, a primeira contribuição que a tecnologia pode trazer é habilitar o cidadão à participação nas decisões do município”. Ele cita o aplicativo Colab, desenvolvido por uma empresa pernambucana, como a ferramenta mais característica dessa contribuição e menciona como alguns representantes do poder público, como os vereadores Jayme Asfora e Ivan Morais, já usam as redes sociais para dar voz aos munícipes.
O diretor da Aries sinaliza que a segunda contribuição é de permitir a produção e o acesso cada vez maior de informações para o uso das políticas públicas. Na experiência recifense, por exemplo, a última pesquisa de Origem-Destino, que serve como base para o desenvolvimento das políticas de mobilidade urbana, foi realizada pelo Instituto Pelópidas Silveira por intermédio de uma ferramenta digital. “Gerar dados mais precisos sobre a cidade dá uma maior capacidade de eficiência para a gestão pública”.
A terceira forma das novas tecnologias impactarem a experiência de vida na cidade é aumentando a interatividade e até proporcionando diversão às pessoas nos espaços públicos. “Existem experimentos recentes, como a prototipação de mobiliários urbanos interativos, como o Playable City, que foi uma parceria do poder municipal com o C.E.S.A.R. Há também a experiencia do L.O.U.Co (Laboratório de Objetos Urbanos Conectados) no Porto Digital. Mas isso é apenas a ponta do iceberg de como vamos usar as tecnologias”, afirma. O L.O.U.Co, por exemplo, tem a proposta de conectar jovens empreendedores para encontrar soluções para os problemas estruturais da cidade e propor melhorias urbanas com uso de tecnologia da informação. Já o Playable City está ligado à proposta de tornar a cidade um espaço “jogável” ou “brincável”.
Ele ressalta que, a partir do momento em que a cidade tem uma maior capacidade de processar informações, poderá trabalhar questões como o gerenciamento remoto do parque de iluminação pública e até a sincronização de semáforos, a partir de dados coletados em aplicativos de mobilidade.
Com a proposta de tornar a cidade mais interativa, com o uso das novas tecnologias, o C.E.S.A.R. criou o projeto Playtown. O objetivo é democratizar a inovação que faz parte do DNA do Bairro do Recife, promovendo experiências de forma lúdica e moderna. “Levantamos problemas e dificuldades da cidade e criamos alternativas de forma a tornar os espaços urbanos mais interativos e divertidos para seus cidadãos e encaminhamos os projetos para o poder municipal”, afirma Filipe Pessoa, executivo-chefe de Empreendedorismo do C.E.S.A.R..
Uma das propostas é a criação de uma rua interativa que captaria o sentimento da população a partir de totens. “As pessoas são convidadas a responder nesses totens como está o seu humor. À medida em que votam, a iluminação da rua vai mudando. Essa era uma forma lúdica de incluir um componente de tecnologia na rotina da cidade”, explica.
O uso das tecnologias a favor das cidades tem vários cases de sucesso. O ranking Connected Smart Cities, que avalia a integração entre a tecnologia e inovação com a mobilidade, urbanismo, economia, educação entre outros temas, apontou o Recife como a 10ª cidade mais inteligente e conectada do País em 2017, sendo a melhor da região Nordeste. A liderança é da capital do Estado de São Paulo entre mais de 500 municípios.
EXPERIÊNCIAS DIGITAIS
A tecnologia em prol da cidade será um dos temas que vai permear o evento Rec’n’Play. Promovido pelo Porto Digital, do dia 30 deste mês a 3 de dezembro, em parceria com a Ampla Comunicação, o projeto pretende ofertar à capital pernambucana um festival tecnológico de porte internacional que dialogue com a cidade. “Vamos tratar de conectividade, criatividade e conexões em comunidades digitais num lugar onde o Recife é mais digital: o Bairro do Recife. Vamos fazer um conjunto de experiências criativas em educação, negócios e entretenimento, como um festival, aberto e disperso pela ilha. Com isso, vamos abrir o digital para a cidade”, afirma Sílvio Meira.
Planejado em seu primeiro ano para acontecer apenas no Bairro do Recife, o evento deve se espalhar pela cidade nas próximas edições, de acordo com os organizadores. A iniciativa é arrojada e pretende entrar no calendário internacional como um dos principais festivais digitais do mundo. Já no seu primeiro ano de realização a expectativa é receber 30 mil pessoas.
Diferente do formato clássico de apresentações e palestras, o Rec’n’Play é organizado em trilhas e percursos, em que o participante é convidado a se deslocar pelo bairro fazendo o roteiro que mais lhe interesse. “Trazemos uma programação com atividades simultâneas e sequenciais, com temas como internet das coisas, cidades inteligentes, fabricação digital, sustentabilidade, que é um problema fundamental a ser discutido no Recife, entre outros assuntos”, informa Silvio Meira.
Mais que promover uma série de ações simultâneas distribuídas pelo território do Bairro do Recife, o evento está estruturado de forma que as atividades interajam umas com as outras. Cada ação do programa integra uma das 7 trilhas: tecnologia da informação e comunicação (TIC); IoT (internet das coisas), fabricação digital e robótica; design; desenvolvimento de games; games e-sports; fotografia; e música. Cada uma delas tem uma curadoria especializada responsável pela organização.
Para o co-presidente da Ampla, Manuel Cavalcanti, o Rec’n’Play tem o potencial de tornar as empresas de tecnologia da ilha mais conhecidas pela população e pelas empresas pernambucanas. “Esse evento irá ajudar o Porto Digital a ter uma visibilidade maior e a se aproximar da comunidade, que ainda conhece pouco desse trabalho. Além da população, as próprias marcas podem buscar soluções para seus problemas. Existem várias startups e empresas já consolidadas fazendo um trabalho de vanguarda aqui no Recife. E nosso trabalho é colocar esses atores em contato a partir do festival”, afirma Cavalcanti.
A Prefeitura do Recife e o Governo de Pernambuco são os patrocinadores do evento, que conta também com o apoio do Sebrae. Além de estimular essa interação do parque tecnológico do Porto Digital com a cidade, poder público municipal e estadual estão interessados em promover na capital pernambucana o turismo tecnológico. “O Estado tem vocação turística com vários segmentos como sol e mar, história, cultura. Por que não uma cidade voltada para inovação e tecnologia ter um evento dessa magnitude? O Rec’n’Play será um marco para o turismo tecnológico no Recife, que será a capital da inovação e da tecnologia do Brasil nesse período”, declarou o secretário de Turismo de Pernambuco, Felipe Carreras.
O prefeito Geraldo Julio ressaltou o potencial do Rec’n’Play para o desenvolvimento dessa área do turismo na cidade. “Estamos falando de um evento que é inspirador, ligado à inovação e à economia criativa, mas que contribui muito para o turismo também. O turismo que está tão atrasado no País inteiro. Estamos entrando no segmento mais inovador que é o de tecnologia, que está gerando eventos grandes pelo mundo”, afirmou o prefeito.
Mais informações sobre o Rec’n’Play no site: recnplay.pe
*Por Rafael Dantas, repórter da Algomais – rafael@algomais.com