Uma Tese sobre o Nordeste Patriarcal para celebrar os 123 anos de Gilberto Freyre – Revista Algomais – a revista de Pernambuco
Cultura bem temperada

Cultura bem temperada

Raul Lody

Uma Tese sobre o Nordeste Patriarcal para celebrar os 123 anos de Gilberto Freyre

Gilberto Freyre forma um novo olhar e um sentimento de nacionalidade a partir das relações sociais nos ambientes da multiculturalidade brasileira, com ênfase no Nordeste. E assim. Gilberto assume um caminho auto etnográfico e se torna também protagonista dos seus relatos sobre a intimidade das casas patriarcais.

É um auto olhar que recupera a sua ancestralidade patriarcal nos depoimentos de familiares e de um contexto profundamente novo e transgressor que marcam os anos 1920.
A busca por um entendimento de Nação nos cenários mundiais de também buscas pelas matrizes da pluralidade etnocultural com os movimentos artísticos do surrealismo, do dadaísmo, do fauvismo e as novas estéticas, os novos contextos e alargamentos das paredes reais de pedra e cal e das paredes simbólicas e dos limites e das possibilidades de tocar no outro, no diferente.

As descobertas de Gilberto na sua história de vida e nas suas relações na casas, trazem descritivos que cruamente revelam os hábitos higiênicos, a sexualidade, o gênero e as classes sociais ,quase “castas”.
Em destaque as relações sociais em bases econômicas para a afirmação de identidades e de papéis sociais na casa patriarcal e nos contextos ampliados na região. E assim fala Gilberto :

“Alfredo de Carvalho, por exemplo _ para poderem comer , na velhice de fidalgos arruinados , o queijo-do-Reino e a passa a que se haviam habituados nos dias de esplendor , terem precisado de vender móveis e livros raros , pratas e joias de família “. Essa intimidade que Gilberto revela dá um retrato cru e direto dos muitos significados de viver na casa e interagindo com as suas diversas ritualidades cotidianas e na ruptura também ritual e afirmativa das festas e do sagrado . Também as funções de gênero nas casas , ou lugares hierarquizados de homens e de mulheres, e a temporalidade nos papeis sociais que determinam as funcionalidades de crianças e de velhos nas casas de pedra, de madeira ,de ferro, e de cal e nas casas simbólicas . As revelações da intimidade, os verdadeiros sentidos de viver em família , as ritualidades da casa, além do teatro social da igreja, da festa, das visitas de viver à mesa E diz Gilberto :” (…) o quase secreto de viver nas alcovas ,das relações entre iáiás e as mucambas ,entre pais e filhos “.das cozinhas “. A moral , o céu sempre numa Igreja dominadora, com os santos , com os ancestrais representados nos seus retratos e morando nos oratórios , lugares de trazer culto ancestral s e as histórias familiares . A tese que celebra 100 anos está no processo de análise da “new history”, uma história social , cultural além dos fatos épicos, dos heróis , onde a pessoa é o cento da história nas suas múltiplas relações humanas e sociais Neste contexto é importante citar um artigo de Gilberto, no Diário de Pernambuco , publica seu artigo “Pirão Glória do Brasil” que afirma como é necessário um monumento ao pirão .E assim mostra um forte sentimento telúrico e moderno, profundamente moderno. As experiências internacionais de Gilberto ampliam o seu olhar brasileiro para o Brasil e em especial para o Nordeste. É preciso estar no Brasil e fora do Brasil para entender o Brasil. A história e a antropologia de Gilberto mostram novas formas de ver os rituais secretos das casas e assim organizar um modelo de nacional. E isso afirma o que diz Braudel” (…) o estudo do passado humano fazia-se necessário aplicar critérios diferentes dos convencionais”. Nesta construção de métodos e de conceitos da cultura que atesta singularidades, temas da vida cotidiana, é destaque no artigo de Gilberto ‘Vida Social no Nordeste Brasileiro (1825-1925) “publicado em 1925 por ocasião da celebração do 1º centenário do jornal Diário de Pernambuco. As pesquisas etnográficas e auto etnográficas em Gilberto Freyre reúnem amplos acervos sociais e culturais que são organizados nas suas obras fundamentais como Casa-Grande& Senzala, Sobrados e Mucambos e Ordem e Progresso. Na tese , Gilberto traz a imagem como forma sensível e linguagem para interpretar e mostrar os temas da cultura material. “(…) para interprestar todo o inventário litográfico que lhe tem sido possível reunir sobre pessoas , sobre casas, sobre móveis, sobre paisagens(…)” O entendimento de paisagem está nos entornos ecologicamente representados e nas paisagens sociais, nas relações urbanas, nas cidades e suas interações com as casas, com as pessoas. Nasce assim um processo generoso para entender o outro, para transitar na diversidade, naquilo que é diferente numa verdadeira busca pela alteridade. Os desafios estão ainda no olhar vitoriano vigente e orientador para representar as relações sociais e familiares e é preciso transgredir estes limites .Gilberto é um inovador , um revelador na busca pelo outro e mostrar pelo olhar antropológico um modelo de formação regional untada de açúcar e de vícios na sexualidade, no catolicismo íntimo com os santos da casa, quase promiscua. Todos estes temas fundamentais para o conhecimento da família patriarcal são ampliados em Casa -Grande & Senzala, num roteiro brasileiro para o que se começou a entender por brasileiro. Ainda as questões referentes a mundialização pelas relações comerciais e com as maneiras de importar hábitos nas casas, nas roupas, nas comidas, nos comportamentos sociais e na dinâmica das relações entre os gêneros para atualizar e viver o moderno nas famílias patriarcais. ‘( … ) na formação de hábitos à época a importação da Inglaterra, da França. de Hamburgo de artigos elegantes de uso pessoal ,de móveis e espelhos para as salas aristocráticas ou burguesas , de alimentos, , vinhos e cervejas e licores considerados finos e capazes de dar prestígio às mesas de casas de família(…) “ Assim ampliadas as relações pelo consumo de bens para a casa e os costumes pessoais vive-se confrontos com as bases etnoculturais formadoras do brasileiro . “(…) homem situado, que podendo ser o situado no trópico, como é o brasileiro e de povos afins do brasileiro pode ser caracterizadas ou condicionadas por outras ecologias . a do homem de origem hispânica ou ibérica a quem juntariam influências não europeias e de culturas extra europeias (…) “

Há ainda um olhar impressionista de Gilberto Freyre sobre todos estes processos sociais que definem e singularizam o brasileiro nos contextos econômicos selecionados, e tendo como lugar ideal e cenário a casa para manifestar a vida e a cultura.

Os argumentos da cultura material na tese de Gilberto são fundamentais por mostrar acervos , usos , funções nas casas
“(…) brasileirismos sertanejos (…) bilhas , os potes, as jarras, as cuias, os punhais, os coco de beber água(… )os queijos, os vinhos, os cachimbos(…)”

E ,sem ´duvida a, cultura material pela comida afirmada nas em Gilberto suas escolhas trazendo a tradução enquanto um argumento na revelação da identidade do brasileiro.
“Os trabalhadores dos grandes engenhos ou fazenda patriarcais do Brasil dos meados do século XIX eram de ordinário bem alimentados e recebiam comidas dos senhores como se fossem_ depõe um observador estrangeiro _ como se fosse uma grande família de crianças .Tinham três refeições por dia e um pouco aguardente pela a manhã .
A primeira refeição constituía de farinha ou pirão , com frutas e aguardente .Ao meio dia , faziam uma refeição muito substancial
De carne ou peixe . À noite feijão- preto , arroz e verduras.”

Outras leituras de Gilberto sobre as comidas e as suas muitas representações alimentares e simbólicas para um .melhor entendimento das casas e sobre os seus habitantes no contexto da família patriarcal .

“ (…) os brasileiros, quando patriarcais precisam não somente da sala de visita e de muitos quartos ,mas de grande sala de jantar. Isto tanto nos sobrados das cidades como nas casas-grandes do interior .as famílias eram numerosas e gostavam de receber amigos para o jantar .Era nas mesas, nos grandes pratos cheios de gorda carne de porco com feijão- preto , de pirão (…) de canjica , de pães doce, de doces ,de bolos e de sobremesas frias , que os brasileiros

Mostravam sua melhor hospitalidade patriarcal (…) os patriarcas enchiam a s mesas especialmente de doces e cremes de frutas nativas , como laranjas, maracujás, goiabas e mangas “.
A comida nas suas muitas formas de comunicação e de produção marcam também os métodos preferenciais de Gilberto na sua tese de base humanista e antropológica nos cenários de um Brasil, no caso preferencial do Nordeste, de Pernambuco ,do Recife e as relações familiares de Gilberto, todos orientadores e formadores de uma busca pelo nacional brasileiro.
“Nos grandes engenhos de açúcar de Pernambuco espalhados entre o Recife e o tio Uma(…) pequenas industrias domésticas desenvolviam-se paralelamente às atividades agrícolas .Entre essas pequenas indústrias a fabricação de vinhos de jenipapo , a preparação de charques ou carne-seca , de queijo de coalho e de várias espécies de doces e de bolos”.
Esse brasileiro na sua diversidade e na sua unidade social e econômica é mostrado com e sem roupa na sua mais perfeita identidade tropical Nordestina.

RAUL LODY.

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