“Temos um robusto ecossistema empreendedor cercado por péssimas estradas”

Conhecido pela determinação de seus empreendedores, o Polo de Confecção do Agreste superou mais uma dificuldade ao atravessar o complicado período da pandemia. Hoje o setor se recupera da crise sanitária e econômica e investe em novas tecnologias, principalmente na venda pela internet e, segundo Bruno Bezerra, presidente da CDL (Câmara de Diretores Lojistas) de Santa Cruz do Capibaribe, são boas as perspectivas para o segundo semestre.

Mas o polo ainda enfrenta desafios como os transtornos logísticos provocados pela situação das rodovias na região, o antigo problema do abastecimento de água, além de dificuldades na área da segurança. Outro tema que tem trazido dor de cabeça aos empresários do ramo de confecções no Agreste é a isenção concedida pelo Governo Federal nas importações de compras de até US$ 50.

Nesta entrevista a Cláudia Santos, Bruno Bezerra analisa as dificuldades e os progressos do setor e como o anúncio do PAC e o fato de a governadora Raquel Lyra ser do Agreste e conhecer a realidade local podem ajudar a solucionar os gargalos do setor.

Como está a conjuntura atual do Polo de Confecções, neste pós-pandemia?

No decorrer de uma jornada empreendedora de aproximadamente 60 anos, um dos grandes diferenciais do Polo de Confecções do Agreste Pernambucano tem sido uma incrível capacidade de adaptação para melhor posicionar-se diante de adversidades e oportunidades. Foi assim durante a pandemia e tem sido assim no pós-pandemia.

Este ano, por exemplo, depois de décadas, mudamos os dias de funcionamento do Moda Center, a nossa principal feira, que acontece em Santa Cruz do Capibaribe, cidade-mãe do Polo de Confecções do Agreste. Antes era realizada sempre às segundas e nos períodos de alta temporada (maio, junho e novembro/dezembro) aos domingos e segundas. Atualmente a feira acontece às sextas. Uma mudança necessária para ganharmos competitividade e nos adaptar a uma nova dinâmica logística do mercado, além de promover a qualidade de vida dos nossos empreendedores.

Outro ponto relevante no pós-pandemia tem sido a profissionalização do processo de digitalização das empresas do polo. Nossos empreendedores entenderam a importância estratégica de dominar as vendas digitais e aliar o físico com o digital no negócio.

Como tem sido esse investimento das empresas nas vendas digitais e quais os resultados?

Muitas empresas do Polo de Confecções estão conseguindo um excelente nível de maturidade digital. Isso acontece quando o empreendedor de curiosidade aguçada decide investir tempo e recursos financeiros na preparação das equipes e na adequação da estrutura para dominar as vendas online, além de se manter atualizado com as mudanças que acontecem cada vez mais rápido. Os resultados têm sido os melhores possíveis, sobretudo porque os empreendedores não precisam deixar as vendas presenciais por causa das vendas online. Eles estão entendendo que não é um contra o outro, é um com o outro, é o digital como mais um canal de vendas.

Qual foi o crescimento de vendas e/ou faturamento do setor no ano passado e quais as perspectivas para este ano?

São períodos complicados para termos como referência, pois em 2021 e 2022 houve uma forte influência da pandemia no ambiente de negócios. Já em 2023 houve uma mudança de Governo Federal, depois de uma das mais polarizadas eleições para presidente da República, o que gerou um cenário de incerteza que praticamente paralisou o mercado. A partir do início do segundo semestre de 2023, começamos a ter mais clareza da situação. Esperamos ter boas rodadas de negócio no mês de agosto e um excelente período de alta temporada nos meses de novembro e dezembro.

Qual a perspectiva do setor em relação à gestão da governadora Raquel Lyra, que é do Agreste Pernambucano?

A expectativa é a melhor possível. Pela primeira vez na história temos uma governadora que é do Agreste Pernambucano e conhece bem o potencial do Polo de Confecções. Contudo, temos também desafios gigantescos. Se levarmos em consideração que a maior parte dos insumos vem de fora de Pernambuco e a maioria também dos clientes que compram no polo vem de outros estados, podemos afirmar que nosso negócio é essencialmente de logística.

Hoje temos no Polo de Confecções do Agreste Pernambucano um robusto ecossistema empreendedor cercado por péssimas estradas de todos os lados (do território pernambucano). O problema do abastecimento d’água que se arrasta por décadas e dificulta a promoção de um real desenvolvimento socioeconômico. Sem falar na falta de segurança que afasta compradores do Polo de Confecções com a violência nas cidades que formam o polo e, especialmente, com os assaltos que acontecem constantemente nas estradas que levam até as feiras de Santa Cruz do Capibaribe, Toritama e Caruaru.

O setor já levou essas questões para a governadora? E como o setor avalia o anúncio do PAC que entre outros investimentos prevê adequação da BR 104 (Caruaru – Divisa PB) e a primeira etapa da Adutora do Agreste Pernambucano?

Constantemente essas questões são levadas para o Governo do Estado, agora em agosto tivemos reunião com a secretária de Defesa Social para tratar da questão da segurança. A questão da BR-104 em 2024 completará 15 anos. Uma situação lamentável, uma vergonhosa debutante que promove prejuízos ao nosso ambiente de negócios e vem tirando a vida de muitas pessoas com diversos acidentes ao longo de todos esses anos. A questão da água é um apelo de décadas. Durante todo esse tempo nunca desistimos de gritar, por mais que todos parecessem surdos.

Como sempre, nos resta continuar trabalhando duro no fortalecimento do Polo de Confecções do Agreste Pernambucano, um dos mais robustos ecossistemas de negócios da América Latina. Por mais que a jornada até aqui diga que não, é nosso dever abraçar a esperança, ainda mais agora com o anúncio do PAC. Vamos seguir cobrando o retorno dos impostos que pagamos, para que nossos governantes façam o que precisa ser feito para melhorar a infraestrutura do Polo de Confecções. Que Deus nos abençoe nessa missão.

O setor tem sofrido o impacto do e-commerce internacional que agora tem isenção de imposto de importação em compras até US$ 50?

A isenção de imposto de importação em compras no e-commerce internacional de até US$ 50 tem um duro impacto na indústria e no varejo brasileiro, resultando em perdas de empregos e prejuízos financeiros. Um dos segmentos mais prejudicados no Brasil é a indústria têxtil e de confecção. Segundo a ABIT (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção), esse setor tem faturamento anual de aproximadamente R$ 190 bilhões, com arrecadação de taxas e impostos na ordem de R$ 16,5 bilhões e uma geração de empregos formais de 1,34 milhão de pessoas.

Um ambiente de negócios sem isonomia tributária (o princípio de que todos são iguais perante a lei, que todos serão submetidos às mesmas regras jurídicas) causa um perigoso desequilíbrio na economia do País colocando em risco os empregos da indústria e do varejo, bem como a viabilidade de muitas empresas.

Assim, para garantir uma concorrência justa, é importante que as empresas nacionais também tenham uma isenção. Isso sem esquecer da importância de investir em campanhas para conscientizar os consumidores, investir em infraestrutura, tecnologia, inovação e capacitação. Dessa forma conseguiremos um ambiente de negócios justo, competitivo e sustentável, para que possamos promover o crescimento econômico e a geração de empregos no Brasil.

Um dos desafios do setor é a redução da informalidade. Como está a relação de trabalho nas empresas de confecção? É necessário o governo investir em educação e qualificação profissional?

Com a criação da sistemática têxtil em Pernambuco a informalidade diminuiu e a arrecadação de ICMS cresceu, uma prova de que quando o Governo do Estado mantém um canal de diálogo com as entidades que verdadeiramente representam a economia do Polo de Confecções, com propósito de realizar um trabalho sério e conjunto, os bons resultados aparecem. A antiga legislação tributária do setor em Pernambuco não contemplava as particularidades e a dinâmica de funcionamento do Polo de Confecções. Com a sistemática, essas questões foram levadas em consideração e conseguimos construir uma legislação que trouxe ganho de competitividade. Uma das principais mudanças foi a cobrança do ICMS na entrada do tecido no Estado. A Secretaria da Fazenda de Pernambuco soube fazer bem esse trabalho e, juntos, transformamos um gargalo que era a legislação tributária têxtil estadual em um diferencial de competitividade para o Polo de Confecções de Pernambuco.

Contudo, precisamos avançar em questões como qualificação profissional, infraestrutura (sobretudo com as estradas), segurança, abastecimento de água, inovação tecnológica e sustentabilidade.

Em todo o mundo há uma discussão para tornar o setor de confecção mais sustentável do ponto de vista ambiental. Como essa questão tem sido tratada no Polo do Agreste?

Essa é uma pauta que precisamos avançar pois tem ficado restrita a iniciativas pontuais, sem conexão com algo maior e coletivo. A questão precisa ser trabalhada pelas lideranças do setor público e privado do Polo de Confecções do Agreste. A colaboração entre o Governo Federal, Estadual e empresas de moda é essencial para promover a sustentabilidade em um ambiente de negócios como o nosso.

Todos esses atores têm papéis importantes a desempenhar para garantir que a indústria da moda no Agreste Pernambucano seja mais amiga do meio ambiente e socialmente responsável. Precisamos viabilizar incentivos fiscais para as empresas que adotarem práticas sustentáveis; redução de impostos para produtos ecologicamente corretos com lixo zero em sua produção, por exemplo.

O Governo Federal sobretudo precisa investir em pesquisa e desenvolvimento de materiais e processos mais sustentáveis na indústria da moda. Isso pode envolver a criação de fundos para pesquisa, parcerias com instituições acadêmicas e a promoção de competições (gameficação) que estimulem a inovação nas soluções sustentáveis para mitigar o peso da pegada ambiental do polo.

Alguns analistas afirmam que um ponto de inflexão do polo seria o de não apenas fabricar e comercializar confecção mas produzir moda, o que agregaria mais valor às peças. Como o senhor avalia essa análise?

Essa já é uma realidade do Polo de Confecções do Agreste Pernambucano. Não fabricamos apenas peças do vestuário em grande volume, nossas empresas criam moda e estão ganhando cada vez mais destaque quando investem em criatividade para se diferenciar no mercado. O Polo de Confecções do Agreste não é apenas um centro de produção em massa, mas um ambiente rico em diversidade de produtores e talentos.

Aqui, designers de moda e estilistas locais dedicam tempo e esforço para criar peças bem elaboradas, que não apenas atendem à demanda de quantidade mas, também, enfatizam a criatividade e a inovação no design de moda. No nosso ecossistema de negócios, a evolução dos profissionais da economia criativa vem promovendo uma incrível revolução na qualidade, no design e na diversidade de produtos produzidos e ofertados no Polo de Confecções, tudo com o preço competitivo que sempre tivemos.

Pernambuco precisa conhecer mais e melhor o Polo de Confecções do Agreste. Vou além, Pernambuco precisa sentir orgulho do Polo de Confecções, um dos mais incríveis ecossistemas de empreendedorismo e moda da América Latina.

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