“Temos que olhar o mapa do Nordeste sem as fronteiras que nos separam” – Revista Algomais – a revista de Pernambuco

“Temos que olhar o mapa do Nordeste sem as fronteiras que nos separam”

Um conjunto de entidades empresariais ligadas à engenharia de Pernambuco, Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte se reuniu na sede do Sinduscon-PE para articular a defesa da recuperação da antiga Malha Nordeste que conectava por trilhos os quatro Estados. Sem operações há mais de 10 anos, ela pode agora ser devolvida pela concessionária FTL (Ferrovia Transnordestina Logística) que entrou com um pedido de devolução junto à ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).

Guilherme Cavalcanti, secretário de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco, esteve presente no evento e integra também o esforço de recuperar o modal considerado indispensável para a economia regional. Nesta entrevista a Rafael Dantas, ele faz também um balanço da sua pasta no primeiro ano de gestão do Governo Raquel Lyra e comenta sobre os planos para 2024. Ele prevê, por exemplo, que as obras para o primeiro trecho do Arco Metropolitano podem começar ainda este ano, já que o projeto executivo fica pronto em abril, o que abre caminho para realizar a licitação.

O que o Estado pretende fazer diante de mais uma iniciativa prejudicial da concessionária que, depois de excluir Suape da Transnordestina, agora quer abandonar a Malha Nordeste?

Esse é um movimento que deixa evidente que a atual Transnordestina incompleta deixou de ser um projeto de nação e passou a ser, exclusivamente, um projeto de quintal da empresa A ou B ou C. É lamentável que o País esteja se submetendo ao capricho individual de uma empresa. A certeza que temos é que estamos na defesa do que é correto e isso é o que alimenta a força da nossa luta. Vamos, cada vez mais, expor a realidade de que o Nordeste, principalmente o Nordeste Oriental, com os estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas, está sendo alijado da possibilidade de ter, de fato, uma maior competitividade.

Em Pernambuco vamos seguir firmes na cobrança dos compromissos reforçados pelo Governo Federal no que diz respeito ao trecho Salgueiro-Suape. Mas, agora, integraremos também essa luta para a reativação de uma conexão das regiões econômicas mais pujantes do Nordeste Oriental. Isso significa ligar o norte do Rio Grande do Norte ao sul de Alagoas e fazer isso dentro de uma concessão que possa privilegiar a integração dessas regiões.

Por fim, a gente já tem dito isso, mas gosto de ressaltar sempre: não estamos falando do trecho Salgueiro-Suape, mas do trecho Suape-Ferrovia Norte e Sul [com a conclusão da Transnordestina fica mais factível a possibilidade de conectar o porto pernambucano com essa importante ferrovia que é a Norte Sul]. Se o Brasil quiser levar a sério o desafio de ter uma integração ferroviária que entrega competitividade, precisamos conectar o Porto de Suape, que é o hub port do Nordeste, às regiões produtivas do Matopiba (sigla para Maranhão, Tocantins, Piauí, Bahia) e ao País como um todo através da Ferrovia Norte-Sul. Temos uma oportunidade de fazer isso. Os planos do Brasil sempre apontaram nessa direção e não faz nenhum sentido que as pessoas abandonem essa linha estratégica. Então, é isso que a gente vai cobrar permanentemente.

Qual a importância dessa articulação regional das entidades empresariais para retomada da antiga Malha Nordeste?

A área de influência de Suape vai de Natal à Maceió. A gente serve às principais áreas metropolitanas de todo o Nordeste Oriental, servimos às grandes cidades do interior e é isso que tem sustentado a demanda. Nesse embate em defesa da Transnordestina, o Porto de Suape, em parceria com a Federação das Indústrias e o Senai, está realizando estudos de cargas e ampliando o raio desses estudos para alcançar todas as regiões produtivas aqui no Estado e prospectando cargas muito além do limite de Pernambuco e do Nordeste Oriental.

Então, é fundamental o fato de o governador da Paraíba [João Azevêdo] ser o presidente do Consórcio Nordeste, o ministro dos Transportes ser alagoano, termos no Rio Grande do Norte talvez o maior potencial das energias renováveis do Brasil e quiçá do mundo. Há uma revolução se iniciando que começa pela capacidade dos ventos e do sol, que tem brilhado um pouco mais forte no Rio Grande do Norte. Tudo isso vai se integrar numa economia pujante que está, sim, ao longo das nossas capitais. Precisamos defender que essa integração se faça de uma forma que fiquemos cada vez mais perto em vez de cada vez mais longe.

Temos que começar a olhar o nosso mapa sem as fronteiras que nos separam. O Estado da Paraíba, por exemplo, de forma muito inteligente abraçou o polo automotivo da Stellantis, como sendo o polo da Paraíba também. Essas grandes obras e grandes investimentos que integram e desenvolvem o Nordeste têm impacto que repercute na região toda e tem que ser objeto de defesa radical da gente.

No ano passado o Governo Federal fez um gesto de incluir no PAC o trecho pernambucano da Transnordestina até Salgueiro. O que foi feito de lá para cá?

Primeiro, estava correndo o prazo do levantamento de haveres, ou seja, uma auditoria final para que possam ser recebidos os trechos que estão principalmente entre Salgueiro e Custódia. Trata-se de levantamento de ativos, a valoração disso para que possa concluir o processo que teve início no Aditivo Nº 1. Isso é o processo que andou, a companhia fez a sua parte, a ANTT fez a sua também, isso agora está em análise pelo ministério e ele tem um prazo para concluir e estamos acompanhando. Além disso, criamos um grupo de trabalho entre o Governo de Pernambuco e o Federal para desenhar uma nova modelagem de concessão.

Já vimos três modelos possíveis que estão sendo explorados e serão aprofundados para que possamos propor isso mais adiante. Também foi colocada à mesa a possibilidade de invertermos parte dessa obra, tendo seu início a partir do Porto de Suape. Isso ainda está em fase de estudo, é cedo para dizer se esse será ou não o caminho a ser trilhado. Mas, o fato é que como não há devolução de ativos nesse trecho, seria uma obra nova, teríamos menos amarras e menos problemas do ponto de vista de tempo para poder fazer. Estamos analisando também essa possibilidade em parceria com o Ministério dos Transportes.

O fato novo é a inclusão da defesa de uma malha nova no Nordeste que conecte as economias do Rio Grande do Norte, da Paraíba, de Pernambuco e de Alagoas ao interior do País através da ligação Suape-Norte Sul.

O senhor poderia explicar essas três alternativas?

Na verdade, seriam: uma nova concessão federal, um chamamento público ou uma delegação do Estado de Pernambuco. Uma nova concessão federal demanda novos estudos, não mais do ponto de vista da engenharia, porque boa parte disso já está equacionada, mas do ponto de vista de viabilidade para se estabelecer quais são os fatores, principalmente o custo total da modelagem econômica para atrair um novo operador privado.

O chamamento público não é precedido por estudos tão minuciosos. Ele simplesmente vai à praça pública ofertar o que seria essa concessão e, aí, o cliente privado oferta com base nos seus próprios estudos. A concessão federal, por ser mais minuciosa e por dotar o poder público do conhecimento mais detalhado da viabilidade econômica, permite que o Governo Federal participe do processo de equacionar a conta econômica-financeira, significa dizer que ele pode aportar algum recurso. No chamamento não, ele simplesmente sinaliza ao mercado, o mercado assume e tem que cumprir aqueles compromissos.

Já a terceira opção, seria delegar ao Estado de Pernambuco para que o governo fizesse uma nova concessão. Essa é uma possibilidade que a gente só contemplará se ela vier agregada com recursos federais para que a gente possa estruturar isso da forma correta e não expor Pernambuco a um risco que a gente possa amanhã ou depois não ter verba para fazer a obra.

Há alguma alternativa preferencial?

Estamos tendo muito zelo nessas análises, não estamos descartando nenhuma possibilidade, mas o fato é que a gente tem avançado muito. Cabe o registro de que a Infra S/A, a ANTT e o ministério, por meio da sua Secretaria de Transportes Ferroviários, estão envolvidos no processo e muito animados com o que vem pela frente. Deveremos ter anúncios de prazos, de eventos que vão correr o mundo em 2024, muito em breve.

O que ministro dos Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, sinalizou sobre a ferrovia no evento de anúncio dos investimentos da Refinaria Abreu e Lima?

Silvio falou da possibilidade de termos ordem de serviço em setembro. Não descartamos essa possibilidade por vários motivos. Primeiro e, principalmente, pelo trabalho que a gente vem fazendo, um trabalho muito duro e muito diligente, mas que tem avançado muito. Segundo pela pressão que a gente vem colocando. É importante lembrar, a governadora hoje (dia19) citou 28 viagens à Brasília ao longo do ano de 2023 e em todas ela aproveitou a presença para pressionar sobre esse tema. Nós temos ministros pernambucanos que estão lá o tempo todo na defesa de Pernambuco. O ministro Silvio Costa Filho tem sido um dos mais ativos nesse ponto, até pela sinergia da pasta dele com a pasta de transporte.

Fiquei muito feliz com a declaração dele e posso dizer que da parte do trabalho técnico que está sendo feito não é impossível que a gente cumpra os prazos daquilo que ele anunciou, é uma possibilidade que a gente tem que contemplar.

Deixando um pouco a ferrovia de lado, teve um grande anúncio do governo federal, entre outros investimentos, o da conclusão da refinaria. Como esse anúncio impacta as perspectivas econômicas do Estado e como o governo pretende atuar para aproveitar esse grande aporte nacional?

Primeiro, a gente cumpriu em 2023 um trabalho fundamental que foi a dragagem do canal externo de Suape (o lançamento do edital da licitação) e o licenciamento ambiental da dragagem do canal interno). Ambos são fundamentais para a capacidade do porto para receber navios de grandíssimo porte do ponto de vista do uso da Petrobras e segundo para que a gente possa, de fato, consolidar a presença do novo terminal de contêineres que chega com a APM Terminals.

Esses dois atos em Pernambuco por si só desencadearam um conjunto de fatos que têm impacto direto na nossa economia. Com a conclusão do processo de dragagem e licenciamento ambiental, foram satisfeitas as condições precedentes que estavam no negócio entre a APM Terminals e o estaleiro Atlântico Sul. Com isso, foi feito um pagamento de R$ 500 milhões ao estaleiro, o que permitirá começar as obras para implantação do terminal.

Qual o impacto para a recuperação do Estaleiro Atlântico Sul?

Com isso começa uma reação em cadeia, primeiro uma empresa que tem recuperação judicial, que é o caso do Estaleiro Atlântico Sul, mas que nunca deixou de trabalhar. O trabalho correto da recuperação que é tentar salvar a companhia, honrar seus credores e garantir a continuidade dos empregos dos seus colaboradores. Hoje o estaleiro que recebe essa injeção de capital vai irrigar, em certa medida, o mercado porque vai honrar os compromissos com os credores mas, principalmente, vai retomar uma posição de saúde financeira que permite pegar novos contratos e novas encomendas. Hoje o estaleiro tem 1.600 colaboradores fixos e já tem seis meses de encomenda para frente.

Então, o estaleiro tem a garantia de operação. A partir do que foi anunciado pela governadora e pelo presidente Lula, vamos fazer um trabalho forte para que as novas encomendas da Petrobras e da Transpetro cheguem aos nossos estaleiros, para reativar a indústria naval.

Então começa a ter uma mexida importante, ou seja, o aumento da capacidade de tamanho de navios, a viabilidade do cais que vai ser destinado ao terminal de contêineres, a reativação da indústria naval e, com isso, começam a chegar outras empresas no setor de energia, que a gente não pode divulgar, mas que estão integradas à cadeia produtiva de uma nova forma de uso energético, principalmente no combustível de navios e de avião. Junto a essas empresas vêm também outras que olham para Pernambuco com uma possibilidade de produzir aqui amônia e hidrogênio verde.

Quais os efeitos esperados em Suape com o anúncio das novas obras bilionárias na Refinaria Abreu e Lima?

Há toda uma cadeia que se desenvolve a partir disso. O que o anúncio traz de verdade é concretude. O mercado se mexe com base em perspectivas com alta probabilidade de acontecer. Quando você começa a ter esses gestos firmes, quando o Governo Federal retoma processos que impactam a nossa economia, isso transborda para outros segmentos produtivos que se mobilizam a partir dessas perspectivas. Estamos muito confiantes de que vamos viver um ano de 2024 especial e que isso pode reabrir um círculo virtuoso na economia de Pernambuco e que provavelmente vai acontecer.

No ano passado vocês tiveram algumas conquistas de captação de crédito muito grandes no Estado. Esse dinheiro já começou a chegar ou um montante maior ainda vai entrar?

Esse dinheiro começou a chegar, já foi anunciado pela governadora parte da destinação disso para obras de infraestrutura no setor hídrico, principalmente na parte das adutoras e barragens mas, principalmente, olhando pelo lado do desenvolvimento econômico, muitos investimentos em estradas.

Isso vai gerar um impacto muito positivo. É um processo longo entre a contratação do crédito, a chegada do recurso, a disponibilidade dos projetos executivos a serem contratados e, aí sim, a licitação. Mas fizemos isso em 2023 em tempo recorde. Sou testemunha de quando ainda em março ou abril todos os técnicos envolvidos no processo diziam que não ia dar tempo, que a gente não iria conseguir. E num esforço pessoal, a governadora botou a faca nos dentes e fez isso acontecer. Pernambuco vai retomar a capacidade de investimento que não tinha há bastante tempo e vai direcionar ao mesmo tempo investimentos obrigatórios com saúde e educação para que a gente tenha uma animação na nossa economia.

A chegada maior de recursos virá em que prazo?

Fica difícil falar porque não está na minha pasta, mas eu diria que a gente vai começar a ver obra já no primeiro semestre. As obras muito grandes, com maior complexidade de projetos, ainda demoram um pouco mais. Por exemplo, o projeto executivo do Arco Metropolitano fica pronto em abril. Com esse projeto executivo pronto e com a gente fazendo os licenciamentos, conseguimos iniciar um trecho dele ainda este ano. O presidente foi cobrado pelo setor empresarial pernambucano, por meio do movimento Atitude Pernambuco, em relação à Transnordestina, mas também em relação ao Arco Metropolitano.

O presidente reforçou o compromisso de destinar recursos do PAC para o Arco Metropolitano e isso é algo que a gente também está costurando com o Ministério dos Transportes. Faremos um trecho do Arco, mas parte dele deve vir com recurso federal, via Ministério dos Transportes. Estamos muito confiantes com o que vem pela frente. E, claro, muito investimento na área de projetos. Pernambuco vinha sem projetos estruturantes, não tinha uma carteira à mão e o que a gente está fazendo agora é acelerar essa carteira.

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